A medicina personalizada teve lugar de destaque na primeira Healthcare Summit organizada pela Forbes Portugal. Para falar sobre o tema, marcaram presença Eugenia Vispo, diretora de medical affairs & regulatory da Johnson & Johnson Innovative Medicine Portugal, e Francisco Goiana da Silva, médico e ex-membro da direção executiva do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Eugenia Vispo começou por mudar o nome do tema para medicina de precisão, uma vez que “é muito mais dedicada ao doente do que ao indivíduo”. “Acreditamos que a medicina de precisão é o caminho para fazer com que os tratamentos sejam mais eficazes e que ao mesmo tempo tenham medos efeitos adversos”, defendeu.
Este tipo de medicina, e Francisco defendeu também este ponto, é eficaz para utente, mas pode também ser muito eficaz para o Estado ou outras empresas, uma vez que consegue garantir uma redução dos custos. “O impacto nos custos está determinado pela eficiência dos tratamentos. Se os tratamentos forem mais eficazes, os pacientes têm de ir menos ao hospital, fazer menos consultas, têm menos efeitos adversos, usam menos recursos. É um sistema muito sustentável, mesmo que não pareça”, defendeu Eugenia.
O desafio que tudo isto traz é a necessidade de uma implementação correta. Ou seja, se for implementado em alguns países ou para determinados grupos, não será eficaz. Eugenia defendeu a criação de um plano, que passa pela regulação, o acesso a dados de qualidade e a colaboração. Até porque, afirmou, Portugal e a maioria dos países europeus estão efetivamente preparados para receber esta medicina em termos de regulação.
“A European Medicines Agency (EMA) está a trabalhar para conseguir avanços neste sentido, mas é uma aproximação completamente diferente. Aquilo a que estamos habituados é ao ensaio químico clássico, a um grupo de pacientes. A medicina de precisão muda completamente, temos de estar preparados para outro tipo de resultados, com grupos de pacientes muito mais pequenos, com desenhos muito diferentes. Por exemplo, onde um fármaco se pode testar para muitas patologias ou vários fármacos para uma patologia”, disse.
Tudo isto tem alguma urgência porque, segundo Eugenia, a medicina de precisão é muito rápida e muito eficiente. Ao chegar rapidamente e com um grande impacto, o que tornará as iniquidades maiores caso o plano não seja aplicado.
A capacidade de Portugal
“Eu acho que nós temos um país que tem uma dimensão interessante para testar inovações, tecnologia de saúde e para tentarmos garantir que há alguma homogeneidade entre as diferentes populações. Nós temos um país que traz muitas oportunidades”.
Mas nem tudo é bom e para Francisco Portugal tem um grande problema: “Eu acho que temos um sistema de saúde que em grande parte é assegurado pelo SNS e pelos impostos, e sendo assim o que eu sinto é que é um serviço ainda muito politizado”. Além disso, Francisco defendeu que em Portugal há uma grande preocupação em defender os problemas de hoje, mas não se antecipa aqueles que poderão ser os problemas de daqui a dois anos, por exemplo.
A medicina de precisão entra aqui como algo com muito potencial, pelo menos assim que forem definidas as estratégias. “Os políticos têm de exigir isto a quem gere. Se somos um país pequeno o suficiente para conseguir grandes resultados, e nós temos um bom laboratório, acho que também somos pequenos demais para, às vezes, olharmos para estas ideias de regionalismos. Há muito caminho a percorrer”, disse, realçando que é importante descartar o “pensamento fundamentalista de que o serviço público tem de ser público em tudo”.
Ao mesmo tempo, abrir a mente para as vantagens que chegam com a inteligência artificial. “Há coisas básicas que podem ser acompanhadas pelo telefone, podem ser feitas por telemedicina, ou que podem ser feitas das farmácias. A medicação para uma constipação simples, por exemplo. Às pessoas que dizem que a inteligência artificial vai matar a medicina e vai acabar com os médicos, eu reformulo: a inteligência artificial vai acabar com os médicos que não a utilizarem para serem mais eficientes e para melhorarem a sua prática clínica”, disse Francisco.
Posto isto, é importante que estes temas mais ligados ao digital comecem a fazer parte do currículo das universidades de medicina.