Professor da Nova School of Business and Economics
Artigo incluído na edição de Setembro 2018
Em 2017 foram batidos todos os recordes de vendas de casas em Portugal: de acordo com as estatísticas do INE, nunca se tinham vendido nem tantas casas, nem a preços tão elevados. Os dados dos Registos e Notariado do Ministério da Justiça disponíveis sobre os primeiros meses deste ano sugerem que estes recordes venham a ser batidos já em 2018.
É como se o ramo imobiliário fosse o “Ronaldo das vendas”, aumentando a parada a cada ano que passa e batendo continuamente recordes. Este padrão de crescimento é tão forte que já levou os representantes dos profissionais do imobiliário a afirmar que o stock de casas em (pelo menos) Lisboa e Porto está a ficar esgotado. Neste cenário de cada vez maior competição e limitação de recursos disponíveis torna-se fundamental revisitar a questão: O que caracteriza os bons vendedores?
Foi com este intuito que fui reler um artigo publicado na Harvard Business Review (digital) em 2011 por Steve Martin, professor e consultor de marketing, conhecido por ter publicado mais de 30 artigos nesta prestigiada revista. O artigo, intitulado “Seven Personality Traits of Top Salespeople”, procura, tal como o nome indica de forma bastante óbvia, fazer um apanhado das características de personalidade mais comuns que Steve Martin encontrou nos cerca de 1000 vendedores a quem teve oportunidade de aplicar testes de personalidade ao longo dos anos.
Ao comparar os resultados dos melhores vendedores com a “norma” (vendedores na ou abaixo da média), verificou que existiam sete elementos que claramente diferenciavam o top. A primeira característica é modéstia e humildade. É importante pois ajuda os vendedores a manterem-se orientados para a equipa, garantindo o buy in de todos os envolvidos em vez de estarem focados em si mesmos. Em segundo lugar aparece a conscienciosidade, reflectida no sentido de dever e na importância dada ao trabalho. Este traço ajuda as pessoas a manter o controlo do processo em vez de contribuir para uma maior desorientação cada vez que o cliente ou um competidor muda de direcção.
Um terceiro traço prende-se com a orientação para a realização (em vez de afiliação ou poder) que se traduz num esforço continuo para atingir objectivos. Esse esforço leva a uma maior procura de alinhamento entre a oferta e as motivações de quem procura. Em quarto lugar, aparece um elemento bastante interessante: curiosidade. Este aspecto leva as pessoas a prestar atenção ao que é dito e a procurar activamente informação, questionando o cliente e tentando rapidamente perceber se existe a possibilidade de fechar o negócio. Os vendedores excelentes tendem também a ser pessoas sem grandes necessidades gregárias, ou seja, indivíduos para quem fazer parte de um grupo e ser amigável e apoiante não é tão central, o que se traduz numa abordagem de venda mais dominante e centrada no resultado.
As duas últimas posições são ocupadas por duas faltas: falta de desencorajamento e falta de auto-consciência. A primeira prende-se uma vez mais com a competitividade que estes vendedores mostram e a sua capacidade de recuperar de momentos mais negativos utilizando o insucesso como treino mental para preparar a próxima venda. A segunda permite que os vendedores não se sintam embaraçados ou inibidos com facilidade, permitindo-lhes ser mais orientados para a acção e lidar de forma mais agressiva com o processo de vendas.
Devemos ter em conta que este estudo foi realizado nos EUA e como tal existem possivelmente diferenças entre esta amostra e uma analisada no contexto português. Um outro detalhe interessante desta análise é que algumas destas características não são propriamente as mais óbvias quando se pensa em vendedores (modéstia ou curiosidade, por exemplo), e podem muitas vezes até ser vistas como contra produtivas tendo em conta as exigências do trabalho em vendas. Daí a importância de se ir revisitando e reflectindo sobre o tema.