A Yunit Consulting foi fundada pelos acionistas Caixa Geral de Depósitos, o BES e a PT. Por um conjunto de circunstâncias, em 2016, Bernardo Maciel, que já estava na empresa desde o início, fez um MBO e comprou a consultora. Em entrevista à Forbes Portugal, o acionista e atual CEO da empresa realça que depois de comprar a Yunit manteve a lógica de relação com os anteriores acionistas, sobretudo com os dois bancos. Além de ter mantido estas duas parcerias, a empresa reforçou também esta lógica de parceria com um conjunto de outras empresas e de outros bancos, com o Millennium, com o Santander e também com o Bankinter.
Trabalhar com o segmento das pequenas e médias empresas tem sido o propósito ao longo destes anos de atividade com o objetivo é apoiá-las em tudo o que sejam processos de investimento e financiamento. Facilitar o acesso das PME a incentivos fiscais ou a fundos comunitários a que se podem candidatar para crescer é um dos pontos estratégicos da atuação da Yunit Consulting.
Bernardo Maciel assume que a evolução da empresa que lidera tem sido positivo, antecipando fechar 2025 com uma faturação de três milhões de euros. Depois de ter crescido de forma orgânica é chegado o momento de ir às compras no mercado para ganhar dimensão e ter músculo para responder às exigências dos clientes. O CEO da Yunit Consulting admite que tem duas aquisições em marcha, uma para fechar ainda este ano e a segunda já para 2026. A ideia foi trazer entidades que tivessem não só negócio, mas também alguma dimensão humana e impacto regional.
Como carateriza a atividade da Yunit Consulting?
A Yunit tem atuado como consultora de gestão há mais de 10 anos. O nosso foco tem sido, sobretudo, trabalhar as PME, muito focado naquilo que é o apoio ao investimento e ao financiamento dos projetos de investimento. Na verdade, a nossa origem vem o período da Troika e do subprime, um período de mais dificuldade das empresas em conseguir financiamento, até pela própria fase que os bancos atravessavam em Portugal. O surgimento ou o potenciar de instrumentos dos fundos comunitários era fundamental para as empresas poderem continuar esses ciclos de investimento. E acabamos por, nessa altura, ter uma proximidade muito grande e conseguir desenvolver, sobretudo, metodologia de trabalho e de ferramentas de incentivo que permitem as empresas ir aproveitando. Estamos a falar de PME que, muitas vezes, não têm a capacidade interna nem quadros suficientes para poderem, em contínuo, olhar para estes temas. Começámos lá atrás, à volta de 2010, a trabalhar este tema da consultoria para as PME. Fomos, depois, desenvolvendo outros serviços muito conexos com estes, os benefícios fiscais associados ao investimento. Depois, mais recentemente, o tema da sustentabilidade e, sobretudo, o impacto do ESG nas PME, tentando descomplicar um tema que, aparentemente, é distante para as pequenas e médias empresas, mas que, no final do dia, acaba por lhes tocar de perto porque estão envolvidos em cadeias de valor com grandes empresas e essas, sim, impactadas diretamente pelas alterações da legislação.
Nesta área, como é que ajudam as empresas?
Na verdade, o nosso propósito neste tema, em concreto, é simplificar este processo, mostrar que não é só um tema verde, um tema green, de sustentabilidade no sentido mais green, mais ecológico do termo, mas, sobretudo, tudo aquilo que envolve a gestão e o tema da sustentabilidade das organizações a médio e longo prazo. Dar-lhes melhoria ao nível dos processos, ao nível da produtividade e, portanto, mostrar-lhes que isto pode ser, de facto, mais do que uma obrigação legal, um instrumento ótimo para poder ter mais competitividade a nível internacional. Acabamos também, ao mesmo tempo, por desenvolver uma área de corporate finance, que também é muito fruto daquilo que é o ciclo de vida das empresas em Portugal. O empreendedorismo em Portugal vem muito dos anos 80 e, portanto, estará hoje numa fase de maturidade, com alguns desafios, uns de crescimento, de ganhar dimensão e competitividade, e outros ao nível da sucessão, empresas muito familiares que, às vezes, não têm, na linha familiar, capacidade de dar seguimento à organização. Estas duas dinâmicas entusiasmou-nos a criar uma oferta ligada, sobretudo, aos temas de M&A, e temos feito também trabalho aí. Este é o grande grupo de serviços que temos no mercado.
São quantas pessoas na empresa?
Temos cerca de 50 pessoas, escritórios em Lisboa e Porto. Temos optado sempre por uma lógica mista de atuação entre combinar recursos da área económica e financeira com recursos de engenharia, porque conseguimos levar mais valor às empresas com áreas de conhecimento bastante complementares e que notamos também no dia-a-dia das empresas faz-lhes alguma diferença.
Pode destacar alguns projetos onde a Yunit tenha participado e que teve como resultado o crescimento de determinada empresa?
Não queria dar casos particulares, mas tivemos, também porque a nossa base foi muito ligada a pequenas e médias empresas, e até às vezes a algumas start-ups, momentos muito interessantes de saltos, sobretudo em empresários que conseguiram perceber o momento da viragem do seu mercado. Empresas que apoiámos nos projetos de internacionalização e que começaram a ter presenças lá fora. No fundo nós associamos as candidaturas dos fundos europeus a ciclos de investimento, e temos clientes que começaram a sua primeira experiência internacional numa determinada altura hoje já estão a alargar a sua presença no mercado. Acompanhamos muito perto o setor do turismo, coincide quase com a nossa existência o grande boom que o turismo teve em Portugal. E, portanto, muito do financiamento conseguimos apoiar as empresas na criação das suas unidades hoteleiras. E fazendo paralelismo com aquilo que são os outros setores, primeiro foi preciso equipar o País, não tínhamos camas suficientes para aquilo que era a imagem que o País estava a conseguir passar e a atrair mercados. Hoje o trabalho é muito mais de diferenciação: unidades hoteleiras que têm ofertas diferentes, que atraem públicos diferentes é fundamental, e temos feito esse caminho. No âmbito do Portugal 2020, o último quadro comunitário antes deste 2030, apoiámos 900 projetos, quase mil milhões de euros de investimento que passou por nós, ou seja, dos investimentos dos nossos clientes, bastante diverso, naquilo que é a economia.
Em termos financeiros como tem sido a evolução da Yunit?
Começámos há mais de 10 anos, quase 15 anos. Fechámos o ano passado com 2,8 milhões de euros de faturação e este ano vamos passar os três milhões de euros de faturação. Tem sido muito positivo esse crescimento orgânico. Estamos agora a avaliar a aquisição de duas consultoras para ganhar outro tipo de dimensão que não seja orgânica, que seja para termos uma capacidade de competir diferente, ter uma dimensão maior, para podermos servir melhor os nossos clientes, que é esse nosso propósito.
A aquisição das duas consultoras será fechada ainda este ano e em que áreas é que atuam?
Na verdade, sendo um bocadinho mais académico, nós fazemos um plano estratégico a cada três anos. Estamos a terminar agora, em 2025, este triénio, estamos a fazer o arranque de 26/28. Já era a nossa estratégia para este triénio consolidar um conjunto de áreas e ter uma maior presença regional. A Yunit, apesar de termos presença no Porto e Lisboa, não somos uma big four, mas também não somos o consultor regional que está ali ao lado da porta. E Portugal tem regiões muito fortes nalguns setores de atividade, que às vezes temos maior dificuldade de penetração, precisamente porque não estamos tão presentes na região. Temos noção da nossa capacidade, temos noção da forma como podemos ser diferenciadores no apoio às empresas, mas a proximidade é relevante. E essa foi a primeira derivada de crescermos por aquisição. Nós não vamos conseguir de uma forma rápida ter presença nestes meios regionais importantes, do Minho, Aveiro, Leiria, falo sobretudo das maiores regiões. E o Minho tem vários aglomerados como Guimarães, Famalicão, Barcelos e Braga que são fortíssimos. A proximidade a estas regiões obrigava a estar lá. Começamos este trabalho já no início do ano, para que, no final deste triénio tivéssemos este trabalho pelo menos concluído, que não depende só de nós, mas também da disponibilidade de haver empresas para isso. Fizemos um mapeamento bastante profundo, procurando duas coisas: ou reforço das áreas de negócio onde já estávamos, ou áreas muito próximas da nossa forma de atuar, que poderia ser importante para alargarmos a nossa oferta, sem irmos para derivadas muito afastadas para não perdermos a nossa matriz base, e isso foi mais ou menos a nossa premissa. Quisemos ir atrás de entidades que tivessem não só serviço, não só negócio, mas também alguma dimensão humana, se quiser, algum impacto regional, porque também é um bocadinho a nossa matriz poder impactar aquilo que é o crescimento das empresas, neste caso um bocadinho mais regional. Estamos na fase final de fecho de um dos processos, tenho alguma dúvida que não se feche até a final do ano, penso que ficará fechada. E uma segunda que pode andar entre o final do ano e o próximo. E depois, voltando atrás, o dinheiro faz falta, e sem recursos financeiros não dá para ir por aí fora para fazer aquisições. Estamos a fazer com capitais próprios. Temos alguma expectativa que o Banco Português de Fomento, que já o anunciou muito recentemente, iria repor a linha ADN, que é uma linha de financiamento, que terminou há cerca de dois ou três anos, que permite financiamento para esse tipo de concentração e de consolidação empresarial. Temos a expectativa, como já foi anunciado, que arranque rapidamente e possamos utilizar como um instrumento para o fazer de uma forma sustentada para que não ponha em risco aquilo que é o fundo do nosso dia-a-dia enquanto negócio.
E a Yunit estará sempre centrada nas PME?
Apesar de trabalharmos grandes empresas, o nosso foco está claramente nas PME, por duas razões: uma muito económica, já que são centenas de milhares e, portanto, é um mercado muito maior. E depois também é quase como um espírito, não vou dizer de missão para não parecer demasiado romântico, mas na verdade, são as PME que precisam deste tipo de apoio para poderem fazer a diferença. E se nós nos dedicarmos muito àquilo que é as competências das nossas pequenas e médias empresas, eu tenho a certeza que muitas delas crescerão, muitas delas serão internacionais, muitas delas ganharão o nível de dimensão que o país precisa para ser cada vez mais competitivo. E olhando sempre para o copo meio cheio e não para o copo meio vazio, até estas dinâmicas a nível da regionalização das cadeias de valor, por força desses conflitos de grandes grupos regionais a nível continental, pode ser uma oportunidade para Portugal no contexto europeu, porque somos um país bastante industrial, bastante competitivo, com pequenas e médias empresas com uma agilidade muito grande de se adaptarem àquilo que são as necessidades de um conjunto de clientes no mercado, e claramente a União Europeia vai passar a consumir mais internamente. E aí se conseguirmos fazer uma aposta grande na modernização, na consolidação, na capitalização das nossas empresas, claramente vamos dar um salto muito relevante nos próximos 10 anos.
E quais são as principais necessidades das PME que vos procuram?
É complexo o mundo das PME. Eu diria, de base, o tema de capitalização, ou seja, as empresas são bastante descapitalizadas por um conjunto de circunstâncias, nomeadamente, da sua própria dimensão. Depois, também, ao nível de competências transversais, o facto de serem pequenas e médias empresas e não terem capacidade de ter quadros superiores nas diferentes áreas do conhecimento gera-lhes dificuldades no dia-a-dia. Mas nos momentos críticos é também uma oportunidade para nós, podermos colmatar pontualmente essas necessidades, porque, de facto, também pode não haver necessidade de terem em permanência estes quadros. E depois também o tema do planeamento e de uma visão a médio e longo prazo, se calhar também condicionado, por isso que eu dizia. É verdade que a economia, sobretudo a economia global, tem tido ciclos muito mais rápidos, muito mais curtos, tem tido mudanças até abruptas e mais imprevisíveis, vendo o conflito da Ucrânia e da Rússia, que é um belo e mau exemplo daquilo que rapidamente mudou o contexto económico, para não falar de todos os outros que também importam à população.
São temas desafiantes…
Todos estes contextos obrigam a que as empresas tenham uma maior agilidade de atuação. Ter de alterar o mercado onde estão a atuar, aparecer uma inovação disruptiva na sua área de negócio e que têm de se adaptar e ser mais competitivos. E, portanto, esta capacidade de ser rápida a atuar e de flexibilidade é, de facto, o grande desafio que as empresas têm. E a perspetiva de médio e longo prazo, de ter uma visão. Costumo muito usar o exemplo de uma espécie de esquizofrenia que é ter de estar no topo da montanha a ver o futuro e, ao mesmo tempo, estar junto ao solo a medir o passo-a-passo do dia-a-dia, que é a característica de uma pequena e média empresa. Mas, quando a dinâmica é muito mais acelerada, torna isto muito mais difícil de trabalhar e é um desafio permanente.
Neste mundo com oscilações de taxas de juros e também com novos conflitos, como é que as PME podem continuar a investir e que soluções é que a Yunit encontra para que elas consigam mais investimento?
Nós estávamos habituados a um contexto europeu, Portugal em concreto, de ausência de inflação, uma inflação muito residual dos últimos 35/40 anos, salvo pontualmente algum episódio. Isso fez com que, associado, talvez já agora, ao tema de cambial com a integração na União Europeia e depois o tema do euro, tirou daqui duas variáveis, que quem competia já antes ou quem está fora desta esfera europeia, mas também dos Estados Unidos, tem de lidar permanentemente, que é o risco cambial e o impacto das inflações. Em economias um bocadinho mais frágeis, isso é relevante. Como dizia, tiraram da equação nos últimos anos o tema e, de facto, não era um assunto que as empresas se preocupavam. Quando voltámos a ter de gerir, não o tema cambial, mas sobretudo o tema da inflação, obrigou a ter que rapidamente atuar porque foram picos bastante elevados em produtos e serviços muito específicos que impactam diretamente a atividade empresarial, nomeadamente a energia. E depois também, falávamos da Ucrânia, o tema de algumas matérias-primas relevantes e, portanto, isto obrigou as empresas a terem de se preparar.
Mas gera constrangimentos?
Se me perguntar do ponto de vista académico, se isto é um tema, eu diria que, no meio de longo prazo, acomoda-se porque incorpora no preço aquilo que é o impacto destes custos. Isto é uma forma um bocadinho romântica de abordar o tema. Do ponto de vista prático, a velocidade e, às vezes, a incapacidade de recursos, e já não falo humanos, mas até financeiros, para poder fazer este planeamento e poder ir acomodando estas variáveis que destaca, claro que é um desafio complicado. A vantagem de ter serviços de consultoria muito próximos e que controlem bem, que conheçam bem, além das ferramentas técnicas, conhecer bem a atividade empresarial e, sobretudo, as cadeias de valor onde elas se movem, conseguimos, obviamente, trazer mais informação, mais conhecimento às empresas para tomarem decisões e, sobretudo, ferramentas importantes, planos de negócio muito arrojados, estratégias de internacionalização bastante sustentadas, faz com que se tente mitigar ou, pelo menos, prever logo à partida um conjunto de circunstâncias que facilitem a incorporação destes impactos.
E qual o papel que os incentivos fiscais e toda esta componente financeira poderá ter nesse reforço da competitividade?
Pegando-nos dois temas em separado. O tema dos incentivos financeiros, muitos que vêm dos fundos comunitários, e mais recentemente também o tema do PRR e, às vezes, alguns instrumentos até do Orçamento de Estado, são fundamentais por duas razões. Primeiro, orientam aquilo que são as temáticas mais importantes para investir. No fundo, sinaliza aquilo que os governos e até em sede europeia, dizem o que devem ser as apostas. Desde logo a sustentabilidade, a inovação, a investigação e o desenvolvimento. E, portanto, todos esses instrumentos, para além de trazerem, de facto, dinheiro para quem faz investimentos com estas premissas, dar-lhes um reforço de estratégia, dizendo que o caminho é por aí, e, de facto, voltando à questão da competitividade internacional, ou bem que somos inovadores e disruptivos no negócio, ou temos muita dificuldade de poder ter capacidade de competir.
E na componente da fiscalidade?
O tema da fiscalidade é um complemento a isto tudo. Quando olhamos de uma perspetiva de médio e longo prazo para os investimentos, ter aqui a capacidade de poder ter projetos aprovados, nomeadamente ao nível dos fundos europeus, no fator de investimento, reduz, de uma forma substancial, a necessidade de capital para fazer investimentos. Falamos, normalmente, de fundos perdidos, que, obviamente, é dinheiro grátis, simplificando a linguagem, e, portanto, obviamente que o investimento de ‘x’ milhões é reduzido logo à partida e facilita o investimento. É certo também que tem de cumprir metas na sua execução, seja do investimento, seja dos seus resultados, mas é uma facilidade, e um belo incentivo para que o negócio avance. Obviamente, no final do dia, isto reflete-se na forma de estar no mercado, porque se o investimento sai mais barato, digamos assim, nomeadamente a capacidade de ser competitivo, está facilitada porque os fatores críticos de investimento saem mais baratos. Os benefícios fiscais, vêm um bocadinho a reboque disto. Na prática acabam por beneficiar, ainda com regimes diferentes, os incentivos, os benefícios fiscais à inovação e os benefícios fiscais à investigação e desenvolvimento têm características diferentes, mas no final do dia são complementares àquilo que em sede de investimento aconteceu também. O que é que isto resulta para as empresas? Fazendo um investimento numa dessas temáticas, tenho um incentivo para aquilo que é um investimento direto, chamado CAPEX, que são os meios utilizados para fazer este investimento. Numa segunda derivada, os benefícios fiscais vêm confirmar essa aposta no investimento e dizer que no final do dia, quando houver resultados, quem fez uma aposta em áreas estratégicas e relevantes, repetindo-me, inovação, investigação e desenvolvimento e outras adicionais, têm um benefício fiscal em sede de IRC no momento de terem resultados. Portanto, diria que é um duplo benefício que aponta claramente para aquilo que deve ser a ótica das empresas, cada uma no seu mercado, porque isto não tem critério de setores de atividade, mas, sobretudo, aponta como é que podem ser competitivos, e voltando-me e repetindo-me, inovação e investigação e desenvolvimento é crítico para podermos ser destrutivos. São instrumentos muito importantes, às vezes mal aproveitados, algumas vezes mal utilizados, pouco pensados à partida, pelas características que eu dizia há pouco, às vezes quando estamos demasiado preocupados com o dia-a-dia, perdemos um bocadinho a visão do médio e longo prazo, mas, tendencialmente, as empresas estão mais preparadas para isso, mas, na verdade, o dia-a-dia às vezes tira-nos a capacidade de olhar em frente e, bem utilizados estes instrumentos, pode ser um fator muito determinante para aquilo que é a competitividade das empresas.
Olhando para o próximo ano, e tendo em conta que já há um draft do Orçamento de Estado para 2026, sente que há esse incentivo ao investimento, que há essa perspetiva de as empresas olharem para estas contas do Estado e avançarem para novos investimentos?
Sim, há um conjunto de benefícios fiscais que se mantém, na proposta do Orçamento de Estado vem lá mencionados. Há o SIFIDE [Sistema de Incentivos Fiscais à I&D Empresarial], que é um benefício fiscal relevante à investigação e desenvolvimento, que termina no final de 2025, que é um contrato renovado, periodicamente, porque decorre do Orçamento de Estado, mas que se antevê que venha a seguir, tem-se mantido, vai sofrendo às vezes algumas afinações, mas continua a ser um instrumento importante, e, portanto, eu diria que vemos aqui, novamente, plasmado aquilo que são os principais benefícios fiscais. Fazendo um parênteses, há umas centenas de benefícios fiscais para empresas, não é fácil dominar as diferentes temáticas, mas também se calhar a nossa cultura é um bocadinho judaico-cristã, latino-mediterrânica, que rendilhamos esse tipo de coisas, mas os principais estão previstos. E há também o tema do IRC, eu diria que é importante, é mais um sinal de apoio e de incentivo às empresas, estamos a falar de um ponto percentual, ou seja, anual, não é fantástico, é um indicador, eu gosto particularmente daquilo que é o incentivo ao investimento, que é muito mais uma alavanca daquilo que pode acontecer no futuro, porque, obviamente, com resultados há benefícios, mas é, obviamente, um sinal importante.
Quando diz que, por vezes, estes instrumentos são pouco utilizados e mal aproveitados, sente que há uma falta de literacia financeira neste segmento de empresas?
Eu diria claramente isso. Há um desconhecimento grande, até por aquilo que eu lhe dizia há pouco, 400 benefícios fiscais para empresas, de diferentes áreas, não é fácil dominar isso, e aí, obviamente, o apoio profissional, que é a nossa oportunidade também, facilita muito isto. Agora, há, de facto, um desconhecimento grande das empresas, porque a legislação nem sempre é fácil, mas tanto falamos de benefícios fiscais como falamos de incentivos ao investimento ou fundos europeus. Seja a capacidade de interpretar de uma forma clara aquilo que são os regulamentos, seja até a previsibilidade da sua utilização, não é fácil. E, portanto, voltando a repetir, o facto de ter apoio profissional ajuda muito, porque temos uma maior sensibilidade para perceber de que forma é que podem ser utilizados, quando é que devem ser utilizados, no fundo desmistificar muito isto. Empresas mais preparadas, obviamente, já têm isto no seu calendário, no seu ciclo de investimento. Empresas menos preparadas acabam por secundarizar e achar que isto não está virado para eles, ou seja, que este assunto não é comigo, e nós também temos muito este papel de tentar descomplicar.
De que forma?
Deixe-me dar-lhe um exemplo que fomos fazendo ao longo dos anos no SIFIDE, no benefício fiscal à investigação e desenvolvimento. É um benefício fiscal altamente relevante para quem faz atividades de investigação e desenvolvimento, mas muitas vezes, e quando falamos para pequenas e médias empresas, as mais pequenas empresas não têm noção de que parte da sua atividade é investigação e desenvolvimento, porque resolvem pequenas dificuldades, pequenas grandes dificuldades naquilo que é o desenvolvimento da sua atividade. Para eles é business as usual, é só mais uma coisa que eles estão a resolver, mas em boa verdade aquilo é investigação e desenvolvimento, porque são pequenas atividades que passam por tentativa e erro, não há resposta certa, têm dificuldades técnicas, procuram disromper algum tipo de metodologia, de produto, de processo produtivo, e isso foi muito o nosso trabalho quando começámos esta atividade, foi chegar muito perto das pequenas e médias empresas e explicar-lhes que o que eles faziam era de facto investigação e desenvolvimento. Não é necessário ter laboratórios e investigadores e batas brancas e aquela lógica e visão clara do que é clássica do que é investigação e desenvolvimento, mas levar esta visão para as empresas foi um trabalho importante. E aquilo que nós mantemos muito é mostrar como é que aquilo que já fizeram tem estas características, o que quer dizer que para a frente, quando planeiam investimentos vale a pena usar esta equipa e este método e esta forma de pensar que já fazem, vamos dizer de uma forma um bocadinho menos preparada e planeada, mas de facto acontece, para que os próximos investimentos tenham esta matriz, facilitando mais uma vez o apoio e financiamento aos projetos.
A vossa atuação acaba por ser tailor-made, ou seja, cada caso é um caso?
Sim. Obviamente que as regras do benefício fiscal ou do incentivo financeiro são bastante objetivas, genericamente objetivas. O que nós tentamos é pegar naquilo que é a ideia do empresário, a estratégia do projeto ou do negócio, dependendo da fase em que estiver, e tentar perceber como é que aquilo faz um match com as regras dos dois instrumentos que falávamos aqui. E aí, a partir daí, aquilo que não é à medida, que são as regras existentes nos regulamentos, é obviamente à medida, porque tentamos perceber o que é que existe de base na ideia do empresário e da empresa, ao mesmo tempo levar-lhes mais informação para que possam às vezes robustecer o projeto, não só para ir buscar financiamento, mas no final do dia, porque esse é o objetivo destes instrumentos, que o projeto seja mais competitivo, na prática para lhes dar mais força, às vezes com mais investimento, mas também complementado com mais financiamento, permitir-lhes ter um projeto mais robusto, que seja mais competitivo no mercado. E a partir daí, obviamente, que é muito mais tailor-made, não aquilo que é a visão superficial de que é apenas uma candidatura a um fundo comunitário, para trás disto, e quando nós felizmente temos tido essa oportunidade, começámos muito cedo a pensar o projeto com os empresários, não é só quando as coisas já estão prontas a ser investidas que começámos a trabalhar, permite-nos, obviamente, acrescentar mais valor às empresas, ou seja, se nós tivermos no momento o pensamento estratégico, é muito mais fácil, conseguirmos, em conjunto, dar mais informação, ajudar, e também entender melhor a estratégia da empresa, do que já numa fase muito final, quando as coisas estão muito construídas.
A internacionalização é um tema recorrente. Até que ponto é que as empresas portuguesas, ou as PME, estão despertas para essa realidade e como que podem ganhar escala lá fora?
Uma economia pequena como a nossa, necessariamente tem de ter a visão sempre na internacionalização. Temos um conjunto de indústrias, de setores ou de cadeias de valor que estão permanentemente expostas à internacionalização desde sempre. O setor têxtil, calçado, metalomecânica, moldes, plásticos, até agroindústria, tirando uma fase, em que era muito para consumo interno, hoje é necessariamente de matriz internacional. O que muda aqui? Um dos fatores que fez aqui uma grande mudança é que a internacionalização era muito reativa. Ou seja, os grandes players internacionais, os grandes industriais europeus, alemães, italianos, por aí fora, vinham a Portugal fazer encomendas nestes setores tradicionais. E, portanto, tínhamos de dar resposta, éramos competitivos por preço, por salários, por um conjunto de características que também fomos evoluindo enquanto país e enquanto sociedade, que nos tornou menos competitivos por estas características e que nos obrigou a ser mais competitivos através de inovação, outra vez, para sermos mais capazes. Portanto, a internacionalização fazia-se de uma forma envergonhada e reativa. Passámos a uma fase dos anos 80 e 90 em que começa a haver uma presença internacional mais forte, através das feiras internacionais em que as empresas começaram a olhar para os mercados externos, eu diria, de uma forma até menos estruturada. Ou seja, quando falámos de setores falámos em regiões ao mesmo tempo. Temos regiões muito marcadas por uma determinada atividade. E se o meu vizinho vai à feira de Frankfurt, eu vou à feira de Frankfurt. Esta dinâmica, se por um lado era interessante porque arrastava, por outro lado, às vezes, era tratar a parte pelo todo e que muitas vezes não faz sentido.
E hoje?
Estamos a falar numa fase de evolução das empresas portuguesas que hoje têm 40/50 anos e estão a atingir uma maturidade que as faz pensar de outra forma. Hoje a internacionalização tem de ser muito mais estratégica, muito mais cirúrgica, por várias razões. Os custos de internacionalização são altos. É preciso ter capacidade e olhar para isto como um projeto de longo prazo. A concorrência é cada vez maior, de todo o planeta. Portanto, hoje, rapidamente, qualquer empresa, não querendo falar das plataformas chinesas, mas conseguimos tratar de um produto em 48 horas, em 72 horas, em qualquer parte do mundo, com tudo aquilo que impacta na sustentabilidade. Mas isto é possível. Portanto, quando nós queremos ser competitivos, temos de ser muito rápidos a atuar. E depois, aquilo que é inovação e o que é diferenciação no mercado. Se antes, fazer a cópia da inovação, e pensemos nos grandes industriais, obrigava à engenharia inversa, ou seja, destruir o equipamento, perceber como é que aquilo acontecia, o que é que tinha ali de inovador e levava o seu tempo para adotar, hoje a inovação é tecnológica e a inovação faz-se quase, tentando simplificar, um copy-paste de uma linha de código e está copiada em 30 segundos. Portanto, obriga a ser muito ágil e muito diferenciador naquilo que é a forma de atuar das empresas para reagir nos mercados internacionais. Ao mesmo tempo, aquilo que dizia da competitividade, a dimensão é fundamental. É incontornável que, para nós que temos capacidade para investir, temos de ter recursos. E o recurso, sejam eles financeiros ou humanos, a dimensão é relevante para poder ter uma equipa de engenharia competente, uma equipa comercial de mercados internacionais competentes, Sem dimensão não há forma de poder ser competitivo. Esse é um passo incontornável.
Mas deveria haver um espírito de parceria ou associativismo nessa internacionalização?
Falando do associativismo ou da ligação a outras empresas isso também, por si só, é uma fase de crescimento e maturidade das empresas porque não se cresce por decreto, não é fácil crescer organicamente. A forma de não crescer organicamente é crescer por aquisição. Crescer por aquisição exige capacidade financeira e, já agora, humana e cultural para poder absorver outras empresas e outras culturas no mesmo grupo. E tudo isso são desafios diferentes. Voltando ao que eu dizia, ao período de evolução das empresas. É incontornável que nós temos de ter dimensão. Não temos de ser todos grandes empresas. Podemos ter áreas de negócio em que somos realmente diferentes no mercado. Podemos ter pequenos boutiques num conjunto de áreas e isto é suficiente para sermos competitivos. Mas é verdade que a dimensão ajuda muito por aquilo que é a capacidade de aguentar ciclos de investimento mais longos, flexibilidade, alterações de estratégia muito rápidas e isso, obviamente, que a consolidação empresarial é crítica para que isto aconteça.
Neste mundo da inteligência artificial, da digitalização, do ChatGPT, são oportunidades ou ameaças para as PME?
Diria que temos sempre de ver como oportunidades, porque são instrumentos diferenciadores, são ferramentas que nos trazem formas de trabalhar mais eficientes, mais disruptivas, mais competitivas. As empresas, genericamente, estão atentas ao tema. Têm, obviamente, alguma dificuldade de poder pegar num instrumento, falando de inteligência artificial, que é uma área de conhecimento bastante abrangente e perceber como aquilo pode ser potenciado no seu negócio. E aqui põe logo duas perspetivas. Potenciar na organização dos processos, no fundo, uma forma de eu trabalhar mais competente para servir melhor os meus clientes, e tem o seu fator. Segunda derivada, como é que eu posso utilizar a ferramenta para desenvolver produtos e serviços. Ou seja, para que os meus produtos e serviços tragam esta componente no momento de servir o cliente. O trabalhar estrategicamente esta grande vantagem tecnológica e científica que foi desenvolvida, é o grande desafio que as empresas têm. Dando um exemplo, há neste momento em aberto um concurso do PRR para a introdução da inteligência artificial, sobretudo nos processos, na forma das empresas melhorarem a sua produtividade usando essas ferramentas, e a procura tem sido elevadíssima. As empresas dominam alguma coisa, percebem a vantagem, a dificuldade é como é que eu vou incorporar isto para as próprias pessoas, enquanto recursos humanos das empresas. O lidar com estas ferramentas, para além do vulgar, do ChatGPT, da utilização particular até, mas que é útil para ganhar aquela boa proximidade à tecnologia, é também um desafio. Acho que tem sido bastante bem aproveitada. Nós não vamos ser substituídos enquanto cidadãos, enquanto empresas por inteligência artificial, nós vamos ser substituídos por quem utiliza as ferramentas de inteligência artificial.
Se voltarmos a falar aqui a três anos, de que Yunit Consulting vamos estar a falar?
Posso dizer com todo o compromisso que isto implica que fizemos um exercício para a construção do próximo triénio e um dos temas que lançámos a nós de direção e que já partilhámos com as equipas num evento de Team Building, foi qual é a capa de um jornal em 2028 sobre a Yunit. E aquilo que nós víamos é uma empresa de referência no mercado que ajuda as nossas empresas a consolidarem-se. A Yunit a ter a sua presença internacional já também afirmada. Já temos feito algum trabalho ao nível internacional, muito mais de captação de investimento do que de prestar serviços fora, mais uma vez porque percebemos a vantagem competitiva que Portugal e a economia portuguesa pode ter num conjunto de geografias.
Portugal pode ter um papel diferenciador?
Temos muito a mania de nos castigarmos com aquilo que é o nosso País, eu acho que nós temos características diferenciadoras muito relevantes, claro, com desafios e com dificuldades, mas que se nós conseguirmos olhar para isto de uma forma global, nós podemos ser uma plataforma e uma base muito importante para um conjunto de outras economias e empresas poderem basear os seus investimentos. Seja no acesso à União Europeia, seja no acesso a fatores de produção competitivos e diferenciadores, seja no acesso até à nossa matriz da CPLP onde podemos ter um papel fundamental naquilo que é uma região que vai ter um crescimento fantástico nos próximos 10/20 anos, nem que seja pelas características dos recursos humanos, muita gente nova cada vez mais bem preparada, com uma riqueza de recursos extraordinária, a começar a estar atenta à inovação, a começar a estar atenta a umas cadeias de valor, a apropriar cada vez mais tecnologia, e nós temos um papel importante, nem que seja por aquilo que a história e a tradição nos trouxeram. Portanto, quem de fora olhar para estes fatores todos, e nós saibamos ao nível de diplomacia económica, mas também os privados, porque temos de ser nós a fazer esse caminho sem ter de andar de mão estendida, podemos de facto ser diferenciadores e não é por acaso o que tem acontecido em Portugal um conjunto de investimentos a acontecer aqui, que vem de vários lados, já veio da África, já veio até antes dos conflitos da Rússia, já veio do leste europeu, já veio dos países árabes, vem da América Latina, vem dos Estados Unidos da América, vem do Canadá e, portanto, por alguma razão isto está a acontecer, e nós temos de saber aproveitar esta dinâmica. Nós temos feito algum trabalho fora, em Singapura, Hong Kong, Colômbia, Brasil, de atrair investidores que estão insatisfeitos com o conjunto de contextos regionais, ou que olham para Portugal como uma forma de poder iniciar a sua expansão internacional, e tem sido muito, muito interessante a forma como vêm Portugal.
Voltando à pergunta…
Daqui a três anos vejo uma Yunit maior, no sentido de mais capacidade na prática para poder fazer crescer os seus colaboradores e as suas pessoas em áreas de conhecimento mais dinâmicas, para podermos servir mais mercados. A nossa matriz há de ser sempre Portugal, continuamos a achar que este mercado das PME tem muito para ser apoiado, e nós queremos fazer esse crescimento com eles. Temos 15 anos, portanto, também sabemos que estamos agora numa fase de muita jovialidade de energia, mas temos de consolidar um conjunto de coisas, claro que é mais acelerado o crescimento das empresas do que enquanto cidadãos, mas queremos fazer esse crescimento e acho que vamos, daqui a três anos, estar numa posição, tal como a economia portuguesa, mais dinâmica, nós mais capazes de poder fazer esse apoio às empresas.





