Maria Duarte Bello, conceituada coach nacional nas questões de liderança e de marca pessoal, lançou recentemente o seu sexto livro, intitulado “Liderança no Feminino – Barreiras e Desafios”. Foi a propósito do trabalho realizado pela Forbes Portugal, as 55 Mulheres Mais Poderosas dos Negócios (capa da edição e agosto/setembro, já na banca), que fomos ouvir as opiniões da especialista sobre o tema.
Conheça a seguir alguns dos seus insights e conselhos que deixa às mulheres que querem seguir a vida do empreendedorismo:
Como avalia o empreendedorismo feminino em Portugal? Qual foi a evolução sentida
nos últimos anos?
O empreendedorismo feminino em Portugal tem ganhado destaque nos últimos anos, refletindo uma mudança significativa na participação das mulheres no mercado empresarial. A avaliação deste fenómeno pode ser feita a partir de vários indicadores, como a taxa de empreendedorismo feminino que indica a proporção de mulheres que iniciam e gerem os próprios negócios em relação ao total de empreendedores. Os últimos estudos fixavam em 30%. Outro indicador importante é o número de empresas fundadas por mulheres.
Nestes anos, houve um aumento notável no número de startups de PMEs criadas por empreendedoras, sinalizando um ambiente mais favorável e encorajador para as mulheres. A avaliação também inclui a análise da diversidade de setores em que as mulheres estão a empreendeder. As mulheres portuguesas têm-se destacado não apenas nos setores tradicionais como moda, beleza e alimentação, mas também em áreas tecnológicas, inovação e sustentabilidade. Como é óbvio a existência de programas de apoio, incentivos fiscais, financiamentos e redes de mentoring específicas para mulheres empreendedoras é fundamental para a avaliação do empreendedorismo feminino. É de notar que diversas universidades e instituições oferecem cursos e workshops voltados para o desenvolvimento de competências empresariais específicas para mulheres.
A criação de redes de networking exclusivas para mulheres empreendedoras tem ajudado a fortalecer a comunidade empresarial feminina. Estas redes proporcionam oportunidades de mentoring, parcerias e troca de experiências, essenciais para o crescimento dos negócios liderados por mulheres. Observa-se também a existência duma crescente sensibilização sobre a importância do empreendedorismo feminino para o desenvolvimento económico e social do país que por sua vez tem levado a uma mudança cultural, incentivando mais mulheres a tornarem-se empreendedoras.
Relativamente à liderança feminina no geral, e não apenas ao empreendedorismo, como vê a ascensão de cada vez mais mulheres aos cargos de topo nas organizações? É uma evolução notória, ou ainda se evoluiu pouco?
A liderança feminina tem-se tornado um tema cada vez mais relevante no mundo corporativo e em diversas esferas da sociedade. A ascensão de mulheres a cargos de liderança reflete mudanças importantes na dinâmica de poder e na promoção da igualdade de género. No entanto, esta evolução apresenta um panorama misto, com avanços significativos em alguns setores e desafios persistentes noutros. Relativamente aos progressos, há um crescimento notável na presença de mulheres em cargos de alta gestão e direção.
Empresas e instituições estão cada vez mais conscientes da importância de incluir mulheres em posições de decisão, reconhecendo os benefícios de uma liderança diversificada e mista para a inovação e o desempenho organizacional. Muitas organizações implementaram políticas de igualdade de género e programas de diversidade e inclusão, visando criar um ambiente de trabalho mais equitativo, promovendo oportunidades iguais para mulheres e homens ascenderem a cargos de liderança.
“A ausência de mulheres em posições de liderança cria um círculo vicioso: a falta de modelos de papel femininos em altos cargos pode desencorajar outras mulheres a aspirarem a essas posições”, refere Maria Duarte Bello.
Contudo e apesar dos avanços, a disparidade de género em cargos de liderança ainda é significativa. Muitas indústrias, especialmente aquelas tradicionalmente dominadas por homens, como a tecnologia e a engenharia, continuam a ter uma representação feminina muito baixa em posições de alta gestão. Além do mais, a dificuldade em equilibrar responsabilidades profissionais e familiares ainda é uma barreira significativa. As mulheres, muitas vezes, assumem a maior parte das responsabilidades familiares e domésticas, o que pode limitar a sua disponibilidade para assumir cargos de liderança que exigem maior dedicação de tempo. Por vezes, também se observa que faltam mentores e patrocinadores que são cruciais para fornecer orientação e oportunidades de crescimento.
Quais são as principais barreiras, desafios e dificuldades sentidas nesta temática?
Os preconceitos inconscientes e estereótipos de género são talvez as barreiras mais enganadoras que as mulheres enfrentam. Existe ainda uma perceção de que características associadas à liderança, como assertividade e autoconfiança, são predominantemente masculinas. As mulheres muitas vezes são vistas como menos aptas para posições de poder, e quando demonstram essas qualidades, são por vezes julgadas negativamente. Desde a educação até as oportunidades de emprego, as mulheres frequentemente têm menos acesso a recursos e oportunidades de desenvolvimento de carreira. Programas de mentoring, desenvolvimento e networking são muitas vezes menos acessíveis às mulheres, o que pode limitar as hipóteses de ascender a cargos de liderança.
O equilíbrio entre trabalho e vida pessoal é um desafio significativo para muitas mulheres. As responsabilidades familiares e domésticas ainda recaem desproporcionalmente sobre as mulheres, dificultando a dedicação total à carreira. Políticas de trabalho flexível e licenças parentais igualmente distribuídas ainda não são uma realidade em muitos lugares, exacerbando esse problema. Por sua vez, a cultura corporativa em muitas organizações continua a ser dominada por normas masculinas que podem alienar as mulheres como por exemplo, reuniões fora do horário de trabalho, networking em ambientes informais como clubes ou bares, e uma falta geral de políticas inclusivas são exemplos de práticas que podem excluir as mulheres.
“Existem diversas estratégias e ações que podem ser implementadas por governos, empresas, instituições e a sociedade em geral para apoiar e estimular a participação das mulheres em posições de liderança e no empreendedorismo”, diz Maria Duarte Bello.
A ausência de mulheres em posições de liderança cria um círculo vicioso: a falta de modelos de papel femininos em altos cargos pode desencorajar outras mulheres a aspirarem a essas posições. Infelizmente, a discriminação e o assédio ainda são realidades em muitos ambientes de trabalho. Mulheres em cargos de liderança podem enfrentar maior escrutínio e críticas, além de serem mais vulneráveis a comportamentos discriminatórios e assédio, o que pode desincentivar a permanência e progressão na carreira. De igual modo, a disparidade salarial entre homens e mulheres mesmo em posições equivalentes, que reflete a subvalorização do trabalho feminino, é uma barreira económica que afeta a motivação e a retenção das mulheres em cargos de liderança.
Como podemos incentivar cada vez mais um maior empreendedorismo e liderança femininos?
Existem diversas estratégias e ações que podem ser implementadas por governos, empresas, instituições e a sociedade em geral para apoiar e estimular a participação das mulheres em posições de liderança e no empreendedorismo. Algumas abordagens eficazes podem passar por implementar programas educacionais que promovam habilidades de liderança e empreendedorismo entre as mulheres desde cedo; fortalecer redes de mentoring onde mulheres líderes possam orientar e apoiar outras mulheres no seu percurso de empreendedor e de liderança; promover eventos de networking exclusivos para mulheres, onde possam compartilhar experiências, estabelecer conexões e encontrar oportunidades de colaboração; facilitar o acesso a financiamentos específicos para mulheres empreendedoras através de programas de microcrédito, fundos de investimento, subsídios e outros e porque não oferecer incentivos fiscais e benefícios para empresas fundadas ou lideradas por mulheres. E ainda, desenvolver políticas organizacionais que incentivem a inclusão de mulheres em todos os níveis hierárquicos, garantindo um ambiente de trabalho justo e equitativo.
“O caminho do empreendedorismo é cheio de altos e baixos. A resiliência é a capacidade de se recuperar rapidamente das dificuldades. Lembre-se de que cada fracasso é uma oportunidade de aprendizagem e crescimento. Persistência é a chave para superar os obstáculos”, aconselha a coach.
Outras estratégias passam por lançar campanhas de sensibilização que mostrem a importância da liderança feminina e do empreendedorismo para a sociedade; realizar formações regulares sobre igualdade de género e inclusão para todos os colaboradores, visando mudar atitudes e comportamentos; criar e manter ambientes de trabalho seguros e livres de discriminação e assédio, através de políticas rigorosas e mecanismos eficazes de denúncia e proteção; implementar políticas de trabalho flexível que permitam um melhor equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, facilitando a participação das mulheres no mercado de trabalho e garantir que licenças parentais sejam igualmente distribuídas entre homens e mulheres, promovendo a responsabilidade partilhada nas tarefas familiares. Podemos, pois, concluir que há muito por fazer.
Que dicas ou conselhos pode deixar às mulheres que desejem enveredar pelo empreendedorismo?
Em primeiro lugar, acredite em si mesma, pois a autoconfiança é a base de qualquer empreendimento de sucesso. Acredite nas suas habilidades, nas suas ideias e na sua capacidade de fazer a diferença. Confiança não significa ausência de medo, mas sim a coragem de seguir em frente apesar dele. Invista tempo em adquirir conhecimentos e habilidades relevantes para o seu negócio. Participe de cursos, workshops, seminários e webinars. A educação contínua não só aprimora as competências, mas também aumenta a sua credibilidade no mercado. Construa uma rede sólida de contatos que inclui mentores, colegas empreendedores, potenciais clientes e investidores. Participar de eventos e grupos de empreendedorismo pode abrir portas e proporcionar um apoio valioso. Ter um mentor pode fazer uma enorme diferença na sua trajetória empreendedora. Um mentor experiente pode oferecer conselhos, partilhar experiências e ajudar a evitar erros comuns. Procure alguém com experiência no seu setor ou com uma trajetória inspiradora.
Desenvolva um plano de negócios sólido, que deve incluir uma análise de mercado, estratégias de marketing, projeções financeiras e um plano operacional, essencial para atrair investidores.
Muitos países, incluindo Portugal, oferecem programas de apoio e incentivos para mulheres empreendedoras, por isso mantenha-se atenta e informe-se sobre os recursos disponíveis e aproveite-os ao máximo. Além disso, o mercado está em constante mudança, e a capacidade de inovar e de se adaptar é crucial. Esteja aberta a novas ideias, tecnologias e métodos de trabalho. A flexibilidade permite que responda rapidamente às mudanças do mercado mantendo a sua competitividade.
O caminho do empreendedorismo é cheio de altos e baixos. A resiliência é a capacidade de se recuperar rapidamente das dificuldades. Lembre-se de que cada fracasso é uma oportunidade de aprendizagem e crescimento. Persistência é a chave para superar os obstáculos. Neste percurso, o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal é fundamental para manter a saúde mental e física. Assim, estabeleça limites claros e encontre maneiras de relaxar e recarregar as energias. É do conhecimento geral que o empreendedorismo pode ser stressante e exaustivo. Priorize a saúde mental procurando apoio quando necessário, praticando mindfulness, meditação ou outras técnicas de gerir o stress. A saúde mental é essencial para a tomada de decisões eficazes e para o bem-estar geral.