Quando Paulo Rosado, CEO da Outsystems, emigrou para os EUA, em meados da década de 1990, com uma bolsa da Fullbright para realizar o mestrado em Ciências Computacionais na Universidade de Stanford, na Califórnia, o jovem licenciado em Engenharia Informática pela Universidade Nova tinha em mente uma carreira académica. Após alguns minutos de conversa com ele, torna-se evidente que teria sido bem-sucedido nesse campo.
Contrariamente à maioria dos engenheiros, Paulo possui a habilidade de comunicar eficazmente com seres humanos, conseguindo mergulhá-los no mundo do software sem a necessidade imperativa de conhecerem linguagens estranhas como Java, C++, HTML, entre outras – a FORBES testemunha isto. Contudo, o apelo de Silicon Valley acabou por ser mais forte.
“Recordo-me perfeitamente do dia em que mudei de ideias. Estava às quatro horas da manhã numa workstation, num ambiente de cowork universitário, a concluir um projeto, junto com quatro chineses. De repente, parece que fui atingido por um raio de luz na cabeça e pensei: esta não é a vida que quero”, relata.
Naquela noite, a academia perdeu um grande professor, mas Portugal ganhou um dos seus maiores gestores de sempre. Hoje, após mais de duas décadas desde a fundação da Outsystems, Paulo continua a liderar a empresa tecnológica portuguesa com o potencial de rivalizar com gigantes como a SAP ou a Oracle. Shamit Mehta, analista principal do fundo de capital de risco Guidepost Growth Equity, que investiu cerca de 50,5 milhões de euros na empresa portuguesa em 2016, declara à FORBES que “todos os ingredientes estão presentes”.
Em 2017, as receitas da empresa aumentaram 63%, ultrapassando os 100 milhões de euros. Contudo, isto era apenas o início, dado o potencial de crescimento do mercado das plataformas de desenvolvimento de software “low-code”, no qual a Outsystems atua. Em 2017, as prestigiadas em tecnologia Gartner e Forrester, colocavam a firma portuguesa no caminho de se tornar o próximo unicórnio português.
E assim aconteceu.
No ranking FORBES das empresas privadas de cloud, a OutSystems tem vindo a subir consecutivamente: em 2021 era 61ª desta classificação e em 2022 surgiu na 44ª posição, com uma avaliação de $9.5 biliões, cerca de 9,2 mil milhões de euros. Agora está no 30º lugar.
O percurso começa com a dificuldade
Com algum tempo disponível após desistir do doutoramento nos EUA, Paulo iniciou a sua carreira profissional no departamento de Pesquisa e Desenvolvimento da Oracle, uma das maiores empresas de software do mundo, localizada no coração de Silicon Valley.
Com o advento das novas tecnologias web, o vale estava em efervescência, e os embriões das grandes empresas online como a Yahoo, Amazon.com e outras estavam a surgir, aumentando a procura por profissionais de engenharia informática.
“Perdi metade dos meus colegas para startups”, revela, sublinhando a luta interior que travava.
“Estava a ser desafiador para mim estar imerso naquele ambiente”, acrescenta. Paulo acredita que o espírito empreendedor não é inato nas pessoas; é algo que se desenvolve. No entanto, o seu percurso contradiz essa crença, já que, após trabalhar durante dois anos na Oracle, o engenheiro regressa a Portugal e funda a Intervento, uma empresa de software e serviços associados.
No final dos anos 1990, bancos, seguradoras e grandes empresas de diversos setores estavam a acelerar a corrida pela inovação. Isso deu origem aos primeiros projetos significativos na área das Tecnologias de Informação (TI) em Portugal, e uma das empresas tecnológicas que se destacou foi a Altitude Software, que ganhou dimensão internacional com uma solução inovadora de Gestão de Relações com o Cliente (CRM).
Carlos Quintas, fundador da Altitude Software, acabou por propor uma fusão à Intervento, proposta que Paulo aceitou, assumindo a vice-presidência de produto e estratégia. A Altitude Software continuou a crescer, e embora estivesse agendada uma Oferta Pública Inicial (IPO) na bolsa tecnológica norte-americana Nasdaq, o estouro da bolha das empresas online em março de 2000 frustrou os planos. Paulo participou no road-show do IPO, mas acabaria por deixar a empresa um ano e meio após a fusão.
À FORBES, admite que nunca compreendeu completamente a filosofia da empresa, mas considera a experiência “um valioso processo de aprendizagem”. No entanto, o engenheiro tinha outros planos em mente.
A sua experiência na Oracle e na Altitude Software tinha revelado uma questão crítica na indústria de software.
“A construção de software dentro das empresas é um processo kafkiano, onde a maioria dos projetos nunca é concluída”, observa.
Nos dois anos da Intervento, Paulo identificou uma contradição na indústria. Embora o software fosse a ferramenta principal para automatizar e otimizar processos em várias áreas, a indústria em si era ineficiente, devido à discrepância entre o tempo necessário para concluir os projetos e a dinâmica dos negócios. Era semelhante a construir uma ponte enquanto as margens e fundações estavam em constante movimento.
Embora seja possível avançar com esforços isolados, isso traz duas consequências. A primeira é um aumento exponencial nos custos: em média, as empresas gastam 85% dos orçamentos anuais dos departamentos de informática na manutenção e adaptação dos sistemas existentes, devido à constante evolução do negócio. A segunda é que os projetos tornam-se intermináveis. “Nos anos 1990, havia uma piada recorrente, que consistia em questionar quantas linhas tinha o código de um projeto antes de ser cancelado”, lembra.
A solução Low-Code
Paulo Rosado começou a vislumbrar a solução para este problema. A sua ideia consistia em criar uma plataforma que permitisse aos programadores e profissionais de TI construir software de forma mais rápida e eficiente, reduzindo a complexidade do processo de desenvolvimento e permitindo uma maior flexibilidade para acomodar as mudanças frequentes nos requisitos das empresas.
Em 2001, Paulo juntou-se a Carlos Alves e Rui Gonçalves, que também tinham experiência em empresas de software, e fundaram a OutSystems. A sua visão era ambiciosa: criar uma plataforma que permitisse a criação de aplicações de software personalizadas de forma mais rápida, ágil e econômica.
O resultado foi uma plataforma de desenvolvimento “low-code”, que permitia aos desenvolvedores criar aplicações usando uma interface gráfica e componentes pré-construídos, reduzindo a necessidade de escrever código manualmente. Isso permitia que as empresas desenvolvessem e iterassem as suas aplicações muito mais rapidamente, acompanhando as mudanças do mercado e das necessidades dos negócios.
A trajetória da OutSystems nem sempre foi fácil. Nos primeiros anos, enfrentaram desafios para convencer o mercado sobre a viabilidade do conceito de desenvolvimento “low-code”. No entanto, a equipa perseverou, refinou a plataforma e conseguiu conquistar clientes e parceiros. Com o tempo, a empresa ganhou reconhecimento e começou a crescer significativamente.
Hoje, a OutSystems é uma referência mundial no mercado de plataformas de desenvolvimento “low-code”, com clientes que vão desde pequenas startups até grandes empresas globais. A abordagem da empresa não apenas acelera o desenvolvimento de software, mas também permite que as empresas enfrentem os desafios de transformação digital de maneira mais eficaz.
Olhando para o futuro
O mercado de desenvolvimento de software “low-code” continua a crescer à medida que mais empresas reconhecem os benefícios de acelerar os seus processos de desenvolvimento e adaptação de software. A OutSystems encontra-se em uma posição vantajosa, com uma plataforma estabelecida e uma base de clientes em crescimento.
Paulo Rosado, juntamente com a sua equipa, construiu uma empresa tecnológica notável que não apenas oferece uma solução inovadora, mas também mostra o potencial empreendedor e inovador que Portugal pode oferecer ao mundo da tecnologia.
Em resumo, a jornada de Paulo Rosado desde a sua formação em Engenharia Informática até a fundação e liderança da OutSystems é um testemunho do poder da visão, da perseverança e da capacidade de identificar e resolver desafios significativos no mundo da tecnologia. A sua história inspira empreendedores e profissionais da área a procurar soluções inovadoras que possam impactar positivamente os negócios e a sociedade como um todo.
Leia também: