Nascido em Ribeira de Pena, Vila Real, o Major-General Isidro de Morais Pereira já conta com mais de 40 anos de serviço efetivo. Com uma carreira militar extensa, prestou serviços em várias Unidades, Estabelecimentos de Ensino Militar, cá e lá fora, e em Órgãos do Exército e das Forças Armadas.
À FORBES, o Major-General fala-nos sobre o seu percurso profissional e sobre a sua ascensão recente a figura pública mediática pelo papel que tem tido como o comentador oficial mais ouvido na CNN quanto à invasão da Ucrânia pela Rússia. O seu currículo explica porque motivo a sua voz está a ser considerada na análise do conflito militar na Ucrânia.
Com uma licenciatura e um mestrado em Ciências Militares, na especialidade de Infantaria, feitos na Academia Militar, está ainda habilitado com o Curso de Promoção a Capitão, outro a Oficial Superior, e o Curso de Promoção a Oficial General. Entre outros cursos que frequentou estão o Curso de Operações Especiais, o Curso de Estado Maior, o Curso de Comando e Estado Maior das Forças Armadas Alemãs – tendo sido distinguido, na Alemanha, com o prémio ‘Certificado de Honra’ General Karl von Clausewitz e tendo visto a tese final que escreveu em alemão, publicada. Decidiu, há cerca de um ano, começar a empenhar-se num Doutoramento de Relações Internacionais no ISCSP, Universidade de Lisboa. Em exclusivo, conta-nos, também, um pouco mais sobre a sua vida pessoal e sobre os projetos futuros que tem.
Com uma carreira militar como a sua, é difícil acreditar que já teve outros sonhos – parece ter sido claro que esta era a sua área de preferência desde muito cedo. É verdade?
Major-General Isidro de Morais Pereira (MG): É algo que tenho de confessar, quis desde muito cedo o servir o meu país e consequentemente os seus cidadãos e a causa pública. Isso, de um modo geral, sempre constituiu uma ideia que se foi forjando no meu imaginário. Daí a minha permanente disponibilidade, quando ainda aluno do Liceu Camilo Castelo Branco, em Vila Real, assumi com gosto responsabilidades de Chefe de Turma que me foi proposta e, mais tarde, após a Revolução de 25 de Abril de 1974, as de Presidente da Associação de Estudantes do Liceu Camilo Castelo Branco. Muito embora a vontade do meu, infelizmente falecido, pai fosse a de me ver tornar-mem Médico, a minha vontade – talvez influenciado pelo papel decisivo dos militares na mudança do curso do nosso país em 1974, tinha eu 14 anos – era o de me tornar num militar, e de vir a tornar-me ‘Oficial do Exército Português’. Da minha perspetiva era isso que melhor se encaixava na minha vontade de servir a causa pública e no fundo o nosso país.
Desde muito cedo o servir o meu país e consequentemente os seus cidadãos e a causa pública. Isso, de um modo geral, sempre constituiu uma ideia que se foi forjando no meu imaginário.
Teve, portanto, de dar vários e largos passos para chegar à sua posição de hoje em dia. Como orientou a sua carreira militar? Teve de sacrificar partes da sua vida para atingir os seus objetivos?
MG: Quando olho para o passado e para o dia em que decidi deixar a minha terra natal, deixar longe os meus pais e irmãos, e rumar a Lisboa para ingressar na Academia Militar, tenho de reconhecer que, bem ou mal, acabei por colocar a minha vida profissional sempre em primeiro lugar. Felizmente consegui – porventura nem sempre sem o sacrifício da minha mulher Cecília e da minha filha Inês – conciliar bem a minha vida profissional com a minha vida pessoal. Nos momentos em que vivi fora do nosso país por necessidades imperativas das várias funções que fui chamado a desempenhar (designadamente na Alemanha, nos EUA e na Bélgica), sempre consegui contar com a presença da minha família. A minha mulher e a minha filha estiveram sempre ao meu lado e julgo terem ganhado com isso. A Cecília adorou. A Inês estudou anos a fio em escolas alemãs e norte-americanas e acabou por se tornar médica. No fim, ficámos todos trilingues, o que é bom. Noutras situações, como foi o caso da Bósnia-Herzegóvina, quando no desempenho de funções de Comando em operações enquadradas numa força da NATO, aí, naturalmente, não pude contar com a tão importante presença delas. O que não foi nada fácil…
É também um muitíssimo bom líder, razão pela qual escolheu começar por ser nomeado e aceitar lugares de Ensino e Comando em vários estabelecimentos e em diferentes unidades e organismos, quer em âmbito nacional quer no internacional.
MG: É verdade que de entre as múltiplas funções que como Oficial do Quadro Permanente do Exército Português pude desempenhar, aquelas pelas quais sempre me senti mais atraído e motivado foram as funções de Comando, Direção ou Chefia. Comandei em todos os escalões, desde o comando de vários Pelotões, até Companhias quer em Mafra – na antiga Escola Prática de Infantaria, quer em Lamego no Centro de Tropas de Operações Especiais, quer em Santa Margarida onde comandei o 2º Batalhão de Infantaria Mecanizado; e também no Teatro de Operações da Bósnia-Herzegovina o 2º Batalhão de Infantaria Mecanizado/SFOR, então no desempenho da missão de Reserva Operacional Terrestre da SFOR/NATO – senti-me sempre amplamente realizado. Já como Oficial General tive o privilégio de dirigir um Diretorado do SHAPE/NATO, o “Operational Preparation Directorate”, ficando como responsável pela certificação de todas as NATO Response Forces e pela Certificação de todos os Comandos da Estrutura da Aliança Atlântica. Confesso que, foi também com orgulho que, como General, me foi dado o privilégio de comandar a Zona Militar dos Açores, o ter sido Diretor Coordenador do Estado-maior do Exército por duas vezes e também, numa posição militar-diplomática, Representante Militar de Portugal junto do Comando Supremo das Forças Aliadas na Europa em Mons, no Reino da Bélgica.
Já como Oficial General tive o privilégio de dirigir um Diretorado do SHAPE/NATO, o “Operational Preparation Directorate” responsável pela certificação de todas as Nato Response Forces e pela Certificação de todos os Comandos da Estrutura da NATO.
O que faz acaba por ser uma ‘arte’ – a de planear e tomar decisões militares não pode ser fácil – que cada vez mais engloba vários fatores inesperados e pouco ‘matemáticos’, por assim dizer. Concorda?
MG: Concordo, sim senhora. Principalmente no nível operacional e estratégico-militar, o planeamento das campanhas militares ou operações de grande envergadura – muito embora se sirvam inclusivamente de modelos matemáticos de apoio à decisão, de que é exemplo a investigação operacional – dada a multiplicidade de fatores em jogo, as decisões são sempre responsabilidade dos Comandantes. E porque essa mesma decisão depende em muito da experiência anteriormente acumulada, da própria intuição e do maior ou menor peso que cada Comandante dá a um ou outro fator, a verdade é que estamos, de facto, mais perante uma arte do que propriamente de uma ciência.
A verdade é que estamos mais perante uma arte do que propriamente de uma ciência.
MG: Muito embora para a conceção dos planos e a respetiva condução, muitas sejam as ciências que para elas convergem no sentido de as tornar as decisões menos falíveis. A guerra continua a ser, como formulado pelo Major-General Karl von Clausewitz, no século XIX, na essência “a oposição de uma ou mais vontade inteligentes”, daí a incerteza, a “neblina da guerra”, ou “jogo de probabilidade e do acaso”. O que torna o planeamento e a conduta das campanhas ou operações de grande envergadura, por outro lado as guerras em si mesmas, como uma “continuação da política por outros meios” e um “ato violento que visa submeter o adversário à nossa vontade”, mais numa forma de arte do que propriamente numa ciência exata. Há sempre elementos aleatórios. Como bem dizem os norte-americanos, wars are always on the edge of chaos.
Foi convidado para ser ensinar em estabelecimentos por onde passaram grandes militares. Por onde passou? Exerceu esta vertente de professor durante muito tempo?
MG: Sim, fui instrutor e/ou professor em praticamente todas as escolas militares que frequentei. Comecei com os muitos anos em que fui professor do antigo e notável Instituto de Altos Estudos Militares – hoje Instituto Universitário Militar – no qual cheguei a desempenhar, como Oficial General, as funções de Subdiretor. Na Escola de Comando e Estado Maior das Forças Armadas Alemãs aonde estudei durante dois anos, fui também convidado para ficar lá como professor. Escolhi voltar à base, no entanto.
Sei também que recebeu várias condecorações, distinções e prémios. Quais considera mais gratificantes, e por quem essas lhe foram atribuídos?
MG: Ao longo da minha carreira militar tive a honra de receber, de facto, algumas distinções. Recebi 21 condecorações e 20 louvores Públicos. Para lhe responder, dando os exemplos para mim mais gratificantes, destacaria apenas o facto de ser Grande Oficial da Ordem de Aviz, uma distinção conferida por sua Excelência o Presidente da República Portuguesa, o de ter sido feito Oficial da Legião de Mérito dos EUA, e o de ter sido agraciado como prémio Karl von Clausewitz em virtude do meu desempenho como aluno no Curso de Comando e Estado Maior das Forças Armadas Alemãs (que frequentei entre setembro de 1994 e outubro de 1996 em Hamburgo na Führungsakademie der Bundeswehr).
O Major-General Isidro de Morais Pereira é Grande Oficial da Ordem de Aviz, uma distinção conferida pelo Presidente da República Portuguesa.
Para se chegar a General é necessário, também, ‘rodar’ por vários postos e experiências, e frequentar um curso para tal.
MG: Sim, é preciso cumprir um conjunto exigente de requisitos, espelhados em lei no Estatuto dos Militares das Forças Armadas, há que frequentar com sucesso vários cursos obrigatórios ao longo de uma carreira militar: o Curso de Promoção a Capitão, os Cursos de Promoção a Oficial Superior e o de Promoção a Oficial General. São cursos bastante exigentes. Para além destes cursos referidos é vantajoso estar habilitado com o Curso de Estado Maior. Um curso que não sendo obrigatório, acaba por se revelar muito útil pela forma como prepara os Oficiais Superiores para o desempenho das mais exigentes funções quer a nível nacional quer, cada vez mais, a nível internacional.
Para se chegar a General “é necessário cumprir um conjunto exigente de requisitos estatutários, espelhados em lei no Estatuto dos Militares das Forças Armadas”
MG: No meu caso frequentei dois Cursos de Estado Maior, o português e o alemão. Para além da formação é imprescindível revelar, de forma clara, uma aptidão para comandar, dirigir e chefiar com sucesso aos mais diversos níveis. E, por fim, quando se é avaliado entre os pares no posto de Coronel e analisada a carreira como um todo, há que destacar-se de forma claramente positiva para que, pelos Generais, seja reconhecido aos candidatos o potencial necessário para estar à altura de desempenhar funções da mais elevada responsabilidade, na estrutura de topo das Forças Armadas. É um filtro muito apertado. Quanto mais se sobe na cadeia de comando, maior o peso da responsabilidade que se carrega. Em cenários de guerra – que tão infelizmente acontecem – vidas de civis e de militares dependem de quem comanda. Comandar é fundamental e não é fácil… daí o grau de exigência requerido.
Que missões cumpriu ao serviço de Portugal? Não se ficou apenas por Portugal, entre o Continente e os Açores. Também representou o nosso país para além das nossas fronteiras. Quer elencar as que considera terem sido as mais importantes?
MG: Cumpri várias missões no estrangeiro. Destacaria apenas as seguintes: desde logo comandei o Contingente Português na Bósnia-Herzegovina, de janeiro a agosto de 2002, na qualidade de Comandante da Reserva Operacional Terrestre da SFOR/NATO. Desempenhei as funções diplomáticas de Adido de Defesa Militar, Naval e Aeronáutico, nos EUA (residente) e no Canadá (não residente), em ambos os casos entre agosto de 2003 e outubro de 2006. Como Oficial General fui Diretor do Operational Preparation Directorate do SHAPE/NATO de julho de 2009 a agosto de 2010. E entre agosto de 2014 e outubro de 2015, desta feita numa posição diplomático-militar, fui Representante Militar de Portugal junto do Comando Supremo das Forças Aliadas na Europa (SHAPE) em Mons, na Bélgica, não muito longe de Bruxelas.
Foi aí que criou as suas várias relações com figuras internacionalmente reconhecidas? Pessoas essas de alta categoria, tanto a nível militar como pessoal.
MG: Foi, sim. Tive a honra e oportunidade de privar e lidar de perto com personalidades internacionalmente reconhecidas. Darei como exemplo apenas algumas. Desde logo o Chanceler Alemão Helmut Kohl, o então Brigadeiro General David Petraeus, na altura chefe de Estado Maior da SFOR na Bósnia-Herzegóvina, com quem privei durante seis longos meses em operações; o General Petraeus, um dos Generais mais respeitados do século XXI, foi mais tarde Comandante 101ª Divisão aerotransportada dos EUA, General de 4 estrelas e Diretor da CIA. Conheci também de perto o General Keith Alexander, Oficial de Informações do Exército Americano e mais tarde Diretor da NSA (National Securuty Agency). Tal como privei, com o Honourable Donald Rumsfeld, na altura Secretário da Defesa os EUA, a Secretary of State Condolezza Rice, e o próprio Presidente dos EUA George W. Bush. Tive igualmente a rara oportunidade de conhecer e privar de muito perto com o atual Secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, na altura Major General Comandante da 10th Mount Division. Naturalmente que cabe aqui também uma referência ao General SACEUR (Supreme Allied Commander Europe) Philip Breedlove com quem privei e com quem trabalhei durante os 13 meses em Mons, na Bélgica.
Tem também uma sensibilidade artística que poucos conhecem…. Pode contar-nos um pouco mais dessa sua vertente?
MG: Essa é uma faceta da minha personalidade conhecida por poucos e espanta-me e agrada-me que saiba. Penso ter herdado do meu querido pai este jeito, passe a imodéstia. Para além de gostar imenso de ler, gosto de desenhar, pintar e esculpir. Participei em exposições ainda como aluno do ensino secundário, em Vila Real, e mais tarde nos EUA, em Washington D.C. Ainda muito jovem, tive a surpresa de ser premiado num concurso evocativo dos feitos do herói nacional Carvalho Araújo, em virtude de um desenho que produzi. Todos aqueles que de mais perto lidam comigo sabem o quanto aprecio a arte e o gosto que tenho por tudo o que lhe esteja associado. Arte é uma coisa que nunca deixará de me fascinar. E família e amigos.
Gosto de desenhar, pintar e esculpir. Já participei em exposições ainda como aluno do secundário, em Vila Real, e mais tarde nos EUA, em Washington D.C.
Desde o início da invasão da Ucrânia pela Rússia, a 24 de fevereiro de 2022, que é convidado regularmente a dar o seu parecer sobre a guerra sobre a qual nos debruçamos atualmente. Como comentador oficial da CNN Portugal – com participações frequentes na, TVI, SIC Notícias, na Rádio Observador, na TSF, na Rádio Renascença e no Porto Canal – tem-se tornado, também, numa figura pública e é hoje reconhecido por muitos portugueses. Como tem lidado com esta nova fase da sua vida, em que se destaca pela clareza e destreza com que fala sobre algo tão marcante no século XXI?
MG: Tenho lidado exatamente da mesma forma com que lidei durante cerca de 44 anos em que servi ativamente Portugal servindo o Exército Português, no nosso país e fora dele. Sempre dando o melhor de mim pela causa pública e em prol de Portugal e dos portugueses.
Sempre dando o melhor de mim pela causa pública e em prol de Portugal e dos portugueses.
MG: Hoje, diariamente, como comentador da guerra na Ucrânia e respetivas envolventes políticas e estratégicas sinto a mesma motivação e a mesmo sentido de utilidade, a mesma vontade de continuar a servir os portugueses informando-os com isenção, com dedicação e entusiasmo. De todos os que me abordam na rua, sem exceção, tenho recebidos inúmeros sinais de simpatia, de incentivo e de reconhecimento, facto que me impele a fazer mais e melhor. Daqueles que no anonimato das redes sociais por vezes criticam as minhas posições de forma gratuita, com palavras menos próprias, até insultos, apenas diria que não pretendo agradar a todos, nem tão pouco é isso que me move. O que me move é a minha firme vontade de analisar factos de forma isenta, e de discorrer sobre os mesmos utilizando o sentido de julgamento próprio de quem acumulou algumas experiências e alguns saberes nestes domínios, ao longo de mais de quatro décadas.
O que me move é a minha firme vontade de analisar factos de forma isenta, de discorrer sobre os mesmos utilizando o sentido de julgamento próprio de quem acumulou algumas experiências e alguns saberes nestes domínios, ao longo de mais e quatro décadas.
MG: Gostaria de dizer ainda que considero imprescindível sabermos sempre ser justos e estar do que considero ser o lado certo da História. A liberdade, a democracia, a tolerância, o direito à autodeterminação dos povos, bem como o respeito pelo Direito Internacional baseado em regras são conquistas da Humanidade das quais não podemos nem devemos abrir mão, mesmo que para isso tenhamos de sacrificar outras coisas.
Considero imprescindível sabermos sempre ser justos e estar do que considero ser o lado certo da História.
E quais julga serem as principais ameaças à segurança internacional na atualidade? Fala regularmente na importância da cooperação entre nações para garantir a segurança internacional – o que também é óbvio por ter sido representante nacional no SHAPE da NATO.
MG: A principal ameaça que impende sobre a nossa forma de vida são as tentativas de potências revisionistas, como é o caso da Federação Russa e da China, para só nomear algumas entidades óbvias. Potências que querem à viva força alterar a ordem internacional vigente, liberal, democrática e baseada em regras, tentando impor uma nova anarquia internacional em que imperaria novamente o direito da força sobre a força do direito. Explicitamente a criação de novas esferas de influência, o poder dos fortes sobre os fracos e o direito da força como forma privilegiada de resolução de conflitos. O que é absolutamente inaceitável neste século XXI, em parte por causa das armas de destruição em massa. Nunca é boa ideia brincar com o fogo, sobretudo agora.
De volta ao ser uma figura pública, sem me esquecer dos exemplos que deu. Esta não é a primeira vez que é comentador sobre uma guerra. Aliás, foi uma decisão política a de dar palco a militares para serem estes a debater sobre assuntos que tanto precisam de experts na área. O que distingue a atual guerra da Rússia contra a Ucrânia das que anteriormente comentou?
MG: Em 2003, aquando da invasão do Iraque por forças a coligação lideradas pelos EUA com a finalidade de depor o regime de Saddam Hussein, era eu professor do Instituto de Altos Estudos Militares, na área do planeamento operacional, tendo sido destacado pelo Ministro da Defesa Nacional para comentar, nas televisões portuguesas e outros órgãos de comunicação social, esse mesmo conflito. Foi, como sabemos, uma guerra muito mais limitada quanto à sua duração e os meus comentários eram feitos de forma mais institucional. Tive sempre de me trajar em uniforme militar e de representar sempre, de alguma forma, a posição militar oficial portuguesa. Contávamos com uma célula de acompanhamento especialmente criada para o efeito, partindo desta célula muita da informação que por mim e outros comentadores era veiculada nos órgãos de comunicação social. Agora a situação é completamente diferente. Não existe célula de acompanhamento, o estudo e análise da informação é feita por mim próprio, e são por isso muitas as horas que diariamente dedico a este estudo. Mas nem tudo são desvantagens, desta feita só me represento a mim próprio e tenho a inteira liberdade, enquanto cidadão, Major General do Exército na situação de Reserva, de dizer exatamente aquilo que a minha consciência me dita. É muito bom poder comentar sem qualquer tipo de amarras intelectuais.
É muito bom poder comentar sem qualquer tipo de amarras intelectuais.
Está, agora, a esforçar-se para completar o seu doutoramento. Tem um óbvio interesse em estar constantemente a aprender, coisa que rapidamente se nota ao falar consigo. Tendo já uma carreira de louvar, o que empurrou a esta decisão académica?
MG: Bom, parece que não poderia terminar esta pequena entrevista sem confessar outro grande amor da minha vida para além do gosto especial pela arte que antes referi. Este ainda é um amor maior, quase uma obsessão que me acompanha desde que me conheço. Tenho-o, desde criança: uma curiosidade sem limites e uma verdadeira paixão pelo saber e pelo conhecimento.
Este ainda é um amor maior, quase uma obsessão que me acompanha desde que me conheço, desde criança: uma curiosidade sem limites e uma verdadeira paixão pelo saber e pelo conhecimento…
MG: Nunca é tarde para cultivar o espírito. E de a isso me entregar. Decidi no verão passado iniciar um ciclo de estudos conducentes ao meu doutoramento numa área pela qual nutro um gosto muito especial, as Relações Internacionais. Espero levar esta nova empresa a bom porto num período desejavelmente curto. Para não falar do que me marca mais: a minha família e os meus amigos. Sinto-me, por tudo isto, muito feliz, apesar desta guerra terrível infligida pela Rússia e depois do horror que foi a COVID-19. A perfect storm… Apesar de tudo, mantenho uma fé inabalável: a de que tudo vai acabar bem!