Tecnologias que incorporam Inteligência Artificial (IA) Generativa — como os conhecidos modelos ChatGPT, Gemini ou DeepSeek — são frequentemente utilizadas para automatizar múltiplas tarefas: redigir documentos, criar imagens, resolver problemas ou sugerir ideias.
Todavia, há um uso mais estratégico e promissor: o de transformar a IA em aliada crítica do nosso trabalho. Na prática, em vez de anularem o pensamento humano, estas inovações revolucionárias podem ter como função primordial ajudar a desenvolvê-lo, promovendo uma cultura de revisão, reflexão e melhoria contínua.
A tentação de deixar a IA fazer tudo por nós é compreensível, pois é rápida, eficiente e, na maioria dos casos, convincente. Contudo, ao delegarmos à máquina a tarefa de pensar, estamos a potenciar o enfraquecimento das nossas capacidades cognitivas.
IA como farol que ilumina e aperfeiçoa o nosso percurso digital
Para que a IA não tenha uma ação demolidora do nosso intelecto como acontece com um Bulldozer no terreno, devíamos pô-la ao serviço da revisão crítica: pedir-lhe que aponte fragilidades, que desafie pressupostos e que sugira alternativas às nossas observações. No fundo, que sirva como uma espécie de guia, de farol, num caminho que é trilhado por nós.
Esta opção não só preserva o nosso pensamento como o aperfeiçoa. O verdadeiro valor está em submeter ideias, textos ou soluções ao crivo da Inteligência Artificial e, a partir daí, decidir o que manter, corrigir ou aprofundar.
Esta atitude proativa e a nível mental mais saudável estimula a análise, a comparação e a argumentação, competências essenciais num mundo saturado de informação instantânea e superficial, a qual deve ser evitada ao máximo, visto que não acrescenta, só limita.
IA deve ser uma ferramenta que liberta e não que diminui
Tal como uma calculadora não elimina a necessidade de percebermos os fundamentos da matemática, a Inteligência Artificial não deve dispensar em qualquer situação a construção do pensamento.
Pelo contrário: a IA pode libertar tempo e energia de atividades rotineiras e que acabam por ser mais entediantes, para nos dedicarmos ao que de facto importa: a clareza de juízos, a coerência lógica e a criatividade argumentativa.
Vários especialistas têm alertado para os riscos de uma aplicação passiva da Inteligência Artificial, defendendo que a sua mais-valia está em ampliar o pensamento humano e não em ocupar o seu lugar. A IA não é um fim, é um meio: não deve efetuar por nós, mas sim connosco.
Como utilizar IA de forma crítica e simples no quotidiano
Para introduzir esta abordagem no dia a dia, apresento um método elementar e eficaz que integra quatro pilares. Numa primeira fase, deve-se produzir autonomamente, ou seja, elaborar um documento, resolução ou proposta com base no nosso raciocínio.
De seguida, é interessante requerer à Inteligência Artificial feedback: quais são os pontos fracos, o que falta e o que pode ser aprimorado. O próximo passo prende-se com avaliar com critério: julgar essas sugestões com espírito crítico, aceitando o que faz sentido e rejeitando o que não se aplica.
Por fim, porém não menos importante, é imperativo que se refinem as sugestões apontadas pela IA, o que se traduz em escrever ou ajustar o que considerarmos fundamental, sempre a partir da nossa escolha pessoal.
É legítimo que possamos solicitar auxílio à Inteligência Artificial para organizar um texto a partir de pontos sintetizados. No entanto, o ciclo proposto procura incentivar uma postura ativa e consciente em detrimento de uma dependência mecânica.
IA: uma estratégia pedagógica e cultural em aberto
Estamos diante de uma oportunidade rara: usar a IA para ensinar a pensar melhor. Não como ferramenta de substituição, mas como parceiro exigente. Este comportamento pode ser muito poderoso no contexto educativo e profissional, situações em que o pensamento crítico é mais preciso e, de modo paradoxal, cada vez mais escasso.
Tornar o ChatGPT num avaliador — e não num autor — é também uma maneira de nos protegermos da mediocridade do conteúdo automático e de reforçarmos a nossa autonomia intelectual num universo digitalmente ruidoso.
Em suma, recorrer à IA como instrumento de revisão crítica é um exercício de responsabilidade intelectual. É, em última instância, uma forma de não nos rendermos à comodidade da resposta pronta, mas de cultivarmos o rigor do pensamento próprio.
Na verdade, o futuro não pertence a quem souber apenas usar a Inteligência Artificial. Pertence, sobretudo, a quem souber pensar com ela. E esta postura será certamente o traço distintivo que vai determinar o rumo de relações pessoais, académicas e de negócios bem-sucedidas.
Diogo Miranda,
Manager na consultora LTPLabs