“Houston, we have a problem”. Todos conhecemos esta frase da expedição Apollo 13, pronunciada ao 3º dia da missão no espaço e após a explosão de um dos tanques de oxigénio. Apesar da gravidade e de a nave se encontrar a quase 330 mil Kms de distância da terra, a expedição acabou num retumbante sucesso em que todos os tripulantes voltaram a salvo para casa. Tendo por base este incidente, a NASA desenvolveu mais de 15 simulações para conseguir analisar a falha e os possíveis cenários alternativos. Este poderá ter sido o primeiro, do que se viria a chamar mais de 50 anos depois, os Gémeos Digitais (Digital Twins).
Em termos simplistas, um Digital Twin consiste numa réplica digital de um objeto físico, permitindo desta forma criar e testar diversos cenários hipotéticos, contribuindo para a inovação e a eficiência nos mais variados setores. Segundo a Gartner, esta é uma das “Big Trends” da década, com um valor de mercado (expectável) a ultrapassar os 183 mil milhões já em 2031.
Além dos diferentes níveis de complexidade dos ‘Digital Twins’, é crucial observar exemplos práticos que demonstram a sua aplicação efetiva:
- Gestão de tráfego: Em Chattanooga, nos EUA foram usadas informações de 500 fontes diferentes para realizar simulações na gestão do tráfego. Usando o “gémeo digital” a cidade registou uma melhoria de 30% no fluxo de tráfego e uma maior eficiência na redução dos atrasos;
- Eficiência energética: A Universidade Tecnológica de Nanyang, em Singapura, conseguiu criar poupanças de 31% na utilização de energia e uma redução de 9,6 quilotoneladas nas emissões de carbono;
- Gestão de recursos: Em Itália, a empresa que gere o serviço dos aquedutos de Puglia investiu 3,4 milhões de euros para otimizar a entrega de água aos cidadãos atuando na prevenção de fugas e avarias;
- Planeamento urbanístico: Em Zurique espera-se que a população local cresça em 300 mil habitantes até 2040. Para clarificar como acomodar este crescimento sem retirar espaço verde à cidade, está a ser criado um Digital Twin da cidade de forma a efetuar diversas simulações.
Os Digital Twins podem ainda ser utilizados no âmbito das cidades inteligentes para maximizar o impacto nos custos operacionais de edifícios através da redução no consumo de energia. Atualmente, os edifícios comerciais e residenciais são responsáveis por aproximadamente 1/3 das emissões globais de gases com efeito de estufa e representam 40% da procura global de energia e 25% da utilização global de água. Ao utilizar tecnologias de Digital Twins, o consumo de energia pode ser reduzido entre 30% a 80%.
Estes exemplos ilustram a escala dos Digital Twins atuais e as eficiências que proporcionam, mas também destacam os benefícios de sustentabilidade que podem oferecer à sociedade. Através da sua capacidade de responder a perguntas como “o que é melhor?”, “e se…?” e “o que vem a seguir?”, um Digital Twin pode fornecer visibilidade sobre o desempenho atual dos sistemas, propor como melhorá-los e também prever como irão funcionar em diferentes cenários.
O futuro está intrinsecamente ligado à nossa capacidade de adaptação e à procura por um estilo de vida mais equilibrado e ambientalmente consciente. É urgente alterar a forma como nos deslocamos, como consumimos energia, como desenhamos as nossas cidades e que padrões de exigência colocamos nos nossos decisores políticos. Porque, no final do dia o que não queremos é, daqui a uns anos, olhar para o céu e afirmarmos “God, we have a problem“.
Félix Lopes,
Head of Public Sector da Capgemini Portugal