O co-fundador e CEO da software house PHC é autor da obra “Gestão Descontraída, mas Profissional”, e defende que a felicidade é lucrativa, para assim combater o mito de que a felicidade é um bloqueio à produtividade. Para ele, o exemplo da PHC comprova que pessoas mais felizes ajudam a empresa a ir mais longe, pois esta tecnológica tem estado no top das empresas mais felizes e das melhores para trabalhar em Portugal. Revela ainda à Forbes Portugal que esta já foi a sétima empresa do mundo com maior employee engagement nas redes sociais e que isso nunca colocou em causa os seus resultados, muito pelo contrário, pois a PHC bate recordes de faturação há vários anos.
A pandemia veio abrir portas para novos modos de trabalhar, que já antes se tentavam impor lentamente… Que mudanças são essas e como estão a transformar o mundo do trabalho?
A pandemia forçou a um avanço enorme no trabalho remoto, quer a nível de aceitação como de ferramentas. O trabalho remoto passou a ser visto com outros olhos, sem o mito de que não era produtivo, e, nalguns casos, como o futuro do trabalho. Mas, como tudo na nossa história é feito de fluxo e refluxo, depois dos benefícios do teletrabalho começámos todos a perceber as suas limitações e constrangimentos – nomeadamente, ao nível da cultura das organizações, isolamento dos colaboradores, estímulo de criatividade em equipa, etc. Assistimos agora a um reequilibrar com o modelo de trabalho híbrido, que penso ser o futuro e traz o melhor dos dois mundos: o foco em casa e a colaboração no escritório. Tem sido este o caminho que estamos a fazer na PHC com o híbrido a trazer enormes ganho de bem-estar e de produtividade.
“Estamos no meio de um processo de humanização das empresas”, afirma Ricardo Parreira.
Quando fala de agilidade nas empresas, diz que não pode haver um big bang de agilidade, é sempre necessário um processo gradual… Essa transformação gradual já está em marchas na maioria das organizações nacionais, ou apenas nas mais inovadoras?
A evolução para a agilidade já está em marcha porque a velocidade do mundo em que vivemos assim o impõe. A questão não é se as empresas vão ser ágeis, mas sim se fazem a transição atempadamente ou se se deixam ficar para trás. E tudo começa com a mentalidade de querer ser ágil, pensar de forma ágil e, então, implementar as melhores práticas. Um erro que se viu na transição para a agilidade foi nalguns casos a tentativa de um salto de agile at scale. É óbvio que não funciona. As organizações são organismos complexos, cheios de processos, métodos e operações que não podem ser de um dia para o outro mudadas. E têm também o mais difícil de mudar: os hábitos das pessoas. O ser humano é por natureza avesso à mudança. É neste sentido que a mudança ágil tem de partir de um trabalho de cultura organizacional. Como referi, a mudança vai acontecer e algumas empresas vão estar na linha da frente porque já iniciaram a transição. É uma questão darwiniana: são os que se adaptam mais rapidamente que sobrevivem.

As lideranças estão a conseguir acompanhar estes novos desafios?
Penso que poderemos dizer que os verdadeiros líderes organizacionais serão os que estarão predispostos a evoluir para ultrapassar os obstáculos e desafios que têm pela frente. Um bom CEO acompanha as tendências e está predisposto a evoluir todos os dias. O grande desafio é como o fazer, pois nem sempre é fácil. Partilho muitas vezes o que faço porque acredito que se todos o fizerem seremos todos melhores em conjunto. Tenho feito alguns vídeos no meu perfil de LinkedIn e participado em alguns eventos sempre para partilhar as boas práticas. Gostava que mais líderes em Portugal fizessem o mesmo.
“O pior que um líder pode fazer é que alguém se sinta injustiçado”, diz Ricardo Parreira.
Como define a sua forma de liderança? É baseado nessa sua experiência que escreveu o livro Gestão Descontraída, mas Profissional? Qual é a mensagem principal da obra?
Tenho uma máxima clara: be kind and care. Esta é a minha forma de ver a liderança porque o pior que um líder pode fazer é que alguém se sinta injustiçado. É por isso que sou um líder que serve a equipa, remove obstáculos e lhes dá condições para fazerem o seu trabalho. Digo, em jeito de brincadeira, que o meu sonho como líder é ser “inútil” – no sentido em que serei um líder feliz no momento em que tiver uma equipa autónoma e que não precise de mim para fazer o seu trabalho. Sobre o livro Gestão Descontraída, mas Profissional”, é o livro que gostava de ter lido quando comecei e tem uma mensagem clara: se queres ser um bom gestor tens de tratar de ti, depois da equipa e só depois da empresa.
O mundo empresarial já não é compatível com as práticas de gestão das últimas décadas, sobretudo a gestão de pessoas. O que precisa realmente mudar?
Estamos a entrar no paradigma de uma gestão 3.0, onde a agilidade, a tecnologia e a aprendizagem contínua rompem com a ideia complexa e burocrática que temos de empresa. A automatização de processos, o acesso em qualquer lugar à informação e a aceleração da inovação têm mudado a organização e os processos, e, inevitavelmente, a forma como as pessoas trabalham e a expectativa que têm sobre o trabalho. Estamos no meio de um processo de humanização das empresas, de transição para uma maior empatia das lideranças, uma maior preocupação com o bem-estar e a forma como se avalia o desempenho das pessoas. Tudo isto está a tornar as empresas melhores, mas também mais desafiantes para a gestão, porque estes processos têm de ser acompanhados com produtividade e resultados – sem isso as empresas não sobrevivem. E, para isso, é necessário aumentar os níveis de confiança nos colaboradores, avaliando o trabalho pelo cumprimento dos objetivos, uma aposta numa cada vez maior na formação e capacitação das pessoas, e no fortalecimento do compromisso com a empresa.
“Tenho uma máxima clara: be kind and care”, explica o co-fundador da PHC. .
A atração de talento é um desafio central dos negócios atualmente, e não falo apenas das tecnológicas… Quais as melhores práticas, aquelas que deveriam estar a ser seguidas por todas as empresas?
Penso que se as empresas querem ter talento têm de ter condições para o receber. Isso começa sempre por ter uma cultura trabalhada de forma profissional, com valores que se traduzem em comportamentos éticos e com os quais as pessoas se identificam. Depois, trabalhar a forma como se expressa essa cultura através de condições no local de trabalho que possibilitem ao talento realizar o seu potencial, treinar os líderes para serem embaixadores da cultura e trabalhar o seu employer branding para que a empresa seja reconhecida de forma autêntica e genuína. Estas são as condições estratégicas mais relevantes. Depois, cada empresa pode ter um conjunto de iniciativas e benefícios em função da sua atividade. Mas a base está ao alcance de todas.
Da mesma forma, a retenção é outro enorme desafio, com a novas gerações a procurarem mais do que apenas um emprego para a vida… Como enfrentar este problema geracional?
Não vejo isto como um problema. Quando pensamos que as pessoas passam a maior parte do seu tempo no trabalho, percebemos a importância que a experiência de trabalho tem nas suas vidas. E ter um impacto emocional positivo na vida das pessoas deve ser também um propósito das empresas. As empresas têm hoje a responsabilidade de proporcionar um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, mas também de promover uma experiência profissional onde exista a possibilidade de realização e o sentimento de contribuição para o propósito.
Foi isto que nos motivou a criar o projeto da Best Experience at Work, com a ambição de ser a referência para trabalhar em Portugal, quer ao nível do espaço e das condições de trabalho, como também ao nível do desenvolvimento pessoal e profissional, bem-estar, atividades internas, liderança e da cultura trabalhada de forma profissionalizada.
“Estamos no meio de um processo de humanização das empresas”, defende Ricardo Parreira.
O que é preciso fazer mais para atrair e reter os melhores talentos?
As empresas precisam de ser realmente empresas onde as pessoas se sintam bem e queiram trabalhar. Para isso, precisamos de criar condições como já referi acima. Repara-se que sabemos o que os melhores talentos querem, muito para além de um salário justo, é sentido de propósito no seu trabalho, evolução constante e um ambiente de entreajuda e colaboração. Não é por acaso que os valores da PHC são adapt and grow, cool but pro e make an impact.
A felicidade nas empresas é uma moda, ou pelo contrário, é uma exigência dos novos tempos que tem mesmo de ser instituída, de forma a garantir a sustentabilidade dos negócios? A necessidade de se falar de felicidade nas empresas deve ser vista de forma natural. O trabalho desempenha uma parte importante da nossa vida e é normal que se discuta como este impacta como nos sentimos e realizamos. A grande dificuldade é que ainda subsiste um mito de que a felicidade das equipas é um bloqueio à produtividade e sucesso económico das empresas. É uma inverdade. Costumo dizer que a felicidade é lucrativa exatamente para combater essa ideia, e o exemplo da PHC comprova que pessoas mais felizes ajudam a empresa a ir mais longe. Temos estado constantemente no top das empresas mais felizes e melhores para trabalhar em Portugal, no ano passado fomos a sétima empresa do mundo com maior employee engagement nas redes sociais e isso nunca colocou em causa os resultados da empresa, pelo contrário, estamos a bater recordes de faturação há vários anos