Um ano depois de ter assumido os destinos da IBM Portugal, Ricardo Martinho, refere à FORBES que a presença da empresa no nosso país passa pelo reforço do negócio nas áreas tecnológicas de IA, cloud híbrida e segurança.
O Presidente da IBM Portugal anuncia a abertura, para 2023, de mais um centro tecnológico da empresa, o sexto da empresa entre nós, juntando-se aos de Vila Real, Tomar, Viseu, Fundão e Portalegre.
A localização em concreta e outros detalhes serão comunicados no próximo ano.
Há um ano, IBM e Kyndryl seguiram rumos diferentes, com o negócio de serviços de infraestrutura de IT a ficar para a “spin-off” Kyndryl. Entende que foi uma decisão acertada, dado que a IBM ficou com o negócio da cloud e da IA?
Ricardo Martinho (RM): Esta foi uma decisão pensada com o objetivo de aproximar a IBM do seu core business e do que temos feito de melhor ao longo dos nossos 111 anos de presença no mundo: tecnologia e investigação. Como tal, ainda antes da pandemia, a IBM começou este processo de transformação com a nossa maior aquisição de sempre, a compra da RedHat. Desde então, otimizámos o nosso portefólio e somos agora uma empresa de soluções de cloud híbrida e de inteligência artificial, além de continuarmos a investir na área de serviços de consultoria que nos permitem ajudar os nossos clientes a fazer a sua transformação digital.
Esta nova IBM, mais ágil, mais centrada na tecnologia, focada na inovação que importa para as empresas e para a sociedade, vem, sem dúvida, responder ainda melhor às novas necessidades das empresas. E, os resultados financeiros que temos obtido nos últimos trimestres, com crescimento sustentado de receita, têm vindo a comprovar que esta é, sem dúvida, uma estratégia acertada.
A IBM continua a desenvolver processadores, tendo agora anunciado no IBM Quantum Summit 2022 uma nova geração de processadores quantum. De que modo se conjuga esta faceta de trabalhar em hardware com a disponibilização de software?
RM: Este é um anúncio que nos deixa a todos muito orgulhosos: o novo processador ‘Osprey’ de 433 qubits, o processador da IBM com maior número de qubits, tendo triplicado os 127 qubits do processador anterior, o IBM Eagle, anunciado em 2021, estando assim um pouco mais próximos do ponto em que os computadores quânticos serão usados para endereçar problemas que antes não tinham resolução. Anunciámos também, a próxima geração de sistemas quânticos: o IBM Quantum System Two, que será uma componente essencial da supercomputação centrada em quântica e que será lançado em 2023. Este é um trabalho contínuo, em colaboração com os nossos parceiros e clientes de todo o mundo, que nos leva a expandir e a avançar a nossa tecnologia quântica no que diz respeito ao hardware, ao software e à integração clássica para enfrentar os maiores desafios do nosso tempo.
“Anunciámos a próxima geração de sistemas quânticos: o IBM Quantum System Two, que será uma componente essencial da supercomputação centrada em quântica e que será lançado em 2023”
O facto de criar processadores de elevada capacidade significa que poderemos voltar a ver um dia a IBM a construir computadores pessoais, como no passado? Ou isso é um passado que não voltará?
RM: A invenção do computador pessoal foi um marco que muito nos orgulha na história de mais de um século da IBM, pautada por tantas inovações que foram revolucionando o mundo ao longo dos anos. Sempre nos focámos na inovação que faz a diferença e é assim que vamos continuar a construir o nosso futuro e o futuro dos nossos clientes. A IBM de hoje definiu uma estratégia clara para liderar na era da cloud híbrida e IA para as empresas. Estamos a integrar tecnologia e conhecimento – da IBM, dos nossos parceiros e até mesmo dos nossos concorrentes – para responder às necessidades urgentes dos nossos clientes que veem a cloud híbrida e a IA como fontes cruciais de vantagem competitiva. Estamos preparados para ser o catalisador do progresso para as empresas à medida que estas seguem o seu caminho de transformação digital. Globalmente, quase 4.000 clientes, muitos em setores altamente regulados, como serviços financeiros, telecomunicações e serviços de saúde, contam com a plataforma de cloud híbrida e aberta da IBM, em Red Hat OpenShift, para a segurança e a flexibilidade necessárias para a modernização. Estou certo de que as inovações revolucionárias da IBM em IA, computação quântica, soluções de cloud híbrida específicas para setores, infraestrutura, segurança e sustentabilidade são neste momento o nosso motor de inovação para os nossos clientes.
“Estamos a integrar tecnologia e conhecimento para responder às necessidades urgentes dos nossos clientes que veem a cloud híbrida e a IA como fontes cruciais de vantagem competitiva”
A computação quântica atualmente está a resolver situações até há uns anos difíceis de solucionar. Consegue dar-nos exemplos de algumas aplicações, a partir de casos na IBM?
RM: Os avanços em cloud híbrida, IA e quantum – e um conhecimento aprofundado de como é que estas áreas se irão unir para alavancar novas capacidades sem precedentes permitindo acelerar a ciência, a descoberta e o impacto – aumentaram substancialmente a nossa capacidade de impulsionar o progresso e abordar os problemas mais urgentes que os nossos clientes, a sociedade e as indústrias estão a enfrentar. A IBM está a explorar e a avançar com aplicações práticas e futuros casos de uso para a computação quântica.
São já mais de 200 organizações — e mais de 450.000 utilizadores – com acesso à maior frota de sistemas quânticos do mundo, composta por mais de 20 computadores quânticos acessíveis na cloud – IBM Quantum Network. São muitos os exemplos e das mais variadas indústrias.
O HSBC está a explorar o uso da computação quântica para a definição de preços e otimização do portefólio, para avançar com os seus objetivos net zero e para mitigar riscos, incluindo identificar e endereçar atividades fraudulentas. O consórcio entre a Mitsubishi Chemical, Universidade Keio e a IBM Quantum está a trabalhar para entender melhor o potencial do lítio-oxigénio como fonte de energia utilizando novos algoritmos que tiram partido da computação quântica. Ou ainda, a ExxonMobil que procura algoritmos quânticos que possam gerir a frota global de navios cargueiros, a Mercedes-Benz que está a usar a computação quântica para criar melhores baterias para os veículos elétricos e a multinacional de telecomunicações Vodafone que irá explorar a forma de aplicar a criptografia de segurança quântica da IBM à sua infraestrutura tecnológica.
A atuação da IBM visa fornecer às empresas ferramentas de apoio à tomada de decisões com base em dados. Que tipo de análise de dados estão a fornecer às empresas? E que eficiência proporcionam? Pode dar exemplos?
RM: Os dados são sem dúvida a base na tomada de decisões que fazem realmente a diferença e por isso mesmo estamos perante uma necessidade não só de garantia de qualidade dos dados, mas também de democratização do acesso aos dados dentro da organização. Desde as vendas, para acelerar a respostas aos clientes, aos recursos humanos, para atrair e reter talento, à área financeira, para planeamento e previsões mais assertivas e flexíveis, à área de risco ou auditoria interna, para garantir que as normas ou recomendações estão a ser cumpridas pelos vários responsáveis da organização, entre outros. Todos precisam dos dados disponíveis e com qualidade para tomarem melhores decisões.
Qual é o problema? Os dados estão em silos, espalhados pela organização e provêm das mais diversas fontes, ou seja, desde logo um problema de acesso aos mesmos. Os dados são cada vez mais complexos e muitas vezes sem qualidade – segundo um estudo da IDC 68% dos dados não chegam a ser analisados e a Forrester diz-nos que 58% das organizações têm problemas com a qualidade dos dados. Não vale a pena investir em transformação digital, automatismos e IA se os dados não estão consistentes e com qualidade.
Com os dados mais isolados do que nunca, a IBM está posicionada exclusivamente para ajudar as organizações a adotar uma arquitetura data fabric para centralizar o acesso, gestão e obtenção de insights de grandes quantidades de dados – independentemente de onde estes proveem, como são armazenados e sem nunca ser necessário ser movidos.
Um exemplo prático, os supervisores de um contact center podem obter informações acionáveis através da análise de chamadas, e-mails, mensagens e das redes sociais para que possam alinhar, recursos e priorizar adequadamente a estratégia da experiência do cliente. O IBM Institute for Business Value (IBV) constatou que as organizações que implementaram esta tecnologia relatam um aumento médio de receita de 3%.
“Não vale a pena investir em transformação digital, automatismos e IA se os dados não estão consistentes e com qualidade”
Qual é o produto “estrela” da IBM em Portugal?
RM: Na IBM não temos apenas um só produto “estrela”, são várias as soluções em que somos líderes e inovadores como a IA e a automação, cloud para diferentes setores, segurança, sustentabilidade, a nossa infraestrutura com as ofertas de servidores e storage, e os nossos serviços de consultoria que oferecem opções abertas, flexíveis e seguras para os nossos clientes.
No entanto, e antecipando já o futuro, não queria deixar de destacar a área de computação quântica que será seguramente a próxima tecnologia disruptiva que irá mudar o mundo e ajudar a resolver os problemas mais complexos que temos e também aqueles que ainda nem sabemos que temos. E, na verdade, já chegámos ao momento em que é tempo de começar a preparar esta nova era.
A separação IBM/Kyndryl, em novembro do ano passado, que crescimento permitiu dar à IBM?
RM: Este spin-off foi um passo significativo na evolução contínua da IBM que nos permitiu tornar-nos numa empresa totalmente focada em soluções e recursos de Cloud Híbrida e de IA para empresas em todo o mundo.
Tínhamos uma componente muito grande nas áreas de serviços com a aposta nas áreas de strategical outsourcing e que foi muito relevante durante um período, mas o mercado vai evoluindo. A IBM, uma vez mais e como tem feito ao longo dos seus mais de 100 anos no mundo, reinventou-se e reforçou a sua aposta na tecnologia, especialmente nas áreas de cloud híbrida e de inteligência artificial que já referi. Aliás, esta transformação e aposta na cloud híbrida começou com a aquisição da Red Hat em 2019 que veio mudar estrategicamente a nossa proposta de valor aos nossos clientes pois permite-nos responder aos seus atuais e futuros desafios.
Como referi, os nossos resultados financeiros têm sido muito positivos, com crescimento sustentado ao longo dos últimos trimestres, o que nos indica que esta é uma estratégia acertada. No anúncio referente ao terceiro trimestre, os nossos resultados superaram as expetativas dos analistas e aumentámos as nossas previsões de crescimento para 2022.
“A nossa aposta na cloud híbrida começou com a aquisição da Red Hat em 2019 que veio mudar estrategicamente a nossa proposta de valor aos nossos clientes pois permite-nos responder aos seus atuais e futuros desafios”.
Em Portugal, como foi este seu primeiro ano à frente da companhia? Que balanço faz: o volume de negócios correspondeu à expectativa?
RM: Assumir a presidência da IBM em Portugal num momento de tanta transformação interna foi um excelente desafio e uma oportunidade única para reposicionar a nova IBM. Em termos de resultados também temos estado alinhados com os resultados da Corporation, o que uma vez mais comprova que a nova aposta em tecnologia é o caminho certo também em Portugal. Temos estado como sempre com o foco de continuarmos essenciais aos nossos clientes, com um reforço claro no nosso ecossistema cada vez mais crítico, seja na área de software ou de infraestrutura, continuamos com uma área de consultoria muito sólida e consolidámos a nossa aposta nos centros nearshore em Portugal, tendo este ano anunciado mais um centro de inovação tecnológica, desta vez em Vila Real. Por tudo isto, o balanço que faço é extremamente positivo.
Quais são os grandes clientes da IBM em Portugal atualmente?
RM: Diria que todas as grandes empresas em Portugal são clientes da IBM, assim como uma parte significativa do tecido empresarial português. Em termos de indústrias, temos uma relação muito próxima com a área dos serviços financeiros, mas temos clientes de vários setores, como energia, retalho, telecomunicações, administração pública, indústria, entre outros.
A que clientes pensa a IBM chegar em Portugal daqui em diante?
RM: Com a nossa aposta no ecossistema, queremos chegar ainda a mais clientes e reforçar a nossa presença em Portugal nas áreas tecnológicas de IA, cloud híbrida e segurança.
Quais são os principais desafios ou obstáculos que está a encontrar ou que antevê para o desenvolvimento do negócio em Portugal por parte da IBM?
RM: Diria que em Portugal um dos grandes desafios prende-se com a escassez de determinados perfis e competências. Apesar de sermos um país que produz muito talento na área das TI, a procura tem aumentado e os jovens tendem a abandonar Portugal e a procurar desafios noutros países.
Foi também por esta razão que para fazer face a esta problemática temos apostado nos nossos centros Softinsa, localizados no interior do país e em estreita colaboração com os institutos politécnicos e Câmaras Municipais. Fomos à procura do talento e estamos também com a academia a reformular currículos que se adaptam às necessidades que temos e que antecipamos para poder responder aos desafios dos nossos clientes. Como referi, este ano anunciámos a abertura de um novo centro em Vila Real, sustentado no crescimento significativo dos outros centros – Tomar conta já com cerca de 200 colaboradores, Viseu com cerca de 125, Fundão com cerca de 60 e Portalegre com 20.
Que objetivos traçou para 2023 para a IBM em Portugal?
RM: Em 2023, prevemos a consolidação da nossa estratégia, mantendo o foco na tecnologia, em IA e em cloud, e reforçando a nossa aposta em temas como a segurança, a sustentabilidade e a computação quântica. Temos que tirar o máximo partido do centro de cloud em Madrid, a 500 quilómetros de Lisboa. Ou seja, vamos ser a capital europeia, depois de Madrid, que mais vai usufruir deste grande centro de cloud. É um centro com uma especialização na área de serviços financeiros, até porque há aqui um grande investimento do CaixaBank, que moveu muitas das suas cargas, inclusivamente críticas, para dentro desta solução. Acho que isto vai mudar a forma como fazemos negócio nos próximos tempos. Tudo o que tenha a ver com inteligência artificial vai igualmente estar mais fortalecido acreditamos que nos próximos dois anos vamos ver grandes mudanças.
“Temos que tirar o máximo partido do centro de cloud em Madrid, a 500 km de Lisboa. Ou seja, vamos ser a capital europeia, depois de Madrid, que mais vai usufruir deste grande centro de cloud”
Em termos de recursos humanos, está previsto um reforço para a IBM em Portugal? Em que ordem de grandeza e para que funções?
RM: A IBM como empresa globalmente integrada está continuamente a recrutar seja para vagas em Portugal ou no mundo. Em Portugal temos vindo a recrutar nos últimos meses, quer na área tecnológica, quer na área de consultoria. Andamos sempre à procura dos melhores em cada uma das áreas para enriquecer aquilo que fazemos.
Estão previstos investimentos para Portugal para os próximos tempos? Pode especificar?
RM: Com a consolidação da nossa estratégia estarão reunidas as condições para abrimos mais um centro de competências em Portugal em 2023 e tenho o sonho de trazer um quantum para Portugal para enriquecer o país em termos da sua capacidade de se diferenciar e ganhar vantagem competitiva no mercado europeu e global e acima de tudo dar a capacidade às empresas interessadas neste consórcio de se evidenciarem e também elas ganharem competitividade face aos seus peers.
“Tenho o sonho de trazer um quantum para Portugal para enriquecer o país em termos da sua capacidade de se diferenciar”
A questão trabalho presencial/trabalho remoto: como estão as equipas da IBM a laborar em Portugal? Qual o regime em que estão a trabalhar e como olha para a questão, de que cada vez mais se fala, da semana de quatro dias de trabalho?
RM: A abordagem da IBM reforça um modelo híbrido que permite que as equipas decidam individualmente quando e com que frequência devem colaborar presencialmente. Isto permite ajudar o colaborador a título individual bem como a promover o resultado do trabalho em equipa. Focamo-nos em resultados porque esta é a melhor forma de medir como é que os nossos colaboradores estão a contribuir para o negócio.