Opinião

Longe dos centros, perto do futuro financeiro

João Guerra

Num país onde mais de 40% das freguesias já não têm qualquer ATM e onde dois terços dos concelhos contam com menos de 10 agências bancárias, segundo dados do Banco de Portugal, torna-se urgente repensar o modelo de acesso a serviços financeiros essenciais. Esta realidade representa um obstáculo real à igualdade de oportunidades para milhares de portugueses que vivem fora dos grandes centros urbanos.

Quando falamos da exclusão financeira no interior do país – e, cada vez mais, também em zonas periurbanas –, devemos também debater a participação plena na economia e na sociedade. Falamos de comunidades onde abrir uma conta, levantar dinheiro ou simplesmente pagar uma fatura pode significar uma deslocação de dezenas de quilómetros – desigualdade de acesso que afeta sobretudo os mais vulneráveis: idosos, pessoas com baixa literacia digital ou famílias com rendimentos mais limitados.

Nos últimos 20 anos, o número de agências bancárias em Portugal caiu para menos de metade. Este fenómeno, embora compreensível no contexto da transformação digital, teve um impacto profundo na relação das pessoas com o sistema financeiro, sobretudo nas regiões onde o digital não é uma realidade acessível ou desejável. Quando os serviços desaparecem fisicamente, desaparece também parte da autonomia, da ligação económica e até da confiança nas instituições.

Mas esta tendência pode e deve ser contrariada. A resposta passa por promover soluções de proximidade que conciliem o melhor do mundo digital com a presença física. Aliás, a inovação financeira não deve ser exclusiva das cidades. Quando levamos serviços essenciais para dentro das comunidades – seja através de pontos de atendimento mais acessíveis, parcerias locais ou modelos híbridos entre físico e digital –, estamos a criar valor económico. Estamos a fomentar o comércio local e, em última instância, a devolver praticidade e dignidade ao dia a dia das pessoas.

Esta acaba por ser uma estratégia inteligente para o crescimento inclusivo do país. Uma comunidade com acesso a serviços bancários é uma comunidade com mais capacidade de empreender, de poupar, de investir no seu futuro. É também uma comunidade mais resiliente e preparada para responder aos desafios e oportunidades que a digitalização pode trazer.

No fundo, o desenvolvimento de soluções que respeitem a realidade local, que apostem em relações de confiança e que sejam construídas de forma simples e próxima, em parceria com os agentes económicos locais, é o caminho. A inclusão financeira não se faz apenas com tecnologia – faz-se com presença, escuta e compromisso.

Portugal precisa destes modelos de proximidade, atentos às necessidades reais das suas comunidades. A cada freguesia onde se recupera um ponto de contacto, a cada comerciante local que se torna um agente de inclusão, a cada cliente que volta a sentir-se parte do sistema, damos mais um passo rumo a uma sociedade mais coesa e justa.

João Guerra,
CEO da Nickel Portugal

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