As criptomoedas como a Bitcoin e a Ethereum, que surgiram após a crise financeira de 2008, têm vindo a tornar-se alternativas de investimento cada vez mais populares e a blockchain está entre as tecnologias digitais emergentes mais suscetíveis de transformar a forma como as pessoas trabalham e vivem, conclui o relatório da Boston Consulting Group (BCG), intitulado “Seven Trends at the Frontier of Blockchain Banking”.
Explica a Boston Consulting Group que a tecnologia de blockchain tem ganho tração, pois não só permite a existência de atividades financeiras anónimas ou pseudónimas sem controlo central, como ainda torna os participantes responsáveis pelas suas transações: “Os dados não podem ser alterados retroativamente, pelo que as aplicações baseadas nesta tecnologia se tornam entidades autónomas e partilhadas. Desta forma, os participantes na rede podem verificar cada transação e confiar no sistema porque os seus dados são amplamente distribuídos e transparentes”.
Embora a inovação neste campo esteja a ocorrer em todo o mundo, com muitos lançamentos de produtos na Europa e nos EUA, a região da Ásia-Pacífico é a que mais se destaca, evidencia a BCG.
Feitas as contas, a China possui maior destaque com a criação de Binance, OKEx e Huobique, que constituem já as três maiores bolsas em transações de criptomoedas do mundo, totalizando, em média, perto de 100 mil milhões de dólares por dia em volume nos mercados de derivados e spot.
Na região, realça a BCG, também se realça a atividade do Japão, cuja bolsa, Mt. Gox, era já responsável por 70% das trocas comerciais de Bitcoin no início dos mercados de criptomoedas. Malta e Suíça também lançaram quadros regulamentares claros para apoiar o desenvolvimento da indústria das criptomoedas.
O relatório da BCG salienta a existência de um surpreendente potencial de encaixe entre as novas soluções fintech e as linhas de negócio convencionais dos bancos, enumerando sete tendências relacionadas com a tecnologia blockchain que irão impactar o sector bancário:
Contratos inteligentes
(como novas formas digitais de implementação de acordos formais)
Os chamados “contratos inteligentes” podem melhorar inúmeras características dos contratos convencionais. Uma das vantagens é que esses contratos inteligentes podem atuar automaticamente sobre uma provisão ativada inesperadamente. “Por exemplo, o contrato inteligente pode prever que, quando ocorre um alargamento do âmbito de um projeto, o fornecedor deverá receber um pagamento e assim atuar automaticamente sobre este acontecimento”, exemplifica a BCG.
Outro aspeto que estes analistas destacam é o facto de os contratos inteligentes poderem dificultar ainda mais a alteração indevida de cláusulas contratuais, aumentando a transparência e resistência dos contratos relativamente a potenciais manipulações legais.
Oferta inicial de criptomoedas
(como novo método de angariação de fundos para empresas)
A criação e utilização de criptomoedas para angariar capital é já uma tendência estabelecida na comunidade financeira e de defensores da tecnologia blockchain. Este processo, denominado de oferta inicial de criptomoedas (ICO – Initial Coin Offering), é semelhante ao de uma oferta pública inicial (IPO – Initial Public Offering), mas sem as proteções que acompanham as ofertas públicas regulamentadas. “No entanto, os bancos também participar em processos de ICO. Além disso, porque oferece retornos apenas baseados no desempenho financeiro e não no capital próprio, os ICOs geralmente dão à empresa emissora um maior nível de independência”, aponta a BCG.
Asset-backed digital tokens
(como criptomoedas transacionáveis tendo por base outros ativos)
Enquanto o valor de uma criptomoeda deriva maioritariamente de uma análise especulativa no momento da troca, o valor dos “asset-backed digital tokens” está ligado à avaliação de outro ativo real que têm por base. “Até ao momento, investidores podem deter no seu portfolio asset-backed digital tokens que se inserem num de quatro grupos: Security Tokens, Real Estate Tokens, Stablecoins e Utility Tokens. Estes podem ser negociados nos mercados secundários”, afirmam os especialistas da BCG.
Nonfungible Tokens (NFT)
(como tokens de criptomoedas com valor inerente)
Embora sejam tecnicamente um token digital, os NFT têm uma característica distintiva – cada token representa uma entidade única. Estes objetos, tipicamente colecionáveis, não são passíveis de troca por contrapartes equivalentes, sendo que como têm por base ativos únicos, como objetos de luxo feitos à mão, estas contrapartes equivalentes não existem. O valor de um NFT reflete o valor do bem a ele associado, mas esse bem não inclui necessariamente o objeto em si. Por exemplo, um NFT pode transmitir a propriedade de uma grande obra digital. No entanto, o artista, ou outro gestor, controla os direitos de autor (indicando onde e por quanto tempo a obra pode ser exibida), enquanto o proprietário do NFT controla os direitos de venda.
Moedas Digitais do Banco Central
(como um novo instrumento cambial criado pelos bancos centrais)
Os bancos centrais (CBDC – Central Bank Digital Currencies) estão a considerar a criação das suas próprias moedas digitais como forma de contrariar a diminuição do uso de dinheiro e o aumento do uso das criptomoedas privadas. “Estas moedas digitais não só possuem diversos benefícios para as economias mundiais, facilitando a digitalização das mesmas e contribuindo para o aumento da confiança para com moedas digitais, mas reforçam também a posição dos bancos centrais como agentes independentes sem interesses comerciais na utilização de dados pessoais no mercado financeiro”, subkinha a BCG.
Produtos financeiros descentralizados
(como aplicações bancárias e financeiras tendo como base a tecnologia blockchain)
A tendência para “novas formas de financiamento/investimento descentralizados engloba uma vasta gama de produtos emergentes, que têm como base a tecnologia de blockchain, para efetuar empréstimos, investimentos, créditos imobiliários e hipotecas”, diz a BCG: “Tais produtos têm maior adaptabilidade e maior potencial de utilização do que os contratos inteligentes ou os tokens. Os produtos financeiros tradicionais são transformados em novas variantes que não requerem um intermediário e que permitem o comércio direto entre pares, pelo que as transações não têm de passar por um banco ou outra entidade. Além disso, confiam em contratos inteligentes para controlar a atividade e estabelecer a integridade das transações”.
Serviços consultivos automatizados
(como meio de orientação e apoio automático para serviços que alavanquem em blockchain)
A necessidade de orientação financeira em tempo real para estes produtos, impulsionada por dados, “irá certamente crescer, exigindo um acompanhamento mais rápido. Assim, a utilização de aplicações de software automatizado por parte dos bancos, que alavanquem em algoritmos ou Inteligência Artificial para monitorizar a atividade de criptomoedas, detetando sinais que indicam boas oportunidades de compra ou venda, e comunicando-as ao investidor, permitirá uma gestão ativa e inteligente da carteira dos seus clientes”, realça a BCG. O relatório indica ainda que “os bancos podem alavancar” os seus serviços, “em todas estas tendências chave do universo blockchain, pela interseção que têm com as ofertas típicas da banca. Por exemplo, os bancos podem oferecer as suas próprias criptomoedas, ou ajudar os seus clientes a ter criptomoedas nos seus portefólios. Podem estabelecer serviços de consultoria e ter o papel de brokers de confiança destes novos instrumentos financeiros. Os bancos podem também tornar-se agentes chave para garantir a confiança no ecossistema, que a comercialização de produtos desenvolvidos sobre a tecnologia blockchain ainda requer”.
A BCG destaca assim a importância de os bancos considerarem a tecnologia blockchain na sua estratégia, não só para minimizarem o impacto de pressões competitivas por parte de outras empresas disruptivas, mas para que estes também consigam consolidar, ou fazer crescer, as suas posições nos mercados onde operam.