Apesar da tecnologia estar a revolucionar a forma como as pessoas interagem com os seus ativos e investem o seu dinheiro, existe ainda uma barreira no acesso a estas oportunidades sobretudo para quem não é especialista. Foi da observação desta lacuna que nasceu a Lympid, a primeira plataforma portuguesa que converte euros em oportunidades de rendimento na blockchain, unindo a economia tradicional à revolução das finanças descentralizadas.
Após o lançamento de uma fase de teste, em março de 2023, a Lympid teve o seu lançamento ao público em junho de 2023. Meio ano depois, ouvimos as convicções e as expectativas dois dois fundadores, André Lages e João Lages.
Como é que surgiu a ideia de criar a Lympid? Qual foi a motivação por trás da criação desta fintech?
André Lages: Começámos por entrar neste espaço das finanças descentralizadas há uns anos com amigos nossos, porque nos interessámos pelo fenómeno das criptomoedas, que permeava na altura ainda de forma mais intensa as redes sociais como o antigo Twitter. Sentimos que estava ali o início de uma grande mudança de paradigma, e não estávamos errados. Isto, a juntar a um par de experiências de voluntariado em países do continente asiático onde reparámos que reinava a desigualdade na oportunidade a meios e produtos de investimento, e sobretudo de rentabilidade do dinheiro pessoal, foi parte do motor para a conceção de uma solução que pudesse procurar dar resposta de alguma forma a esta questão da acessibilidade. Mesmo em Portugal, uma nação mais desenvolvida e com menores índices de pobreza, é de conhecimento geral que estamos na cauda da União Europeia em termos de literacia financeira – e muito se tem falado sobre como dar a volta a isto, sobretudo num cenário altamente inflacionário e com menor poder de compra. A Lympid surge, a nosso ver, aqui como uma oportunidade para se começar a investir em produtos alternativos aos mais comuns, numa plataforma regulada e de confiança, onde todos os produtos lá colocados são cuidadosamente curados pela nossa equipa para proporcionar a melhor experiência de investimento ao utilizador, independente do seu nível de conforto e de conhecimento na área.
“A Lympid surge, a nosso ver, aqui como uma oportunidade para se começar a investir em produtos alternativos aos mais comuns, numa plataforma regulada e de confiança”
O João e o André Lages são os dois fundadores da Lympid. Que idade têm, que cargos ocupam cada um e qual foi o vosso caminho profissional até chegarem aqui?
João Lages: Acho que podemos começar por mim. Tenho 32 anos, sou natural de Esposende e formado em Direito e Finanças, com uma passagem de mais de 6 anos por uma instituição financeira multinacional enquanto analista sénior e auditor. Posterior a esta experiência, cofundei uma empresa de consultoria blockchain onde prestei apoio a meia dezena de projetos na área cripto ao nível europeu.
André Lages: Sou de Braga tenho 34 anos e advogado de formação, levando já mais de uma década em prática judicial e litigância, tendo já representado instituições financeiras e bancos comerciais. Já fiz também assessoria jurídica para uma mão cheia de projetos europeus em blockchain.
O que é que identificaram como uma lacuna no acesso às oportunidades financeiras para não especialistas?
João Lages: Precisamente essa questão: o acesso não era facilitado. Ouvia-se falar no mundo cripto, Web3 e blockchain, e parecia uma dimensão paralela à nossa – nós queremos ser a ponte, o Web 2.5, se assim quisermos dizer. Ligamos produtos de investimento descentralizados em protocolos na blockchain à pessoa mais comum que tenha acesso à internet no telemóvel.
Quem são os investidores e acionistas da Lympid?
André Lages: Contamos a 1inch e o programa acelerador da Chainlink enquanto alguns dos investidores na Lympid, algo que creio que nos valida tendo em conta a sua relevância no ecossistema mundial de cripto e Web3. Temos ainda o reconhecimento da Fintech House, iniciativa da Portugal Fintech em parceria com o SITIO, que dado o seu historial de apoio a algumas das maiores fintechs portuguesas, corrobora o potencial que vemos neste projeto.
Qual é a diferença entre a Lympid e a insolvente FTX?
João Lages: O principal diferenciador é o nível de transparência das nossas operações em relação à FTX. Analisando em maior detalhe, todas as operações dos nossos clientes ocorrem na blockchain e, apesar de à primeira vista poder parecer um tecnicismo, a realidade é que permite a qualquer pessoa com acesso a Internet ter uma espécie de auditoria em tempo real das contas de clientes da Lympid e ao movimento dos seus fundos.
Em plataformas como a FTX é impossível ver o fluxo de fundos salvo se for concedido acesso ao seu sistema interno, não oferecendo esta máxima transparência que tanto prezamos.
Nós decidimos aproveitar tudo o que a blockchain tem de bom e construir o nosso produto de forma mais transparente e aberta. Além disso, todos os fundos dos nossos clientes estão separados entre si e entre a empresa, o que significa que é impossível utilizarmos os fundos dos clientes sem a sua autorização.
“Decidimos aproveitar tudo o que a blockchain tem de bom e construir o nosso produto de forma mais transparente e aberta”.
Pode explicar o modelo de negócios da Lympid e porque é que afirmam que une a economia tradicional às finanças descentralizadas? É pelo facto de utilizarem a moeda estabilizada US Dollar Coins? Mas há mais plataformas que utilizam também…
André Lages: A equipa da Lympid faz uma curadoria cuidada dos produtos financeiros a que os nossos utilizadores têm acesso, para garantir a melhor experiência através da disponibilização de um leque variado e de confiança, ainda que sempre subordinado – como qualquer investimento – ao fator de risco. Navegar verdadeiramente o mundo das finanças descentralizadas envolve múltiplas fases e processos, desde a criação de carteiras, a compra de “gas”, a escolha de um produto de juros, à conversão de euros em criptomoedas – e não podemos pensar que os utilizadores da Web2 vão passar por todas estas etapas.
Na Lympid implementamos uma maneira melhor e mais fácil para que qualquer pessoa, independentemente do seu grau de conhecimento na área, possa aceder diretamente a finanças descentralizadas, permitindo o acesso a produtos de rendimento passivo que pagam juros muito acima do que os bancos tradicionais oferecem. Esta abordagem simplificada é conseguida através de um modelo de um utilizador, uma conta bancária, uma carteira – permitindo que os utilizadores invistam nestes produtos inovadores através de Euro. Em suma, o cliente pode então depositar e investir Euro nestes produtos sem ter que se preocupar com a parte tecnológica e com a segurança.
“[Na Lympid], os utilizadores investem nestes produtos inovadores através do Euro”
Quais são os produtos específicos oferecidos aos utilizadores da Lympid?
João Lages: Neste momento oferecemos dívida dos EUA tokenizada que está a gerar 5% ao ano. No fundo, os clientes podem depositar euros na Lympid e investir os seus fundos em dívida dos EUA, sendo que todas estas operações ocorrem na blockchain. Temos também a opção de comprar e vender criptomoedas e de ganhar juros em algumas delas. Em breve vamos listar mais produtos de rendimento passivo como, por exemplo, empréstimos peer-to-peer e dívida de estados europeus tokenizada.
“Neste momento oferecemos dívida dos EUA tokenizada que está a gerar 5% ao ano”
A pessoa deposita euros na compra de criptomoedas (US Dollar Coins), as quais são usadas para a aquisição de dívida dos EUA. É este o percurso ou não é nada disto? Consegue exemplificar, de forma concreta? Em que moeda é que a pessoa recebe os seus juros? Em US Dollar Coins? Em euros? É possível reverter as US Dollar Coins para euros ou isso nunca será possível, já que a lógica é que a pessoa se mantenha no universo cripto?
André Lages: É exatamente isso. Começa-se por transferir os seus euros para carteira na plataforma Lympid e convertê-los diretamente em USD Coins. Aí, pendendo um mínimo de 25 USDC, pode-se investir em T-Bills (ou obrigações do Tesouro americano) tokenizadas, um dos produtos com menos risco a nível mundial. O utilizador receberá os juros em USDC e pode sempre fazer a reconversão para euros a qualquer momento da sua jornada dentro da plataforma da Lympid.
Que taxas de rentabilidade garantem?
João Lages: As taxas de rentabilidade variam de produto para produto, mas por exemplo na questão das T-Bills americanas neste momento os juros estão nos 5%, superior a qualquer certificado de aforro.
Onde é que os utilizadores podem reinvestir os seus ganhos?
João Lages: Em qualquer produto que esteja disponível dentro da nossa plataforma. Bastará converter os tokens ou euros para ir de acordo com o que o produto requer.
Apenas investem na dívida dos EUA? Se sim, qual o motivo? Se não, que outras formas de rendimento alternativas disponibilizam?
André Lages: Além da dívida dos EUA tokenizada, temos também um produto que permite ganhar juros em criptomoedas como em Ethereum e BNB. Em breve vamos listar dívida de estados europeus tokenizada onde vai ser possível gerar rendimento em euros tokenizados cujo valor está indexado ao Euro.
De que forma é que a tecnologia blockchain é incorporada nas transações da Lympid? Como é que a Lympid assegura que os utilizadores tenham total controlo e transparência sobre os seus fundos e investimentos?
João Lages: A blockchain é a base de toda a nossa operação, visto oferecermos oportunidades de investimento em DeFi (abreviatura em inglês para finanças descentralizadas). Pelo seu cariz característico – sendo uma tecnologia imutável que protege criptograficamente os registos nela feitos – asseguramos desta forma a segurança nas transações, bem como controlo e transparência para com o utilizador. Com esta tecnologia conseguimos garantir um nível de transparência das nossas operações nunca antes visto no mundo das finanças.
“Com a tecnologia da blockchain conseguimos garantir um nível de transparência das nossas operações nunca antes visto no mundo das finanças”
Quais foram os principais desafios enfrentados desde o lançamento da Lympid?
André Lages: O primeiro desafio que tivemos em mãos e que, para nós, esteve como prioridade desde o momento em que fundámos o projeto, foi sem dúvida estabelecer o nosso modelo de negócio sobre uma estrutura regulada e acreditada. É algo que sentimos que faz falta que se saiba no que toca ao mundo ligado às criptomoedas e investimentos através de plataformas digitais no geral, que este tipo de projetos existem realmente a querer melhorar as opções financeiras das pessoas de forma simples, transparente e regulada. A nossa operação conta com parceiros licenciados e devidamente regulados na Estónia e na Alemanha, estamos devidamente capacitados para operar com euros e contas vIBAN, bem como as autorizações e registos necessários para custódia e troca de criptoativos – a regulação clara que já vigora no Espaço Económico Europeu e que decorre principalmente de normas de combate ao branqueamento de capitais e financiamento de terrorismo.
Quantos utilizadores têm a nível global e desses quantos são portugueses?
João Lages: Já cumprimos o nosso objetivo para 2023, ou seja, estamos, neste momento, com 5500 utilizadores registados ou em processo de conclusão de registo. O nosso mercado em Portugal é expressivo e em crescimento, com mais de 50%.
“O nosso mercado em Portugal é expressivo e em crescimento, com mais de 50%”
Como planeiam atingir a meta de utilizadores que delinearam? Qual é a expectativa para o encerramento de 2023 em termos de operações processadas e volume de negócios?
João Lages: Continuamos com uma aposta forte na presença digital, sobretudo através de canais onde sabemos estar boa parte do público que nos interessa alcançar, como seja o Telegram, o X ou mesmo o Reddit; temos também o nosso canal de LinkedIn bastante ativo porque acreditamos no seu poder enquanto rede social para gerar awareness para o nosso projeto. Estamos no bom caminho para corresponder às expectativas a que nos propusemos de mais de 20 mil operações processadas, e cerca de 10 milhões de euros de volume total de transações na plataforma.
A Lympid é composta atualmente por quantas pessoas? Preveem contratar em 2024? Se sim quantas pessoas e para que tipo de funções? Ou isso não está previsto?
André Lages: Neste momento, a nossa equipa nuclear é composta por dez pessoas. Para além de mim e do João, temos ainda o João Gonçalves, engenheiro de software com histórico de relevo em fintech e inovações blockchain, com mais de uma década em sistemas financeiros e que lidera o nosso desenvolvimento técnico. Temos parte da equipa a trabalhar no produto, nas áreas de backend, frontend, design, devops, e também na área de marketing.
Para 2024, em termos de recrutamento, o nosso objetivo será contratar para incorporar cerca de 10 pessoas. O foco em termos de funções recairá sobre desenvolvimento tecnológico e marketing, que são pilares que vemos serem prioritários para o nosso crescimento sustentável enquanto startup.
Quais são as vossas metas para 2024?
João Lages: O objetivo principal no nosso horizonte é o breakeven. É ambicioso, estamos cientes disso, mas os desenvolvimentos que temos registado permitem-nos acreditar que é uma meta exequível. O mais importante, ainda assim, é mantermos o foco na melhoria da nossa plataforma para continuarmos a crescer a nossa comunidade e a oferecer os melhores produtos, centrados numa experiência intuitiva e de fácil acesso.