“O investimento na diversidade e o ambiente de inclusão devem ser parte da cultura interna da empresa e defendido por todas as suas equipas”, sublinha Ana Correia, responsável de Recursos Humanos da Zühlke Portugal, consultora suíça com escritório no Porto.
Em entrevista à FORBES, Ana Correia diz que a Zühlke implementou, tanto em Portugal como a nível internacional, “quotas para diversificar o talento, não só a nível de género como também de outros grupos” e que “as organizações têm muito a ganhar com a inclusão de talento diverso nos seus projetos, já que é a troca de experiências, próprias de cada pessoa, que se assume como grande fonte de aprendizagem e ensinamento”.
O setor da tecnologia em Portugal ainda é demasiado masculino e pouco inclusivo?
Ana Correia (AC): Essa é uma ideia que vamos ultrapassando de forma contínua, embora continue a haver uma discrepância no número de mulheres em tecnologia. De facto, o mercado tecnológico tem sido marcado por uma forte predominância de especialistas masculinos, contando apenas 17% de talento feminino, de acordo com o Guia do Mercado Laboral da Hays em 2022. Na Zühlke queremos contribuir precisamente para que o número de mulheres em tecnologia cresça, abrindo novas oportunidades para desenvolverem as suas carreiras neste setor.
“O mercado tecnológico tem sido marcado por uma forte predominância de especialistas masculinos, contando apenas 17% de talento feminino”
Tomando o caso da Zühlke como exemplo, quantos funcionários têm e qual é a quota de colaboradores do sexo feminino na empresa?
AC: O grupo Zühlke conta com mais de 1600 colaboradores, distribuídos pelos seus 16 escritórios. Entre as medidas que implementamos tanto em Portugal como a nível internacional conta-se a recomendação de quotas para diversificar o talento, não só a nível de género como também de outros grupos. No Centro de Engenharia do Porto, somos mais de 40 profissionais, com 20% de talento feminino, e estamos a trabalhar ativamente para elevar o número de contratação de mulheres.
No tocante a cargos de liderança da Zühlke, as mulheres preenchem já que percentagem no total de diretores?
AC: Este é outro dos nossos objetivos para criar condições equitativas de acesso às nossas oportunidades, seja na entrada ou na promoção interna. Os processos de avaliação e promoção nos cargos são revistos com rigor e de forma recorrente, de modo a conseguirmos fortalecer estas medidas de evolução na carreira de forma igual para todos os nossos colaboradores e independentemente do género, idade, etnia, nacionalidade e background. O Centro Global de Engenharia do Porto é um destes exemplos, liderado por Mariana Salvaterra que, para além de desempenhar funções de General Manager, também é Head of Software Excellence para Portugal. Contamos ainda com uma Diretora de Dados e Inteligência Artificial para o Centro Global de Engenharia e também a função de General Manager da Bulgária é desempenhada por uma mulher. Acima de tudo, queremos ser, cada vez mais, uma organização que premeia os profissionais pelo valor do trabalho que criam e pelo potencial de liderança que apresentam para elevar soluções, equipas e resultados.
Há outros grupos ou escalões sociais que a empresa se esforça por admitir nos seus quadros? Quais? E quantos funcionários enquadrados nestas categorias acolheram?
AC: As medidas de diversidade, equidade e inclusão que promovemos surgem precisamente no sentido de criar condições de acesso iguais para todas as pessoas que se candidatam e, por isso mesmo, enriquecer as nossas equipas. Para acolhermos dois colaboradores invisuais foi necessário adaptarmos, por um lado, o processo de entrevista para que tivessem a mesma oportunidade de participar sem serem prejudicados pela sua incapacidade, e, por outro, criarmos condições dentro do escritório para desenvolverem o seu trabalho, com equipamentos adaptados e acolhimento do cão-guia de um dos profissionais. As organizações têm muito a ganhar com a inclusão de talento diverso nos seus projetos, já que é a troca de experiências, próprias de cada pessoa, que se assume como grande fonte de aprendizagem e ensinamento.
“As medidas de diversidade, equidade e inclusão que promovemos surgem no sentido de criar condições de acesso iguais para todas as pessoas que se candidatam e, por isso mesmo, enriquecer as nossas equipas”.
Em termos de diversidade, quais são as preocupações que a empresa tem no recrutamento dos seus recursos?
AC: Existe, por um lado, uma preocupação com a disponibilização e abertura das nossas oportunidades a todos os que desejem trabalhar no setor tecnológico. Por outro, procuramos também construir um ambiente de trabalho que acolha e incentive esta diversidade. Somos uma empresa orientada para pessoas, e olhamos, acima de tudo, para o valor que cada profissional acrescenta para a sua equipa na Zühlke.
Quais são os benefícios que a Zühlke tem tido por apostar numa equipa mais diversa e inclusiva?
AC: Em primeiro lugar, temos criado mais oportunidades para que outras pessoas, como minorias, com algum grau de incapacidade ou outros grupos que por vezes têm maior dificuldade em entrar no mercado, consigam explorar as suas competências na área da tecnologia. Esta é uma valência que tem distinguido a Zühlke e captado tantos especialistas altamente qualificados e competentes para as nossas equipas. Depois, é percetível como a inovação e a verdadeira disrupção só surgem pelo debate de ideias diferentes. As experiências, o background, as conquistas e os desafios de cada pessoa são diferentes, mas é precisamente por isso que enriquecem a equipa e os projetos. No limite, os resultados da organização crescem graças a este investimento na diversidade.
“Temos criado mais oportunidades para que outras pessoas, como minorias, com algum grau de incapacidade ou outros grupos que por vezes têm maior dificuldade em entrar no mercado, consigam explorar as suas competências na área da tecnologia”
De que forma têm procurado atingir uma maior diversidade e inclusão nos recursos humanos?
AC: É possível otimizar este recrutamento diverso e inclusivo em todo o processo. Desde logo, procuramos que as nossas ofertas e processo de entrevista utilizem linguagem que respeite e inclua todas as pessoas. Depois, também damos formação aos colegas responsáveis por este contacto com quem se candidata, de modo a aprofundar um discurso mais inclusivo e menos parcial. A nível do dia a dia, além das medidas implementadas, procuramos que esta cultura orientada para as pessoas seja cada vez mais transversal ao modo como trabalhamos em equipa, pensamos nas soluções para cliente ou gerimos a relação com os nossos stakeholders. Uma das práticas que implementamos é precisamente consultar junto dos nossos fornecedores as suas próprias políticas de diversidade e inclusão, de modo a garantir que estamos alinhados pelos mesmos objetivos e valores. Além disso, promovemos com regularidade assessments internos para perceber de que forma as medidas estão a ser implementadas e que impacto estão a gerar para colaboradores e equipas.
Quais são as metas internas a que se propuseram atingir em termos de paridade e inclusão da diversidade?
AC: Em termos concretos, por exemplo, procuramos manter até 70% de um determinado grupo demográfico para que haja maior diversidade; queremos pelo menos que 30% dos cargos executivos sejam ocupados pelo género feminino; o novo escritório do Porto para onde iremos mudar, está a ser projeto pensado de modo a permitir que pessoas com mobilidade condicionada possam trabalhar neste espaço. Desenvolvemos ainda uma análise sobre a igualdade salarial em todos os escritórios do grupo, assim o processo de revisão e promoção devem respeitar determinados critérios para assegurar diversidade e inclusão.
Entende que o tópico da promoção da diversidade e inclusão (D&I) representa já uma preocupação para as empresas?
AC: É cada vez mais notório um esforço nesse sentido e vemos outras empresas em diferentes setores advogarem estas práticas. No entanto, mais que palavras é fundamental que sejam realmente implementadas as medidas que se defendem. Há uma grande correlação entre a diversidade das equipas e os bons resultados que a organização atinge, e cada vez devemos perceber que o verdadeiro valor da nossa organização está nas nossas pessoas, nos e nas especialistas que constroem em conjunto as melhores soluções para cada cliente e estão na origem da inovação e disrupção do que aqui criamos, em conjunto.
“Mais que palavras é fundamental que sejam realmente implementadas as medidas que se defendem”
Olhando para o mercado de um modo geral, o que é que considera que é preciso fazer para se vencerem preconceitos e se aumentarem dentro das empresas este tipo de quotas? Quais os caminhos a seguir?
AC: A definição de quotas é um primeiro passo para potenciar a diversidade, sendo que esta prática deverá imiscuir-se na cultura da organização e no seu próprio modo de funcionamento. Ou seja, o investimento na diversidade e o ambiente de inclusão devem ser parte da cultura interna da empresa e defendido por todas as suas equipas. Esta é uma maratona que caminhamos juntos, onde é fundamental ouvir o feedback de candidatos e de colaboradores para compreender de que forma os nossos processos e ambiente de trabalho respondem às políticas de diversidade e inclusão que foram delineadas, o que pode ser otimizado e onde nos podemos desafiar para sermos uma organização cada vez mais inclusiva.
“A definição de quotas é um primeiro passo para potenciar a diversidade, sendo que esta prática deverá imiscuir-se na cultura da organização e no seu próprio modo de funcionamento”.