Steve Forbes, director da Forbes EUA
Artigo incluído na edição de Dezembro de 2015
Uma das ideias mais perniciosas e que polui o nosso entendimento sobre o que é a economia — e a política— é a de que a economia é um mecanismo, como um automóvel, um comboio ou uma central de energia. As colunas de opinião estão cheias de frases que remetem para uma economia “a sobreaquecer”, “a precisar de arrefecer”, “cansada”, a precisar de um abanão” ou “a precisar de um estímulo.”
Estas metáforas não são inofensivas. São um epítome da forma como os economistas nos ensinaram a ver a economia — como algo que pode ser manipulado, guiado ou orientado. Acreditam que deve ser conduzida pelo governo e que o mesmo deve garantir que uma economia corre sempre à mesma velocidade, nem muito depressa (quente) nem muito devagar (fria).
É tudo um grande disparate. O resultado são políticas estatais intervencionistas que se revelam nocivas — resta saber mesmo até que ponto. As economias não são máquinas. Como afirmou o meu colega John Tamny da Forbes.com —autor de um dos livros mais esclarecedores deste ano, “Popular Economics” — e como muitos observadores iluminados não se cansam de explicar, as economias são compostas por um conjunto de indivíduos que trabalham individualmente ou em organizações. E podemos acrescentar—ou pelo menos tentar — que é composta pelo que lançam em termos de produtos e serviços. Mas isto não quer dizer que possamos controlar o que estas pessoas — milhares de milhões! — fazem.
Na maioria dos casos, a melhor receita para uma boa saúde da economia é: “menos é mais.”
Nas economias descura-se ou minora-se frequentemente a “taxa de rotatividade” extraordinária de actividades que existe num mercado livre. Todos os dias assistimos à abertura de novas empresas e ao fecho de outras. Nos EUA, em períodos normais, são criados meio milhão de empregos ou mais todas as semanas, e meio milhão são cortados ao mesmo tempo. Os empresários estão constantemente a lançar novos produtos e serviços, a maioria dos quais acaba por se revelar um fracasso. Mas há quem consiga vingar.
O que o governo pode — e deve— fazer é influenciar o ambiente no qual este fluxo de actividade decorre. As principais variáveis são: tributação, política monetária, despesa do estado e regulação. Na maioria dos casos a melhor receita para uma boa saúde da economia é: “menos é mais.”
Os erros catastróficos cometidos pelos governos podem envenenar os mercados, como aconteceu na década de 1930 e, em menor escala, na década de 1970. Actualmente, vivemos um período semelhante. Os erros da Reserva Federal e do Departamento do Tesouro, ao enfraquecerem o dólar no início dos anos 2000, conduziram a um falso boom de mercadorias, a uma bolha imobiliária e, por fim, ao pânico que se registou em 2008-09. Outros erros do governo houve que tiveram também um papel importante, nomeadamente a regra contabilística de avaliação do preço de mercado aplicada ao capital dos bancos antes da crise financeira. Esta regra destruiu desnecessariamente o capital dos mesmos numa altura em que estavam mais vulneráveis. E quando esta política foi invertida, no início de 2009, e após pressões do Congresso, a bolsa, que sofrera até então, subiu de forma acentuada.
Infelizmente, tivemos toda uma série de erros por parte da Fed—abrandamento quantitativo, operation twist e política de taxas de juro zero— que contribuíram para uma redução da actividade económica e que afectaram os fluxos normais de crédito. O dinheiro foi direccionado artificialmente para o governo federal, para a Fannie Mae, para o Freddie Mac e para as grandes corporações à custa dos consumidores e das pequenas e novas empresas. Um bom exemplo de uma política que beneficiou gradualmente os mais pobres mas que acabaria por aumentar a fortuna dos mais ricos.
Aos erros da Fed juntaram-se aumentos de impostos e uma leva de regulações anti-crescimento por parte do ObamaCare, da lei Dodd-Frank, das agências de regulação de Washington como a FCC, a EPA e do Conselho Nacional de Relações Laborais. O conceito/objectivo de uma economia que se comporta como um motor bem oleado acaba por afectar e não por melhorar a criação de riqueza. E gera intervenções estatais que retardam o crescimento. Ludwig von Mises, um grande economista, mas pouco reconhecido do século passado, salientava que os gastos por parte do Estado ou a emissão de moeda para dar fôlego à economia não têm o mesmo efeito que injectar gás num motor. Acaba sim por distorcer as coisas, afectando assim o progresso. O abrandamento quantitativo, por exemplo, enriqueceu algumas faixas à custa de outras, atrasando a recuperação económica.
E chegamos assim às bolhas que são definidas como uniformemente perigosas; mas as bolhas não são todas iguais. Existem bolhas saudáveis e outras que não o são. As bolhas boas ocorrem quando muitas pessoas reconhecem uma grande oportunidade, muitas vezes na área da tecnologia.
O sector automóvel é disto um bom exemplo. Nos EUA, os fabricantes de automóveis eram às centenas; hoje só temos três. No início da década de 1980 assistimos a um boom na quantidade computadores pessoais — mas o mercado sofreu uma reestruturação e empresas como a Atari e a Commodore caíram por terra. No final dos anos 1990 as empresas reconheceram a importância deste tipo de máquinas. Hoje, este espaço é dominado pela Google, tendo a Microsoft e outros sido relegadas para segundo plano, ficando com uma quota fraccionada do mercado. E, mais recentemente, assistimos a uma verdadeira onda de abertura de lojas de cupcakes, número que, entretanto, tem vindo a baixar. A existência de uma série de bolhas boas é sinal de uma economia viva, criativa e inovadora. Os excessos acabam por ser eliminados e o capital recanalizado para oportunidades mais prometedoras.
Há mais de 200 anos que os economistas se debruçam sobre os ciclos económicos — os altos e baixos de uma economia. A maioria abordou este fenómeno como se de uma doença se tratasse, algo que tem que ser curado, e não como fluxos e refluxos de um mercado livre onde o que as pessoas querem é criado e o que as pessoas não querem é destruído. Isto aplica-se tanto às novas indústrias como aos comerciantes que baixam os preços para se desfazerem de stocks que já não querem. Os ciclos económicos são uma característica, uma constante do dia-a-dia de um mercado livre. Tentar travar este processo, conhecido como destruição criativa, conduz a estagnação. Exemplos perfeitos disto são a Europa e o Japão, cujos governos intervencionistas tentaram manter as coisas como estavam.
Nada disto é novo. Durante séculos a China, o Japão e aquilo a que antes chamávamos o subcontinente indiano resistiram a mudanças no statu quo económico. Passaram por uma série de convulsões políticas e militares, mas os ritmos da vida económica pouco mudaram.
Por razões várias, a Europa quebrou de forma decisiva este padrão de estagnação económica, e o mesmo aconteceu nas regiões onde os seus colonos se fixaram em grande número, nomeadamente na América do Norte. Os Estados europeus onde a mão do governo era relativamente leve – a começar pelas cidades-estado do norte de Itália e mais tarde na Holanda e na Grã-Bretanha, assistiram ao desenvolvimento de mercados de capitais, direitos de propriedade e direitos políticos e ao aparecimento de instituições e costumes que conduziram à Revolução Industrial. Os EUA então criados levaram esses avanços mais longe do que qualquer outro país.
As duas guerras mundiais do Século XX, a Grande Depressão e a Guerra Fria, colocaram esta extraordinária evolução em perigo. Estes acontecimentos deram azo
a um forte aumento dos poderes do Estado, poderes estes cujo peso não diminuiu em tempo de paz. Uma série de observadores e políticos começaram a defender que, se um governo conseguia mobilizar os recursos de uma sociedade para travar uma guerra, podia usar também esses poderes para equilibrar o ciclo económico, pondo fim à confusão nos mercados livres e criando prosperidade para todos. Na década de 1930, a catástrofe económica fez com que as pessoas desconfiassem dos mercados livres, gerando assim a convicção de que eram inerentemente instáveis. Mas foram os vários erros do Estado que conduziram a esse período terrível.
John Maynard Keynes aconselhava a uma orientação política sensata e activa por parte do Estado, que conduziria a uma prosperidade perpétua. Keynes, tal como muitos outros, viam a economia como um motor que nunca gripava nem sobreaquecia. E minorou a importância dos empresários, que desdenhava. A solução era o controlo da massa monetária em circulação parte do governo. Estava errado. Mas o seu perigoso legado – veja-se a estagnação a que se assiste em todo o mundo – continua entre nós.