A Forbes esteve à conversa com Paula Moldes, diretora da Stivali, uma referência na Moda portuguesa, conhecida por reunir num só espaço marcas icónicas, e principalmente por ‘descobrir’ talentos emergentes do design e trazê-los para Portugal.
Fundada em 1986 por Manuel Casal e Eckhard Frank, a Stivali distingue-se pela sua exigência na curadoria de marcas, pela qualidade irrepreensível das peças e pelo serviço ultra personalizado, agilizado por um atelier de costura in house.
Mais do que um espaço, a Stivali é um conceito com uma identidade forte, definida pela visão pioneira dos seus fundadores, uma equipa altamente qualificada, uma enorme sede de mudança e uma curadoria on point.
Os dois visionários por trás da Stivali desde cedo que consistentemente apostaram na inovação e trouxeram-nos marcas mundialmente reconhecidas, como a Chanel, Yves Saint-Laurent, Valentino, Chloé e Roger Vivier. Recentemente foi inaugurado um novo espaço na loja: o da Moda masculina.
A Stivali é uma loja multimarcas de renome em Portugal, que trabalha com grandes marcas internacionais de luxo, e que levou a Paula a viajar um pouco por todo o mundo. Como começou o seu percurso profissional neste setor e o seu interesse pelo mundo da moda?
Paula Moldes (P): Curiosamente eu estudei para ser professora de Educação Física, mas um problema no joelho impediu-me de exercer e acabou por me alterar os planos. Podia ter tirado outro curso – em fisioterapia, por exemplo – mas, para grande desgosto dos meus pais, decidi largar os meus estudos e ir logo trabalhar para uma loja. Acabou por ser o melhor que me podia ter acontecido. Foi assim que tudo começou. O meu interesse por Moda já vem desde que sou criança. Digo sempre que nasci num atelier de costura. Até ter seis anos tínhamos um atelier em casa e eu passava ali muito tempo. Lembro-me de fazermos as fardas de alguns dos comandantes da GNR, na zona do Restelo, e de assistir ao processo todo de corte, costura e provas.
Ou seja, passou a infância a divertir-se com roupa e a observar first hand, e desde muito cedo, como as peças ganham forma.
P: Sim, enquanto as outras crianças brincavam na rua e nos jardins eu, sendo filha única e sem ter vizinhos da minha idade, ia para o atelier brincar com botões, giz, réguas, e panos de várias cores e feitios. Adorava ver pessoas a fazerem provas de roupa. A Moda foi sempre um caminho paralelo ao da minha infância.
“Enquanto outras crianças brincavam na rua, eu ia para o atelier brincar com botões.”
E cresceu sempre com este bichinho da Moda dentro de si…
P: Sim. Quando tinha 15 ou 16 anos, gastava a minha mesada toda em revistas de Moda, como a Vogue. Ninguém da minha idade fazia isso, mas eu folheava as páginas todas e era transportada para um Mundo de sonhos. Quando chegou a altura de tomar uma decisão entre continuar a estudar ou seguir Moda, era óbvio para mim o que queria fazer.
Quando chegou a altura de tomar uma decisão entre continuar a estudar ou seguir Moda, era óbvio para mim o que queria fazer.
E como foi quando chegou à Stivali?
P: Entrei na Stivali em Junho de 1990. Quando cheguei conheci logo o Frank e o Manuel. Lembro-me que o Frank, em particular, tinha uma visão do mundo muito diferente da minha. Era muito ‘à frente’. Sentimos os três uma sincronização quase energética mal nos conhecemos. Comecei imediatamente a consumir e a respirar este mundo. Foi uma experiência única: comecei a viajar para ir assistir aos desfiles da Dior e do Valentino, e acompanhei o início da Dolce & Gabbana, por exemplo. Isto foi também na altura em que a Prada começou a ser a Prada que hoje conhecemos e quando o Calvin Klein e a Donna Karen surgiram com as primeiras coleções. Aliás, tudo o que vemos hoje foi inspirado por aquela altura e tive a oportunidade de viver essa era de inovação.
“Quando cheguei conheci logo o Frank e o Manuel. Tivemos os três uma sincronização quase energética quando nos conhecemos.”
De repente a Paula viajava pelo mundo fora, e assistia aos desfiles que antigamente só podia ler sobre, na Vogue.
P: Sim, e viajar era o máximo, especialmente com o Frank e o Manuel. Nós víamos peças de 10 a 15 marcas diferentes por dia, e depois decidíamos o que queríamos trazer para Portugal. Ainda hoje fazemos isso, de certa maneira. Somos também reconhecidos por descobrir e ‘iniciar’ marcas na Stivali, que pouca gente conhece. A Prada, a Gucci, a Todds, tudo começou aqui na loja.
São também muito conhecidos por serem das únicas lojas multimarcas a vender Chanel.
P: Tivemos a Chanel durante quase 30 anos e fomos das poucas lojas multimarcas do mundo a fazê-lo. Lembro-me de assistir à chegada de Karl Lagerfeld à marca, e vi praticamente todos os desfiles da Chanel desde então. Quando vou com a equipa de compras assistir aos mesmos, eles acham tudo inovador e vão aos arquivos ver peças, mas digo-lhes sempre para virem ter comigo porque eu conheço-os todos. Eu vendia as peças desse mesmo arquivo que eles hoje consultam. Efetivamente sou da geração que teve o privilégio de assistir aos expoentes máximos da criação. A Moda é isto: criação. É criar uma essência própria. Não é só usar grandes marcas, é dar aos clientes a oportunidade de se conhecerem a eles próprios através da roupa que vestem.
O vosso serviço é muito pessoal e personalizado. São conhecidos pela vossa dinâmica e pelo aconselhamento que oferecem aos que aqui vêm. De que forma é que a Stivali ajuda os seus clientes a atingirem esse auto-conhecimento?
P: Tentamos sempre ir ao encontro do que sentimos os clientes querem, fazendo sempre questão de ir mais além e explorar a essência dos mesmos de formas em que eles ainda não o fizeram. É importante saber intuir quais as coisas novas que fazem diferença para as pessoas e em como se sentem quando as usam. Vestir uma pessoa e dizerem-nos que se sentem especiais é glorioso. Na Stivali ajudamos sempre os clientes a atingir melhor o seu potencial através dos nossos serviços.
“Na Stivali ajudamos sempre os clientes a atingirem o seu potencial através dos nossos serviços.”
P: Temos um atelier de costura in house, onde fazemos todos os arranjos possíveis e imagináveis – para homem e senhora. Somos rigorosos de maneira a que os clientes saiam da loja com as peças tailored ao corpo deles. Com 8 mestres na loja, todos especialistas em áreas diferentes, estamos prontos a ajudar ao pormenor com bons serviços de atelier.
E ser uma loja multimarca facilita muito nessa descoberta?
P: Completamente. As lojas multimarcas são essenciais no mundo da moda. Lojas monomarca tem uma filosofia apenas. A nossa loja tem muitíssimas diferentes. Nós ‘misturamos’ conceitos de maneira a ajudar o cliente com quem estamos a interagir. No fundo a Moda é partilha, e passar isso para os nossos clientes é essencial. É uma forma de nos elevarmos a nós próprios. Não é status, é poder interior. Em loja estamos sempre a inspiramo-nos uns aos outros: clientes e colegas. Quando um cliente cá vem fazer uma alteração a uma peça, todos queremos ver o resultado final. Não tenho dúvida nenhuma que essa energia é sentida por todos quando aqui entram.
“Moda é partilha. Não é só status, é poder interior.”
É um serviço único e pioneiro que oferecem. Acabam por ser uma loja diferente e distinguem-se da competição.
P: Certamente. Temos uma abordagem discreta, chic, glamorosa e entusiasmante, mas sempre adaptada às necessidades dos nossos clientes. Fazemos tudo o que é possível para os vestir para eventos e ocasiões especiais. Não só participamos no processo inteiro como nos apoiamos em serviços exteriores sempre que é preciso. Adoramos trabalhar em equipa e sabemos que todos melhoramos quando nos apoiamos mutuamente. Voltamos aqui ao que disse anteriormente sobre a partilha, ou à sintonização, que considero importantíssima quando falamos em Moda.
“Temos um atelier de costura in house, onde fazemos todos os arranjos possíveis e imaginários – homem e senhora.”
A Stivali é, também, perita a acompanhar os novos trends da moda – de roupa a conceitos.
P: Sim. O mais importante é o futuro e isso é algo que a Moda nos dá: uma perspetiva para o futuro. Não só em termos pessoais, mas também económicos e sociológicos, em termos do que o mundo está a passar. Estamos no que considero ser um momento brilhante no mundo da Moda. As marcas estão a mudar de criadores e designers, algo que é frequente em tempos de crise. A transformação que mais noto é a imersão de mercados com designers fantásticos que se focam no futuro. É entusiasmante. E estamos a assistir a uma coisa que era impensável há 30 anos: a sustentabilidade da roupa. Do material das peças ao modo em que compramos, e de que forma podemos com isso contribuir para um mundo mais sustentável.
“A sustentabilidade da roupa é uma ‘nova onda’ entusiasmante no mundo da moda.”
P: Há um enorme foco agora em utilizar materiais recicláveis, em poupar água na produção de peças, em utilizar cores que menos danifiquem o planeta, etc. Mais uma vez tenho a oportunidade de assistir a uma ‘nova onda’ na moda, a da sustentabilidade na compra e no consumo. Menos ego e mais abertura para o mundo – uma partilha enorme de conhecimento. Existe um grande esforço coletivo de apresentar ao mundo formas mais saudáveis, dinâmicas e sustentáveis – e mais chic – de explorarmos a personalidade de cada um.
“O mais importante é o futuro e isso é algo que a moda nos dá: uma perspetiva para o futuro.”
Sente que esta proximidade aos clientes ajuda também neste processo de sustentabilidade e individualidade?
P: Tentamos sempre que os clientes comprem peças para mais que uma ocasião. Algo que possam usar várias vezes para os clientes terem um closet repleto de peças boas, úteis e permutáveis. Esta filosofia torna-nos muito mais flexíveis e sustentáveis, porque transformamos peças e ajudamos os clientes a reutilizar o que já têm estação após estação. Com clientes habituais consigo saber o que já lhes vendi e ajudamos sempre com a criação de novos outfits com peças novas e não só. Apesar dos nossos serviços serem muito personalizados, somos sempre fiéis no que ao manter a individualidade de cada um. Ser individual torna-nos diferentes e isso é algo a celebrar. É um feito extraordinário conseguirmos aceitar e adequar as diferenças de cada um e respeitá-las. Aprendemos imenso. Ao contrário das notícias que nos vinculariam todos, homogeneizando-os, estamos a assistir a um momento brilhante em que cada um faz questão de se afirmar a si próprio.
“Há um enorme foco agora em utilizar materiais recicláveis, em poupar água na produção de peças, em utilizar cores que menos danifiquem o planeta.”
Têm clientes de várias gerações que compram na vossa loja. Como caracteriza um cliente Stivali?
P: É uma pessoa dinâmica, independente e forte. Normalmente são pessoas ocupadas e que querem uma vida mais facilitada. Confiam em nós para ter uma imagem cuidada, discreta e que se destaque no meio de muitas outras pessoas. A Stivali é transversal, mas sempre chic. Temos linhas muito bem definidas quando compramos para a loja também: marcas discretas na apresentação, mas com glamour. E sabemos discernir.Os nossos clientes inspiram-nos e temos uma linha condutora forte ao escolher as peças que vão agradar a uma imensa camada de clientes. Temos gerações diferentes das mesmas famílias a vir comprar cá. Os nossos clientes são fieis à loja.
É quase como um serviço de personal stylist, que atrai clientes de todo o lado, não só portugueses. Têm muitos clientes vindos de fora?
P: Sim. Os nossos clientes não são só portugueses. Claro que a maioria são nacionais, mas temos muitos clientes internacionais que cá vem frequentemente, e trazem filhos e amigos. Passam tardes inteiras a planear conjuntos que querem usar na nova estação. Estabelecemos relações pessoais com todos e já sabemos o que vão gostar de ver em loja. Escolhemos peças para o nosso stock sempre que possível, sempre que os começamos, com eles em mente.
“Os nossos clientes não são só portugueses.”
P: O facto que termos uma equipa muito firme e ‘aliada’ é muito especial. Partilhamos conhecimento entre nós, e com os clientes também. Se tenho uma ideia que é útil a uma cliente de uma colega minha, tenho todo o gosto e vontade em partilhar as minhas ideias. Pode ser em termos de visão ou filosofia. O nosso objetivo é sempre ajudar o cliente.
A Stivali contribuiu imenso para uma cultura de Moda em Portugal. Sente que é um privilégio ter a oportunidade de estar à frente desta grande loja?
P: É uma sorte gigante trabalhar no que gosto mesmo, na minha paixão. E o privilegio de trabalhar com o Frank e o Manuel que me deram a oportunidade de crescer e aprender muito. Ao fim de 30 anos, continuo a acordar feliz por vir trabalhar.
“Em loja estamos sempre a inspiramo-nos uns aos outros: clientes e colegas.”
P: A criação de uma cultura de Moda em Portugal deve-se muito ao termos trazido marcas de luxo para o nosso território nacional. Fomos pioneiros na introdução de novos conceitos cá, e das primeiras lojas a fazer shop-in-shop, e a ter eventos com várias marcas e parcerias diferentes. O facto de agora sermos uma ‘referência’ é algo orgânico. Vem de uma paixão pela inovação, pela diferença, e por fazermos questão de marcar a diferença.
O vosso espaço de homem é também uma coisa recente na loja. Como surgiu esta ideia de adicionar moda masculina à vossa loja?
P: Há vários anos que nos pediam para abrir uma secção de homens na Stivali. Em Outubro de 2021 inauguramos o piso de moda masculina. Acho que o homem tem tido uma evolução enorme no mundo da moda. Procuram coisas muito especificas e adoram experimentar coisas novas. Nunca senti um interesse tão elevado em moda masculina como hoje em dia. Deixou de existir tanto a divisão entre o masculino e o feminino que existia antigamente. O estigma associado aos homens perceberem de Moda também diminuiu bastante. É quase cultura saber o que se sabe há no mundo da Moda agora.
“Nunca senti um interesse tão elevado em moda masculina como hoje em dia. Deixou de existir tanto uma divisão entre o masculino e o feminino como existira antigamente.”
P: Moda é para todos, não só para mulheres – e isso tornou-se muito evidente recentemente. Queríamos abrir portas àqueles que querem descobrir mais sobre o que lhes podemos oferecer.
Dados importantes
Quem é: Paula Moldes
Onde está: Avenida da Liberdade, 38B, 1250-145, Lisboa
Contactos: stivali@stivali.pt | +351 910 841 801
Website: www.stivalilisboa.com
Instagram: @stivali_lisboa