As grandes empresas portuguesas continuam a registar anos de resultados históricos, contribuindo, assim, para engrandecer o já elevado património das famílias mais poderosas do país. Bastante resilientes à crise pandémica, boa parte dos negócios nacionais, – pelo menos os contabilizados para esta shortlist –, recuperaram em força e ultrapassaram as performances financeiras de 2019. Até o setor automóvel recuperou – ainda que a crise esteja novamente à espreita – com famílias que controlam grupos como o Salvador Caetano, o Grupo NORS, a Ascendum e a Santogal a subirem de posições na lista de 2024.
Assim, analisando as 50 maiores fortunas nacionais, verificamos que o valor total das mesmas atinge este ano os 45,8 mil milhões de euros, um valor superior em 5 mil milhões face à contabilização de 2023. Isto representa cerca de 17% da riqueza nacional produzida num ano, já que o PIB do ano passado foi de 267,3 mil milhões de euros. Só os 10 mais ricos detém uma fatia de 23,5 mil milhões de euros, quase metade dos 50 nomes. O último nome do top 25, António Mota, da Mota Engil, ficou acima da fasquia dos 500 milhões de euros, e o último nome a entrar nos 50, o empresário Paulo Fernandes, da Cofina, Altri e Rama, está nos 310 milhões de euros. Todos os restantes nomes avaliados – perto de 100 – ficaram abaixo deste valor.
A revista Forbes Portugal publicou em dezembro, na edição que está agora em banca, o seu ranking anual dos 50 milionários nacionais, e vai começar a publicar agora textos relativos a cada um dos nomes da sua lista.
Família Amorim continua a liderar o top50
Assim, não será novidade que o primeiro lugar do ranking se mantenha inalterado e a grande distância do segundo classificado. A família herdeira dos negócios de Américo Amorim soma e segue, mantendo-se de pedra e cal na primeira posição nacional, sendo que esta é a única integrada na lista mundial da Forbes Internacional. Com uma fortuna que ascende a cerca de 5,4 mil milhões de euros – contabilização feita ao dia 2 de dezembro de 2024 –, o valor mais alto de sempre, Fernanda, Paula, Marta e Luísa Amorim estão posicionados no 571º lugar no ranking mundial.
Turismo, energia, distribuição, retalho automóvel são alguns dos setores que mais valorizaram no último ano e que deram ainda mais poder financeiro às famílias que os controlam.
A raiz da fortuna dos Amorim está na indústria da cortiça, empresa que tem atualmente uma capitalização bolsista que ascende a 1,11 mil milhões de euros. Porém, o maior ativo das quatro mulheres mais ricas do país é a Galp, que tem um valor de mercado acima dos 11 mil milhões de euros e da qual detém uma participação de 36,69% indiretamente através da Amorim Energia. As ações da empresa, que cotava a 16,24 euros no dia da avaliação, subiram cerca de 20% no último ano, o que ajuda a explicar o crescimento da fortuna da família Amorim, que o ano passado estava nos 4,8 mil milhões de euros.
A novidade deste ano é que a família Guimarães de Mello, em terceira posição na lista de 2023, ascendeu ao segundo lugar do pódio, com uma avaliação de cerca de 3.329 milhões de euros, um incremento de 600 milhões de euros. A família, descente do empresário José de Mello, é dona da rede de clínicas e hospitais privados CUF, da indústria química Bondalti, de 17% da Brisa, e de uma nova holding, a WineStone, para a aposta nos vinhos e no enoturismo, e explora herdades como o Monte da Ravasqueira, no Alentejo, entre outras.
Família Soares dos Santos perdeu algum valor
A família também beneficiou da descida de valor da terceira classificada, o clã descendente de Alexandre Soares dos Santos. Este foi um dos poucos casos de perda de valor face a 2023, já que as ações da Jerónimo Martins, o seu principal ativo, caíram face à avaliação de 2023. Os sete herdeiros têm participação maioritária na Sociedade Francisco Manuel dos Santos, dona de cerca de 56% da Jerónimo Martins, empresa que detêm, entre outras empresas, a rede de supermercados Pingo Doce. As ações do grupo nacional cotavam a 18,19 euros no dia 2 de dezembro, data da avaliação da Forbes Portugal, tendo o seu valor caído quase 21% face à avaliação de 2023. Todos os elementos desta sociedade familiar, como os primos Fernando Figueiredo dos Santos, Maria Isabel Martins dos Santos, Maria Helena Mota Goya e Maria de Lurdes Soares dos Santos, perderam valor e desceram de posição no ranking.
No quarto lugar têm-se mantido, mais ou menos estáveis, os três filhos de Belmiro de Azevedo, Nuno, Paulo e Cláudia. Donos de participações na Sonae SGPS, Sonae Capital, Sonae Indústria, SonaeCom, contabilizam este ano um total de 2.383 milhões de euros, o que representou um incremento de 250 milhões de euros face a 2023. O Grupo Sonae, liderado por Cláudia Azevedo, que engloba marcas como a Modelo Continente, a Worten, a MO, a Salsa Jeans, a Zipyy, a Wells, a Sierra, a NOS, registou um volume de negócios consolidado de 8,4 mil milhões de euros em 2023.
Conheça os que mais subiram na lista
A família Jervell e a família Vieira, do grupo NORS e Ascendum, continuam a galgar no ranking nacional dos maiores patrimónios, tal como a família Silva Domingues e Carlos Moreira da Silva, que dividem a propriedade do BA Glass. Isto porque qualquer um destes grupos está a crescer a uma velocidade acelerada e a baterem recordes de receitas.
A família Silva Domingues, liderada por Francisco Silva Domingues e Rita Silva Domingues, dona do BA Glass Group, da holding Fim do Dia SGPS, da Tangor Capital, da Euroatla, da Euronave, e da Cerealis, ultrapassou este ano a fasquia dos mil milhões de euros, passando da 13º posição para a 7ª, tendo protagonizado uma das maiores subidas no ranking. A família está este ano avaliada em qualquer coisa como 1.694 mil milhões de euros.
Também Carlos Moreira da Silva, seu sócio na BA Group e na Cerealis, viu o seu património subir de 860 milhões de euros para os 1.613 milhões, passando da 16º posição para a nona. O BA Group, que produz embalagens de vidro, fatura mais de 1,5 mil milhões de euros e libertou um EBITDA de 525 milhões de euros em 2023, um crescimento de mais de 200 milhões de euros neste indicador, o que impulsionou a valorização do negócio.
Área automóvel em crescimento nos maiores patrimónios
O Grupo Nors, de Tomás Jervell, que atua no setor automóvel, maquinaria e mobilidade, detido em parceria com a família Jensen Faria Leite, e que consolida a Ascendum, de Ernesto Gomes Vieira, foi também um dos patrimónios que mais valorizou. A família Jervell, avaliada em 1.110 milhões em 2023, sobe agora para os 1.213 milhões de euros, já que o grupo que lidera alcançou em 2023: um volume de negócios alcançou os 2,8 mil milhões de euros, e um EBITDA de 188,7 milhões de euros.
Também na área automóvel, a família descendente de Salvador Caetano registou uma melhoria de resultados, levando Maria Angelina Ramos e restante família acionista, a subir de valor na lista da Forbes Portugal. Está agora na 11º – caiu um lugar – com um total de 1.318 milhões, contra os 996 milhões alcançados o ano passado.
A família Silva Domingues, liderada por Francisco Silva Domingues e Rita Silva Domingues, dona do BA Glass Group, da holding Fim do Dia SGPS, da Tangor Capital, da Euroatla, da Euronave, e da Cerealis, ultrapassou este ano a fasquia dos mil milhões de euros.
De ressalvar ainda, nos maiores crescimentos do ano, que os dois principais empresários do turismo nacional continuam a acrescentar valor aos seus ativos. Dionísio Pestana, o empreendedor madeirense que fundou o Grupo Pestana, e Jorge Rebelo de Almeida, que fundou o grupo Vila Galé, continuam a dar cartas na hotelaria. Dionísio, que já explora 108 unidades, com quatro insígnias, a Pestana Hotels & Resorts, a Pestana Pousadas de Portugal, a Pestana Collection Hotels e a Pestana CR7 Lifestyle Hotels, ascende à sexta posição, com um património de 1,75 mil milhões de euros. E Jorge Rebelo de Almeida, na 13º posição, ultrapassou este ano a fasquia dos mil milhões de euros de património. O grupo Vila Galé tem sob a sua gestão 45 unidades hoteleiras, das quais 32 em Portugal, 11 no Brasil, uma em Espanha e outra em Cuba.
As fortunas que a Forbes não avaliou
À semelhança do que aconteceu no ano passado, também este ano se repetiu a dificuldade: como avaliar as fortunas dos fundadores portugueses de empresas consideradas unicórnios, se as suas participações não são conhecidas? O único unicórnio do qual a participação era pública, a Farfech, de José Neves, deixou de pertencer ao empresário pelos conhecidos problemas financeiros que enfrentou e continua a enfrentar. O empresário chegou a ser um dos homens mais ricos com um património acionista de mil milhões de euros, em 2019, e hoje pouco se sabe da sua situação.
Tirando a Farfech, que deixou de ser unicórnio – empresa tecnológica não cotada avaliada em mais de mil milhões de dólares -, Portugal tem seis empresas com ADN nacional com este estatuto, embora apenas uma tenha sede em Portugal, a Feedzai.
A Forbes Portugal não consegui avaliar com precisão suficiente para inserir na lista a fortuna dos portugueses fundadores de unicórnios, nem a fortuna de Cristiano Ronaldo, do qual apenas são conhecidos os ganhos anuais e não o dinheiro que efetivamente detém em contas e aplicações.
Segundo os dados da lista da CB Insights, a Talkdesk, fundada por Tiago Paiva e Cristina Fonseca, é a mais valiosa, com um total de 10 mil milhões de dólares (cerca de 9,4 mil milhões de euros). Ou seja, estes dois empreendedores poderiam estar na lista dos 50 mais ricos, se tiverem apenas 5% ou 10% da empresa. O mesmo acontece com a Outsystems, avaliada em 4,3 mil milhões de dólares (cerca de 4 mil milhões de euros), e fundada por Paulo Rosado, ainda acionista.
A Remote, co-fundada pelo português Marcelo Lebre, vale agora 3 mil milhões de dólares (cerca de 2,8 mil milhões de euros), sendo que a Sword Health – fundada por Virgílio Bento e mais quatro empreendedores, regista a mesma avaliação, tal como a Anchorage, de Diogo Mónica. A Feedzai, de Nuno Sebastião, mantém o seu valor inicial do estatuto, de mil milhões de dólares (cerca de 950 milhões de euros). Todos estes empreendedores poderiam estar na nossa lista, se conseguíssemos chegar às parcelas certas, e por isso, não quisemos arriscar.
Outra dificuldade que a Forbes sentiu foi a avaliação de Cristiano Ronaldo. É público quanto ganha o desportista português – a Forbes Internacional avalia os seus ganhos anuais em cerca de 260 milhões de dólares, (cerca de 245 milhões de euros), em campo e fora dele – e é sabido que tem vários negócios em andamento, bens imóveis, coleções de automóveis. Porém, não conhecendo o que o jogador tem realmente em contas bancárias, e outras aplicações, a metodologia da Forbes para este estudo, aplicada ao património empresarial, não se apresenta eficaz.
A metodologia usada nas avaliações de 2024
A Forbes Portugal realizou, mais uma vez, um levantamento dos empresários mais ricos do país avaliando sobretudo os seus patrimónios empresariais – avaliações feitas para cerca de 100 empresários – através das suas participações em sociedades cotadas e não cotadas. Em vários casos, naqueles em que não é possível aferir as participações específicas de cada membro, ou em casos de heranças indivisas, é avaliada a posição da família como um todo. No caso da família Amorim, a única no ranking internacional, utilizamos os cálculos, atualizados ao dia de 2 dezembro de 2024, do simulador da Forbes International.
Para todas as outras foram feitas avaliações empresariais que não pretendem mais do que ser apenas o produto de uma intensa pesquisa jornalística, que resulta da consulta de informação disponível em relatórios e contas de empresas, sobretudo relativas ao exercício de 2023, de textos publicados nos órgãos de comunicação social bem como da consulta de fontes próximas. Os dados recolhidos resultam de informação pública, acessível, e a sua veracidade depende muito da transparência desses dados. Não nos é possível avaliar a liquidez existente em contas bancárias dos protagonistas, dentro ou fora do país, bem como as suas dívidas pessoais e outros créditos associados, tal como carteiras de ações não divulgadas, ou participações não qualificadas. Foram, no entanto, excluídos do estudo os casos em que as dificuldades financeiras são do domínio público.
Para avaliar as empresas cotadas foram tidas em conta as cotações das sociedades à data de 2 de dezembro de 2024, o mesmo acontecendo nas holdings de empresas cotadas. Nestas últimas utilizou-se o valor do mercado da casa-mãe, pois as empresas por ela detidas não podem ser livremente negociadas.
Para proceder às avaliações patrimoniais, nas holdings não cotadas foi aplicada a avaliação da soma das partes, e nas sociedades do grupo foi aplicado, individualmente ou consolidado, o método dos múltiplos EV/EBIDTA, utilizando para isso a lista dos múltiplos de Damodaran. Para encontrar o valor de mercado da empresa aplica-se o valor dos resultados antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (EBITDA), vezes o múltiplo do setor, excluindo-se ainda a dívida líquida. Nas sociedades imobiliárias, utilizou-se o valor dos capitais próprios. As empresas da banca não cotadas foram calculadas através da utilização do PER do setor aplicado sobre os lucros. Para as sociedades cotadas foi usado o valor bolsista das mesmas.
(Texto publicado na edição de dezembro/janeiro, agora em banca)