Susete Estrela, Health Coach e colunista da Forbes Portugal, moderou o painel dedicado à saúde mental no 1º Forbes Health Care Summit que contou com a participação de Ema Paulino, Presidente da Associação Nacional das Farmácias, e Gustavo Jesus, médico psiquiatra, Diretor Clínico do PIN – Partners in Neuroscience e autor do livro “300 mil anos de ansiedade” (ver intervenção de Gustavo Jesus em artigo separado, aqui).
Susete Estrela quis saber se podem as farmácias ser usadas para melhorar a saúde mental. Ema Paulino, Presidente da Associação Nacional das Farmácias (ANF), que participou na discussão, entende não apenas que sim, mas que podem ser mesmo um instrumento relevante numa estratégia mais ampla de saúde mental.
Ema Paulino explicou que, dada a rede capilar das farmácias em todo o território nacional e até o grau de proximidade (quase familiaridade e empatia) que as farmácias conseguem com os seus utentes, estes estabelecimentos são, já hoje, muito mais do que meros pontos de venda de medicamentos, com uma grande capacidade de atendimento em virtude de haver 4,2 farmacêuticos por farmácia, em média, em Portugal. E, frisa Ema Paulino, as farmácias podem desempenhar um papel ainda mais relevante no aconselhamento de muitos cidadãos para os direcionar para outras especialidades clínicas e, especificamente, de saúde mental.
Embora assuma que a rede de farmácias é “muito qualificada” e já “tem adquirido competências adicionais para intervir na jornada da saúde da pessoa”, a responsável pela ANF entende que “temos de ir mais a fundo”.
“Temos pessoas que vão à farmácia todos os dias. A pessoa ir à farmácia todos os dias manifesta uma necessidade mais profunda e temos de a perceber para direcionarmos as pessoas”.
Ema Paulino destaca nesse âmbito o projeto que está em curso que visa que as farmácias fiquem mais bem preparadas para compreenderem as reais necessidades dos utentes e assim melhorarem o serviço prestado para benefício do próprio utente. Esse projeto resultou já num protocolo firmado em outubro de 2022 com a Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) que, neste momento, se encontra na “fase 1”, de melhorar a própria saúde mental das equipas das farmácias: “Esse protocolo tem que ver, numa primeira fase, com o bem-estar do profissional de saúde e do cuidador. Para cuidarmos dos outros, temos que estar nos próprios bem. Estamos nesta fase de capacitar as equipas das farmácias”.
Ema Paulino acrescenta que “a segunda parte do trabalho deste programa passa pelo farmacêutico saber interpretar o contexto do utente, mediante as solicitações e as interações que tem com os pacientes, fazendo uma abordagem que convide a pessoa a partilhar consigo [as suas preocupações] para percebermos se o farmacêutico tem competência ou se tem de direcionar o assunto para outro profissional”.
O “contexto da pandemia colocou a nu situações que gostávamos de atender”, reforça.
A Presidente da ANF acentua que a aquisição destes conhecimentos pelos farmacêuticos é indispensável, pois as pessoas que vão às farmácias têm “diferentes necessidades” e os profissionais que nelas trabalham “têm de perceber as expectativas manifestadas pelos utentes, mas também têm de perceber as necessidades não transmitidas. Temos de aprender a fazê-lo de forma rápida, usando estratégias para tal, para adequar o tratamento ao que se pretende”.
Ema Paulino diz mesmo que o contacto das farmácias com os utentes “não são oportunidades de intervenção. São responsabilidades de intervenção”. E isso é verdade tanto no interior, como nas grandes cidades: “Há muitas pessoas sozinhas na Grande Lisboa, com as quais as farmácias contactam, por vezes, diariamente”, cujas necessidades vão para lá das da compra de um medicamento.
Contacto das farmácias com utentes “não são oportunidades de intervenção. São responsabilidades de intervenção”
Esta profissional de saúde diz que “não é vergonha nenhuma [falar ou ter] uma doença mental”, acrescentando que a terapêutica tem de evoluir ainda, no sentido de reduzir os efeitos secundários da medicação e “interferir menos com a vida das pessoas”: “A área dos medicamentos da saúde mental é a que tem um maior abandono da terapêutica”, devendo-se isso, em parte, às características desses medicamentos. Criticando o facto de, para a sociedade comum, “as doenças mentais parecerem que são do imaginário”, Ema Paulino declara perentoriamente: “Não são! Têm uma fisiologia associada!”.