Forbes PME Power: Como as PME Gazela se estruturam para vencer?

No mundo empresarial, poucas expressões brilham tanto quanto “crescimento acelerado”. Mas dentro das paredes de uma PME, sobretudo das chamadas “Gazela”, a velocidade tem um preço: exige estrutura, visão, disciplina, tecnologia e, acima de tudo, pessoas que saibam correr sem perder o equilíbrio. Este foi o ponto de partida do painel “Organizar para Crescer: Pessoas,…
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No Forbes PME Power, quatro líderes revelaram os fundamentos que sustentam um crescimento rápido e sustentável. Do talento à automação, da agilidade à cultura, o painel mostrou que nenhuma empresa cresce sozinha. Cresce com sistemas, com propósito e com a coragem de mudar quando o mundo muda.
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No mundo empresarial, poucas expressões brilham tanto quanto “crescimento acelerado”. Mas dentro das paredes de uma PME, sobretudo das chamadas “Gazela”, a velocidade tem um preço: exige estrutura, visão, disciplina, tecnologia e, acima de tudo, pessoas que saibam correr sem perder o equilíbrio. Este foi o ponto de partida do painel “Organizar para Crescer: Pessoas, Processos e Tecnologias nas PME Gazela” e que juntou quatro líderes de áreas críticas do ecossistema empresarial português.

Sara do Ó (CEO Founder e Presidente do Conselho de Administração do grupo Ó Capital), Luís Cadillon (Director of Business Unit – New Customer Acquisition para Portugal e Cabo Verde da Cegid), António Henriques (CEO da CH Consulting) e Renato Quiaios Arantes (Grupo RQA) trouxeram não apenas opiniões, mas diagnósticos experienciados, e muitas vezes incómodos, sobre o que realmente permite que uma empresa cresça de forma sólida em Portugal.

Sara do Ó abriu o debate lembrando o essencial: falar de PME é falar da realidade da economia portuguesa. “É aqui que tudo acontece, é aqui que é grande parte da criação de valor, da criação de emprego”, afirmou. Mas o problema começa logo no ponto de partida: a esmagadora maioria das empresas são micro, e a “escada” entre micro, pequena e média não foi pensada para ser fácil de subir.

Sara do Ó, CEO Founder e Presidente do Conselho de Administração do grupo Ó Capital.

A maior barreira é psicológica, cultural e estrutural: “A dureza do curto prazo é tão grande, tão grande, tão grande que a clareza do longo prazo não é visível.”

As empresas vivem absorvidas pelo “dia-a-dia” do cashflow, incapazes de investir, planear ou atrair talento. E, quando o tema é talento, Sara trouxe a pergunta que resume o dilema português: “O que é que leva alguém que é o melhor aluno de uma faculdade a vir trabalhar para uma PME?”

Mas há outro bloqueio, mais profundo: a dificuldade de juntar esforços, competências e empresas. “Fazemos muitas empresas e poucas marcas”, provocou. A fragmentação continua a ser uma das maiores fraquezas do país. “A dificuldade que é juntar empresas… e dizer ‘anda fazer o caminho comigo’.” E, ainda assim, é exatamente aí que está a solução: “É uns com os outros que se fazem pequenas e médias empresas.”

Digitalizar para ganhar tempo

A digitalização surgiu naturalmente como o segundo eixo do debate. Luís Cadillon, da Cegid, começou por contextualizar: a empresa, que integra hoje marcas como Primavera e PHC, durante décadas concorrentes, assumiu a missão de democratizar o software de gestão e a automação. Temos mais de 100 mil clientes… temos o dever de levar a digitalização a todas as empresas”, afirmou.

O desafio das Gazela é claro: “A falta de tempo, a falta de disponibilidade para dotar as suas empresas com todos os sistemas de gestão necessários.” É precisamente por isso que a automatização de tarefas repetitivas se torna vital: faturação, stocks, salários, reconciliações.

Luís Cadillon, Director of Business Unit – New Customer Acquisition para Portugal e Cabo Verde da Cegid.

E a inteligência artificial já não é tendência, é ferramenta imprescindível. “Permitem a qualquer colaborador comunicar em linguagem natural e obter insights preciosos para a tomada de decisão.” Se o crescimento é rápido, a informação tem de ser ainda mais rápida.

Agilidade é o músculo que não pode atrofiar

A palavra “agilidade” ganhou densidade com António Henriques, CEO da CH Consulting. A empresa nasceu em 1998, fez carreira nos cinco continentes e hoje mantém a mesma filosofia: agir rápido, questionar tudo, nunca adormecer.

António foi direto: “A agilidade é um predicado que uma empresa de sucesso não pode abandonar, nunca. Nem quando faz 500 mil, nem quando faz 10 milhões.” Para ele, os planos rígidos morreram. “Esta história de fazermos cálculos a cinco ou dez anos… é tudo para esquecer.”

E acrescentou uma lição construída ao longo de três décadas: nos tempos atuais, a resiliência supera até as competências técnicas. “Hoje a resiliência é uma disciplina que é mais importante que os idiomas.”

António Henriques, CEO da CH Consulting.

É, no fundo, a arte de estar preparado para mudar tudo, a qualquer momento. E sintetizou com humor uma filosofia que se tornou método de Recursos Humanos: na CH, para entrar, é preciso “saltar de paraquedas”. Não é metáfora. É cultura. É preparação para o desconhecido.

Renato Quiaios Arantes, à frente de um grupo de construção em crescimento acelerado, trouxe a perspetiva da operação no terreno. A construção vive entre a pressão dos grandes projetos, a escassez de mão-de-obra e a volatilidade geracional.

Com franqueza, explicou: “Os novos mudam de opinião muito rápido… e depois não têm muitas contas para pagar porque os pais pagam-lhes as contas até aos 40 anos.”

Num setor onde a rotatividade pode destruir equipas inteiras, o grupo adotou uma estratégia quase desportiva: scouting de talento, recrutamento seletivo e autonomia real.

“Só assim é que conseguimos que os vários departamentos das várias empresas consigam comunicar entre si”, explicou. Sem isso, diz, o gestor fica condenado ao papel mais conhecido, mas menos estratégico, das PME portuguesas: apagar fogos.

Coragem para correr riscos

Quando o debate se centrou no equilíbrio entre financiamento e talento, Sara do Ó voltou a sublinhar que “as empresas são pessoas movidas por um propósito” e que todos são peças de um puzzle comum. Mas o acesso ao capital continua a ser a maior dor: “O private equity só olha para empresas com determinado valor de EBITDA… e quantas empresas em Portugal têm 500 mil euros?”

Por isso, defende fusões, alianças e “saltos de fé”: “É mesmo preciso correr risco. Não há outra forma.” E acrescenta um ponto que raramente é assumido no discurso público: o fundador sabe sempre mais sobre a empresa do que qualquer consultor, mas precisa de parceiros, não de isolamento.

Tecnologia como igualador

Luís Cadillon reforçou a importância da tecnologia como motor de escala. Lembrou o exemplo simbólico de Primavera e PHC, rivais durante 25 anos, agora são parte da mesma visão global: “Foi feito por ousadia.”

Hoje, graças à cloud, o acesso ao software deixou de ser luxo: as microempresas podem iniciar-se com custos mínimos e crescer por módulos. A verdadeira questão já não é custo, é coragem para adotar. “Há uma oportunidade de ouro para nos diferenciarmos… aproveitando a inteligência artificial”, indicou

Para António Henriques, a resposta é pragmática: talento exige projeto e salário competitivo. E contrariou a ideia de que os jovens preferem multinacionais: “Não é para mim claro que prefiram… desde que haja projeto, princípio, meio e fim.” E contrariou uma ideia instalada: os jovens nem sempre preferem multinacionais. Preferem projetos com sentido, história e impacto. Talento não se compra apenas: constrói-se.

Mas também é preciso sorte e fé, diz ele: “É ter um projeto, pagar bem e rezar muito para que tudo corra bem”. A experiência permite esta honestidade.

A verdade como estratégia

Renato Quiaios Arantes trouxe ao fecho uma das ideias mais cruas do painel: a transparência absoluta como arma de gestão. “A verdade é a parte mais importante de qualquer empresa.” Dizer aos colaboradores quanto custam à empresa e o que têm de produzir. Explicar margens, impostos, riscos e os desafios da concorrência. Porque, nos momentos difíceis, é essa transparência que cria alianças internas e externas: “Nas dificuldades, vamos encontrar um porto de abrigo junto dos colaboradores, dos fornecedores e dos clientes que acreditam em nós.”

Renato Quiaios Arantes, CEO do Grupo RQA.

Alertou ainda para um problema sistémico: grandes empresas estão a captar mão-de-obra qualificada das PME, e “isto vai ser catastrófico nos próximos anos” se não forem criados incentivos à retenção de talento.

Quatro caminhos para crescer

No fecho do painel, quando a moderação pediu uma última orientação para as empresas que ambicionam escalar, as respostas revelaram quatro dimensões essenciais do crescimento. Para Sara Do Ó, a maior ameaça ao sucesso é, paradoxalmente, o próprio sucesso. “Não perder a mentalidade de dia 1”, avisou, sublinhando que mesmo quando uma empresa chega ao topo, deve continuar a trabalhar com a humildade, a disciplina e a urgência de quem ainda está a começar. A vigilância perante a autossatisfação é, para ela, condição de sobrevivência: “O sucesso é o maior inimigo do sucesso.”

Luís Cadillon reforçou a necessidade de acompanhar essa mentalidade com ferramentas capazes de libertar tempo e potenciar talento. Para o diretor da Cegid, a chave passa por combinar capacidades humanas com tecnológicas. “Juntem inteligência artificial à inteligência emocional”, defendeu, para que as equipas possam concentrar-se no que realmente cria valor. A inteligência artificial, explicou, não substitui pessoas, vincando que as amplifica e representa uma oportunidade rara para diferenciar empresas, agilizar processos e elevar a competitividade.

Já António Henriques trouxe a voz da experiência acumulada em décadas de gestão e expansão internacional. Para ele, não existe sucesso sem trabalho contínuo, disciplina e constância. Mas também não existe sem humanidade. “Para lá chegar, vai ter que haver imenso trabalho”, afirmou, antes de lembrar que escolher este caminho exige também celebração e prazer. Em suma, “trabalhem e divirtam-se”, porque a exigência é grande, mas a jornada só se sustenta quando há alegria em construí-la.

A perspetiva de Renato Quiaios Arantes acrescentou um elemento de base, quase fundacional: a ética da transparência. No seu entendimento, “a verdade é a parte mais importante de qualquer empresa”, e é nas fases difíceis que isso se torna mais evidente. Explicar o negócio, os custos, os riscos e as limitações passa a ser, não um detalhe, mas uma estratégia de alinhamento e sobrevivência.

Quatro perspetivas distintas, mas complementares: humildade estratégica, inteligência aplicada, resiliência bem-humorada e verdade radical. Juntas, desenham o verdadeiro suporte do crescimento sustentável numa PME Gazela.

A Forbes Portugal promoveu a iniciativa PME Power 2025 em parceria com a Iberinform e a Câmara Municipal de Leiria e com o apoio da Cegid, Crédito Agrícola, Chanceplus, Ó Capital, RQA Construção e Yunit Consulting.

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