A Krest Investments é uma promotora imobiliária detida por uma holding familiar, com um portefólio que inclui projetos em diversos setores, nomeadamente escritórios, logística, retalho, residencial e hotelaria. Esta empresa, de origem belga, já assinou diversos projetos em Portugal, nomeadamente a K-Tower e o hotel Moxy Lisboa Oriente, no Parque das Nações, os edifícios residenciais Jardim Miraflores, em Oeiras, e no Algarve o projeto residencial Lakes 24, em Vilamoura, e o Horizon Ocean Gardens, que se encontra em fase de construção.
A Krest surgiu em 2011 na Bélgica. Os primeiros investimentos foram em imóveis de logística, seguindo-se um parque de escritórios, o Axis Parc, que é o maior office parque da Bélgica. No início, a Krest era um investidor, mas, a partir de 2013, quando entrou no mercado português passou também a fazer a operação dos edifícios por si próprios.
Claude Kandiyoti, Chief Servant Officer (CSO) da Krest Real Estate Investments, é o líder da empresa, sendo um antropologista que pretende investir em Portugal em projetos que façam a diferença na vida das pessoas, começando, desde logo, com a ideia da habitação para todos, a também ao nível da cultura.
À Forbes, Claude Kandiyoti fala dos investimentos já feitos em Portugal e dos próximos projetos, entre os quais está um novo conceito que a Krest pretende introduzir, fundindo o conceito de hotel e hostel num mesmo projeto.
Qual foi o objetivo quando entraram em Portugal?
Quisemos entrar em Portugal por termos visto a oportunidade de comprar uma carteira ao Estado, pois o governo português, com a crise, pretendia colocar no mercado esse portefólio para investidores estrangeiros. As pessoas não estavam a olhar para Portugal devido à crise, mas percebemos que o país estava já noutro momento: na verdade, estava a sair da crise e vimos uma oportunidade nisso.
Adquiriram esses edifícios?
Comprámos cerca de 11 edifícios ao governo, que são edifícios arrendados à diferentes organismos, como Autoridade Tributária, IPDJ e ASAE. São edifícios muito bem localizados, com uma localização privilegiada em Lisboa, caso da Praça do Comércio, Rua Rodrigo da Fonseca e Alfândega, por exemplo.
E o que é que fizeram com esses edifícios que compraram ao Estado?
Ainda estão alugados ao governo. Na altura, pensámos que poderia ser um negócio “win-win” para nós e para o governo. Num certo sentido, estávamos a comprar dívida portuguesa e, para o Governo, era necessário, em 2014, arranjar dinheiro para pagar as pensões no final do ano. Na altura, achamos que uma dessas entidades gostaria de sair dessas instalações e pensamos que seria uma boa oportunidade para, talvez, construir um novo campus para esse fim. Comecei a olhar, por volta de 2014, terrenos para desenvolver escritórios e alugá-los depois a um dos ministérios.
Mas isso aconteceu?
Nunca aconteceu. Mas fizemos planos para fazer isso. E, a certa altura, demos por nós a operar esses terrenos. Começámos a comprar terrenos, inicialmente, para construir escritórios e desenvolvemos a K-Tower [na Avenida Aquilino Ribeiro Machado, no Parque das Nações] que era suposto ter sido um campus para o governo. Foi assim que foi desenvolvido, mas no final o que fizemos foi como o nosso primeiro projeto o Moxy Lisboa Oriente e os escritórios K-Tower.
Fizeram recentemente um investimento no Parque das Nações.
Sim, fizemos. Em 2015, comprámos ao município dois terrenos em que a ideia era fazer algo sustentável. Desenvolvemos o hotel da marca Moxy em que o hotel estava, simultaneamente, ligado aos escritórios e à estação de comboios ali perto [da Gare do Oriente], criando um conceito de mobilidade, de fácil acesso, em que era possível dormir no hotel e ter realmente algo que funcionasse como que uma continuação da estação de comboios desenhada pelo arquiteto Santiago Calatrava. Em Portugal, construímos essencialmente. Começámos por construir o Moxy, que foi um grande sucesso. O hotel abriu em 2013.
Esse foi o vosso maior investimento até essa altura?
Foi um investimento importante. São cerca de 30.000 metros quadrados que desenvolvemos. O que aconteceu foi que nunca o entregámos ao governo, mas sim à empresa de tecnologia Critical TechWorks, uma joint venture entre a BMW e a Critical Software e alugaram 80% do espaço. Esse edifício K-Tower ganhou o ‘Óscar’ de Melhor Design em escritórios e o edifício mais sustentável de Portugal [Prémio Nacional do Imobiliário 2024 na categoria Escritórios e o Prémio de Excelência em Eficiência e Sustentabilidade, n.d.r.]. E nós vendemos o escritório da K-Tower [a venda por parte da Krest Real Estate Investments foi comunicada em março de 2024, por um valor não revelado, tendo o edifício ficado nas mãos de um fundo imobiliário alemão gerido pela Real I.S. AG, n.d.r.]. Portanto, a ideia é fazer sempre projetos que sejam bons para a comunidade, que sejam diferentes em termos de produto e que sejam super sustentáveis.
Como vê o mercado imobiliário em Portugal?
O mercado imobiliário em Portugal ainda é muito diferente do que vemos no norte da Europa atualmente. No norte da Europa, temos uma situação em que o mercado está bloqueado. Na Bélgica, por exemplo, vemos um mercado que está completamente em baixo. E o que eu vejo é que, na verdade, no sector residencial, nos parques de retalho ou hotelaria, são os mercados em franca expansão em Portugal. Portugal torna-se agora o novo mercado super funcional na Europa, quando era um mercado mais lento da Europa até há uns cinco ou seis anos. Portanto, há uma espécie de mudança na história do que é o mercado português. Nós estamos cá para longo prazo. Queremos investir a longo prazo e estamos muito felizes por estar aqui.
Os vossos projetos mais recentes são no Algarve, o Horizon Ocean Gardens, e em Miraflores/Linda-a-Velha, concelho de Oeiras. Estão na parte final de construção?
Em Miraflores, temos um projeto que abrange três edifícios [Torre Girassol, Lotus Living e Villa Iria, n.d.r.]. Já finalizámos a construção de dois edifícios e o terceiro está para breve. Foi um grande sucesso este projeto. O conceito significa sair da cidade de Lisboa a uma distância de apenas a 15 minutos do centro, mas para quem vive na cidade de Lisboa, esta era uma espécie de outra cidade.
Por isso, pensámos que em vez de investir em Lisboa, que tem preços muito elevados, porque não criar novas comunidades nos arredores de Lisboa? Ir de oeste para a margem sul e fazer uma cintura à volta de Lisboa, com a ideia também de ter mais terra para poder criar comunidades e reconectar um pouco esta zona à cidade de Lisboa. E dizer que, de facto, a Grande Lisboa e Lisboa são uma só cidade.
No Algarve temos um projeto, o Horizon que tem cerca de 130 apartamentos, os quais estão cerca de 90% vendidos. A maior parte dos projetos que fazemos são para portugueses. No Algarve, curiosamente os portugueses deixaram de comprar casas secundárias. Portanto, é mais um mercado estrangeiro. E nós continuamos fortes no Algarve. Portanto, a ideia para nós não é estarmos apenas ligados a Lisboa. Mas sim estarmos realmente presentes em todo o lado.
Com esse objetivo, quais são os próximos projetos que tem em mente?
Temos atualmente três projetos que vamos lançar. O primeiro é um projeto no Algarve, em Alvor, um pequeno projeto residencial junto ao mar com grande sucesso. O segundo será um projeto também residencial em Marvila, porque acreditamos muito na regeneração e no redesenvolvimento de Marvila. O terceiro é um projeto de 245 apartamentos em Paço de Arcos chamado Arcoverde. Estamos a recriar um bairro com comodidades e quartos de condomínio, com uma espécie de nova regeneração da forma como se vive em Lisboa.
Esses três projetos vão começar quando?
O primeiro, no Algarve, terá início em julho. Marvila começará provavelmente em setembro/outubro. E a construção do Paço de Arcos começará no início de 2025.
O mercado português está numa tendência de subida. Não teme que este tipo de subida esteja a atingir o seu fim?
Queremos analisar o impacto que teve o fim do regime fiscal de Residentes Não Habituais [revogado pelo Orçamento do Estado de 2024, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2024, n.d.r.]. Talvez no final deste ano possamos ter uma ideia acerca disso. Sobre a pergunta que me faz, é algo estranho, pois depende do projeto de que se está a falar. A maior parte dos novos projetos está a correr bastante bem, mas nota-se um ligeiro abrandamento nas vendas. Não o sentimos, mas o mercado e os dados mostram que as coisas estão a acalmar. Não é o mesmo que na Bélgica, por exemplo, onde o mercado está parado e há muito poucas transações no mercado. Mas acho que o mercado português vai ser resiliente. Os portugueses querem investir. Há também um novo tipo de pessoas que compram para investir e não para viver, o que é novo em Portugal, onde as pessoas compravam a sua casa como primeira residência.
“Não o sentimos, mas o mercado e os dados mostram que as coisas estão a acalmar”
Os vossos projetos são de luxo?
Os projetos que temos têm qualidade, mas não são topo de gama. Fazemo-los para a classe média e para os portugueses. Portanto, 80% dos nossos clientes são portugueses. É esse o nosso objetivo. Na verdade, tudo o que fazemos é principalmente para os portugueses.
Começaram com escritórios e depois passaram a residenciais. A quota residencial vai ser dominante na Krest?
Na história do Krest, começámos com escritórios, que era a nossa principal atividade, e depois fizemos a transição para o residencial. Este ano, o residencial será mais importante, mas veremos como as coisas evoluem. No nosso pipeline de projetos de escritórios temos planificado estarmos na cidade do Porto e também no segmento de hotelaria
Temos em vista no que respeita a escritórios, vamos criar escritórios na área da hospitalidade. Por isso, temos uma marca de hospitalidade chamada Yust [sigla para Young Urban Style, n.d.r.]. Estamos a tentar investir numa nova forma de viver e de pensar, o conceito de coliving. Por exemplo, no nosso projeto de hospitalidade Yust, que combina o conceito de hotel e ‘hostel’: em que é possível comprar a cama, em quartos com seis a oito camas; e ter também um sistema convencional de hotel de curta duração – tudo no mesmo edifício, com um restaurante super agradável.
Esse conceito será trazido para o Porto?
Talvez seja algo que vamos colocar no Porto. Temos três na Bélgica e queremos trazer esse conceito para Portugal.
Portugal já é mais importante para a Krest em termos de quota do que a Bélgica?
Sim. Portugal representa 70% do nosso investimento. E vai aumentar, de facto.
Há mais cidades portuguesas nas quais vão investir. Quais?
Vamos continuar no Algarve, com o projeto de Alvor, e estamos à procura de novos projetos na região algarvia. No Porto, estamos a planear desenvolver um empreendimento perto da estação de comboios da Campanhã, que penso que vai ser um grande projeto, porque agora vão trazer o comboio de alta velocidade para a Campanhã. Será uma mistura de hotel e escritórios.
E depois estamos a olhar para a margem sul de Lisboa. Vamos para Alcochete, onde estamos a trabalhar muito para fazer um novo bairro. Lisboa é uma cidade demasiado cara atualmente. E nós temos de fazer parte da solução, criando habitação a preços acessíveis. E, para isso, é preciso comprar terrenos para depois se construir habitação a um preço barato para poder satisfazer as necessidades de habitação que existe. Ainda faz parte do mercado comprar terrenos.
Relativamente ao vosso projeto de construir casas acessíveis. Que projetos e preços têm em mente para atingir esse objetivo?
Hoje não posso falar de preços porque temos outra questão, que é o preço de construção. O preço da construção valorizou-se muito em Portugal. E isso está a tornar-se um problema.
E temos que ver esta questão do IVA [programa que prevê a aplicação temporária do IVA à taxa mínima de 6% nas obras de construção e reabilitação de habitação destinados a habitação permanente, n.d.r.] e, mais uma vez, tudo depende do que o governo vai fazer. Por isso, se o governo reduzir o IVA automaticamente, a construção vai continuar a crescer. E também há falta de mão de obra em Portugal. Mas, atualmente, o que pretendemos é não fazer muitas remodelações, pegando num edifício e remodelando-o. Queremos pegar naquilo a que chamamos greenfield e desenvolvê-lo. Por isso, se conseguirmos comprar um terreno a um determinado preço e fizermos uma certa quantidade neste conceito de greenfield, então, automaticamente, podemos fazer uma habitação que, em termos de custos, é reduzida. Portanto, estamos a falar de preços entre 3000-3500 euros por metro quadrado, o que seria cerca de 60% mais baixo do que o preço na cidade de Lisboa.
Têm esses projetos em construção?
Não, ainda não estão em construção. Em Paço de Arcos será mais para o segmento médio. Mas Alcochete vai ser isso.
E quando terá esses projetos feitos?
Em termos de calendarização, o que estamos a tentar fazer é entregar um mínimo de cerca de 110-150 unidades por ano. Portanto, temos hoje um planeamento que vai até 2032-2033. Portanto, será ao longo desse período.
Os projetos da Krest têm algum traço em comum?
Trata-se, antes de mais, de criar projetos que respondam a uma necessidade. Um projeto tem de ser sustentável e a sustentabilidade em Portugal ainda está uns furos abaixo do que fazemos noutros países. Por isso, queremos estabelecer padrões diferentes em termos de sustentabilidade. E acreditamos que temos de fazer projetos com bens partilhados, em termos de madeira, de painéis solares, gestão de resíduos, gestão de energia. Isso tornou-se um lema.
E também na zona onde as pessoas vivem, que tenha um aspeto agradável. É por isso que colocamos arte em todos os nossos projetos. Há sempre uma componente que é artística.
O novo aeroporto [em Alcochete, n.d.r.] vai valorizar o vosso projeto…
Um aeroporto na margem sul será ótimo e nós estaremos lá, embora não estejamos a desenvolver os nossos projetos à espera do novo aeroporto, até porque, desde que vim para Portugal que oiço que Lisboa vai ter um novo aeroporto! Mas continuaremos a desenvolver os nossos projetos. Mas um novo aeroporto é bom, pois irá criar um ecossistema de termos de escritórios, hotéis, campus diversos.
Que retrato faz de Portugal, desde que começaram a investir aqui?
Portugal mudou muito desde que começámos aqui. É um país totalmente diferente e os portugueses e a economia do país mostraram-se resilientes na crise financeira [de 2010–2014, com a vinda da “Troika”, n.d.r.] e estou muito confiante no mercado. Não creio que Portugal vá entrar numa nova crise, porque aprendeu com a crise de há 14 anos. Tem uma economia muito sólida, apesar do facto de ter hoje políticos instáveis.
“Não creio que Portugal vá entrar numa nova crise, porque aprendeu com a crise de há 14 anos. Tem uma economia muito sólida, apesar do facto de ter hoje políticos instáveis”
Mas a economia em si e a dívida do país estão noutro nível. Penso que este é o momento para Portugal, em termos de história, estar de facto na vanguarda da Europa, o que é espantoso, porque não aconteceu durante décadas, nem um século, em que Portugal podia ser uma montra para a Europa e para a forma como se sai da crise e se torna mais forte.