Na vida de Winston Churchill houve certamente milhares de momentos de antologia. Os discursos, as decisões cruciais para o destino de milhões tomadas em Westminster.
Um destes momentos, desta feita de descanso, foi à beira do Atlântico, numa suite de um hotel no Funchal com vista para a cidade, em 1950, um ano antes de assumir de novo a chefia do governo do Reino Unido. O hotel escolhido fora o Reid’s Palace, histórico hotel de luxo e conforto que segue à risca os padrões de comodidade ingleses. Hoje em dia, o Reid’s é Belmond Reid’s Palace Funchal, em virtude das constantes mudanças accionistas que obrigam a acrescentos periódicos nos nomes de muitos hotéis.
Ainda celebra os seus hóspedes ilustres e a herança british, procurada por muitos. Churchill não foi esquecido e ainda está presente na suite presidencial, com o seu nome, pontuada por caricaturas e biografias do antigo primeiro-ministro britânico. A suite principal – a outra suite presidencial dá pelo nome de George Bernard Shaw, também ilustre visitante do hotel – tem uma diária de 2360 euros, segundo a página na internet do Reid’s.
O Reid’s mantém este tom clássico e inabalavelmente inglês. O hotel mantém uma sala de bridge, onde os hóspedes podem – se arranjarem parceiros – lançar as cartas à mesa e mantém a hora do chá, todos os dias, com sanduíches ao gosto inglês (pão-de-forma, pepino, salmão, queijo-creme), scones acompanhados de compota, manteiga e natas, e uma gama de chás e infusões e champanhe a copo.
O bar, chamado simplesmente de “Cocktail Bar”, tem vista para o Funchal e, no seu programa regular, concertos diários de clássicos brasileiros, reinterpretações ao vivo de canções contemporâneas e tributos a Sinatra e aos ABBA, por exemplo.
O Reid’s inclui ainda três restaurantes, por ordem crescente de sofisticação: o Villa Cipriani, especializado em culinária italiana, o William’s, o restaurante de gama intermédia, e o The Dining Room, que só permite entrada a clientes com a combinação casaco-gravata.
Ilustre livro de visitas
Em 1891, o jovem William Reid, de 14 anos e saúde frágil, é enviado pela família para a Madeira. Vai para climas melhores, disse-lhe o pai, passando-lhe para a mão cinco libras. Chegado cá, anos mais tarde, peripécias e tiros na água depois, resolve abrir um hotel na área do Funchal, à época principal cidade de uma ilha ainda muito longe de estar nos guias das low-cost.
Situou-o num penhasco chamado Salto do Cavalo, à beira-mar. O hotel acabaria por receber, anos depois, personalidades como a imperatriz da Áustria-Húngria Isabel I, mais conhecida por Sissi, o escritor George Bernard Shaw, prémio Nobel da Literatura, em 1925, ou o já citado Churchill, numa ilha que, à época, tinha grande falta deste tipo de comodidades para o visitante mais abastado.
Mais tarde, no século XX, o hotel é adquirido pela família Blandy, também de origem inglesa – um clã ainda hoje membro firme na elite funchalense, proprietária da marca de vinho Blandy’s e com uma participação no “Diário de Notícias da Madeira”.
No final do século passado, os Blandy vendem o Reid’s Palace ao grupo Orient-Express. Por sua vez, o grupo hoteleiro sofre um rebranding em 2014 – e, assim, o centenário hotel passa a chamar-se, por extenso, Belmond Reid’s Palace Hotel. Reid’s para os amigos.
Mas a história do hotel é feita não só pelos famosos que lá passaram, mas dos clientes que vão e vêm e que, por pouco tempo que seja, vão deixando a sua marca. Alguns vêm mesmo para ficar.
O hóspede mais longevo foi um dinamarquês que se alojou no Reid’s e aí permaneceu durante 15 anos, não saindo sequer quando o hotel entrou em obras, em 2006.
Aí acabaria por falecer, no final de 2014 – e, por ser um hóspede ilustre, que já faz parte da família Reid’s, figura no hall of fame do hotel, que inclui também o antigo Primeiro-ministro António Guterres e Cavaco Silva, antigo chefe de governo e antigo Presidente da República portuguesa.