Um tribunal de Ho Chi Minh, no sul do Vietname, confirmou hoje a condenação à morte de Truong My Lan, a antiga magnata do imobiliário no centro do maior escândalo financeiro do país.
Os juízes vietnamitas consideraram não existir “nenhuma razão” para reduzir a pena pronunciada em primeira instância contra a antiga executiva, considerada o cérebro de uma fraude que se suspeitava, no início, que fosse de 12,5 mil milhões de dólares, quase 3% do PIB do Vietname, mas cujo montante real pode chegar a 27 mil milhões de dólares (25,7 mil milhões de euros), de acordo com a agência de notícias France-Presse.
Os delitos de Lan têm “consequências graves” e não há “circunstâncias atenuantes” para reduzir a sentença por desvio de fundos e suborno, indicaram os magistrados no recurso, de acordo com o meio de comunicação local VNExpress, citado pela agência de notícias EFE.
No entanto, os juízes sublinharam que a lei permite que a condenação à morte seja comutada em prisão perpétua se forem devolvidos pelo menos três quartos (75%) do valor das perdas causadas.
De acordo com alguns analistas, esta sentença extrema pode, precisamente, ter como objetivo pressionar a magnata, de 68 anos, a pagar esse montante.
Durante o processo de recurso, entre 04 e 26 de novembro, Lan, de 68 anos, mostrou-se, aliás, já disposta a pagar completamente a dívida, depois de, em abril, ter sido condenada à pena capital por desvio de fundos do Banco Comercial de Saigão (SCB).
“O valor total dos seus bens excede efetivamente o montante da indemnização exigida. No entanto, a sua venda exige tempo e esforço, uma vez que muitos dos bens são imóveis e levam tempo a liquidar. Truong My Lan espera que o tribunal possa criar as condições mais favoráveis para que ela possa continuar a liquidar as indemnizações”, disse à BBC o advogado Nguyen Huy Thiep, antes do seu recurso ser rejeitado.
Poucos esperavam que os juízes se comovessem com estes argumentos. E foi, de facto, o que sucedeu. Lan está agora, de facto, numa corrida contra o tempo para angariar os fundos de que necessita.
Este recurso, que Lan perdeu, não é o último recurso, tendo ainda a possibilidade de pedir amnistia ao Presidente.
Fraude que foi montada
O tribunal considerou que Lan controlou ilegalmente o Saigon Joint Stock Commercial Bank entre 2011 e 2022 e utilizou-o para desviar fundos através de empresas fantasma, encobrindo o seu rasto através do suborno de funcionários.
Os procuradores disseram ao tribunal que Lan e os seus cúmplices desviaram fundos através da concessão de 2500 empréstimos ilegais no valor de milhares de milhões de dólares a estas empresas fantasma, o que resultou em perdas para o banco de cerca de 27 mil milhões de dólares.
O veredito da primeira instância, conhecido em abril de 2024, acabou por declarar Lan culpada de suborno, desvio de fundos e violação das regras bancárias, encerrando um julgamento de um mês que foi objeto de grande cobertura por parte dos meios de comunicação social estatais e que terá envolvido centenas de advogados, toneladas de provas e milhares de pessoas convocadas para testemunhar.
A sentença da primeira instância, que inclui também 40 anos de prisão e uma ordem de indemnizar o banco em 27 milhões de dólares, foi invulgarmente severa para uma mulher condenada por crimes de colarinho branco no Vietname e, já na altura se especulava que fosse uma tentativa de recuperar mais dinheiro de Lan.
Lan negou as acusações feitas contra ela e declarou-se inocente: “Estou muito zangada por ter sido suficientemente estúpida para me envolver neste ambiente de negócios muito feroz – o setor bancário – do qual tenho poucos conhecimentos”, afirmou no primeiro julgamento.
De acordo com a Associated Press, 85 outras pessoas foram também processadas no âmbito deste caso de fraude. Segundo a Associated Press, estas pessoas são acusadas de violar a lei bancária, suborno e abuso de poder. De acordo com o jornal Thanh Nien, quatro pessoas foram condenadas a prisão perpétua, enquanto as restantes – incluindo o marido e a sobrinha de Truong My Lan – foram condenadas a penas de prisão que variam entre 20 anos e três anos de prisão suspensa.
O julgamento de Lan faz parte de uma repressão mais vasta contra a corrupção por parte do governo comunista do Vietname. O projeto, que o secretário-geral e dirigente do Vietname, Nguyen Phu Trong, apelidou de “fornalha ardente”, já custou a carreira a dois presidentes em poucos anos, bem como a milhares de outros funcionários e burocratas.
Lan foi detida no âmbito da luta contra a corrupção em 2022. De acordo com a BBC, Lan vem de uma família sino-vietnamita da cidade de Ho Chi Minh, anteriormente conhecida como Saigão, e começou como vendedora de bancas de mercado, fundando mais tarde a sua empresa imobiliária VTP e comprando terrenos e propriedades no âmbito das reformas económicas da década de 1980.
O Vietname trata a pena de morte como um segredo de Estado. O Governo não publica o número de pessoas que se encontram no corredor da morte, embora os grupos de defesa dos direitos humanos digam que há mais de 1000 e que o Vietname é um dos maiores carrascos do mundo.
Normalmente, há grandes atrasos, muitas vezes de muitos anos, antes de as sentenças serem executadas, embora os prisioneiros sejam avisados com muito pouca antecedência.
6 toneladas. É o peso das 104 caixas de provas utilizadas no julgamento, segundo a BBC.
com Lusa e Forbes Internacional