No final de uma parceria que durou um ano, Gonçalo Peixoto apresentou a sua coleção cápsula (com um número menor de peças que as coleções habituais) para a Decenio, a marca portuguesa que tem o Mediterrâneo como inspiração. Para o designer, o desafio estava bem definido: colocar o seu ADN nessa inspiração que é a base de todas as peças da marca parceira.
O resultado foi apresentado na passada quinta-feira e umas horas antes Gonçalo contou tudo sobre o projeto à Forbes Portugal.
Fale-me um pouco sobre este projeto em parceria com a Decenio.
Este é o final de uma parceria entre Gonçalo Peixoto e a Decenio, uma marca portuguesa. Faz precisamente agora um ano que as coisas começaram e a parceria foi uma coleção no Portugal Fashion, em outubro, e agora este é o final, o lançamento de uma coleção cápsula. A Decenio aqui teve um papel muito importante porque me deu sempre um cartão branco, então fiz durante toda a coleção o que eu achava que era a visão do Gonçalo Peixoto para a Decenio. Hoje [11 de maio] é o fim, para já, desta relação com uma coleção que vai estar à venda a partir de dia 12 de maio em todos as plataformas e lojas da Decenio. Queria com esta coleção dar um bocadinho um novo ar à Decenio, mais fresco, mais Gonçalo Peixoto, jovem, colorido, com lantejoulas, brilhos, com aquilo que nós não estamos habituados a ver uma marca como a Decenio a trabalhar. Hoje [11 de maio] é o evento, em que estará presente a imprensa e a squad do Gonçalo Peixoto, que está sempre presente e que é efetivamente muito forte, é um dos motivos do sucesso da marca.
Como descreve esta coleção?
Há uma palavra muito presente na Decenio, e isto é o ponto de partida para todas as coleções, que é o Mediterrâneo. A Decenio é uma marca que começa tudo o que é a parte criativa com o Mediterrâneo. Eu acho que é uma palavra muito abrangente, acho que conseguimos ir a muitos lados com o Mediterrâneo. Eu tentei ir a sítios que eles não vão, tirá-los um bocadinho da zona de conforto deles, apostar em coisas que eles normalmente não estão habituados a apostar. Se calhar no Mediterrâneo nós pensamos em brancos, uma tranquilidade, paz, e eu quis abanar um bocadinho as coisas, que não deixam de ser mediterrânicas, e trazer aqui um bocadinho de lantejoulas e brilhos. Eu queria que as pessoas passassem na Decenio e na montra percebessem ‘aquilo é Gonçalo Peixoto para a Decenio’. E foi isto que eu tentei fazer, reinterpretar este Mediterrâneo e o que é o Mediterrâneo para mim, o que me faz lembrar, quais são as minhas memórias, o que é o Gonçalo a interpretar este tema. Queria que fosse efetivamente muito diferente daquilo que eles fazem no dia a dia.
E o resultado?
Acho que está bem conseguido porque consigo ver ali o Mediterrâneo na coleção, através das cores, silhuetas, cortes, tecidos, mas também consigo ver ali um lado Gonçalo Peixoto, que era isso o mais importante. Acho que quando estamos a criar para outros temos que nos pôr um bocadinho no papel da marca e estudar a história, perceber as suas crenças, mas na verdade eu queria que tivesse um ADN muito duro, forte e vincado, e acho que conseguimos.
Que feedback tem recebido da parte da marca?
A Decenio com esta parceria queria entrar num mercado um bocadinho mais jovem, que é um mercado que eu sei que domino, que tenho muitas seguidoras e muitas compradoras nessa faixa etária, e eu pelo contrário ganhei uma faixa etária um bocadinho mais acima, mais ponderada, que também era importante para mim. Acho que isto foi uma win-win situation, foi bom para os dois, crescemos os dois. Costumo dizer isto a todos os meus amigos que têm marcas e todas as marcas que conheço: Acho mesmo que Portugal tem espaço para tudo, que há muitos tipos de compradores e somos todos muito diferentes uns dos outros, por isso não vejo como concorrência, mas como uma aliança. O que eu fiz para a Decenio são coisas que eu não teria na minha coleção, ou vice-versa.
Falámos sobre a presença do squad no evento, qual é o papel das redes sociais e deste squad na marca?
Eu costumo dizer que sou um designer das redes sociais. A marca começa há mais ou menos 10 anos, quando eu começo a criar, e a verdade é que eu usei as redes sociais como uma arma, como o meu aliado para começar a dar um pulo. A minha carreira nasce nas redes sociais, depois expande-se e sai, mas as redes sociais são o que me torna diferente dos outros designers. Nós temos um bocadinho a percepção, se olharmos atrás na história da moda em Portugal, que os designers são uma figura longínqua, que nunca conhecemos muito, nunca ouvimos falar muito ou eles nunca se dão muito a conhecer. Eu queria ser disruptivo nisso, queria aproximar as pessoas da marca, que as pessoas me pudessem dar o feedback diário, que eu pudesse perceber quais são as necessidades delas, como posso melhorar, que eu pudesse tornar-me um melhor designer. Este squad vem muito vincado à marca, que é assumido, porque eu acho que trago aquilo que elas querem usar, acho que entendo muito bem a mulher e isto é um trabalho que eu faço porque ouço muito a compradora, alio-me muito àquilo que a compradora me diz. Também se torna importante porque eu sou um dos primeiros a fazer isto dos squads em Portugal, não havia squads a assistir ao desfile, a usar a roupa do próprio desfile, isto era uma coisa que não se via em Portugal. Ou seja, vim tentar trazer aquilo que via lá fora, que consumia. É esta que eu acho que é a poção mágica para a marca.
Sente que essa estratégia é bem recebida em Portugal?
Sempre que fazia um desfile a Rita Pereira usava um look do próprio desfile. Lembro-me de nos primeiros anos todos os meus colegas de profissão dizerem: ‘mas isso não faz sentido nenhum, como é que estás a desperdiçar um look, como é que alguém já está a mostrar um look que tem de estar no segredo dos deuses’. Há meia dúzia de meses a Balenciaga fez isso com a Kim Kardashian e foi incrível, breathtaking. Eu disse: ‘faço isto há cinco anos em Portugal e ninguém acha que estou a fazer isto em condições’. Com o exemplo lá fora, a partir de agora é: ‘o Gonçalo é um génio, como é que ele fez isto’. Eu sempre acreditei que esta era a minha maior arma e por isso quando começo com o squad tenho a certeza que isto é visto como algo que é menos moda ou menos profissional, agora acho que todos eles tentam fazer a mesma coisa. Por isso é que acho que estou um bocadinho à frente.