A White Deer, sob a liderança de Maria Costa Maia, destaca-se como um farol de honestidade, transparência e inclusão no mundo da moda. Esta não é apenas uma marca, garante a empreendedora, é um movimento que empodera e celebra as mulheres, oferecendo-lhes não somente peças de vestuário, mas também experiências que tocam a alma. Maria descreve os desafios que enfrentou, desde a aprendizagem no mundo dos negócios até à formação de uma equipa comprometida, e como, com resiliência e paixão, superou cada obstáculo, transformando a White Deer numa marca de sucesso.
No site da White Deer diz ter tido “a sorte de crescer com a liberdade de ser o que quisesse”. Acrescenta que sempre foi livre para pensar da forma que quis e para escolher o seu caminho. “Livre para mudar de rumo”, afirma. É, efetivamente, uma pessoa com sorte?
Sim, sou uma privilegiada e faço questão de o mencionar imensas vezes nas minhas palestras. Sobretudo, sou privilegiada na família que tenho. Acho que esta sorte tem de ser aquilo que eu quiser. Vem muito daquilo que os meus pais me incutiram a vida toda. Sou enfermeira de formação, e há cinco anos e meio decidi largar as análises clínicas para abraçar o projeto da minha marca. Sempre gostei de me vestir bem, sempre gostei de vestir as minhas amigas. Sempre fui aquela rapariga com um armário cheio de roupas e que investia nisso. A moda sempre me fascinou, até porque acredito sinceramente que é uma forma de nos exprimirmos. Por isso, defendo a ideia de que na White Deer não vendemos roupa, vendemos emoções.
Acredita ser muito mais que uma marca de roupa?
Claramente. Acho que existem milhares de marcas, e nós temos mesmo de nos diferenciar de alguma forma. Os meus pais sempre me apoiaram muito. Venho de uma família onde há médicos, mas os meus pais nunca me obrigaram a seguir o mesmo caminho. Na altura, decidi ir para enfermagem porque sempre gostei muito de lidar diretamente com pessoas. Não me arrependo de ter seguido essa formação académica, apesar de no início os meus avós paternos não terem particularmente adorado a ideia. Mas o que interessava era o que os meus pais achavam. São grande influência na minha vida, sem dúvida alguma, tenho uma relação muito próxima com a minha família. Mesmo quando desisti de enfermagem para fundar a minha marca tive o apoio dos meus pais. Sempre foi muito natural em casa falarmos sobre trabalho, mesmo nos jantares. Tenho um enorme equilíbrio familiar, muito saudável. Por isso, sim, sinto que sou muito privilegiada porque tive quem me apoiasse, não financeiramente, mas psicologicamente. Além de que, estando eu a viver sozinha, sabia que, se tudo corresse mal, tinha um quarto em casa dos meus pais.
Essa influência positiva dos seus pais foi fundamental para dar o passo de abrir o negócio?
Sem qualquer dúvida. A minha mãe é empreendedora, já teve múltiplos negócios para além de ter sido professora de História. Mas uma das minhas grandes influências na área do empreendedorismo foi o meu avô, que infelizmente já não está cá, mas foi crucial em todo o meu percurso.
O que a inspirou a criar uma marca de roupa “de mulher para mulheres”?
Tem muito que ver com a minha marca pessoal. Sinto que falo muito para as mulheres, acho que é uma luta muito nossa a nível de empreendedorismo. E não estou a falar de feminismo, não iria tanto por aí. Gosto muito de roupa, nomeadamente feminina, nunca tive como objetivo que o projeto englobasse a vertente masculina. Mas a verdade é que sempre preferi falar mais para as mulheres, para o meu nicho, para aquilo que eu realmente me sinto confortável em fazer, tanto a nível da minha marca pessoal como a nível de marca de roupa também.
“Uma das minhas grandes influências na área do empreendedorismo foi o meu avô, foi crucial em todo o meu percurso”
Que valores é que a marca insiste em defender e, sobretudo, comunicar?
Honestidade, transparência e inclusão. Estes são os três principais que estamos constantemente a trabalhar. Porque sei que é muito difícil as marcas serem assim. Sinto que as marcas tentam contornar esta parte da honestidade, da transparência e da inclusão e, sem dúvida alguma, do empoderamento, que é aquilo que nós defendemos. Queremos que as pessoas vistam a nossa roupa num dia menos confortável e que se sintam mais confiantes. Não é simplesmente por serem peças bonitas, isso é um plus.
Não fala na qualidade dos produtos. Para si, é uma condição obrigatória?
Claramente! É inerente à marca, não tem sequer de ser referida, está embutida no produto. Vamos muito para além disso. Queremos proporcionar experiências aos clientes, receber a encomenda num papel de seda. Mesmo que a peça custe 10, 20 ou 30 euros, quero que o cliente tenha uma experiência premium, desde o perfume que pomos na peça de roupa ao autocolante… Esta experiência premium é o que está inerente à nossa marca e acredito ser o nos diferencia. Outro ponto que vos faz evidenciar é o apoio ao cliente.
Até que ponto a moda, a forma como a mulher se sente confortável, podem influenciar o seu dia a dia e o modo como lida com os desafios da sociedade?
Sinceramente? Tudo! Por exemplo, eu gosto de me sentir empoderada muito mais num momento como este, numa entrevista. Então, sentia que tinha de escolher um blazer, oversize, porque acho que é a peça que me define. Acho que é importante conhecermo-nos e sabermos como nos sentimos confortáveis. Estar com o cabelo apanhado, a mesma coisa. Muitas vezes, a roupa fala por nós, quer queiramos, quer não. A nossa imagem fala por nós, e a roupa está inerente à nossa imagem. Portanto, sem dúvida alguma que acho que é preciso termos bastante cuidado com isso.
Neste percurso, o que é que considera ter sido o maior ou os maiores desafios?
Não dominar qualquer tipo de conhecimento na área dos negócios, ter demorado demasiado tempo a contratar pessoas e não ter financiamento externo.
Financiou o projeto com capitais próprios?
Capitais próprios e uma conta caucionada, nada mais.
Falou da dificuldade em contratar pessoas. Não existiam profissionais no mercado?
A questão não foi bem essa… Pessoalmente, tive dificuldade em começar o processo. Durante dois anos e meio fiz quase tudo sozinha. Chegou a um ponto em que até podia estar a ganhar mais do que agora, mas era profundamente infeliz. Não conseguia desligar do trabalho, não delegava nada, fazia o apoio ao cliente, tratava com os fornecedores, embalava, tirava fotografias, geria. A partir do momento em que se ganha volume, é impossível.
“Em 2024, pretendemos começar a vender para outros mercados”
Hoje, mantém a aposta em influencers para potenciar a sua marca?
Trabalho com influencers desde o início. Trabalho com a Madalena [Abecasis], por exemplo, há três anos. Esta aposta foi intensificada na pandemia, as pessoas estavam em casa e queriam comprar roupa. Obviamente que a pandemia foi algo terrível, mas do ponto de vista puramente do negócio correu muito bem, e conseguimos escalar num ambiente adverso. A verdade é que a nossa marca deu um salto gigantesco. Aliás, foi nessa altura em que demos este enorme salto, que comecei a contratar pessoas. Atualmente, somos 11.
Hoje, como define o seu projeto?
No início, como estava tão empenhada na marca e era eu que fazia absolutamente tudo, não conseguia visionar o meu propósito: empoderar mulheres através da nossa roupa. Hoje, consigo. Quero potenciar toda uma comunidade, porque é isso que temos.
Em termos de mercado, quais os planos de crescimento, de expansão?
Em 2024, pretendemos começar a vender para outros mercados. Hoje, 99,5% da nossa faturação vem de Portugal, e temos realmente interesse em começar noutros mercados. Estamos a começar a trabalhar nisso internamente, nomeadamente no mercado europeu, como por exemplo, o francês.
Como constroem a vossa coleção?
De vez em quando lançamos coleções em que somos nós a fabricar e a desenhar, mas tipicamente, de dois em dois meses, mais ou menos, desloco-me a França e a Itália, onde escolho as nossas coleções. Ou seja, são peças executadas por revendedores essencialmente franceses e italianos.
Não sendo as peças executadas por vocês, é mais difícil o controlo da sustentabilidade do produto?
Claro, e sou 100% transparente. Somos extremamente sustentáveis nos processos que controlamos, mas há outros que nos escapam claramente. Não vale a pena estar a transmitir uma mensagem que não é real, opto sempre pela transparência na comunicação. Fazemos tudo o que está ao nosso alcance para sermos o mais amigáveis ambiental e sustentavelmente. É um compromisso que temos, com a certeza de que há ainda um imenso caminho pela frente.
O que é que podemos esperar da marca neste ano?
Sinceramente, no ano passado fizemos um trabalho gigantesco, foi o nosso melhor a nível de faturação, mas também a nível de empresa. Estamos mais bem organizados. Vamos fazer várias campanhas de grande dimensão, com vários propósitos. Não vão ser campanhas de roupa só porque sim, porque a roupa é bonita. Ponto final. Vamos ter campanhas com propósitos. Quero que a empresa esteja a faturar, daqui a cinco anos, pelo menos 3/4 milhões ao ano, com uma margem de lucro, potencialmente, entre os 16% e os 20%. É com isto, e muito mais, que podem contar.