A carreira de Tomás Appleton pode ser descrita como uma série de “regressos a casa”. Experimentou o râguebi e não gostou, mas um ano depois voltou e nunca mais largou a modalidade. Teve experiências no estrangeiro, em Inglaterra e na Nova Zelândia, mas acabou por regressar a Portugal e tornar-se capitão da seleção nacional. Pensou em ser médico, avançou para o curso de medicina dentária, mas hoje divide o seu tempo entre o desporto, o trabalho na Appleton Medical Care e o curso de medicina.
O râguebi entrou na sua vida por influência do irmão Francisco. “Lembro-me de ver o meu irmão chegar a casa todo sujo, que era o típico, na altura estava a relva a aparecer para o râguebi, eram pelados, e acho que comecei a ganhar aquele bichinho e alguma vontade de querer começar a jogar”, explica Tomás à FORBES. Mais do que o desporto, aquilo que mais tarde o fez querer ficar foi o que o râguebi ensina. “Os princípios, ter feito os meus melhores amigos da vida lá, isso foi o que me foi mantendo. E depois todos os valores que estão associados ao râguebi, acho que foram esses valores que me levaram a ficar”, diz.
É que o râguebi não se contenta com a evolução e formação dos seus jogadores dentro de campo. É necessário garantir que do lado de fora eles são igualmente bons. “Não é só formar bons jogadores, é formar bons homens, boas pessoas”, explica o jogador. Um exemplo disso mesmo é o trabalho que a seleção nacional faz nas prisões, quando os jogadores tentam incutir aos reclusos estes mesmos valores, que passam pelo companheirismo, espírito de sacrifício, capacidade de liderança e respeito pelas pessoas.
Regresso ao Mundial
Um jogo de râguebi tem 80 minutos, mas para falarmos sobre este jogo vamos voltar o foco para apenas alguns segundos. Na última posse de bola da partida, caiu no colo da seleção de râguebi a esperança de um país inteiro. O momento em apneia enquanto a bola pontapeada por Jerónimo Portela subia e acabava por bater no poste, o apito do árbitro, o pontapé de Samuel Marques, um empate e uma explosão de alegria. Da maneira mais portuguesa possível, os Lobos, como é conhecida esta equipa, conseguiam, assim, a segunda qualificação portuguesa para um Mundial da modalidade, 16 anos depois da primeira vez.
“Esse jogo é muito um culminar de quatro anos de trabalho. Este processo começou em 2019, quando o Patrice [selecionador nacional] entrou. Acho que foi provavelmente a mudança mais radical que o râguebi português teve na sua história. Ele incutiu-nos um profissionalismo e uma exigência a que nós, na verdade, não estávamos habituados”, conta Tomás.
A equipa nacional está dividida entre dois grupos distintos. Por um lado, aqueles que dedicam as suas vidas inteiramente ao râguebi, uma vez que conseguem jogar a nível totalmente profissional. Desses, a maioria vem de França, com dupla nacionalidade. Depois existe um segundo grupo, onde Tomás está inserido, que jogam por clubes e seleção, mas conciliam o desporto com outros trabalhos. A chegada de Patrice Lagisquet veio mexer um pouco com isto.
“Ele disse-nos: ‘Vocês querem jogar o Mundial, jogar como profissionais, têm de treinar como profissionais, não há discussão. Se vocês estiverem a competir com EUA, Espanha, Geórgia ou quem for, eles vão estar a treinar como profissionais.’ Ou seja, nas semanas de jogo, fazíamos semanas completamente profissionais. Acho que isso foi a grande diferença. O Patrice tem uma experiência inacreditável, e isso foi um choque grande para nós, mas acho que também foi uma das chaves para o sucesso”, diz o jogador.
Foi também desde a chegada do treinador francês que Tomás se tornou capitão desta equipa, algo que descreve como “um dos maiores orgulhos” da sua vida. “Lembro-me perfeitamente de que o grande objetivo da minha carreira era jogar por Portugal, mas ser capitão acho que foi uma coisa que foi surgindo ao longo do tempo. Tem que ver com experiência, com algum destaque que uma pessoa começa a ganhar na equipa”, diz, sublinhando que nisto da liderança não está sozinho. Se não estiver em campo? “Há alguém que vai fazer o meu papel tão bem ou melhor”, garante.
Mas Tomás não consegue esconder que realmente tem a mentalidade certa para esse papel. Quando questionado sobre as suas expetativas para o Mundial, ainda pensou na resposta-tipo que os jogadores têm dado em qualquer entrevista, mas no final foi a ambição que falou mais alto.
“A nossa ideia é passar a mensagem de que vamos lá para aproveitar o momento, para estar no Mundial, para jogar, mostrar que queremos ser competitivos. Mas a verdade é que nós estamos a treinar neste momento para ir ganhar a Gales, pelo menos. Nós vamos entrar no primeiro jogo para ganhar, sem dúvida alguma. Não sabemos se é isso que vai acontecer, sabemos que nem somos sequer favoritos em nenhum jogo do grupo, mas nós neste momento vamos lá literalmente para ganhar a Gales. Não justifica, acho eu, estarmos a fazer todo este processo, deixar as nossas famílias e trabalhos durante quatro meses, e não ser para ganhar”, conclui.
(Leia o artigo completo na edição de agosto/setembro da Forbes Portugal)