Chamar-lhe uma nova profissão, por esta altura, já se torna um pouco injusto. É recente, e ainda incompreendida por muitos, mas é a realidade de várias marcas e criadores de conteúdo há anos suficientes para já não ser vista como uma novidade.
A influência digital começou de uma forma orgânica. As partilhas de pessoas, na altura, completamente anónimas sobre os seus gostos ou o seu dia-a-dia – como Mia Rose, que começou a fazer no Youtube logo em 2006, Wuant em 2012 ou nomes internacionais como PewDiePie e Zoella, que iniciaram o seu percurso em 2010 e 2007, respetivamente – acabaram por se tornar numa forte ferramenta de marketing. O público começou a confiar na opinião e experiências destas pessoas e acabou por escolher fazer ou comprar aquilo que por eles é sugerido.
No final, criou-se a receita ideal para aumentar o alcance de uma marca. As mesmas que, agora, explicam como funciona – do seu ponto de vista – o trabalho com os influenciadores e de que forma o marketing de influência veio mudar as suas estratégias de marketing.
“O principal objetivo do marketing de influência é, antes de mais, aumentar a notoriedade de uma marca e/ou de um produto, ganhando maior alcance, dando maior visibilidade e melhorando o seu posicionamento online. Também ajuda os consumidores a desenvolver mais confiança e credibilidade em relação a esse produto, criando uma recomendação de utilização e, posteriormente, uma possível compra”, explica Laura Carandini, PR & marketing manager da ghd Ibéria, à Forbes.
A receita
Há várias formas de realizar este trabalho entre influenciadores e marcas: das permutas aos contrários anuais, passando por eventos, publicações pontuais, publicidade em outros meios ou minutos num determinado vídeo.
Marcas como a Instax, que pertence à Fujifilm, optam maioritariamente por permutas, algo bastante habitual nos primeiros tempos da profissão, quando ainda existia alguma incerteza em relação à vertente de negócio desta área. “Sim, sempre permuta. Obviamente quando queremos um trabalho, queremos a produção de um vídeo, aí obviamente que tem de haver uma contrapartida maior, pode haver um pequeno investimento financeiro. Agora, regra geral é permuta, e não é só cá em Portugal, é uma estratégia da marca baseada em micro-influenciadores. E territórios, nós escolhemos muitos territórios, estamos muito na parte cultural, da educação, sustentabilidade, solidariedade e apoio social. Nós tentamos estar em diversos territórios”, explica Isabel Pereira, corporate communication manager & marketing imaging da Fujifilm.
No caso da ghd, por exemplo, acabam por passar pelas várias modalidades, dependendo da dimensão do influenciador e da relação que têm com a marca: “Dependendo dos seus indicadores – seguidores, engagement e conteúdo – optamos por colaborar em troca de produto ou pagamento por publicação. Só fazemos contratos anuais, quando já trabalhamos com esse perfil há algum tempo e verificamos que ele cumpre os valores da nossa marca e os nossos objetivos, tanto em termos de conhecimento do produto, como de vendas”, explica Laura.
A Freshly acaba por concordar neste ponto. “Depende muito do tipo de influenciadores e da relação que temos”, explica Beatriz Pedrosa, responsável pela marketing de influência da marca em Portugal, à Forbes. Aquilo que estão a comunicar também tem o seu peso. Algo que seja para comunicar num longo período de tempo obriga a várias ações com os influenciadores, enquanto que para uma comunicação pontual a estratégia passa também por uma ação pontual.
O que é que funciona melhor? “Esta relação ajuda porque a comunidade vê e percebe que é realmente uma marca que aquela pessoa consome e que até já tem, se calhar, feedback de mais do que um produto. Esta existência de uma relação mais duradoura, acho que realmente traz resultados. Mas depois depende sempre muito. Também fazemos comunicações one shot que resultam muito bem. Tem muito a ver com o produto e com esta coisa de realmente a mensagem ser passada com verdade e com transparência”, afirma Beatriz.
Além de decidirem de que forma querem trabalhar com os influenciadores, as marcas têm que, naturalmente, escolher os perfis mais adequados para as representarem no digital.
“Para a Nespresso, é importante que o perfil dos criadores de conteúdo com quem trabalhamos esteja, em primeiro lugar, em linha com o posicionamento da marca, mas não só. Para nós, é também importante que o criador de conteúdo goste realmente dos nossos produtos e que estes estejam refletidos no seu dia-a-dia de forma natural. Não basta haver uma transação, é importante haver uma identificação mútua e uma relação quase familiar. Temos vindo a trabalhar com influenciadores que são identificados através de um processo dedicado que combina KPIs qualitativos e quantitativos. E aqui, incluímos perfis de todos os tipos. O principal critério é que consigamos trabalhar autenticidade e relação com as suas comunidades”, diz Diogo Duarte João, public relations & events specialist na Nespresso, à Forbes.
Só que nem tudo é tão claro como pedir auxílio aos números. E é nesta fase do processo que começam a surgir os erros por parte das próprias marcas.
“É muito importante que a identificação dos criadores de conteúdos seja o mais imparcial possível. Se uma marca trabalhar com um criador de conteúdo que não consome o produto ou se tratar-se de um gosto pessoal em trabalhar com aquela pessoa em específico, isso não irá funcionar. Têm de existir fatores de decisão, e um bom equilíbrio em relação aos objetivos da marca”, afirma Diogo.
Reinado do Instagram e TikTok
É comum as marcas procurarem controlar todo o processo destas parcerias, mas nem por isso o mais correto. Num mercado onde é essencial que o público se identifique com o influenciador, para que tenha em conta a mensagem que está a ser passada, não é possível tornar o processo mecânico e tirar-lhe a autenticidade. A momento chave desta troca é o briefing que a marca passa ao criador e a forma como lhe permite – ou não – manter a sua identidade e a forma como costuma fazer as coisas.
Isto obriga também as marcas a realmente escolher os indivíduos que melhor se identificam com os seus produtos e valores. Invés de escrever um briefing e enviar o mesmo plano para uma série de influenciadores, obrigando-os todos a fazer o mesmo. “Nós vemos influenciadores que depois perdem o caráter da autenticidade porque falam de todas as marcas, são influenciadores que tanto se vê a publicitar uma carteira ou uma marca de beleza, como aqui já estão a fazer outra. Para o consumidor final, depois o resultado é quase nulo, porque vê que aquilo no fundo é uma publicidade encapotada pela marca”, explica Isabel.
O TikTok foi uma plataforma que acabou por ajudar a que isto não aconteça: “O TikTok veio realmente melhorar esta questão porque tornou qualquer campanha que se faça muito autêntica. Isto é, nós conseguimos aferir se o influenciador tem de facto uma afinidade e gosta do nosso produto, porque vemos coisas extremamente interessantes, muito criativas e que não nos passariam pela cabeça. Essa parte é muito positiva, eu acho que o TikTok conseguiu isto. O Instagram também foi já uma melhoria, um salto em relação ao Facebook, mas o TikTok muito mais”, continua Isabel.
Foi desta forma que a plataforma chinesa ganhou terreno em relação à maioria das redes sociais. Ainda que, em Portugal e provavelmente em outros lugares, o Instagram continue a ser a principal rede social para muitas marcas e influenciadores.
“O Instagram é uma das redes preferidas e mais consolidadas, e destaca-se por apresentar conteúdos mais visuais, pelo que o seu conteúdo tende a ser mais qualitativo e cuidado. Enquanto o TikTok é puro entretenimento, aqui a originalidade é premiada, pelo que o conteúdo tem de ser mais dinâmico, natural e em formatos curtos”, diz Laura.
Sucesso comprovado
A Nespresso tem numa das grandes influenciadoras a nível mundial um exemplo de sucesso para a marca. Chiara Ferragni, empreendedora e influenciadora digital italiana, assinou uma coleção limitada marca. “A coleção Nespresso x Chiara Ferragni foi um absoluto sucesso em Portugal. Poderiam existir dúvidas da eficácia desta ativação por ser uma celebridade italiana, mas a verdade é que a coleção esgotou em poucos dias e, ainda hoje, existem pessoas a perguntar por produtos dessa coleção. Acreditamos que o sucesso de uma relação não se pode medir apenas pela compra de um produto, mas também pela referência que é criada na mente do consumidor. É muito importante ter sempre em consideração o aspeto qualitativo da ação”, diz Diogo.
Comprovada a eficácia, as marcas começaram a apostar mais e mais no marketing de influência. A ghd dedica-lhe 15% do seu orçamento de marketing. Assim como a Instax, sendo que se aqui entrarem os eventos – que contam com a presença dos influenciadores – a percentagem cresce para os 20% a 25%.
As restantes marcas têm também vários casos de campanhas de sucesso. A ghd com nomes como Margarida Corceiro, Pamela Reif ou Maria Pombo; e a Instax com Bárbara Tinoco; A Freshly com Mafalda Sampaio, Alice Trewinnard, Madalena Abecasis ou Helena Coelho. Mas além dos macro-influenciadores, também os micro-influenciadores conseguem ser muito importantes para uma marca.
“Nós trabalhamos com micro e macro porque realmente ambos são muito importantes à sua maneira. Por exemplo, os micro-influenciadores às vezes podem não ter uma comunidade tão grande, mas têm uma comunidade muito mais fiel e muito mais atenta. Enquanto outras vezes tens os macro, que são incríveis, mas que têm uma comunidade gigante, que depois acaba por ser mais disperso”, conta Beatriz, realçando que, um pouco como todos os passos mencionados até agora, a escolha acaba por depender do objetivo da marca e da campanha. Mas, sim, os dois conseguem resultados positivos.
O que nenhuma marca revela, com base novamente no facto de que tudo acaba por ser variável nesta indústria, é os valores que pagam aos influenciadores para que tudo isto aconteça. Mas para que se tenha uma ideia: “Um conteúdo meu por post, uma fotografia, pode ficar à volta dos 10 mil euros, sim. Mas lá está, é muito raro uma marca pedir só uma post, normalmente é sempre um pack, digamos”, contou Margarida Corceiro, líder da lista dos mais influentes do Instagram em Portugal, à Forbes em 2023.
(Artigo publicado na edição de agosto/setembro 2024 da Forbes Portugal)