Opinião

O futuro não se negocia: a eletrificação é a única estrada competitiva para a Europa

Domingos Silva | Managing Director Volvo Car Portugal

A Europa construiu durante décadas uma posição de liderança no setor automóvel, sustentando milhões de empregos, exportações de elevado valor acrescentado e uma cadeia industrial complexa e altamente especializada. No entanto, essa liderança está hoje a ser desafiada por novos protagonistas globais, em particular por fabricantes asiáticos que avançam rapidamente em escala, tecnologia e custo. Perante este cenário, enfraquecer compromissos de longo prazo para ganhos de curto prazo seria um erro estratégico com consequências duradouras. A incerteza regulatória não protege a indústria europeia. Fragiliza-a.

A revisão das metas de CO₂ e o debate em torno de 2035 devem ser encarados com pragmatismo, mas também com visão. Uma política consistente, previsível e ambiciosa é o que permite às empresas investir, inovar e planear a longo prazo. A eletrificação não é apenas uma resposta às alterações climáticas; é o caminho inevitável para garantir que a Europa continua a competir num mercado global cada vez mais exigente. Adiar decisões ou diluir objetivos apenas transfere o problema para o futuro, tornando-o mais difícil de resolver.

Na Volvo, fizemos uma escolha clara. Em menos de dez anos, construímos um portefólio completo de veículos elétricos e estamos preparados para avançar para um futuro totalmente elétrico, com os híbridos de longo alcance a funcionarem como uma ponte de transição. Esta transformação exigiu investimento, foco e coragem estratégica, mas provou que é possível adaptar um fabricante europeu tradicional a uma nova realidade tecnológica. Se nós conseguimos fazê-lo, outros também conseguem.

Portugal é um exemplo concreto de como políticas claras e consistentes produzem resultados. O nosso país destaca-se na Europa pela adoção de veículos elétricos, pela maturidade da infraestrutura de carregamento e pela abertura dos consumidores à inovação. Este ecossistema demonstra que, quando existe alinhamento entre políticas públicas, indústria e mercado, a transição acelera de forma natural e sustentável.

Medidas como o reforço da produção europeia de baterias são, por isso, positivas e estratégicas. Desenvolver uma cadeia de valor de baterias na Europa é essencial para reduzir dependências externas, assegurar resiliência industrial e capturar mais valor económico dentro do espaço europeu. Iniciativas que promovem investimento local, inovação e coordenação entre Estados-Membros são passos na direção certa.

Também a simplificação regulatória merece atenção. Reduzir burocracia e custos administrativos pode libertar recursos para aquilo que realmente importa: inovação, descarbonização e competitividade global. A eficiência regulatória não deve ser confundida com ambição reduzida. Pelo contrário, regras mais simples e claras fortalecem a capacidade das empresas europeias de competir num mercado global altamente dinâmico.

No lado da procura, a aposta na descarbonização das frotas empresariais é particularmente relevante. As frotas corporativas representam a maioria das novas matrículas e têm um impacto significativo na redução de emissões. Além disso, são fundamentais para alimentar o mercado de veículos usados, tornando a mobilidade elétrica mais acessível a um público mais vasto. No entanto, para que esta dinâmica funcione, é essencial garantir um mercado de segunda mão saudável, apoiado por incentivos adequados e por uma infraestrutura pública de carregamento robusta. Sem isso, os valores residuais enfraquecem, os custos aumentam e a transição perde tração.

Reforço que a eletrificação é uma oportunidade histórica para reforçar a competitividade da Europa, mas apenas se tivermos a coragem de manter o rumo e, na Volvo, acreditamos que o futuro não se adia; prepara-se.

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