Opinião

O mito do grande comprador

Pedro Amendoeira

Um dos mitos mais prevalecentes nas Compras (Procurement) é que quando se compram grandes volumes se conseguem as melhores condições possíveis, desde que se consultem vários fornecedores. Os seguidores desta linha de raciocínio acreditam que, quando encorajados pela possibilidade de uma grande venda, a maioria dos vendedores faça o seu melhor para a conseguir, considerando tanto os preços como as condições gerais.

Embora grandes volumes ajudem a obter melhores preços, não são garantia suficiente para os assegurar. Muitas pequenas empresas obtêm negócios mais vantajosos do que concorrentes maiores através de um conhecimento superior do mercado, de capacidades de negociação ou simplesmente de sorte com o momento.

Primeiramente, o momento em que nos aproximamos do mercado pode fazer uma enorme diferença. Se a fábrica do fornecedor estiver a funcionar a plena capacidade, satisfazer grandes encomendas para além disso só será interessante se a margem for bastante elevada. Se, por outro lado, a fábrica tiver sede de produção, pode sacrificar a margem apenas para funcionar e diluir os custos fixos. Conhecer a “fome” de cada fornecedor é fundamental para cronometrar o momento de os abordar. Este fenómeno de fome/fartura pode afetar todos os fornecedores de uma determinada indústria ao mesmo tempo ou uns mais do que outros; também pode ser sazonal, acompanhar crises gerais ou ir contra elas.

O conhecimento do mercado e do produto também tem um enorme impacto nas condições que pode obter, independentemente do volume. Para alguns fornecedores, as grandes encomendas podem ser totalmente indesejáveis, pois exigem uma grande ligação de capital para matérias-primas, armazenamento, stocks, etc., que não dispõem de tesouraria para pagar. Em paralelo, outros fornecedores podem aparentemente oferecer as melhores condições para grandes quantidades, mas depois recuperam as suas margens através de custos ocultos, como transportes, extras por urgências, noutros produtos ou em serviços pós-venda mais elevados. A função dos vendedores é obter as melhores condições possíveis para eles, por isso compete-lhes aproveitar eventuais lacunas de conhecimento que o comprador possa ter, até porque ninguém conhece melhoro seu mercado. Ainda assim, quanto mais informação o comprador tiver, melhores serão as condições.

As competências de negociação também desempenham um papel relevante. O problema é que todos pensam que são bons negociadores. Os melhores vendedores sairão da mesa não só com um grande negócio para eles, mas também com o comprador a pensar que os forçaram ao máximo.

Além disso, a força da relação pode pesar mais do que o volume, isto é, um cliente de confiança, com um bom planeamento para encomendas pequenas, pode obter melhores preços do que um cliente que faz uma encomenda grande.

Finalmente, a complacência desempenha muitas vezes um papel que não deve ser negligenciado:  acreditarmos que somos um grande comprador e que estamos a obter as melhores condições pode impedir a descoberta de melhores oportunidades com fornecedores alternativos.

Assim, embora frequentemente volumes mais elevados conduzam a melhores condições, existem exceções – e razões que as explicam e que são motivo suficiente para declarar que  este mito não resiste a um exame minucioso.

Pedro Amendoeira,
partner da ERA Group

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