Alrosa – o maior produtor de diamantes do mundo, que é parcialmente detido pelo governo russo – deixou o Conselho de Joalheria Responsável (Responsible Jewellery Council – RJC).
A informação oficial é que a Alrosa renunciou voluntariamente ao cargo de Vice-Presidente do RJC, mas a realidade é que a Alrosa saiu desta instituição pelo seu próprio pé, mas sob enorme pressão de grandes marcas de luxo como Cartier, Van Cleef & Arpels e Boucheron, que deixaram o grupo como forma de protesto contra as ligações russas do RJC na sequência da invasão da Ucrânia.
A vaga de contestação fez com que a Alrosa tenha renunciado à sua posição de vice-presidente no conselho do RJC no início de março, depois da empresa e o CEO, Sergei S. Ivanov, terem sido sancionados pelo governo dos EUA (o Reino Unido anunciou suas próprias sanções à Alrosa na semana passada).
Contudo, esta saída da Alrosa é apenas parcial, já que a RJC continua a listar a empresa como membro, mantendo ainda a sua certificação “responsável”, algo que deixou os demais membros insatisfeitos e chocados.
Em reação, muitas insígnias de luxo criticaram o facto da RJC não mostrar intenção em cortar os laços com a Rússia, comunicando o seu abandono da organização. Foi o caso da Richemont (dona da Cartier, Van Cleef & Arpels e Montblanc), Kering (com participações que incluem a Boucheron) e Pandora, a maior joalheria do mundo.
A Rússia produz cerca de 30% dos diamantes no globo, 98% dos quais são extraídos e vendidos pela Alrosa.
O RJC foi criado para ajudar a regular o setor da joelheria, melhorar a sua reputação, promover o fornecimento responsável e eliminar os “diamantes de sangue” das cadeias de fornecimentos.
A dificuldade de o RJC romper relações com a russa Alrosa levou o Watches of Switzerland a declarar em comunicado que o grupo estava “chocado e horrorizado” com a invasão da Ucrânia pela Rússia e que decidiu retirar-se do RJC porque a “abordagem” do grupo contradiz os “valores comuns que esperamos da nossa indústria”.
O Watches of Switzerland agrupa marcas como Rolex, Patek Philippe, Audemars Piguet, Cartier, OMEGA, TAG Heuer, Breitling, Tudor, Blancpain, Vacheron Constantin, Panerai, IWC, Jaeger-LeCoultre, Piaget, Hublot, Zenith, Breguet, Bovet e Grand Seiko.
Outras marcas, como Cartier e outras insígnias do grupo Richemont, como Van Cleef & Arpels, Montblanc e Piaget, também saíram do RJC – o CEO e presidente da Cartier, Cyrille Vigneron, disse que fazer parte de uma organização com membros que estão a “apoiar conflitos e guerras” não se alinha com os valores da Richemont.
O RJC, que estabelece padrões éticos para as indústrias de joias e relógios, aceitou a suspensão da Alrosa como vice-presidente, mas manteve-a como membro, o que deixou o setor chocado.
A Kering, cujas participações incluem Boucheron – um dos mais antigos ateliers de joias da França – Pomellato e Qeelin, também deixou o RJC, justificando a “incapacidade do grupo de enfrentar a situação atual na Europa” de maneira consistente com os valores da Kering.
A Richemont indicou não pretender ser membro de uma “organização do setor que inclui empresas que contribuem para o financiamento de conflitos e guerras”.
A Pandora anunciou que estava a deixar o RJC após 12 anos de associação devido ao “fracasso em suspender as associações de empresas russas” e em conseguir que os membros “interrompam os negócios com a Rússia”.
Emblemas como a americana Tiffany & Co, a suíça Chopard ou a dinamarquesa Pandora foram ainda mais longe, anunciando que vão suspender a compra de diamantes russos.
A diretora executiva do RJC, Iris Van der Veken, também acabou por se demitir, supostamente por insatisfação com o fracasso do grupo em suspender a associação da Alrosa.
Um aspeto que fica em aberto é se as marcas que deixaram o RJC irão regressar à organização, após todo este processo.
A Alrosa é negociada publicamente na Bolsa de Valores de Moscovo e a Federação Russa detém uma participação de 33% na empresa. O pai de Ivanov, Sergei Borisovich Ivanov, é um político e um dos aliados mais próximos do presidente russo, Vladimir Putin, segundo o Tesouro dos EUA. A Alrosa produz 26% da produção global de diamantes do mundo, de acordo com a empresa.