Há seis anos, quando a 3G Capital assumiu o controlo da Burger King, Daniel Schwartz assumiu a missão de transformar uma cadeia de hambúrgueres com 60 anos de história num negócio cool. Schwartz tinha apenas 32 anos.
A Burger King tinha o seu quê de anacrónico, um menu caótico e vendas a cair a pique. A receita dos seus restaurantes correspondia, em média, a metade da receita dos restaurantes da McDonald’s. Mas onde há baixo desempenho, há oportunidade.
Schwartz começou por cortar na sede de Miami, simplificou a preparação de alimentos, distribuiu acções pelos quadros intermédios e reduziu os salários e o activo real, vendendo lojas próprias a franchisados.
Nos anos seguintes, a Burger King transformou-se na Restaurant Brands International, um activo actualmente em franco crescimento. Em 2018, abriu 1000 restaurantes Burger King em todo o mundo, contra 600 com a assinatura McDonald’s, cujos restaurantes continuam a ter um volume médio de negócios superior.
Em Portugal, onde a Burger King opera através da Food4Kings, esse investimento é bem notório. Depois de em 2017 ter anunciado um investimento de 100 milhões de euros no mercado nacional nos cinco anos seguintes, com vista a aumentar a presença da marca de Norte a Sul do país, a marca conta já com 101 restaurantes e 2400 funcionários. “Queremos consolidar o nosso compromisso de qualidade e frescura nos nossos ingredientes junto dos clientes portugueses”, afirmou Borja Hernández de Alba, director-geral do Burger King para Portugal e Espanha, em Fevereiro, no seguimento do anúncio da abertura de sete novos restaurantes em Portugal.
O êxito da Burger King contrasta com o fiasco da Kraft Heinz, outra marca do portfólio 3G. Em Fevereiro, a Kraft Heinz anunciou que o valor contabilístico da empresa seria reduzido em cerca de 14 mil milhões de euros, um sinal claro de que os negócios clássicos de alimentos e bebidas estão a perder valor.
No caso da Burger King, a situação é diferente. A empresa-mãe, cuja receita consiste essencialmente em comissões de franquia, facturou quase 5 mil milhões de euros em 2018, mais 17% do que no ano anterior, ao passo que a McDonald’s não foi além de 8%. “Quantas empresas se podem orgulhar de ter nascido nos anos 50 do século passado e estar hoje a crescer acima dos 10%?”, pergunta Schwartz, hoje com 38 anos.
Para uma cadeia de fast-food que supervisiona 26 mil restaurantes com vendas combinadas no valor de 29 mil milhões de euros, a Restaurant Brands International até é bastante ágil. Em Janeiro deste ano, por exemplo, a Burger King introduziu a promoção “Whopper Detour”, em que o cliente pagava um cêntimo pelo ex-líbris da marca se pedisse comida na app da marca a menos de 100 metros de um McDonald’s.
Em Fevereiro, foi lançado um anúncio de 45 segundos durante o Super Bowl, com imagens de arquivo de Andy Warhol a desembrulhar e a comer lenta e metodicamente um Whopper. Resultado?
A app da Burger King entrou para o top das mais usadas na App Store da Apple durante a campanha publicitária e “Andy Warhol” foi a expressão mais pesquisada no Google durante todos os jogos do Super Bowl.
Liderança construtiva
Talvez Schwartz consiga transformar a sua cadeia de hambúrgueres numa coisa suficientemente cool para os clientes desta “Nova Era”.
Aliás, já estão em curso planos para introduzir uma empada de proteína vegetal da Impossible Foods, uma start-up apoiada por investidores como Bill Gates e o braço de capital de risco da Alphabet.
Este é um negócio importante para a Impossible, que em breve estará presente em 7 mil restaurantes Burger King. A última década foi um misto de sorte – lugar certo, hora certa – e grandes doses de energia.
Foi, aliás, uma década efervescente para Schwartz, um tipo de sorriso rasgado que saiu da Universidade de Cornell em 2001 com um diploma em Economia aplicada. Quatro anos depois arranjou emprego na 3G Capital, a empresa de private equity que ficou conhecida por desenhar a operação de fusão da Anheuser-Busch InBev (e que mais tarde caiu em descrédito devido ao fracasso da fusão Kraft Heinz). Schwartz tornou-se partner da 3G aos 27 anos. “O grupo acredita que vale a pena investir nos jovens e dar-lhes oportunidades. Trabalhei arduamente e provei que vestia a camisola. Pus sempre a empresa e o negócio em primeiro lugar”, lembra.
A mulher não criticava a sua dedicação, pois, sendo médica, também sabia o que era trabalhar longas horas e até tarde. Schwartz começou então a sondar oportunidades: “Perguntava à minha mulher ou à minha mãe: ‘Vamos supor que a McDonald’s vale 70 mil milhões de dólares. Quanto é que valerá a Burger King? ‘Uns 30 mil milhões’, diziam elas”.
A 3G pagou um prémio de 46% pelas acções negociadas em Bolsa e comprou a cadeia de restaurantes por 4 mil milhões de dólares em 2010 (cerca de 3,1 mil milhões de euros), incluindo a dívida. Depois, Schwartz ofereceu-se para ajudar na gestão. “Queria fazer parte do projecto, não me apetecia ficar fechado num escritório à espera dos relatórios mensais.”
Aos 29 anos, Schwartz tornou-se director financeiro da Burger King. Vendeu o jacto da empresa, pediu aos funcionários que fizessem chamadas internacionais gratuitas via Skype e, para ter uma ideia do todo, de vez em quando trabalhava por turnos no Miami Burger Kings, onde fazia de tudo um pouco, desde limpar casas de banho a cozinhar e servir hambúrgueres no drive-thru.
Apetite para crescer
Em 2012, a Burger King voltou a cotar na Bolsa pela mão da 3G e, em Junho de 2013, Schwartz ascendeu ao cargo de presidente-executivo. Nos 18 meses seguintes, as acções da Burger King duplicaram, enquanto as acções da McDonald’s caíram 8%.
Apesar de estar concentrado na venda de hambúrgueres, Schwartz não perdeu de vista novas oportunidades. Em 2014, a empresa passou a chamar-se Restaurant Brands International e comprou a cadeia de cafés canadiana Tim Hortons.
Mais tarde, em 2017, pagou cerca de 1,6 mil milhões de euros pela cadeia de churrasqueiras Popeyes. Warren Buffett, que é fã da Tim Hortons, contribuiu com 2,7 mil milhões de euros para financiar o projecto, onde Bill Ackman também investiu, através do seu hedge fund Pershing Square, que detém 5% das acções. A participação da 3G é de 41%.
Recentemente, Schwartz foi promovido a presidente da Restaurant Brands International, e o homem que durante muitos anos ocupou esse cargo na Burger King, Jose Cil, de 49 anos, passou a presidente-executivo. “Nós apostamos nas pessoas, em gente ambiciosa disposta a trabalhar mais do que os outros, cuja motivação vai muito além do salário. Querem fazer algo em grande”, realça Cil.
Schwartz vive na Florida com a mulher e três filhos e tem trabalhado essencialmente nos escritórios da Restaurant Brands International em Miami e Toronto. A partir de agora, porém, vai passar mais tempo na sede da 3G, em Nova Iorque.
“Não vou ser presidente-executivo de outra empresa, mas ambicionamos fazer mais e, no futuro, poderemos vir a comprar outros negócios”, explica, a propósito das suas novas funções. Ou quiçá se dedique a recuperar outras empresas da 3G. Aliás, é caso para perguntar se quem já levou a cabo uma grande reviravolta na Burger King não poderia também fazer magia numa marca antiga que envolve ketchup e queijo? A resposta é diplomática: “Faça-me essa pergunta daqui a seis meses, quando estiver por dentro da operação da Kraft Heinz.”
No negócio da 3G, consolidar é tão importante como comprar e vender. Schwartz explica: “As empresas de investimento mais tradicionais, se estivessem no nosso lugar, provavelmente já teriam vendido [a Restaurant Brands International] há muitos anos. Nós não só não vendemos, como comprámos mais marcas pelo caminho. A ideia é construirmos uma grande empresa com uma mentalidade de longo prazo.”