Nos últimos dois anos, os parceiros de Maran Nelson enviaram por diversas vezes flores ou chocolates à sua assistente executiva, Clara, em sinal de gratidão pelo seu excelente trabalho.
Clara responde sempre aos e-mails no espaço de 15 minutos, mesmo durante a noite. Sabe sempre qual o melhor restaurante de sushi para um almoço de negócios em Palo Alto, criando para o efeito notas no calendário com indicação do tempo de deslocação. Não dá erros ortográficos e nunca se esquece de dar seguimento a um e-mail.
Mas Clara não aprecia os ramos de flores que recebe porque é um ciborgue – parte algoritmo, parte humana. É o resultado de dois anos de testes intensivos e de 4,5 milhões de euros de financiamento na start-up Clara Labs.
Maran, presidente executiva e co-fundadora da empresa norte-americana, e o director técnico Michael Akilian, ambos de 25 anos de idade, juntamente com uma mão cheia de investidores de renome, tais como Marc Benioff, presidente executivo da Salesforce, estão convencidos de que Clara vai mudar a forma como trabalhamos, a começar por ajudar-nos a gerir esse pesadelo que é a nossa caixa de correio electrónico e que tanto tempo nos tira.
Apesar de toda a tecnologia de aprendizagem automática envolvida, trabalhar com os assistentes robô da Clara Labs é muito simples. Por entre 89 a 360 euros por mês, consoante o volume de trabalho e as suas necessidades, é atribuída uma “Clara” ao e-mail específico de um executivo.
Pode sempre mudar-lhe o nome: o primeiro cliente de Maran, Danielle Morrill, da start-up de tratamento de dados Mattermark, escolheu o nome de Claudia Robertson; o co-fundador da Reddit e investidor na Clara Labs, Alexis Ohanian, optou por Max Power, inspirado no alter-ego de Homer Simpson num dos seus episódios favoritos desta série.
Clara só comunica através de e-mail e em linguagem natural. Pode adicioná-la a qualquer e-mail para que possa gerir a suas tarefas, ao que ela, discretamente e usando o campo “CC” do seu e-mail, assume todas essas entediantes interacções que podem arruinar o dia de trabalho de cada um.
Conceda-lhe acesso aos seus calendários on-line e ela agendar-lhe-á reuniões, chamadas, almoços e cafés. Clara pega nos seus contactos e vai sugerindo horas e locais com base nas suas preferências. E pode comunicar com ela como quem comunica com uma assistente humana.
Se lhe disser “não se esqueça de me lembrar para marcar uma consulta no dentista para a semana” receberá um e-mail num tom amistoso, pontualmente à mesma hora, sete dias depois.
Quando um e-mail é demasiado complicado para ser gerido pelos algoritmos de Clara, entra em cena um dos ajudantes humanos da empresa, alguém que trabalha a partir de casa num determinado fuso horário em qualquer parte do mundo. “Apesar de toda a capacidade de aprendizagem automática, as máquinas ainda não conseguem compreender na totalidade a linguagem natural, extremamente complexa — não chegam lá, pura e simplesmente,” afirma Maran.
E enquanto um bot lhe responde normalmente numa algaraviada, Clara envia uma mensagem do algoritmo indicando a acção que acha dever ser tomada para uma das pessoas que trabalha com a empresa, continua Maran. É esta abordagem híbrida que diferencia Clara dos chatbots e dos assistentes virtuais de empresas como a Amazon.com, a Google e o maior concorrente de Clara, o X.AI.
Fugir dos e-mails
Clara surgiu como forma de resistir à tirania da caixa de entrada de e-mails e nem sempre foi automática. Em 2013, Maran viu-se confrontada com o seu primeiro grande desafio desde que saíra da Universidade do Texas em Austin, onde estudou Neurociências e Psicologia.
Não era o cargo em si, de co-fundadora da start-up de testes A/B Crowdery, apoiada pela aceleradora Y Combinator, que mais a sobrecarregava. Era a cultura da empresa baseada em e-mails sem fim e mensagens com “resposta para todos”. Deu consigo a descurar contactos importantes ao esquecer-se de agendar este ou aquele telefonema ou de responder a um convite. “Não gostava nada e era mesmo má naquilo,” afirma.
Quando a Crowdery fechou, Maran juntou-se a Michael, engenheiro informático e o seu melhor amigo desde o 10.º ano. Os dois recrutaram especialistas como Danielle, e Michael criou um protótipo que permitiria a ambos entrarem e gerirem a agenda manualmente. “Queríamos saber o que é que as pessoas pretendem de um produto como este,” afirma Michael.
Pouco tempo depois, Maran estava de volta à Y Combinator, sendo a pessoa mais nova e a única mulher a ser apoiada por esta aceleradora dois anos seguidos. E foi aceite pela sua forte convicção de que a automação e a tecnologia de aprendizagem automática, que não estavam ainda presentes no produto, lhes permitiria ganhar nova escala.
Quando chegou a altura de angariar capital, em 2014, Clara já estava na mira dos investidores. Os empregados da Heroku, subsidiária da Salesforce, já usavam este produto quando Benioff passou o primeiro cheque. De entre os clientes de destaque contam-se os executivos do Sequoia Capital (que também investiram), Stripe e Hipmunk.
A start-up não revela dados financeiros, mas com os preços deste serviço a ultrapassarem os 4200 euros ao ano para executivos muito ocupados, as suas receitas serão na ordem dos milhões de euros, pelos cálculos da FORBES.
Os seus apoiantes vêem grande potencial na Clara, muito para além da sua capacidade de gerir agendas. “A minha lista de contactos está refém da minha caixa de entrada de correio electrónico,” afirma Ohanian da Reddit. “Clara lida bem com isso e consegue operar maravilhas. Os resultados são por vezes inesperados. Só tivemos que descobrir como agilizar essa capacidade. Clara tem tudo para ser o elo que vai permitir uma maior evolução do produto”, destaca Maran.
Utilizadoras intensivas como Morrill não se cansam de louvar o trabalho de Clara.
“As pessoas vão ao meu escritório e perguntam pela minha assistente, a Claudia,” afirma. “E dou comigo na estranha obrigação de ter que informar que ‘ela não existe.’”