Elvira Fortunato, Sara do Ó, Pedro Dias e Álvaro Meyer debateram as suas ideias sobre como liderar na era da Inteligência Artificial, durante um dos painéis do Forbes Annual Summit 2024, que decorreu ontem no palacete do Hotel Tivoli, na Avenida da Liberdade, em Lisboa. O evento, que celebra os nove anos de existência da Forbes Portugal, decorreu sob o mote Reimagine Portugal e contou com a presença de várias personalidades do panorama empresarial português.
A premiada cientista Elvira Fortunato, vice-dean do CENIMAT i3N, da Universidade Nova, e ex-ministra da Ciência, Tecnologia e Educação Superior, abriu o debate dizendo que é fã das tecnologias e que a Inteligência Artificial é um tema fundamental. “Eu, como cientista não sou ainda uma utilizadora muito forte nestas áreas, mas estou convencida que é uma tecnologia irrefutável, que vai alterar a forma como vivemos, a nível mundial. Mas há um alerta que preciso fazer, até mesmo para os cientistas: temos de ter consciência de que a IA, tal como a conhecemos hoje, não é uma tecnologia sustentável”.
Elvira Fortunato diz que é necessário que se desenvolvam novos métodos de computação, porque esta que temos atualmente não é sustentável.
Adianta que a tecnologia requer muito consumo energético e que as emissões de dióxido de carbono são muito elevadas, o que coloca um desafio à comunidade científica que tem de recorrer a novas formas de computação, pois cada vez precisamos de mais centros de dados, que têm ciclos de vida curtos, numa média de cinco anos, e tudo isso provoca lixo eletrónico.
Por isso a especialista diz que é necessário que se desenvolvam novos métodos de computação, porque esta que temos atualmente não é sustentável. Ora isto abre portas para novas oportunidades para novos métodos de trabalho na área dos materiais e da sustentabilidade. Explica ainda que é necessária formação para usar esta tecnologia, pois a falta dela pode ser prejudicial, sobretudo na educação superior.
Sara do Ó: Temos de evitar o alarmismo
Sara do Ó, fundadora do Grupo Your e de várias outras empresas, e empreendedora por natureza. Começa por gracejar, dizendo que ainda é analógica e ainda imprime em papel os contratos, porém, a sua empresa já usa IA, e que mais tarde ou mais cedo, a IA chega a todas as empresas. “Como líder sinto que há algum alarmismo com estas novas ferramentas e formas de trabalhar. Mas estou muito otimista e estamos a fazer um caminho. Aquele em que 85% dos projetos ainda falham. Mas é um caminho que temos de fazer”, diz.
Explica que, no Grupo YOUR, dedicado à gestão financeira de empresas, já iniciaram o processo de transformação tecnológica há três anos, sendo que a primeira abordagem foi organizar a área de dados e automatização dos processos, pondo a tecnologia a uso das pessoas, para que tenham mais tempo para a relação com o cliente. “Vai ser preciso dar muita formação, ainda na primeira e segunda linha, mas estamos na fase de perceber que formação é que podemos passar às restantes 700 pessoas.
“A regulação ajuda e impulsiona a que as organizações adotem a IA tendo em conta questões de ética e de privacidade de dados, de segurança e de ESG. Logo, é importante para que sigam estes princípios”, diz Pedro Dias, da KPMG.
Álvaro Meyer, fundador da Volup e Forbes 30 Under 30, – a Volup é uma app de entrega de comida premium em casa – refere, sobre o tema, que a tecnologia e sobretudo a IA vai ter um grande impacto e o maior desafio da sua geração vai ser acompanhar a evolução deste grande salto que a IA vai trazer. Entende que todos vão utilizar e quem não usar acaba por ficar para trás. “Eu utilizo o ChatGPT no dia-a-dia e para mim tem sido útil para tomar decisões, é uma espécie de coach que me apoia e tem ajudado muito a aumentar a nossa produtividade”, diz.
Já Pedro Dias, partner de Advisory da KPMG Portugal, afirma, em relação à legislação da União Europeia, que incidirá sobre a IA no próximo ano, existem duas perspetivas: há pessoas que dizem que é um erro, porque estamos a limitar a sua evolução, mas na KPMG olham de fora diferente para a questão. “A regulação ajuda e impulsiona a que as organizações adotem a IA tendo em conta questões de ética e de privacidade de dados, de segurança e de ESG. Logo, é importante para que sigam estes princípios”, afirma Pedro Dias.
Elvira Fortunato: É importante não esquecer a formação
Respondendo a uma questão colocada pela moderadora Nilza Rodrigues, diretora da Forbes Portugal, sobre a importância da ética e transparência na IA, Elvira Fortunato refere que para além da regulação, que é muito importante, também a formação. “Eu, como professora universitária penso que as instituições de ensino superior têm de começar a incluir estas tecnologias como uma ferramenta, mas a formação é essencial. Vejo muitas vantagens na utilização da IA, mas como todas as tecnologias, temos o lado branco e o lado negro. E continua dizendo que, por exemplo, “Já começamos a ver muita produção de artigos científicos, de investigadores, que começam a aparecer só com base no chatGTP, o que não pode acontecer. E a formação vai ajudar a diminuir a probabilidade de errar”.
Explica ainda que é necessária formação para usar esta tecnologia, pois a falta dela pode ser prejudicial, sobretudo na educação superior, pois as instituições vão formar pessoas que chegam às empresas e que estas já estão mais à frente do que aprenderam.
“O meu novo amigo, como chamo ao ChatGPT, está disponível para todos. Mas se não fizer as perguntas certas, não funciona. O meu maior medo é o mau uso, porque a tecnologia não tem o discernimento do que é certo e errado, e isto é assustador”, refere Sara do Ó.
Sara do Ó refere que as suas empresas sempre introduziram novas ferramentas, sempre numa ótica da procura da melhoria contínua, o que é fundamental em qualquer liderança. Em ralação à IA diz que vai ser tudo mais rápido e vai haver alteração de competências e que as pessoas vão deixar e fazer tantas tarefas mais repetitivas e aborrecidas para dar atenção ao cliente.
“O meu novo amigo, como chamo ao ChatGPT, está disponível para todos. Mas se não fizer as perguntas certas, não funciona. O meu maior medo é o mau uso, porque a tecnologia não tem o discernimento do que é certo e errado, e isto é assustador”, diz. Refere ainda que isto prova que os seres humanos vão ser cada vez mais precisos. “Temos de treinar o ser humano em si, o nosso coração, a nossa sensibilidade, o não perder o olho no olho, por senão podemos entrar num mau caminho”. Remata. A área da Educação será a que mais vai beneficiar da IA, pois vai estar disponível para todos, mas temos de saber educar as crianças para saber usar a tecnologia.
Volup não pode só depender das tecnologias
A Volup usa a tecnologia, mas Álvaro Meyer reconhece que as automatizações que utiliza no negócio por vezes não correm, porque precisam mais do elemento humano, do seu input. Ou seja, a Volup não vai poder depender somente das tecnologias. Já Pedro Dias refere a propósito das máquinas terem ou não um maior coeficiente de inteligência, afirma que há um novo coeficiente, o emocional, que é o mais importante. Ou seja, é preciso preparar as gerações futuras e trabalhar cada vez mais as soft skills, a capacidade de liderar, de gerir equipas, a par com as competências técnicas.
“Nós professores é que temos de mudar a forma como ensinamos. Eu valorizo mais o raciocínio do que a memorização”, diz Elvira Fortunato.
Respondendo ao desafio de como podem reimaginar Portugal numa era de IA, Elvira Fortunato afirmou que entende que todas estas tecnologias serão mais inclusivas, mais globais e mais democráticas, mas deixa um alerta na área da Educação. “Nós professores é que temos de mudar a forma como ensinamos. Eu valorizo mais o raciocínio do que a memorização. Na Nova preocuparmo-nos também em formar melhor pessoas”. Afirmando ser otimista acredita que vamos ter um futuro mais risonho, mais verde, mais inclusivo.
A IA vai ajudar a termos um Portugal mais produtivo
Sara do Ó gostaria de ter um Portugal mais produtivo, menos burocrático, com processos mais céleres. “Precisamos de mais produtividade. Precisamos de mais grandes empresas e que seja tudo mais acelerado. E acho que a IA vai conseguir trazer isso, sobretudo a reforma da administração pública”, diz.
Alvaro Meyer, sendo espanhol, afirma que sentiu muito o peso da burocracia, ao iniciar a sua vida empresarial no país – abriu a primeira empresa aos 21 anos -, mas acredita no potencial do país e da capital, que é um mercado teste para muitas tecnológicas. “A IA vai revolucionar a burocracia e deveria apostar-se nessa mudança, sobretudo na Administração Publica, onde deveria reduzir a burocracia, afirma.
Para fechar o debate, Pedro Dias afirma que a IA é uma oportunidade se não olharmos para ela como uma ameaça. “Somos humanos, e se transformarmos os nossos recursos humanos aumentados com IA, o tamanho do país não nos vai limitar. Temos falta de pessoas, e por isso vejo um Portugal mais sustentável produtivo, mais alavancado se usarmos a tecnologia ao nosso dispor. Isto é a nossa oportunidade”, finaliza.