“Somos o que fazemos. Nos dias em que fazemos, realmente existimos; nos outros, apenas duramos”, escreveu Eça de Queirós. Olhando para o presente político e energético em Portugal e na Europa, percebemos que esta reflexão permanece bastante atual. Com um novo Parlamento e Governo em funções, temos uma oportunidade única para decidir o que queremos ser amanhã – e a decisão passará, sem dúvida, pela aceleração da transição para as energias renováveis.
Portugal, nos últimos anos, tem demonstrado um crescente compromisso com a energia verde, destacando-se em áreas como a energia solar e eólica. No entanto, a realidade é que os desafios de hoje exigem soluções ainda mais ambiciosas e uma visão mais ousada. O Governo tem em mãos o poder de acelerar esta revolução energética, modernizando as infraestruturas, promovendo o armazenamento de eletricidade, flexibilizando o sistema elétrico, e digitalizando o setor para o tornar mais eficiente e interligado. O nosso país já deu grandes passos, mas há ainda um longo caminho a percorrer, e o tempo é um recurso que não podemos desperdiçar.
Ainda assim, não basta reagir às crises energéticas que surgem globalmente: é preciso antecipá-las, tomar as decisões necessárias para que o país continue a avançar de forma sustentada. Como o pioneiro do Realismo em Portugal nos lembrou, o que hoje fazemos determinará o que seremos amanhã e se adiarmos as decisões mais difíceis, “empurrando com a barriga”), corremos o risco de ficar para trás na industrialização verde.
No cenário europeu, o Parlamento recém-eleito tem também uma oportunidade de fazer, mudar e liderar. O Pacto Ecológico Europeu é o grande farol que guia a política energética da União Europeia (UE), mas as divergências entre os interesses económicos dos Estados-membros (na energia nuclear, sobretudo) e a urgência climática podem criar alguma pressão. A Europa, tal como Portugal, precisa de agir com rapidez e determinação para atingir a neutralidade carbónica, mas a dependência de fontes de energia externas como o gás natural e as tensões geopolíticas continuam a ameaçar o objetivo de uma UE energeticamente independente. Cabe ao Parlamento europeu romper o status quo e impulsionar não apenas a sustentabilidade, como um futuro verde alicerçado nas soluções de hoje. As energias renováveis têm desempenhado também um papel fundamental na reindustrialização europeia, ajudando a fortalecer as cadeias de valor, a criar empregos qualificados e a garantir uma maior autonomia energética, em linha com as recomendações do relatório de Draghi.
Globalmente, há questões que não podemos ignorar: como garantir que o desenvolvimento das energias renováveis respeita os ecossistemas e preserva as nossas áreas naturais? E como educar e capacitar a população para que faça escolhas energéticas conscientes? A sustentabilidade tem de ser sinónimo de um equilíbrio entre progresso e preservação ambiental.
O futuro energético de Portugal e da Europa está a ser moldado agora e se escolhermos a inovação, a ambição e a sustentabilidade, podemos alcançar um amanhã próspero, verde e socialmente justo. Se, por outro lado, continuarmos a adiar as decisões necessárias, no futuro sair-nos-á mais caro, com consequências inevitáveis. O tempo para agir é agora — o futuro depende disso.
Este é um momento crucial, tanto para o governo português como para o Parlamento europeu, que têm nas suas mãos a capacidade de moldar o amanhã energético de forma decisiva. Afinal, a energia que moverá o futuro é aquela que decidimos produzir hoje.
João Schmidt,
Diretor de Desenvolvimento de Negócio da Statkraft em Portugal