Opinião

Tecnologia sem diversidade é inovação pela metade

Alexandra Andrade

Vivemos num momento de aceleração tecnológica sem precedentes. A inovação digital está a transformar radicalmente os modelos de negócio, os processos de trabalho e as competências mais valorizadas no mercado. Mas, apesar deste avanço, há um fator estrutural que continua a travar a evolução plena das organizações: a falta de diversidade nos setores onde se desenha o futuro.

Em Portugal, segundo dados da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), apenas cerca de 20% dos profissionais na área tecnológica são mulheres. Esta estatística, praticamente estagnada há anos, reflete um desequilíbrio de base — alimentado por fatores culturais, educacionais e institucionais que continuam a afastar grande parte do talento feminino de setores como engenharia, tecnologias de informação ou ciência de dados. Mais do que um problema de representatividade, esta ausência limita a inovação, reduz a competitividade e empobrece a visão estratégica das organizações.

A situação torna-se ainda mais crítica quando olhamos para áreas emergentes como inteligência artificial, automação ou cibersegurança — precisamente os domínios onde se constroem os próximos capítulos do mundo do trabalho. E é também nestes contextos que a presença de mulheres é mais residual e, neste momento, o que está em causa já não é apenas garantir igualdade de oportunidades: é assegurar que as decisões que moldam o futuro digital são tomadas com base numa visão plural, diversa e representativa da sociedade.

Porque a transformação digital exige mais do que tecnologia. Exige visão estratégica, pensamento crítico, empatia, sensibilidade ética e capacidade de adaptação. E estas competências são potenciadas em ambientes diversos, onde diferentes percursos, géneros, experiências e origens contribuem para soluções mais robustas, humanas e completas.

Nos últimos anos, temos assistido a avanços importantes. Programas de mentoria para mulheres em áreas STEM, políticas de diversidade mais estruturadas e uma crescente consciencialização sobre a importância da equidade começaram a ganhar força. Mas é fundamental ir além da sensibilização. As organizações têm a responsabilidade de criar condições reais para que o talento feminino possa evoluir, alcançar posições de liderança e permanecer de forma sustentável no ecossistema tecnológico.

Neste sentido, promover a diversidade não é uma ação simbólica ou uma obrigação moral. É uma decisão estratégica. De acordo com estudos internacionais, as empresas com maior equilíbrio de género nas equipas de liderança apresentam melhores resultados financeiros, maior capacidade de inovação e taxas mais elevadas de retenção de talento. Incluir mais mulheres na construção do futuro tecnológico não é um favor — é uma vantagem competitiva.

O caminho está traçado, mas ainda longe de ser percorrido. É necessário agir de forma concertada: através de políticas educativas que incentivem, desde cedo, a escolha por áreas tecnológicas; programas de apoio à progressão de carreira feminina; revisão dos processos de recrutamento; e mecanismos de identificação e combate a viéses inconscientes. A diversidade tem de deixar de ser um valor aspiracional e passar a ser um critério efetivo de gestão.

Desta forma, a tecnologia continuará a evoluir — com ou sem nós. Mas se quisermos que essa evolução seja ética, sustentável e verdadeiramente transformadora, precisamos de garantir que é pensada e desenvolvida com todas as vozes à mesa. Só assim a transformação digital será, de facto, um motor de progresso — e não apenas mais uma expressão de desigualdade replicada com novos códigos.

Alexandra Andrade,
Country Manager da Adecco Portugal

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