Numa altura em que tanto se fala de descarbonização, e em que a ideia do fim da utilização de fontes energéticas fósseis se vai instalando na cabeça de quem lidera governos e empresas, a Sunconcept resolveu abraçar essa ideia para se antecipar ao mercado na produção de barcos movidos a energia electro-solar.
São silenciosos, auto-suficientes, não-poluentes. São barcos que tiveram de ser pensados e desenhados de raiz para acomodar esta nova abordagem tecnológica.
Recusaram adaptar embarcações já existentes a este tipo de energia. Era preciso criar algo novo – e de preferência inovador.
Uma embarcação calculada para albergar os painéis solares suficientes para alimentar as baterias que movimentarão o barco com uma autonomia interessante. “Nós invertemos a lógica da coisa. Uma coisa é pormos um motor eléctrico num barco com casco normal – o barco não foi feito para aquilo, é uma questão só de consumos – outra coisa é criarmos uma embarcação, com casco específico, com materiais específicos que possam ter o máximo de eficiência possível com o motor eléctrico”, explica Manuel Lázaro Brito, sócio fundador da Sunconcept, à FORBES.
“É uma questão de hidrodinâmica”, acrescenta.
Estes não são navios com uma imensa autonomia e, nesse ponto, partilham das mesmas dificuldades com que os donos de automóveis eléctricos se deparam.
São silenciosos, auto-suficientes, não-poluentes. São barcos que tiveram de ser pensados e desenhados de raiz para acomodar esta nova abordagem tecnológica.
“Efectivamente as embarcações são construídas utilizando processos e materiais que não são recentes no mercado e que estão presentes em outras indústrias, da mesma forma que as baterias de lítio ou os motores eléctricos não são novidade tecnológica”, explica Nuno Silva à FORBES, engenheiro naval e membro do departamento de desenvolvimento e inovação da Sunconcept. “A inovação culmina da conjugação dos melhores equipamentos e materiais aliado ao fabrico em série e por processos avançados. Resulta assim um produto tecnológico e de alta qualidade”, garante.
Actualmente a Sunconcept tem dois modelos no portefólio. Um já bem testado, ao passo que o outro tem apenas um preparado e pronto para envio ao cliente. Há ainda outro barco maior na calha – e que já conta com uma encomenda.
O modelo Sunsailer 7.0 é o primeiro conceito criado pela Sunconcept, um pequeno barco com um casco de deslocamento de 7 metros e capaz de alcançar velocidade de cruzeiro de 5 a 6 nós. O modelo maior, o CAT 120, é um pequeno catamarã com capacidade para entre 25 e 45 passageiros e que já foi vendido a dois clientes.
Este último antecipa o objectivo da empresa de criar barcos capazes de transportar um número de passageiros acima da centena. Sempre com a mesma filosofia energética.
Novas apostas
O universo das empresas de construção naval portuguesas decresceu desde 2007 até 2017. Em 2007, havia 177 empresas a operar no sector. Dez anos depois, o número era de 131, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE).
A Sunconcept já se inclui nas nove empresas do sector sediadas no Algarve sinalizadas pelo INE como estando em operação em 2016. Começaram um ano antes, em 2015, com uma ideia que se concretizou numa versão simples e pequena de barco.
Na manga dos quatro fundadores da empresa estão ideias de barcos bem maiores.
O investimento inicial partiu, em grande parte, do bolso de todos os sócios, ao qual se juntaram fundos comunitários no âmbito do quadro Portugal 2020 – num total de 1,3 milhões de euros. Mas é preciso mais para financiar o crescimento da empresa.
Planeiam construir uma nova fábrica, necessária para expandirem o negócio, e para isso precisarão de financiamento na ordem dos 1,5 milhões de euros. Manuel e os seus sócios ainda estão a recolher financiamento junto de diversas fontes.
A estratégia é continuar a captar mais clientes, mas com projectos para barcos maiores (e mais caros).
Capital próprio (de novo), banca (uma estreia e “algo obrigatório” a este ponto, garante Manuel à FORBES), mais fundos comunitários e talvez a entrada de “investidores com capitais próprios”, assume.
No horizonte têm como objectivo alcançar uma facturação de 1 milhão de euros em 2019 e 2,8 milhões de euros em 2020, afiança João Bastos, director-geral da Sunconcept, à FORBES.
Um dos primeiros clientes da Sunconcept foi o grupo Esporão, produtor de vinhos. Venderam um Sunsailor “para utilizarem na Quinta das Murças, no rio Douro para um [projecto de] turismo rural dentro da propriedade”, explica João.
A estratégia é continuar a captar mais clientes, mas com projectos para barcos maiores (e mais caros). Para o conseguirem precisam de criar uma máquina produtiva. O primeiro passo é a construção de barcos em série. A partir daí, querem começar a criar modelos maiores para transportar mais pessoas.
Mas, para se conseguir estes propósitos, é essencial proficiência em engenharia. Para serializar a produção e começar a construir barcos maiores, a Sunconcept precisa de instalações maiores.
Pelo que o armazém da zona industrial de Marim, em Olhão, onde tem o seu actual estaleiro, fica curto para as actuais ambições. Já anunciaram, entretanto, a construção de um novo estaleiro perto da ria Formosa, também em Olhão, a alguns quilómetros da actual sede.
Uma proximidade com o mar que lhes vai ser útil quando tiverem de lançar os navios à água, em vez de os transportarem em camiões, pelas estreitas estradas do interior do concelho, até ao Atlântico.
As novas instalações irão produzir, com a unidade a trabalhar em pleno, 5 catamarãs por ano e 20 exemplares dos barcos mais pequenos. E prometem estar em linha com os preceitos da própria empresa: produzirão a sua própria energia, terão zonas translúcidas no estaleiro para deixar entrar luz natural e terão um sistema de aproveitamento de águas residuais. Tudo isto porque querem ser mais do que um estaleiro naval. Querem produzir conceitos de barcos.
O objectivo é desenhar os projectos sempre de acordo com os pressupostos navais e energéticos gizados desde o início pela Sunconcept e, se necessário, delegar a construção propriamente dita a outras companhias – parceiros, como lhes preferem chamar. “Não queremos propriamente comprar os estaleiros de Viana do Castelo nem a Lisnave”, brinca Manuel Costa Braz, presidente-executivo da Sunconcept.
“Nós gostaríamos era que a Sunconcept fosse uma entidade que aparecesse em primeiro lugar quando se falar de barcos com estas características”, acrescenta, focado no mercado global.
Enquanto essa projecção não chega, estão de olho em eventuais clientes e atentos a possíveis encomendas substanciais, como os concursos a abrir pelo Governo para os novos ferries da Transtejo, a empresa pública que opera a travessia de barco entre Lisboa e as localidades da Margem Sul.
Estão tranquilos, garantem, mas a trabalhar para alcançarem a tão desejada velocidade de cruzeiro.