A Women’s Summit deste ano arrancou com o “Pontapé de Saída” de Jéssica Silva. A futebolista do Benfica e da seleção portuguesa foi a primeira oradora convidada a subir ao palco no Estúdio Time Out e dedicou o seu pitch ao empoderamento feminino e ao papel fundamental que as mulheres desempenham na sociedade.
“Sou a Jéssica Silva e tenho 29 anos. Sou jogadora de futebol. Sim, sou jogadora de futebol. Isto aqui há uns tempos era um bocadinho inimaginável. Quer dizer que alguma coisa está a mudar e acho que futuramente vai ser mais e mais normal vermos jogadoras de futebol aqui nestes palcos”, iniciou a jogadora.
Comecei o seu percurso no futebol mais tarde do que aquilo que é considerado normal para os rapazes, com cerca de 10 anos de diferença. Mas nem por isso olhou para o obstáculo como um impedimento. Mesmo quando torciam ao nariz sempre que a ouviam dizer que é jogadora de futebol.
“O futebol está associado aos homens, aos rapazes, mas ainda bem que as coisas estão a mudar e eu estou muito feliz por fazer parte desta mudança”, diz. “A minha carreira começou mais ou menos há 15 anos e todas estas conquistas, todo este meu percurso, foi feito muito à base daquela que é a minha paixão pelo jogo. Na verdade, eu não gostava muito de futebol, gostava era de jogar à bola. E entretanto, percebi que tinha uma aptidão diferente e podia ser profissional”.
Os obstáculos foram, efetivamente, uma constante na sua carreira. Só que a atitude de Jéssica face a eles também nunca mudou. “A minha trajetória foi feita com muitos obstáculos, mas eu sinto-me uma campeã. Mais do que os títulos, porque sou uma privilegiada, fui a primeira e até então a única portuguesa a ganhar uma Champions League, mas mais do que esses prémios, foi ter conseguido desbravar e tornar-me profissional. E não andar nisto de uma forma singular”, afirmou. “Independentemente de qualquer obstáculo que me foi imposto, lutei, acreditei naquilo que era o meu sonho. Naturalmente tive referências, não tão portuguesas porque o futebol feminino em Portugal quase que não existia. Eu tive que sair de Portugal com 19 anos para ir para a Suécia, Espanha, França, Estados Unidos, e passado seis ou sete anos voltei a Portugal e é incrível como as coisas mudaram. Hoje sou profissional de futebol no meu país que é algo que me deixa bastante orgulhosa”.
Além de tudo o que conquistou dentro das quatro linhas, e só nesta época a equipa feminina do Benfica fez o pleno a nível de competições nacionais (Campeonato, Taça de Portugal, Taça da Liga e Supertaça), Jéssica realçou também o papel que desempenha fora do campo.
“Paralelamente à minha carreira dentro de campo, o futebol abriu-me portas para passar uma mensagem. Um legado eu deixo isso para as minhas colegas mais antigas que também fizeram com que eu hoje fosse uma das jogadoras a falar com vocês. Mas ao longo da minha carreira tive de ultrapassar uma série de obstáculos. Há obstáculos que são inevitáveis na carreira de um atleta, lesões, jogos perdidos, penaltis falhados, mas mais do que isso foram os obstáculos que eu tive de enfrentar fora de campo, nomeadamente as ideias pré-concebidas”, disse.
A decisão de usar a voz que o futebol lhe deu é, na verdade, mais raro do que se possa pensar no desporto. “O futebol deu-me a oportunidade de ter voz, poder falar, não ter medo de falar. Às vezes há uma certa limitação dos jogadores de futebol, sobretudo eles, não têm voz para falar sobre diferentes problemas sociais, mas eu tento fazer o meu caminho um bocadinho à minha maneira”, afirmou.