O crescimento do emprego na zona euro concentra-se em setores como a construção e serviços, o que aliado à sua resiliência face à expansão do PIB, se traduz num fraco desenvolvimento da produtividade, alertou hoje a presidente do BCE.
Na abertura do Fórum do Banco Central Europeu (BCE), cujos debates arrancaram hoje em Sintra, Christine Lagarde destacou que o processo inflacionista se tornou mais persistente, já que apesar de algumas pressões na inflação – como a diminuição dos custos de produção – terem começado a desvanecer-se, outras ganharam peso.
Segundo Lagarde, a segunda fase do processo inflacionista está “a começar agora a tornar-se mais forte”: o impacto do aumento dos salários.
“Os trabalhadores ficaram, até à data, a perder com o choque inflacionista, tendo sofrido grandes decréscimos dos salários reais, o que está a desencadear um processo sustentado de convergência em alta dos salários, com os trabalhadores a tentar recuperar perdas”, assinalou.
Lagarde advertiu que esta convergência está a repercutir-se na inflação subjacente, que capta mais pressões internas sobre os preços.
Segundo as projeções do BCE, os salários irão crescer mais 14%, entre agora e o final de 2025, e, em termos reais, recuperarão plenamente o nível anterior à pandemia.
A presidente do BCE explicou que, apesar desta convergência já ser tida em conta, este impacto “foi recentemente amplificado por um crescimento da produtividade mais baixo do que o projetado anteriormente”.
Segundo Lagarde, existem dois fatores do atual ciclo económico que “estão a contribuir para esta dinâmica” e “ambos podem também persistir”: a resiliência do emprego em relação ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e a composição do crescimento do emprego.
Os decisores esperavam que um abrandamento do crescimento económico no ano passado levasse a uma ligeira redução do crescimento do emprego, o que não aconteceu.
“Essa desconexão reflete, em parte, a acumulação acrescida de mão de obra pelas empresas, num contexto de escassez de mão de obra, o que é visível no atual desvio entre o total e a média de horas trabalhadas”, assinalou Lagarde.
A presidente do BCE considerou que isso “está a afetar o crescimento da produtividade”, advertindo que como se espera que o desemprego registe uma nova ligeira descida, “a motivação das empresas para acumular mão de obra poderá não desaparecer rapidamente”.
Aliado a isso, o crescimento do emprego está a concentrar-se em setores com “um crescimento da produtividade estruturalmente reduzido”.
Lagarde salientou que desde a pandemia o maior crescimento tem sido na construção e no setor público – “ambos com um decréscimo de produtividade -, assim como nos serviços.
“Estas tendências poderão também persistir em alguns desses setores nos próximos anos, dada a relativa fraqueza da indústria transformadora e as mudanças de longo prazo no sentido do emprego nos serviços”, afirmou.
Para a presidente do BCE, a zona euro irá enfrentar, assim, “vários anos de aumento dos salários nominais, sendo as pressões sobre os custos unitários do trabalho exacerbadas por um fraco crescimento da produtividade”, sublinhando o papel da política monetária neste contexto.
Por um lado, o banco central tem de assegurar a ancoragem das expectativas da inflação – e evitar que se assista a uma espiral inflacionista nos salários – e que as empresas absorvem a subida dos custos do trabalho nas margens.
Lusa