Os agentes de IA são tão transformadores como foi, no seu tempo, o aparecimento da internet. Vão mudar a forma como organizamos trabalho, gerimos operações e criamos valor.
Uma pergunta que ouço frequentemente é como se deve encarar a liderança nesta nova era. Eu utilizo os mesmos modelos mentais que uso para liderar os meus colaboradores mais independentes e com maior autonomia. Estes colaboradores avaliam situações, tomam decisões criteriosas e apresentam resultados com base na sua compreensão da intenção estratégica. Os agentes de IA operam de forma semelhante, mas à escala de máquina.
Como líderes, já sabemos como gerir operações complexas: definir objetivos claros, estabelecer limites e medir resultados. Mas com os agentes de IA, estamos a entrar em território novo. Ao contrário dos sistemas tradicionais que seguem instruções precisas, os agentes de IA são dinâmicos, adaptando a sua abordagem com base no contexto e aprendendo com cada interação. Temos de pensar nisto como se estivéssemos a aplicar princípios de liderança a um novo tipo de membro da equipa, um que combina tomada de decisão semelhante à humana com ações à escala de máquina. O nosso desafio é desenvolver modelos de governança, gestão de risco e operacionais que integrem esta diferença fundamental.
Um modelo mental útil é comparar a nossa relação com a IA à de um CEO com o seu conselho de administração. Não gerem as decisões diárias: alinham estratégia, definem métricas de sucesso e mantêm a supervisão. Os agentes de IA funcionam de forma semelhante, tomando decisões autónomas com base no contexto estratégico que fornecemos. Um conselho de administração bem-sucedido não funciona em microgestão em parceria com o CEO; define uma direção clara e oferece uma supervisão inteligente.
Para isso, temos de considerar a direção estratégica, definindo intenções e resultados esperados, não passos detalhados. Também temos de estabelecer limites claros para a tomada de decisão, o âmbito da autonomia dos agentes de IA, estabelecendo ao mesmo tempo protocolos para quando devem escalar decisões. Finalmente, as reuniões do conselho avaliam o desempenho geral, garantem alinhamento estratégico e ajustam a direção conforme necessário. A abordagem aos agentes de IA deve fazer o mesmo, com revisões regulares para avaliar a eficácia, refinar as estruturas de tomada de decisão e garantir o alinhamento com os objetivos estratégicos.
Outro modelo vem da gestão de risco. A gestão de risco tradicional opera como uma linha de produção: previsível e controlado, com regras claras. Já a gestão de risco da IA autonomizada opera como uma sala de mercados, onde os operadores (traders) têm autoridade em tempo real, que deteta para tomar decisões dentro de parâmetros definidos, enquanto a empresa mantém a supervisão. As salas de mercados modernas utilizam uma monitorização de risco sofisticada em tempo real que deteta padrões invulgares instantaneamente. Os agentes de IA requerem uma vigilância semelhante, mas com uma complexidade acrescida. Precisamos de detetar quando o seu comportamento se desvia dos parâmetros esperados e quando as suas ações cumulativas criam riscos emergentes.
Os circuit breakers de mercado — salvaguardas automáticas que param a negociação durante uma volatilidade extrema — são outro paralelo útil. Os sistemas de IA precisam de um mecanismo semelhante, mas mais subtis, capazes de parar as operações tanto por violações claras, mas também perante padrões anómalos que possam sinalizar riscos imprevistos. Os limites de posição também se aplicam bem à gestão de risco da IA. Os operadores não podem exceder certos limiares de risco sem aprovação; os agentes de IA precisam de restrições semelhantes, mas com limites adaptativos.
Esta nova forma de gerir o risco reflete uma mudança organizacional mais profunda. A maioria das organizações modernas opera como departamentos separados. As empresas habilitadas por IA vão funcionar mais como um sistema imunitário, com inteligência distribuída a operar por toda a organização, respondendo a desafios em qualquer parte do sistema e adaptando-se continuamente com base no que aprende.
Os agentes de IA transcendem as fronteiras organizacionais tradicionais e criam valor ao conectar o trabalho entre silos. O seu impacto estender-se-á muito para além das TI, quebrando barreiras em todas as funções de negócio, das finanças ao marketing, às operações e ao serviço ao cliente.
Esta mudança também impacta a forma como pensamos sobre os processos de negócio. Hoje pensamos em termos de fluxos de trabalho lineares, como uma corrida de estafetas. Os agentes de IA funcionam de forma diferente. Compreendem os objetivos e o contexto, e depois orquestram dinamicamente as respostas. Os agentes de IA representam a próxima evolução; precisamos de voltar a imaginar os fluxos de trabalho lineares como processos dinâmicos e conscientes do contexto que se adaptam em tempo real.
Talvez o mais significativo seja que os agentes de IA transformam a forma como as organizações aprendem. As organizações hoje lutam com a memória institucional. O conhecimento fica preso em silos departamentais; as lições desvanecem-se à medida que as pessoas saem; e o contexto perde-se entre as passagens de testemunho. Os agentes de IA retêm e constroem sobre cada interação, sintetizando continuamente insights. Quando um agente descobre uma abordagem melhor, essa aprendizagem torna-se imediatamente disponível em toda a rede.
A mudança mais profunda que os agentes de IA exigem não é tecnológica — é cultural. A maioria das organizações otimiza para a consistência e previsibilidade. Os líderes são tipicamente recompensados pela execução impecável de planos predeterminados. Mas os agentes de IA exigem que adotemos uma mentalidade cultural diferente, uma que abrace a adaptação e a evolução baseadas na aprendizagem contínua.
Os laboratórios de investigação são modelos instrutivos, pois combinam métodos sistemáticos com uma abertura a descobertas inesperadas. Precisamos deste equilíbrio de estrutura e flexibilidade para implementar agentes de IA de forma eficaz.
Neste novo modelo cultural, a nossa abordagem às operações torna-se mais dinâmica. Em vez de depender de processos fixos, devemos cultivar um ambiente que encoraje a exploração e a iteração. O seu objetivo não é a execução perfeita de passos predefinidos. É a descoberta contínua de melhores formas de alcançar os resultados desejados.
Esta mudança para uma cultura de aprendizagem altera a forma como humanos e agentes de IA interagem, transformando-nos de operadores de processos a parceiros de aprendizagem. Como líderes, desempenhamos um papel vital nesta mudança, modelando a curiosidade, encorajando a assunção de riscos calculados e valorizando a aprendizagem tanto quanto os resultados imediatos.
Os princípios que explorámos unem-se quando aplicados para gerir resultados em vez de fragmentos de um fluxo de trabalho.
No apoio ao cliente, por exemplo, em vez de dividir um pedido entre agentes de IA, é mais eficaz atribuir-lhes problemas específicos de ponta a ponta. Por exemplo, um agente pode tratar totalmente de todas as questões de faturação, desde o contacto inicial até à resolução. Isto cria limites claros ao mesmo tempo que permite autonomia. O agente pode aceder ao histórico do cliente, sistemas de faturação e ferramentas de autenticação para orquestrar toda a jornada de resolução.
O modelo de governança guia esta jornada através de objetivos claros, como metas de satisfação do cliente e tempos de resolução e os controlos de risco espelham os princípios da sala de mercados: “Escalar para humanos se o sentimento do cliente cair abaixo de 70%”, ou “Pausar as operações se o tempo de resolução exceder 10 minutos”, ou “Sinalizar para revisão se a solução se desviar mais de X% dos padrões passados”. Como um sistema imunitário, o agente pode aceder a dados e capacidades através das fronteiras organizacionais para criar soluções abrangentes. E cada interação melhora as respostas futuras através de feedback contínuo e adaptação para refletir a nossa cultura de aprendizagem.
Como líderes, a nossa oportunidade reside em voltar a imaginar processos de ponta a ponta com agentes de IA como membros integrantes da equipa, podendo aplicar os princípios de liderança que conhecemos a esta nova era de inteligência autonomizada.
Ishit Vachhrajani,
Global Head of Enterprise Strategy na AWS