Qual é o retrato que pode ser feito em termos do negócio atual de cacau e chocolates, a nível global e em Portugal? Tem havido um crescimento do consumo e produção? Que indicadores têm?
Começando por olhar para o panorama geral, terminámos o mais recente exercício financeiro com um volume de negócios consolidado em 14 mil milhões de euros, o que representa um aumento de 10,4% face ao período anterior. O número de colaboradores cresceu quase 7%, para um total de 41.441, sendo que, no total, contamos com 109 empresas e 32 fábricas em todo o mundo, vendendo diretamente e através de distribuidores em mais de 170 países.
“Portugal é um país latino atípico no que toca ao consumo de chocolate”
Em Portugal, a Ferrero é líder indiscutível no seu setor. Estamos presentes no mercado há 35 anos e muitos dos nossos produtos já se tornaram referências nas suas próprias categorias. Portugal é um país latino atípico no que toca ao consumo de chocolate e acreditamos que tal acontece não só pela influência histórica dos anglo-saxões, mas também pela elevada percentagem de emigrantes regressados de países onde o consumo de produtos à base de chocolate é particularmente elevado.
Consideramos o consumidor português como atento e apreciador tanto da qualidade dos nossos produtos, bem como da forma dedicada como trabalhamos.
Em Portugal, qual é o vosso “produto-estrela”, aquele que mais vende?
Em Portugal, o produto estrela é, sem dúvida, o Ferrero Rocher. Uma verdadeira love brand, que assume valores que vão muito além do simples tamanho do produto. O Ferrero Rocher conseguiu o seu lugar indiscutível nos costumes portugueses, fazendo já parte da cultura e tradição local.
Quais são os principais desafios e oportunidades que esta indústria enfrenta?
Tal como acontece em todos os setores, temos de enfrentar os desafios de uma nova economia, onde os ciclos mudam rapidamente devido a condições económicas, muitas vezes externas.
Precisamos de pensar na nova sociedade e nos novos consumidores, assim como na nova consciência social.
“O que define um produto e o que define uma empresa são os valores que transmitem”
A sustentabilidade, a economia circular, a inclusão e a diversidade são temas que devem ser incorporados e desenvolvidos de forma construtiva em todas as empresas, interna e externamente, seja qual for o setor a que pertencem.
O que define um produto e o que define uma empresa são os valores que transmitem e que a sociedade acaba por adquirir como seus.
Quais são as projeções da Ferrero para o futuro do mercado de cacau e chocolates?
Olhamos para o futuro do mercado com otimismo. A ciência e a inovação permitem-nos explorar novos territórios, abrir novos segmentos e uma maior aproximação a novos consumidores.
Quais são as estratégias da empresa para se manter competitiva nesse cenário?
O Grupo Ferrero conta, no seu portefólio, com marcas e produtos únicos e icónicos. Temos apostado, de forma consecutiva, em apresentar novidades ao mercado, ligadas a diferentes épocas do ano – com a adaptabilidade e a versatilidade que temos, conseguimos adaptar-nos às mudanças que observamos no consumo de uma forma ergonómica e confortável.
O Grupo tem vindo a apostar em novos segmentos – como o da bolacha e dos gelados -, com o objetivo de reforçar a oferta em áreas onde não estava presente. Isto dá às marcas a possibilidade de ter uma frequência multiplicada de contacto com os consumidores, aumentando assim o valor de marcas icónicas como Ferrero Rocher, Nutella, Kinder.
“O Grupo tem vindo a apostar em novos segmentos – como o da bolacha e dos gelados -, com o objetivo de reforçar a oferta em áreas onde não estava presente”
Consideramos importante continuar a aplicar os princípios cardeais da nossa filosofia, assentes na estimulação da procura, o que obviamente envolve grandes investimentos em todas as variáveis do negócio, imagem e reputação corporativa.
Vamos também continuar a desenvolver a nossa vertente de Responsabilidade Social e Corporativa (RSC) com o Projeto Empresarial Michele Ferrero (MFEP), criado há 18 anos por Michele Ferrero, e que tem como missão criar empregos e realizar projetos humanitários que promovam o desenvolvimento educacional, social e de saúde em algumas comunidades desfavorecidas onde a Ferrero opera, especificamente em Yaoundé (Camarões), Baramati/Pune (Índia) e Walkerville (África do Sul). Atualmente, empregamos mais de 230 pessoas nos Camarões, mais de 2.920 na Índia e mais de 380 na África do Sul, totalizando mais de 3.530 pessoas, o que corresponde a 9% do total de colaboradores da empresa. Além disso, 79% das matérias-primas agrícolas utilizadas por este projeto são adquiridas a fornecedores locais.
Adicionalmente, a sustentabilidade global (ecológica, económica e social) acompanha também a nossa estratégia, o nosso crescimento e o nosso desenvolvimento. Fazemos parte da sociedade e contribuímos conscientemente para a melhoria dos nossos produtos e do universo em que a Ferrero atua, ajudando a preservar o planeta e a melhorar as condições e a qualidade de vida das pessoas.
“O nosso objetivo é motivar os nossos funcionários e melhorar a sua tomada de decisão”
Outro ponto que para o Grupo Ferrero tem uma tremenda importância são as pessoas. Para conseguirmos ter sucesso empresarial a longo prazo é decisivo contar com uma equipa de trabalho diversa e inclusiva. O nosso objetivo é motivar os nossos funcionários e melhorar a sua tomada de decisão, orientação para o consumidor e envolvimento na empresa. Ao ingressar na Ferrero, os funcionários começam desde logo a ser envolvidos na vida da empresa e esse envolvimento continua ao longo de todo o seu ciclo profissional, para que sintam que estamos a aproveitar ao máximo a sua contribuição.
Quais são as principais tendências e inovações no setor de cacau e chocolates que a Ferrero está a acompanhar?
Recentemente, desenvolvemos uma gama de tabletes de chocolate premium, sob a égide de marcas icónicas como Ferrero Rocher e Raffaello.
Entrámos com força no mercado dos biscoitos com produtos inovadores à base de cremes com cacau, como o biscoito Nutella e o Nutella B.Ready. Entrámos também no mercado de sorvetes com a força de marcas como F.Rocher, Raffaello, Kinder Bueno e outras.
Através da inovação, temos a capacidade de explorar qualquer formulação de produto que possa replicar a experiência organolética dos nossos produtos em situações e necessidades diversas, ampliando a nossa esfera de potenciais clientes.
Há novas exigências do mercado e novas preferências dos consumidores que surgiram recentemente?
O consumidor está em constante evolução, mas falar apenas do consumo é restritivo. O consumidor é também comprador e cidadão, e é nestas três dimensões que nos esforçamos para melhorar constantemente a nossa proposta.
Do ponto de vista do consumidor, somos sem sombra de dúvida uma das empresas mais inovadoras do setor, com uma capacidade constante de oferecer novas receitas e novos produtos ao mercado. Esta é uma necessidade de consumo que se acelerou com as mudanças sociológicas e a redução dos anos que separam as gerações.
Do ponto de vista do comprador, hoje é necessário que o ato de compra seja uma experiência real. Basta pensarmos em como todo o mercado do retalho mudou, seja no setor do vestuário ou o do desporto. Na Ferrero, esforçamo-nos para oferecer uma apresentação de excelência dos nossos produtos dentro das lojas, por exemplo, atraindo e satisfazendo as necessidades estéticas das pessoas, ao mesmo tempo que proporcionamos uma experiência de compra positiva.
“Esforçamo-nos para oferecer uma apresentação de excelência dos nossos produtos dentro das lojas, atraindo e satisfazendo as necessidades estéticas das pessoas”
Finalmente, no que toca ao consumidor enquanto cidadão, é importante voltar a referir a importância de ter, como empresa, uma reputação intocável relativamente a temas como a sustentabilidade e o reconhecimento enquanto player proativo na evolução social e económica.
Ao adquirir a Eat Natural em 2020, a Ferrero diversificou a sua atividade, ao setor das barras de cereais. Como tem corrido esta aposta?
Durante os últimos anos, o Grupo Ferrero tem estado empenhado na aquisição de outras empresas que possam enriquecer sinergicamente a sua oferta e aumentar a presença em países e mercados estratégicos para o seu desenvolvimento.
Adquirimos empresas relevantes na área dos biscoitos, como a Delacre, a Kieldsens, a Fox’s entre outras. No mercado dos gelados, adquirimos também a Ice Cream Factory Comakers, uma empresa de prestígio europeu, e a Wells, uma das empresas norte-americanas líder no setor.
Já no setor dos produtos tendência, adquirimos empresas como a Eat Natural e a Fulfill, ativas na produção de barras à base de proteína e cereais. Adicionalmente, conseguimos diversificar ainda mais a nossa oferta com aquisições de empresas que atuam no setor dos pré-preparados e dos congelados/frescos, como a italiana Fresysistem, que produz pastelaria congelada para bares e cafés.
Todas estas aquisições fizeram parte de uma aposta estratégica no futuro do Grupo, que pretende consolidar-se como um dos grandes líderes mundiais e impulsionar o crescimento dos mercados onde opera.
A Ferrero vai lançar novos produtos no mercado para breve? Em caso afirmativo, o que é que nos pode adiantar?
Para já, e tendo em conta a sazonalidade dos nossos produtos, estamos focados na nossa gama de gelados lançada em Portugal. Fizemo-lo como resposta a uma necessidade do mercado que identificámos, e só lançámos esses produtos quando tivemos a certeza que garantia a nossa qualidade e sabor único, de forma a corresponder às expetativas dos consumidores. Além de uma excelente aceitação, temos registado altos níveis de procura, o que comprova que foi uma boa aposta da nossa parte.
Mais recente também lançámos no mercado português o Ferrero Rocher Golden Eggs e o Ferrero Rocher Ovo Flama. Ambos os produtos estão disponíveis na versão original e também na versão de chocolate negro, para quem procura um sabor mais intenso. Já no final do ano passado lançámos o Pocket Coffee, um bombom que combina o requintado chocolate negro e o autêntico café 100% Arábica – trata-se de um verdadeiro boost de energia para todos os precisam dele no seu dia a dia.
Como é que a Ferrero está a lidar com as questões relacionadas com o desflorestamento e as alterações climáticas no setor do cacau?
Estas políticas são acompanhadas de outras ações. A Ferrero avaliou 420.000 hectares de terra sob risco de desflorestação e distribuiu mais de três milhões de árvores multiusos para plantação nas explorações agrícolas e 775.000 árvores autóctones pela Costa do Marfim, para o reflorestamento ao longo de quatro anos. Estamos convictos de que estes esforços trarão benefícios ambientais e climáticos, bem como melhorias na produção de cacau e na restauração florestal.
Sabemos que o cacau é uma fonte de rendimento e um modo de vida para muitas comunidades e, portanto, a desflorestação e as alterações climáticas ameaçam esse cenário. E por isso consideramos essencial promover a transição para meios de subsistência sustentáveis, com o objetivo de proteger as florestas, garantir a segurança económica e sustentar um planeta saudável.
Quais são as iniciativas da empresa para minimizar esses impactos?
A Ferrero adotou extensas medidas para promover a sustentabilidade social e ambiental em toda a sua cadeia de abastecimento de cacau. No âmbito do Plano de Ação CFI 2018-2022, a Ferrero alcançou marcos significativos nos seus três pilares:
Pilar 1 – Compromissos de Proteção e Restauração Florestal
- Mapeamento de 153.000 agricultores em polígonos
- Avaliação de 421.000 hectares de terra quanto ao risco de desflorestação
- Distribuição de 5,4 milhões de árvores não-cacau para plantação nas explorações agrícolas e fora delas
- Envolvimento de 77.000 agricultores em práticas agroflorestais
- Envolvimento de 10.000 agricultores em Pagamento por Serviços Ecossistémicos (PES)
- Formação de 68.000 agricultores em práticas de cacau climaticamente inteligentes
Pilar 2 – Produção Sustentável e Meios de Subsistência dos Agricultores
- Apoio a 36.000 agricultores através de Planos de Desenvolvimento Agrícola
- Envolvimento de 26.000 pessoas em atividades geradoras de rendimento adicionais
- Distribuição de 5,2 milhões de mudas de cacau melhoradas
- Estabelecimento de 1.505 associações comunitárias ativas como forma de promoção de uma cultura de poupança e de uma política de empréstimos para autofinanciar a economia das aldeias.
- Inscrição de 9.800 pessoas em produtos e serviços financeiros
Pilar 3 – Envolvimento Comunitário e Inclusão Social
- Implementação de programas de restauro e proteção florestal em 161 comunidades
- Gestão de 53.000 hectares de terra através da Gestão de Recursos Naturais Baseada na Comunidade (CBNRM)
- Envolvimento de 4.700 jovens em grupos de serviço comunitário
- Distribuição de 7.900 “fogões limpos” a famílias em várias comunidades
- Olhando para o futuro da CFI 2.0, a Ferrero está empenhada em desenvolver e fortalecer ainda mais os sistemas de Rastreabilidade Nacional, colaborando com os governos nacionais e a indústria de confeitaria em geral.
Como é que a Ferrero está a trabalhar para garantir a transparência e a rastreabilidade na sua cadeia de abastecimento de cacau e que medidas adotaram para garantir que o cacau utilizado seja proveniente de fontes sustentáveis?
O nosso mais recente relatório de sustentabilidade detalha como o Grupo Ferrero está a alcançar rastreabilidade até ao nível da exploração agrícola em mais de 96% do seu volume de abastecimento de cacau. Além disso, 82% do volume total de cacau foi obtido de grupos de agricultores apoiados pela Ferrero. E a nossa atenção não vai apenas para o cacau, no caso de todas as avelãs fornecidas, o Grupo consegue rastrear 79% do volume total, apesar das complexidades sistémicas na cadeia de abastecimento.
A rastreabilidade na cadeia de abastecimento da Ferrero é de 96% no cacau, e 100% no óleo de palma
Outro elemento importante, e muitas vezes injustamente atacado, é o facto de 100% do óleo de palma ser certificado e segregado pela RSPO (Roundtable on Sustainable Palm Oil), sendo que 99,95% é rastreável até 146 moinhos de óleo de palma e 722 plantações. O modelo de segregação garante que o óleo de palma sustentável é separado das plantações e fazendas, em toda a cadeia de abastecimento, sendo que o Grupo Ferrero é uma das primeiras empresas globais a obter 100% de óleo de palma segregado e certificado pela RSPO (desde 2015).
É importante referir que o Grupo Ferrero está comprometido em apoiar e melhorar o abastecimento sustentável dos seus ingredientes, além de partilhar conhecimento ao longo de toda a cadeia de valor.
Quais são as expectativas da Ferrero em relação às alterações climáticas e aos seus impactos na produção de cacau? A empresa está a adotar medidas específicas para se adaptar a essas mudanças? Quais?
O Grupo Fererro tem como objetivos a gestão e redução do impacto ambiental, aumentando a eficiência ambiental nas operações e cadeia de abastecimento, reduzindo emissões e consumo de água, e aumentando a circularidade na produção e embalagem.
Para alcançar esses objetivos, a empresa realiza auditorias e desenvolve planos de gestão da água em locais significativos e trabalha com fornecedores para melhorar a separação e recuperação de resíduos.
Além disso, 92% da eletricidade global da Ferrero provém de energias renováveis, e a empresa está no caminho de ter todos os ingredientes totalmente certificados, com resultados já avançados no óleo de palma (100% certificado), cacau (96%) e outros ingredientes relevantes.
É também importante referir que 11 unidades de produção da empresa já atingiram uma taxa de recuperação de resíduos superior a 99%.
Em termos de uso de embalagens de plástico, a Ferrero vai proceder a alguma alteração nesse campo, substituindo o plástico por outros materiais, seja cartão ou vidro?
Esse é um campo no qual temos vindo a inovar e já nos comprometemos a que 100% das nossas embalagens sejam reutilizáveis, recicláveis ou compostáveis até 2025. Neste momento, já ultrapassámos a barreira dos 80%.
Podemos dar como exemplo as novas embalagens de Ferrero Rocher: uma caixa totalmente em polipropileno (PP), mais fácil de reciclar e que reduz a pegada de carbono em 30% face às caixas anteriores, mantendo a icónica transparência da embalagem e a qualidade do produto garantida. Desde a introdução destas embalagens em setembro de 2021, foram usadas aproximadamente menos 2.000 toneladas de plástico, resultante de um uso de cerca de menos 40% de plásticos nas embalagens de 16 e 30 peças. Assim que a implementação destas embalagens ecológicas esteja finalizada, em todo o portefólio Ferrero Rocher, estima-se que se evite o uso desnecessário de cerca de 10.000 toneladas de plástico.