O Telescópio Espacial James Webb (JWST) está a desvendar novos mistérios cósmicos sobre galáxias que se formaram nos primórdios do Universo. Descobertas estas que estão a desafiar o modelo padrão da cosmologia que tem orientado a nossa compreensão do Universo desde os anos 1990; ou, talvez melhor, as perspetivas várias que têm sido enunciadas.
A surpresa reside no facto que algumas das novas galáxias identificadas, observadas apenas 500 a 700 milhões de anos após o Big Bang, têm uma massa superior a 10 mil milhões de vezes a do nosso Sol. Algumas até ultrapassam, em massa, a nossa própria Via Láctea, mesmo de esta ter tido mais tempo para se desenvolver.
Com estas descobertas, as teorias das últimas décadas – como o modelo da energia escura e matéria escura fria (ΛCDM) – deixam de conseguir explicar, na sua totalidade, o motivo pelo qual (e como) estas galáxias se formaram tão rapidamente e atingiram tamanha magnitude. Os quadros teóricos anteriores não o previam; indicam que é imprescindível reavaliar as nossas fundamentações teóricas.
Para as galáxias se formarem tão rapidamente, e do tamanho agora identificado, seria preciso que as mesmas tivessem convertido quase 100% do seu gás em estrelas. Um número que desafia aquilo que, até vermos com nitidez as fotografias a infravermelhos do JWST, achávamos analiticamente possível. Até agora acreditávamos que apenas 10% do gás das galáxias era transformado em estrelas. Mas imagens mostram tal não ser o caso.
Vimos, no último ano e meio, galáxias semelhantes que não poderiam ter tido tempo de se formar. Descortinamos, depois outras, enormes com 500 milhões de anos, e este Verão foram confirmadas outras com menos de 400 milhões de anos. E agora, para espanto de todos, há sinais, considerados inequívocos, da existência de galáxias anteriores que terão sido formadas antes dos 13,8 mil milhões de anos – a idade que, até às fotografias do James Webb, considerávamos ser a do nosso Universo visível.
As leituras que teorizámos desde Albert Einstein, de Stephen Hawking, e Roger Penrose, parecem não condizer com as imagens que agora vemos em pormenor. Novas interpretações da natureza estrutural dos black holes começam a emergir, em tentativas insuficientes para sabermos como interpretar os novos dados obtidos.
Tudo indicia estarmos perante mudanças de monta na Cosmologia e na Astrofísica. Avançamos, com rapidez, para uma mudança de paradigma, ou pelo menos alterações de fundo.
O desafio científico é tal que os astrónomos – eventualmente todos – estão a considerar a possibilidade da existência de novas forças, ou partículas, que deram início ao Universo. Cosmólogos de renome começam a pôr em dúvida construtos como os de dark matter e de dark energy. Ou, até mesmo, a possibilidade de uma idade muito maior para a criação do Universo, a que se terá seguido um Big Bang. Apesar destes termos, e esse evento, não terem sido demonstrados, estes eram, até agora e teoricamente, o mais perto da “verdade” a que tínhamos pensado ter chegado.
Mais, em termos da “sabedoria convencional”, já são vários os cientistas que consideram não ter havido uma “criação” do Universo, mas sim uma sucessão de Universos, que se seguiriam um aos outros num “tempo” infinito. Todos estes, debates (e teorias) fascinantes.
Podem, contudo, existir outros motivos que expliquem o porquê das novas galáxias identificadas parecerem maiores (e mais densas) e, por isso, mais antigas do que teoricamente pensávamos. Hipóteses abundam, como por exemplo a ideia de existirem buracos negros supermassivos no centro das mesmas que, em resultado, aquecem o gás circundante, levando-nos à convicção de que as galáxias podem parecer mais brilhantes. Se assim for, as suas massas podem, também, parecer mais densas e as suas luminosidades menos antigas do que as imagens do JWST nos têm sugerido.
Nessa linha, uma outra possibilidade aventada pelos cientistas, mais simples e mais atida às convicções anteriores, é a de que ‘poeiras pré-estelares’ estejam a fazer com que a cor da luz das galáxias pareça mais vermelha do que o é na realidade. O tom avermelhado que vemos, segundo estas hipóteses, oferece-nos a ilusão de que estão a mais anos-luz de nós e, portanto, que apenas aparentam, como efeito da sua velocidade, estar mais distantes.
Há quem persista num conservadorismo teimoso e quem prefira não o fazer, tentando avançar, com entusiasmo, na esteira de uma postura de “dúvida metódica” que tem sido caraterística no andar da investigação científica – sobretudo na chamada investigação fundamental. A efervescência e euforia dos especialistas são cada vez mais tangível. Muito literalmente, os tempos mudaram.
Projetos como o Cosmic Evolution Early Release Science Survey (CEERS) e o COSMOS-Web, uma iniciativa do JWST, estão a desempenhar papéis cruciais na recolha e análise destes novos dados. Para os nossos melhores cientistas, é certo, o momento que vivemos é muitíssimo estimulante.