Tudo começou em 2013, quando Maria Guedes decidiu reunir 20 marcas nacionais num pequeno mercado em Colares. Agora, dez anos mais tarde, o Market Stylista é considerado um dos maiores eventos nacionais de divulgação de marcas portuguesas, contando com mais de 20 mil visitas num só fim-de-semana.
Com curadoria de Maria Guedes, o evento reúne mais de 120 marcas nacionais (e restaurantes também) na FIARTIL, no Estoril. A plataforma de compras ao ar livre acontece quatro vezes por ano e conta com a presença de marcas emergentes e de outras já estabelecidas.
A FORBES esteve à conversa com Maria Guedes, que nos conta como tudo começou há 20 anos atrás. Um caso peculiar de enorme sucesso em Portugal, Maria Guedes falou-nos sobre o seu percurso profissional e história de vida.
O Market Stylista abre portas dia 27 e 28 de Maio, na FIARTIL, no Estoril, das 10h às 19h.
Maria, este projeto acaba por ser um subproduto do teu conhecido blog, o Blog Stylista, e tem hoje uma grande dimensão, especialmente quando comparado ao teu primeiro evento de 2013, em Colares. Mas como é que tudo começou?
Maria Guedes (MG): Tudo começou, na verdade, há 20 anos atrás. Sou formada em Marketing e Publicidade, e tirei o meu curso no IADE, em Lisboa. Trabalhei em algumas agências de publicidade, em branding. Eu criava marcas, na criação de identidades. E eu adorava o que fazia, mas o que queria fazer era mesmo Moda; desde miúda.
Sou formada em Marketing e Publicidade, e tirei o meu curso no IADE, em Lisboa. Mas o que queria fazer era mesmo Moda; desde miúda.
Era um sonho que não conseguias largar?
MG: Sim. Desde muito pequena que vibrava com a ideia de fazer roupa. Lembro-me de passar horas a desenhar, a pintar as paredes de casa (risos). Sempre fui muito criativa.
Mas não seguiste Design de Moda na universidade. Foi só quando te aventuraste em Nova Iorque que agarraste neste teu sonho e o tornaste numa realidade.
MG: Sim, eu quando terminei o liceu, o panorama de Moda na altura também era pouco rentável e acabei por não estudar Design de Moda. Acabei por escolher o curso de Marketing, apesar de sentir que estava a desistir um pouco do meu sonho. Foi já depois de trabalhar em Marketing que me inscrevi no curso da Parsons, em Nova Iorque, que era possível de completar em dois anos. Uma espécie de Fast Track para quem já tinha um curso superior.
Foi aí que encontrei um curso na Parsons, em Nova Iorque, que dava para completar em dois anos.
Um curso intenso, portanto.
MG: Exatamente. Acaba por ser um curso de Moda intensivo, que se debruça sobre várias áreas diferentes – desde costura e têxtil a marketing e pricing. Tinha muitas disciplinas e senti que era um curso muito completo. Foi uma experiência espetacular – cheguei a estagiar com o Zac Posen e tive oportunidades interessantes que me deram novas perspetivas. No fim desses dois anos intensivos, o plano era continuar nos Estados Unidos, mas o meu processo para ter um visto perdeu-se. Falei com os meus pais e decidimos que o melhor era passar o Verão desse ano em Portugal, até estar tudo resolvido.
Foi uma experiência espetacular – cheguei a estagiar com o Zac Posen e tive oportunidades interessantes que me deram novas perspetivas.
Mas esse Verão acabou por se ver prolongado e já não quiseste voltar a Nova Iorque.
MG: Sim, depois desse Verão em Portugal, pus em causa voltar para os Estados Unidos. Tinha os meus pais cá, assim como toda a minha família e a minha irmã, os meus amigos, etc. E também a nossa cultura. Em Nova Iorque sentia que alguns amigos ‘iam e vinham’ e a nível cultural, por mais próximos que fôssemos, faltava-me sempre aquele reconforto de experiências de infância partilhadas.
Em Nova Iorque sentia que alguns amigos ‘iam e vinham’ e a nível cultural, por mais próximos que fôssemos, faltava-me sempre aquele reconforto de experiências de infância partilhadas.
MG: Confesso que fiquei sem saber o que fazer. Enviei alguns currículos para sítios diferentes, em Portugal, mas não tinha muitos contatos em Moda. Conhecia uma costureira e comecei a desenhar vestidos para convidadas de casamento e vestidos de noiva. Foi um negócio que durou cerca de sete anos – o último vestido de noiva que desenhei foi o meu.
E como surgiu a tua ideia de escrever um livro, o “Tanta Roupa e Nada para Vestir”, com ilustrações feitas por ti?
MG: Quando comecei a desenhar roupa para casamento as pessoas pediam-me conselhos – de maquilhagem, sobre o que usar como acessórios. Juntei tudo num livro, que enviei para várias editoras. Fiquei surpreendida quando grandes grupos de publicação demonstraram interesse no meu trabalho e quiseram apostar – e publicar – aquilo que eu tinha escrito. Pude optar. Acabei por escolher trabalhar com a Porto Editora. Quis escrever um livro que fosse versátil: um que tanto dava para ler naquela altura, como agora. Ainda hoje continuo a vender o livro, o que é curioso.
Quase que em paralelo, em 2009, e por ‘um empurrão’ do teu pai, começaste o teu blog: o Blog Stylista.
MG: Sim. O meu pai sempre foi um homem muito moderno e aconselhou-me a criar um blog. Aliás, foi ele que me ensinou a fazer um (risos). Tudo isto numa altura em que estavam apenas a começar a aparecer outros blogues do mesmo género, criados por norte-americanas e espanholas. Coincidiu, também, com o aparecimento de mais lojas fast fashion, em Portugal, e com um interesse maior e mais generalizado em Moda.
O lançamento do blogue Stylista coincidiu com o aparecimento de mais lojas fast fashion, em Portugal, e com um interesse maior e mais generalizado em Moda.
E como é que o blogue cresceu tanto?
MG: É curioso porque até começou por ser um projeto sem contrapartida – não havia ali negócio nenhum. Eu ia vestindo as coisas de que gostava e mostrava-as aos meus leitores. As marcas podiam falar comigo e perguntar-me se eu gostava das suas peças e, se sim, eu própria vestia-as por serem marcas com que me identificava. Era tudo muito orgânico. Até que a certa altura fui a um mercado, em Colares, de uma amiga de infância que já não via há muitos anos, a Mafalda.
E é curioso porque até começou por ser um projeto sem contrapartida – não havia ali negócio nenhum. Eu ia vestindo coisas de que gostava e mostrava-as aos meus leitores.
MG: Lembro-me que era fim-de-semana e eu e o Miguel, o meu marido, fomos até Sintra ver o tal mercado, numa quinta. Acabou por ser um programa engraçado, numa altura em que não havia assim tanta oferta de coisas para se fazer ao fim-de-semana. Isto foi há dez anos. Gostei do conceito, falei com a Mafalda e sugeri trazer-lhe 20 marcas portuguesas, e também convidar os leitores do meu blogue.
Ou seja, uma coisa improvisada, pensada no momento, quase.
MG: Sim! Eu anunciei esse ‘primeiro mercado’ no meu blogue, mas apenas num post ou dois, com um cartaz que fiz sozinha. Uma coisa muito improvisada. Foi uma boa surpresa, apareceu imensa gente. As marcas que vieram comigo acabaram por vender muito e foi todo um evento muito divertido. Conheci leitoras do blog que vieram, de propósito, do Algarve ou de Braga, para irem ao mercado. Percebi que conseguia fazer eventos que atraíssem pessoas de todo o lado. Nesse ano, em 2013, ainda tivemos um mercado de Natal, também em Colares.
Eu anunciei esse ‘primeiro mercado’ no meu blog, mas apenas num post ou dois, com um cartaz que fiz sozinha. Uma coisa muito improvisada. Foi uma boa surpresa, apareceu imensa gente.
Mas o espaço começou a ficar pequeno para a procura que existia?
MG: Sim, e com o interesse que tínhamos tido percebemos que precisávamos de um sítio maior. No ano a seguir, fui falar com a Câmara de Cascais e perguntei sobre o espaço da FIARTIL. Estava fechado praticamente o ano inteiro e era lá que eu queria estar. Fartei-me de insistir até descobrir como fazer lá os meus mercados. E, em 2014, consegui. Na altura organizei os meus mercados de Verão e os de Inverno eram em Lisboa. Foi em 2019 que comecei a fazer ambas as estações no Estoril, na FIARTIL, onde ainda estamos hoje.
No ano a seguir, fui falar com a Câmara de Cascais e perguntei sobre o espaço da FIARTIL. Estava fechado praticamente o ano inteiro e era lá que eu queria estar. Fartei-me de insistir até descobrir como fazer lá os meus mercados. E, em 2014, consegui.
MG: Em 2020, com o início da pandemia, foi mais complicado. Tivemos de mudar de localização, e assim o fizemos, mas cumprimos com toda a regulação existente na altura e correu tudo bem. O mesmo se passou em 2021, e também então mantivemos os cuidados recomendados pela DGS e conseguimos avançar.
Mas agora existem quatro MARKET STYLISTA por ano. Um para cada estação: Primavera, Verão, Outono e Inverno.
MG: Sim, em 2021 tive o primeiro Market Stylista de Outono. E, em 2022, comecei a fazer o de Primavera. Percebi que havia público para todas as estações e que havia marcas para tudo e todos. As pessoas gostam de programas, gostam de compras, de passear. Saber que isto é um evento regular, no sítio onde é, tornou-se agradável também. Temos uma oferta que considero genuinamente interessante; não é um mercado tradicional. E é sempre engraçado notar que, há 15 anos atrás, não era tão cool usar marcas nacionais como agora o é. Cada vez mais gostamos de vestir as nossas marcas e ainda bem. O facto de ser ao ar livre é convidativo.
O Market Stylista tem agora cerca de 120 marcas e até restaurantes, certo?
MG: Sim. Entre as marcas presentes temos nomes como Anna Westerlund, Juliana Bezerra Jewellery, Latitid, Benedita Formosinho, Friuli, DCK, More is Better, Sienna, Tema, Zouri, Isto, Fairly Normal, Grace Baby & Child, Wolf & Rita, Maria Gorda, Mustique, Imago, MPL Beauty, IMMA, Oh Monday, SLOW, This Must Be The Place, Sanpi, Grau, Two Zero Brand, Knot, Antimilk, Colé, Santini, Sister’s Department, Cantê, Favorite People, Inusitado, 38 Graus, Pasta Non Basta, Sushi Corner, Quinta do Arneiro, Brigadeirando, The Therapist, Gleba, entre outros.
Acaba por ser uma experiência diferente de comprar numa loja tradicional.
Estás à frente de um projeto gigante em que ainda fazes a maior parte do trabalho behind the scenes, que é preciso.
MG: Ainda hoje faço praticamente tudo, sim. Sou eu que faço a contabilidade, falo com as Câmaras, lido com as burocracias, com as licenças, os seguros, a contratação de polícia, o staff, as hospedeiras, as fotografias, as produções, enfim, tudo! Antigamente fazia muito mais, mas desde 2016 que tenho uma produtora que é o meu braço direito. Ela é excelente no que faz e entendemo-nos lindamente. Ela gere as coisas no terreno, e eu fico-me mais pelos bastidores, onde me sinto mais confortável. Tenho também um fotógrafo como quem trabalho, e designers que hoje são minhas amigas.
Ainda hoje faço praticamente tudo, sim. Sou eu que faço a contabilidade, falo com as Câmaras, lido com as burocracias, as licenças, os seguros, a contratação de polícia, o staff, as hospedeiras, as fotografias, as produções, enfim, tudo!
MG: Ter arranjado pessoas para me ajudar – que são muito melhores que eu em várias destas áreas – foi ótimo. Com a idade também aprendi a relativizar as coisas e já não sinto a necessidade de fazer um milhão de coisas num dia. Gosto de levar tudo com calma e ter tempo, também, para estar com os meus filhos e de os ir buscar à escola, por exemplo. Mas também são quatro alturas do ano em que estou mais ocupada. Depois tenho a sorte de ter o meu Verão mais livre para estar disponível para eles. Em boa verdade, acaba por ser uma vida pouco equilibrada, mas sempre encontrei o meu próprio equilíbrio nesse desequilíbrio todo.
Em boa verdade, acaba por ser uma vida pouco equilibrada, mas sempre encontrei o meu próprio equilíbrio nesse desequilíbrio todo.
E hoje em dia, és tu que vais atrás de marcas, ou elas que vão atrás de ti?
MG: A maior parte são candidaturas que recebo. Vou vendo quais são as que me interessam, para manter uma curadoria minha. Se encontro uma marca que gosto, convido. Também podem ser sugestões de amigos. Marcas que conheçam e que acham que se enquadram com o Market Stylista. Claro que também existem marcas que eu adorava ter connosco no evento, mas que não passa pela estratégia deles vender em mercados ‘de rua’. Algumas marcas querem um posicionamento menos mainstream.
Com mais de 20 mil visitantes por fim-de-semana, o mercado é um lugar excelente para marcas se exporem cá fora. Têm muitos visitantes estrangeiros?
MG: Temos muitos visitantes estrangeiros, sim. Acho que o facto de termos um nome inglês é também atraente para um público que não só o nacional. É um nome autoexplicativo e é uma maneira de dar a conhecer a produção nacional àqueles que nos visitam. Seja porque vêm os nossos cartazes online, no Instagram, ou pelas ruas de Cascais, é muito óbvio o tema do Market Stylista. E em Cascais temos muitos turistas que passam pela FIARTIL.
Acho que o facto de termos um nome inglês é também atraente para um público que não só o nacional. É um nome autoexplicativo e é uma maneira de dar a conhecer a produção nacional àqueles que nos visitam.
MG: Além de possibilitar as vendas, que é o primeiro objetivo, o mercado também acaba por ser uma boa plataforma de divulgação das marcas e do seu trabalho. Há muitos jornalistas e pessoas da indústria que nos visitam para saber o que há de novo, para olhar para as peças e compreender a sua qualidade ao vivo. Sinto que estamos a fazer um bom trabalho e é sem dúvida para continuar.
Além de possibilitar as vendas, que é o primeiro objetivo, o mercado também acaba por ser uma boa plataforma de divulgação das marcas e do seu trabalho.
Dados importantes
Quem é: Maria Guedes
Onde está: Market Stylista, na FIARTIL: Av. Amaral, 2765-192 Estoril, Portugal
Datas: 27 e 28 de Maio 2023
Instagram: @stylista_mg
Website: www.mariaguedes.pt
Horários: Das 10h às 19h