Em março, vai ser inaugurada em Londres, num interessante double entendre, a exposição intitulada, ‘States of Violence’. Está previsto que o evento decorra entre os dias 24 de março de 2023 e 8 de abril de 2023, reunindo o trabalho de vários artistas que se opõem frontalmente a quaisquer tipos de opressão governamental.
O projeto é fruto de uma parceria entre a a/political, uma organização artística internacional sem fins lucrativos, com sede em Londres, à qual se junta a WikiLeaks, a organização não-governamental por trás do famoso website com o mesmo nome, e uma terceira entidade, a Wau Holland Foundation, uma organização alemã criada em memória ao fundador da maior associação de hackers na Europa, apelidada de The Chaos Computer Club (CCC).
A exposição conta com obras criadas por artistas icónicos, como Ai WeiWei, Dread Scott e Vivienne Westwood (através da sua The Vivienne Foundation), entre outros. O objetivo é o de destacar as novas estruturas modernas de poder, emergentes à escala global, expondo material classificado nos media. Fá-lo ao revelar a existência de telegramas ultrassecretos produzidos pelo governo norte-americano, algo que nunca antes esteve disponível no Reino Unido – pelo menos in print.
Entre as obras de arte que vão ser apresentadas, consta uma série de fotografias tiradas por Ai WeiWei, no quadro de um projeto intitulado “Study of Perspective”, em que o artista chinês é mostrado a levantar “o dedo do meio” a edifícios que retratam a autoridade institucional. Os restantes trabalhos apresentados examinam muitas das “técnicas” de opressão utilizadas pelos governos – da guerra e tortura à brutalidade policial e à constante e intrusiva vigilância.
Várias cópias de documentos classificados, tornados públicos (‘leaked’) pelo ativista Julian Assange, através do website WikiLeaks, serão também exibidos.
Em 2010, Assange publicou online, no website WikiLeaks, vários telegramas diplomáticos classificados, oriundos dos EUA, o que levou ao processo-crime com o qual o cidadão australiano se tem vindo a enfrentar. Mais conhecida por “cablegate”, a divulgação dos telegramas enviados e recebidos pelas várias embaixadas norte-americanas (e outras) espalhadas por todo o mundo, incluiu informação confidencial sobre as guerras no Iraque e no Afeganistão, expondo abusos e violações de direitos humanos fundamentais.
Agora em formato físico, a exposição, também composta por 66 livros com os ditos telegramas, concretiza a primeira vez em que os telegramas “ultrassecretos” são apresentados ao público no Reino Unido. Apesar de já estarem disponíveis digitalmente há mais de uma década, a posse e o acesso aos materiais que vão estar expostos podem acarretar consequências legais – visto que o American Espionage Act de 1917 continua em vigor.
Numa curiosa espécie de interatividade, os visitantes veem-se surpreendidos com o aviso que, ao abrir e folhear os 66 livros que estarão disponíveis, correm o risco de também serem processados pelo crime que Assange foi acusado de ter cometido. Sej
a ativa ou passivamente, aqueles que forem visitar a exposição vão estar envolvidos e, de certa maneira, “a praticar” o mesmo crime que Assange, um gesto que busca expor o “perigo invisível da lei”, afirmou um porta-voz da a/political.
Assange está detido por espionagem numa prisão de alta segurança, Belmarsh, em Londres, desde 2019, à espera de ser extraditado para os Estados Unidos.
O objetivo deste evento, que decorrerá por um curto período, na capital do Reino Unido, não é apenas o de demonstrar solidariedade com Julian Assange.
O embaixador do WikiLeaks, Joseph Farrell, afirmou publicamente que o propósito da exposição é o de sublinhar as ameaças mais amplas à liberdade de expressão com as quais nos confrontamos hoje em dia. Segundo o mesmo, o “caso Assange” abriu um precedente para jornalistas internacionais que, se escreverem sobre “algo que o governo chinês não goste, permitirá a este, solicitar extradições e colocá-los na prisão”.
O site de denúncias, WikiLeaks, onde agora mais de 10 milhões de documentos e cópias de materiais oficiais classificados, censurados, ou restritos, foram depositados, viabilizou que, sob anonimato, delatores de todo o mundo conseguissem revelar documentos muitas vezes altamente confidenciais.
Julian Assange, o fundador do WikiLeaks, enfrenta possíveis 175 anos de prisão, segundo os termos da lei de espionagem de 1917 que proíbe a obtenção de informações, fotografias ou cópias de quaisquer informações, caso estas sejam relativas à defesa nacional norte-americana, sobretudo os que tenham sido obtidos com a intenção ou razão para acreditar que a informação poderá ser usada para prejudicar os Estados Unidos, ou para a vantagem de qualquer nação estrangeira.
Através deste evento, as três entidades, Wau Holland Foundation, a/political, e WikiLeaks, manifestam uma intenção claramente política: a de demonstrar os riscos para a democracia de um secretismo pandémico.
Dados importantes
Nome da exposição: States of Violence
Colaboração entre: Wau Holland Foundation, a/political, WikiLeaks
Localização: The Bacon Factory, 6 Stannary Street, Kennington, Londres SE11 4AA
Datas: 24 de março 2023 a 8 de abril de 2023