Catarina Garrett e Filipa Pinto de Carvalho fundaram a AGPC, um one-stop office que auxilia investidores estrangeiros a estabelecer-se em Portugal.
Com percursos académicos e profissionais na tradicional área do Direito, as advogadas deixaram os escritórios de advocacia para se tornarem empreendedoras e dedicarem-se a apoiar os seus clientes estrangeiros a estabelecerem-se em Portugal. E falam da sua experiência
Como surgiu a ideia de criar a AGPC (Almeida Garrett Pinto de Carvalho) e o que as motivou a especializarem-se nesta área, sendo que continuam a ser advogadas, certo?
Ambas trabalhávamos como advogadas em projetos de assessoria a clientes estrangeiros. A Catarina vinha de um período a viver em São Paulo e a Filipa trabalhava em Lisboa com investidores e empreendedores estrangeiros numa fase em que se começou a observar uma tendência crescente neste setor. A nossa experiência com este tipo de clientes, que estão a contactar pela primeira vez com o país, levou-nos a perceber que valorizam uma assessoria mais abrangente, com uma visão orientada para a concretização dos objetivos de investimento e negócio e que lhes permita perceber quem são os parceiros de confiança para os atingir. A par disso, pretendem ter uma experiência o mais organizada e tranquila possível, nomeadamente no que respeita às necessidades das suas famílias e outras áreas igualmente fundamentais e do dia-a-dia como, por exemplo, em termos de saúde e educação. Decidimos, por isso, criar a AGPC, que é uma sociedade de advogados que fornece um apoio completo, nomeadamente em termos de serviços jurídicos, e somos especializados nas áreas da imigração, corporate e fiscalidade, mas também procuramos ter uma visão holística das necessidades de cada cliente no que respeita a outras áreas. Além de trazer investimento para Portugal, procuramos promover relações harmoniosas entre os nossos clientes e as comunidades locais. A nossa missão é garantir uma adaptação e integração transversais, tornando a experiência do cliente uma jornada enriquecedora e mutuamente benéfica.
“[Os investidores estrangeiros também] pretendem ter uma experiência o mais organizada e tranquila possível, nomeadamente no que respeita às necessidades das suas famílias”
A empresa tem duas sócias. Há mais colaboradores?
Contamos hoje com 6 colaboradores. No início deste ano, expandimos a nossa equipa e planeamos continuar a alargá-la até ao final de 2024.
Quais foram os principais desafios que enfrentaram ao lançarem a AGPC?
No fundo, os desafios normais de montar um negócio do zero, tornarmo-nos empreendedoras e construirmos o negócio com base numa visão que queríamos e queremos que seja moderna, com foco no cliente, que questione procedimentos tradicionais e que procure novas soluções mais eficientes para a prestação dos serviços. A formação de uma equipa não só experiente e conhecedora, mas alinhada em termos de valores e sentido de missão, também sempre foi uma prioridade que se liga com a nossa vontade, desde o início, de querermos promover relações harmoniosas entre os nossos clientes e as comunidades locais através de projetos que tenham efetivamente um impacto positivo. Essa abordagem envolve tomadas de decisão conscientes e escolhas por vezes complexas, mas que procuramos que sejam coerentes com a nossa visão original. Além disso, construir uma rede de contactos e parcerias estratégica foi fundamental para a AGPC. São parcerias que nos permitem oferecer serviços integrados e personalizados, adaptados às necessidades específicas de cada cliente e construção e manutenção dessas relações estratégicas requer tempo, esforço e dedicação contínuos, mas são essenciais para o sucesso e crescimento da AGPC.
Como funciona a AGPC e quais são os principais serviços que oferecem aos investidores estrangeiros que desejam estabelecer-se em Portugal?
Temos um serviço de assessoria abrangente, procurando ligar todos os pontos relevantes tanto da mudança para um novo país, como tudo o que implica ter ou abrir um negócio em Portugal, o que implica uma colaboração estreita com parceiros de confiança. Esses parceiros incluem bancos, fundos de investimento, operadores imobiliários e outros agentes do setor. No que respeita à parte empresarial, por exemplo, procuramos definir a melhor estratégia de investimento de acordo com os objetivos do cliente, apoiar a estruturação do negócio do ponto de vista societário e fiscal, nomeadamente quando se tratam de empresas com sede ou sócios noutros países e onde esse enquadramento legal e fiscal também tem de ser considerado. É um serviço abrangente de apoio à abertura de empresa ou lançamento de uma startup em Portugal que inclui não só o apoio em todos os trâmites legais e burocráticos, mas também a ligação com todas as entidades e outros prestadores de serviços necessários ao lançamento do negócio em Portugal.
Além de questões relacionadas com imigração, aspetos societários e tributários, temos também uma equipa focada em acompanhar o cliente em necessidades práticas, nomeadamente através do nosso serviço de assistência de saúde – para dar a conhecer os sistemas público e privado, a encontrar os seguros certos e os cuidados médicos que possam precisar. Além disso, procuramos apoiá-los e às suas famílias em tudo o que uma mudança para um novo país implica, desde a inscrição dos filhos na escola até à procura do alojamento adequado. Ambas estivemos a viver no estrangeiro há uns anos e, portanto, sentimos na pele a preocupação de percebermos como seríamos tributadas, que trabalhos poderíamos exercer, o processo de inscrição dos nossos filhos na escola – no fundo, toda a parte burocrática. O nosso objetivo é, por isso, garantir uma transição suave e sem complicações, fornecendo um suporte abrangente em todas as etapas do processo de mudança para Portugal.
“Ambas estivemos a viver no estrangeiro há uns anos e, portanto, sentimos na pele a preocupação de percebermos como seríamos tributadas, que trabalhos poderíamos exercer, o processo de inscrição dos nossos filhos na escola”
Também prestam assessoria aos empreendedores nacionais que procuram expandir os seus negócios internacionalmente?
Sim, também prestamos assessoria aos empreendedores nacionais que procuram expandir os seus negócios internacionalmente. Esta abordagem é uma resposta dinâmica às mudanças no cenário empresarial. É uma questão bastante pertinente porque, até recentemente, observámos uma procura principalmente de empreendedores internacionais por apoio local. No entanto, à medida que o mercado evolui, temos sentido um aumento significativo nas oportunidades para apoiar empreendedores locais na sua jornada de internacionalização.
“Temos sentido um aumento significativo nas oportunidades para apoiar empreendedores locais na sua jornada de internacionalização”
O vosso acompanhamento não é apenas ao nível de empresas e negócios. Também dão apoio nos processos de estrangeiros que pretendem vir morar para Portugal. Esse tem sido uma área na vossa empresa que tem crescido mais?
Investir num negócio em Portugal vai além das formalidades de abrir uma empresa e lidar com questões de imigração, aspetos societários e tributários. Os nossos clientes procuram-nos também para os auxiliarmos em áreas essenciais relacionadas com a mudança para um novo país. Daí termos uma equipa especializada em questões relacionadas com o nosso sistema de saúde, nomeadamente ao ajudar a encontrar os seguros adequados, assim como, por exemplo, a inscrição dos filhos na escola ou a procura pelo alojamento adequado. Quanto mais o investidor ou empresário souber que tem essas questões asseguradas, mais tranquilamente tomará a decisão de investir ou empreender e mais livre estará para se focar nesse objetivo, assegurando sempre que a família está a ser assessorada e apoiada na integração na comunidade local.
“Quanto mais o investidor ou empresário souber que tem questões [pessoais] asseguradas, mais tranquilamente tomará a decisão de investir”
Em que se traduz o acompanhamento personalizado que garantem?
Começamos por conhecer o cliente, as suas necessidades e aspirações para estabelecer um negócio em Portugal. A partir daí, elaboramos uma lista abrangente dos seus requisitos e objetivos, de forma a identificarmos como é que podemos contribuir para realizá-los. E tal não se limita apenas aos recursos internos da nossa equipa, mas também à nossa ampla rede de parcerias e profundo conhecimento do mercado local. Ao entendermos completamente os objetivos do cliente, podemos oferecer soluções personalizadas que atendam às suas exigências específicas. E tal não se limita apenas às questões relacionadas com imigração, negócios e impostos, pois ajudamos os nossos clientes e respetivas famílias noutras áreas fundamentais da mudança para outro país, nomeadamente em termos de alojamento, educação e saúde. Procuramos sempre criar as condições necessárias para que haja uma boa integração com a comunidade local e incentivar o surgimento de colaborações e sinergias que sejam positivas para ambos.
Da vossa experiência, de que principais obstáculos os investidores estrangeiros se queixam quando estão a entrar no mercado português?
Individualmente, procuram sentir-se acompanhados em várias áreas e setores. Isso inclui a necessidade de suporte em termos fiscais, assistência para encontrar serviços como, por exemplo, ajudar na matrícula dos filhos em escolas. Para os investidores é muito importante ter uma visão ampla e clara do mercado, dos procedimentos, das regulamentações e das oportunidades. Além disso, é essencial sentirem estabilidade naquilo que lhes é apresentado. Procuramos apoiá-los desde o desenho da estratégia, com o conhecimento de que precisam para tomar decisões informadas em matérias de societário, imigração e fiscalidade, entre outras. Sentirem que têm um parceiro de confiança para navegar as diferentes questões burocráticas e regulatórias que possam surgir também é fundamental. Esta logística pode ser bastante complexa e daí a nossa abordagem holística para fornecer um apoio abrangente em todas essas áreas. Do ponto de vista empreendedor, os investidores ponderam sobre a escolha de Portugal em vez de outros países, sendo que para muitos é um mercado de entrada para a Europa. No início desse processo, surgem muitas ponderações e dúvidas sobre o ambiente de negócios, regulamentações e oportunidades disponíveis, que nós procuramos ajudar e facilitar.
“Para os investidores é muito importante ter uma visão ampla e clara do mercado, dos procedimentos, das regulamentações e das oportunidades”
Que dificuldades continuam a deparar-se quando estão a tratar de um processo de legalização de um negócio por parte de um estrangeiro?
É natural que um cliente estrangeiro que pretende lançar ou expandir um negócio para Portugal possa ter expectativas sobre a forma como os processos decorrem baseadas no que é a experiência no seu país de origem. Apoiá-los no sentido de prestar informação e ajudar a navegar os diferentes procedimentos é muito importante para que haja uma gestão equilibrada de expectativas. É legítimo que os nossos clientes esperem encontrar um sistema regulatório estável e serviços com uma resposta ágil e, portanto, procuramos contribuir positivamente para que cada vez mais assim seja.
Já tiveram casos de investidores que recuaram na sua intenção de investir em Portugal por razões burocráticas?
Sim, já tivemos casos de investidores que recuaram na sua intenção de investir em Portugal devido a razões burocráticas. Os atrasos no desenvolvimento dos processos podem ser motivo de ponderação, levando-os a reconsiderar as suas decisões. No entanto, como empresa, procuramos estar do lado da solução dos desafios, a fim de manter o investimento. Procuramos ajudar a superar as barreiras burocráticas e facilitar o processo para que o investimento possa ser concretizado com sucesso.
Quanto tempo demora, em média, um processo de legalização de um negócio?
Depende muito da complexidade e dimensão do negócio, se necessita de licenciamento específico ou não. Temos assessorado empreendedores que escolhem Portugal para lançar a sua startup e o processo inicial pode demorar entre três semanas a um mês. Também temos assessorado empresas de maior envergadura a abrir a subsidiária europeia no nosso país e, em casos simples, pode demorar entre um mês a dois, podendo por vezes envolver também processos de imigração do CEO ou do managing director.
Há uma crescente apetência para as empresas se instalarem em Portugal? Quais os setores de atividade e nacionalidades que mais têm recorrido aos vossos serviços?
Sim, definitivamente temos observado uma crescente inclinação por parte das empresas em instalarem-se em Portugal. Este fenómeno é especialmente evidente em empresas mais maduras e bem estabelecidas nos seus mercados de origem, que optam por abrir subsidiárias em Portugal como porta de entrada para o mercado europeu. Além disso, continua a ser uma tendência a escolha de Portugal por parte de empreendedores que procuram lançar as suas empresas ou startups. Quanto aos setores de atividade e nacionalidades que mais têm recorrido aos nossos serviços, temos visto uma diversidade significativa. No entanto, destacam-se especialmente os setores de tecnologia, turismo, imobiliário e serviços financeiros, com uma variedade de nacionalidades representadas, incluindo, mas não se limitando a países europeus, asiáticos e americanos.
“Empresas mais maduras e bem estabelecidas nos seus mercados de origem optam por abrir subsidiárias em Portugal como porta de entrada para o mercado europeu”
95% dos nossos clientes provêm do mercado internacional. Este mercado é predominantemente composto por clientes norte-americanos (que constituem mais de 80% dos nossos clientes, sendo a maior fatia do estado da Califórnia, seguida de clientes do estado de Nova Iorque), com uma presença significativa também de investidores brasileiros e de outras regiões da América do Sul. Após as políticas do Brexit, observámos um aumento no número de clientes do Reino Unido. Prestamos também assessoria a clientes do Canadá e alguns da Ásia, sobretudo Singapura, onde vemos um movimento interessante de empresas com mais maturidade, nomeadamente no setor tecnológico, que veem Portugal como uma porta interessante para o mercado europeu e que abrem aqui subsidiária. Além disso, prestamos os nossos serviços também a clientes do Médio Oriente. Os principais setores de investimento que nos procuram são o imobiliário, fundos de investimento e o setor empresarial. Empresários de diversos setores investem em abrir empresas ou subsidiárias aqui, replicando ou expandindo as suas operações. Muitos optam por estabelecer uma empresa europeia em Portugal como uma estratégia de acesso ao mercado europeu. A tecnologia é também uma forte aposta dos nossos clientes. O setor da produção agrícola tem igualmente evoluído, assim como o das energias renováveis. Temos também clientes com muita experiência e maturidade no que toca a fundos de investimento.
“Os principais setores de investimento que nos procuram são o imobiliário, fundos de investimento e o setor empresarial”
Quais são os planos futuros da AGPC?
Estamos atualmente no início do processo de apoio a clientes em Espanha e a estabelecer parcerias noutros países europeus, de forma a oferecermos um suporte abrangente para clientes que vêm de fora da União Europeia e veem Portugal como a porta de entrada para o mercado europeu. Queremos atender às necessidades dos nossos clientes de forma eficaz, independentemente de onde estejam localizados.
Que mensagem gostariam de transmitir aos potenciais investidores estrangeiros interessados em estabelecer-se em Portugal?
Gostaríamos de transmitir sobretudo uma mensagem de confiança, pois acreditamos firmemente no caminho que tem sido trilhado para tornar Lisboa e Portugal um país atrativo e um hub de inovação. Os investimentos passados realizados tanto por entidades públicas quanto privadas estão a dar os seus frutos e estamos confiantes de que existem todas as condições para que esse progresso continue e a posição de Portugal se fortaleça ainda mais. Encorajamos os investidores a explorarem as oportunidades disponíveis em Portugal, onde encontrarão um ambiente acolhedor para os negócios, uma cultura de inovação e um ecossistema em crescimento que oferece suporte e oportunidades para o sucesso.
“Os investimentos passados realizados tanto por entidades públicas quanto privadas estão a dar os seus frutos”
O que é que gostariam que fosse revisto na legislação para tornar mais simplificado estes processos de legalização de negócios?
Entendemos que é importante para a manutenção de relações estáveis e de confiança com investidores e empresas internacionais (e acrescentaríamos que o mesmo é verdadeiro no caso de empresas nacionais) que haja uma coerência elevada entre os princípios que motivaram as diversas legislações e programas disponíveis e a forma como estes se materializam na prática através de procedimentos que se desejam responsivos e ágeis para que sejam agentes da concretização dos objetivos e não obstáculos. Além disso, é essencial o desenvolvimento de legislações assentes numa visão de longo prazo como, por exemplo, no caso das políticas fiscais terem um mínimo de duração estável que permitam um planeamento e estratégia desenhada a vários anos. É igualmente vital que haja tranquilidade, ponderação e assertividade, sempre que os regimes precisem de serem revistos (e é natural que assim seja) e adaptados à normal evolução e necessidades do país e da sua população.
“É essencial o desenvolvimento de legislações assentes numa visão de longo prazo como, por exemplo, no caso das políticas fiscais”