A série ‘Irreversível’ estreou a 14 de outubro e narra um enredo de crime e drama numa cidade costeira, onde uma psicóloga e um inspetor fazem tudo o que podem para descobrir o responsável pelo assassinato de uma jovem. Ao mesmo tema que aborda temas relevantes para a sociedade como a saúde mental, adoções ilegais, bullying, homofobia e maternidade.
A Forbes Portugal falou com Bruno Gascon, o realizador da série, e com Laura Dutra, que dá vida a Sara, sobre este novo projeto.
Como surgiu a ideia para série?
Sou um grande fã de thrillers e quando tive a ideia de criar uma série deste género sabia que além de descobrir quem é o assassino queria que o espetador encontrasse nas diversas personagens segredos ligados a temas de interesse global e, acima de tudo, se identificasse com elas. Uma vez mais quis trabalhar com as zonas cinzentas que, na verdade, fazem parte de todos nós enquanto seres humanos.
Onde foi buscar inspiração?
A história de “Irreversível” passa-se numa pequena cidade costeira onde apesar de todos se conhecerem, todos escondem segredos que uma tragédia vai colocar a descoberto. A inspiração veio, lá está, da investigação que fui fazendo ao longo dos anos para outros projetos, das conversas com psicólogos e sobretudo da observação do quotidiano e da realidade do mundo em que vivemos.
Porque é que foi importante retratar temas relevantes para a sociedade atual e de que forma eles vão chegar ao público?
Acho que nunca é demais falar de saúde mental, assim como de alguns temas que fazem parte desta série e que surgem integrados na história de vida das personagens, tendo influência na forma como elas agem e nas suas escolhas, tanto no passado como no presente. Espero que o espetador termine a série e sinta que além de um thriller e de um mistério para resolver esta série lhe deu algo mais em que refletir.
A aposta portuguesa nas séries tem vindo a ser bem-sucedida, o que é que levou a este bom momento?
Temos feito verdadeiros milagres em Portugal, dado que estamos sempre a lutar contra a maré e em enorme desvantagem porque não existe uma verdadeira indústria cinematográfica ou audiovisual no nosso país. Mas efetivamente vivemos um momento que pode ser considerado positivo, embora estando ainda longe de ser o que todos nós desejamos: mais ficção de melhor qualidade e, sobretudo, mais diversidade e maior estabilidade. É importante que esta aposta nas séries não pare, pois somente assim vamos poder crescer e melhorar. Quanto ao que nos levou a este bom momento? Sem dúvida a aposta da RTP no formato, em qualquer mercado internacional de séries o exemplo da televisão pública é considerado um case study. Se existem hoje em dia tantas séries diferentes, tantos novos realizadores, à RTP podemos agradecer.
De que forma poderemos manter esta tendência e até melhorar?
É como referi: é importante que existam mais projetos, cada vez mais diversidade e, sobretudo, estabilidade para que os guionistas, realizadores, atores e técnicos possam fazer cada vez mais projetos, pois cada vez que isso acontece existe uma aprendizagem e uma melhoria. Isso levará à produção de séries de maior qualidade. Depois obviamente se queremos ser competitivos com o mercado internacional é necessário maior investimento e, claro, que todos os canais e plataformas sejam mais participativos no nosso país.
Numa altura em que se discute um orçamento de estado e a fatia com que cada área fica, o que é que gostaria que os partidos tivessem em conta quando se trata da cultura?
Acho que falta perceber-se que a cultura é uma área tão digna como todas as outras e que merece mais respeito, consideração. Sobretudo, que quem toma as decisões se devia informar e ouvir o setor no seu todo e não apenas parcialmente, talvez assim as medidas fossem mais eficazes. Falta perceberem que tal como acontece em tantos países a cultura deve ser a base de tudo e, se queremos falar de números, pode ser uma indústria altamente lucrativa quando a aposta nela é feita de forma coerente e eficaz. Jamais poderemos evoluir se a cultura continuar a ser tratada como tem sido.
Como descreve o seu personagem nesta série?
A Sara é uma jovem com uma enorme profundidade emocional e psicológica, que vai sendo desvendada ao longo da série. O que mais me fascinou na personagem foi a sua vulnerabilidade e a forma como as suas vivências traumáticas influenciam a sua perceção do mundo e as suas relações. A Sara simboliza aqueles que, muitas vezes, são marginalizados, e acredito que a sua história tocará quem já viveu situações semelhantes, de forma a haver uma identificação e, quem sabe, um pedido de ajuda.
O que foi mais desafiante na preparação da personagem?
O mais importante para mim em qualquer personagem é garantir que ela seja real. No caso da Sara, um dos maiores desafios foi mergulhar numa espiral constante de angústia e revolta, algo que está muito distante da minha natureza, pois considero-me uma pessoa feliz e equilibrada. Contrariamente à Sara que está num lugar emocional completamente diferente. Pesquisei bastante sobre a depressão nos jovens, o impacto do bullying nas escolas e a falta de apoio a quem enfrenta dificuldades de integração. Isso ajudou-me a compreender melhor as dores e os conflitos internos da personagem.
De que forma é que a experiência internacional da Laura influenciou esta personagem?
Trabalhar em diferentes contextos culturais permitiu-me perceber que os desafios enfrentados pelos jovens são questões universais presentes em todo o mundo. A diversidade de experiências que vivi profissionalmente ajudou-me a compreender melhor as nuances das relações e os conflitos internos, o que é essencial para dar vida a personagens mais complexas.
Se tivesse que recomendar esta série a alguém, o que é que lhe diria para a convencer a ver?
“Irreversível” é uma série poderosa que aborda questões cruciais e reais, mas acima de tudo a falta de apoio psicológico. Cada personagem traz à tona as suas lutas, e a forma como lidam com os desafios da vida. A série também nos desafia a olhar para o que está à nossa volta e a refletir sobre como podemos ser mais empáticos e menos preconceituosos.