Muito se tem escrito sobre as ameaças ao sector financeiro nos últimos tempos: os novos bancos digitais, a regulamentação cada vez mais restritiva, a competição das Fintechs, o futuro das cripto moedas e a relevância do modelo de distribuição suportado por agências bancárias físicas – tudo tópicos bastante pertinentes e polarizadores de opinião.
Mas acredito que há um tema que, não sendo menos essencial, não tem conseguido obter o necessário tempo de antena: a experiência do cliente – definida como o impacto cumulativo dos vários pontos de interação ao longo de um determinado período no qual um utilizador interage com uma determinada organização. A este respeito, a Forrester diz-nos que os clientes estão dispostos a pagar até 4.5x mais por uma excelente versus uma má experiência do cliente.3
Sob a perspetiva das organizações, um estudo da Bain & Company mostra-nos que, num universo de 362 empresas entrevistadas, 80% acreditam que entregam uma “experiência superior” aos seus clientes.1 Esses mesmos clientes entendem que, afinal, só 8% dessas empresas cumprem com essa entrega.
Ou seja, quando fomos todos subitamente confrontados com um aumento da procura por produtos e serviços entregues de forma digital, remota e instantânea, motivado por esta nova realidade de distanciamento social e teletrabalho, não conseguimos deixar de nos questionar se as empresas que tanto têm investido em transformação digital, de forma a manterem-se relevantes neste novo contexto social, se têm de facto investido da melhor forma os seus recursos ao garantir que o cliente é colocado no centro do seu negócio e da sua estratégia, de forma não só a proporcionar ao consumidor a melhor experiência possível mas também a fidelizar o mesmo e consequentemente aumentar as receitas geradas.
Recentemente, em uma compilação das 100 empresas mais influentes em 2021 que visava responder à questão de quais as organizações que estavam de facto a moldar o nosso futuro, encontramos referência à Nubank, a maior fintech da América Latina, de origem Brasileira e que já oferece os seus serviços financeiros a uma base de mais de 35 milhões de clientes, o que lhe vale também o título (informal) de maior banco digital do mundo.2
Assente num modelo de distribuição totalmente digital e com uma forte presença nas redes sociais, onde recorre a um estilo coloquial na interação com os seus seguidores, a Nubank tem observado um crescimento exponencial fruto de uma aposta contínua na construção de uma excelente experiência do cliente fortemente alicerçada na entrega de uma interação personalizada, onde o cliente se sente de facto ouvido e achado relevante versus alguma experiências industrializadas e habituais nos nossos mercados, o que tem ajudado a atrair cada vez mais “Nus” para dentro da Nação Roxa.
O exemplo do Nubank é claro em demonstrar não só o poder da aposta no desenho de uma experiência de cliente no que diz respeito à capacidade de retenção dos clientes, mas também de que forma o sector financeiro se pode preparar para a (forte) ameaça da entrada das Big Techs no sector. Estas grandes empresas de tecnologia, nomeadamente a Google, Amazon, Apple e Facebook, já oferecem aos seus clientes experiências digitais refinadas, disponíveis a qualquer hora e centradas na entrega de produtos e serviços de forma instantânea, o que contrasta com a experiência que a maior parte dos bancos, principalmente os incumbentes, oferece aos seus clientes – fica então claro que podemos estar a observar os primeiros passos para a disponibilização de uma verdadeira oferta
disruptiva e que poderá retirar relevância aos bancos como principais parceiros de serviços financeiros nos canais digitais.
No final do dia, a fórmula de “sucesso” até parece ser bastante simples – basta que as organizações dediquem os seus recursos a escutar de forma ativa, proactiva e recorrente, aquilo que os seus clientes realmente precisam e quais as suas reais ambições e necessidades, devidamente alinhadas aos seus eventos de vida, para que usem essas impressões de forma a alimentar o desenho (e implementação) de uma experiência adequada aos segmentos que servem.
E aí sim, podemos então falar de iniciativas de transformação digital – não há qualquer dúvida sobre os benefícios reais que este processo de mudança organizacional, cultural e operacional oferece às organizações, quando devidamente implementado e direcionado ao importante objetivo de satisfazer as necessidades dos clientes e não as habituais métricas financeiras.
28 de Dezembro, 2022