A FORBES esteve à conversa com Carlota Morais Pires, fundadora da The Communication Studio, uma agência de comunicação com uma abordagem eclética, com sede em Lisboa. O estúdio oferece serviços de assessoria de imprensa e desenvolvimento de marcas nas áreas de moda, design e lifestyle.
Com um percurso e uma carreira internacional, como jornalista digital e depois de ter trabalhado para conhecidas marcas de moda, Carlota tem vários projetos em mãos e tenciona continuar a fazer crescer o seu studio nos próximos anos.
Como agência de comunicação, em Portugal, é justo dizer que já trabalhaste com marcas de renome nacional e internacional e que demonstras um profundo conhecimento deste setor. Como começou este interesse por moda, artistas, e designers e como surgiu a ideia de fundar, antes dos 30 anos, o teu The Communication Studio?
Carlota Morais Pires (CMP): Eu queria ser jornalista de moda. Com 12 ou 13 anos adorava comprar revistas – fazia recortes do que gostava mais, já inventava histórias e escrevia-as em cadernos. Adorava escrever e era muito criativa. Acho que foi um caminho muito linear porque tive a sorte de saber o que queria e, por isso, dei todos os passos nessa direção. Licenciei-me em Comunicação Social e Cultural, e também concluí um Mestrado em Ciências da Comunicação, ambos na Universidade Católica Portuguesa. O meu Mestrado investigava o Impacto da Internet no Jornalismo de Moda em Portugal e, na mesma altura, comecei a trabalhar na Vogue. A ideia de fundar o The Communication Studio só surgiu dez anos depois da minha primeira experiência profissional nesta área.
E esse interesse na Vogue, surgiu apenas quando estudavas na Universidade? Ou era já um sonho de infância?
CMP: A Vogue era a única revista de Moda em Portugal e eu lia-a de uma ponta à outra. Adorava os textos e os editoriais. Assim que terminei a Licenciatura, comecei a enviar currículos para a equipa. O meu horário no Mestrado era pós-laboral e eu queria usar o tempo que tinha durante o dia para aprender e adquirir a experiência que não tinha. Na altura a Vogue não me respondeu, mas acabei por conseguir um estágio na Máxima, que durou seis meses.
Desde cedo que sonhei ser jornalista de moda.
Mas chegaste ao fim do estágio, ou tentaste na mesma ‘saltar’ para a Vogue?
CMP: Acabei o estágio e até comecei outro, logo de seguida, numa agência de comunicação, também enquanto estudava. Trabalhei com marcas incríveis, como a Chopard e a Hacket London. Passados seis meses ‘despedi-me’ da agência para me focar no Mestrado. Apercebo-me agora que estas experiências, mesmo que na altura não fossem exatamente o que procurava, acabaram por me ajudar muito a ter noção do que queria e do que não queria fazer.
Mas, entretanto, os teus planos mudaram…
CMP: Sim, no dia a seguir a sair deste estágio na agência de comunicação (curiosamente para me dedicar ao Mestrado) recebi um telefonema da Vogue. Ofereceram-me um estágio curto, de apenas três meses, na redação. Acabei por prolongar e fiquei, numa primeira fase, quase dois anos. Lembro-me de entrar na Vogue, com outras estagiárias e de me dizerem que era impossível trabalhar na revista quando o estágio chegasse ao fim. Acabei por começar a escrever para a redação, para o online, para a Beleza e a assistir o Paulo Macedo, diretor de Moda, nos editoriais. Foi bom porque tive uma compreensão maior do que cada editor fazia e aprendi muito. A Vogue foi a minha maior e mais importante escola – a Patrícia Barnabé e a Rosário Mello e Castro foram as minhas ‘mentoras’ e ensinaram-me a ser muito exigente com o meu trabalho. A equipa era incrível e tive muita sorte em poder trabalhar com todas estas pessoas.
A Vogue foi a minha maior e mais importante escola.
E foi nesta altura que decidiste sair um pouco para fora, e explorar este mundo da moda a nível internacional? Como foi sair de Portugal e ir para Inglaterra?
CMP: Nesta altura, a Paula Mateus, ex-diretora da Vogue ajudou-me a conseguir um estágio na Condé Nast International, em Londres. Era assistente e fazia de tudo um pouco. Fui, por exemplo, assistir a Anya Ziourova num editorial para a Tatler Russa. Trabalhava no gabinete ao lado da Suzy Menkes, uma das maiores referências do jornalismo de Moda. Também estagiei na Diane Von Furstenberg (a criadora que inventou o wrap-dress), onde tiveuma experiência curta em wholesales. E, logo a seguir, fui para a Stella McCartney, onde também trabalhei como assistente. Eu tinha 24 ou 25 anos e foi uma experiência super dura, mas trabalhar fora muda-nos a cabeça para sempre. Eu era muito miúda e inexperiente quando fui e foi uma oportunidade para crescer.
Trabalhar fora muda-nos a cabeça para sempre.
Acabaste por ‘cair’ no epicentro da moda, e a trabalhar de imediato com grandes nomes. Um autêntico ‘entrar pela porta de cima, ou da frente’.
CMP: Sim, mas sinto que ter trabalhado na Vogue ajudou muito. E em Londres acabei por trabalhar em áreas muito diferentes umas das outras, mas todas dentro da mesma indústria. Ganhei uma perspetiva de quase 360º graus do que é uma marca, aprendi como é que as coisas são produzidas, vendidas e consumidas. Lembro-me de na altura de estar inquieta por não me focar só numa área mas agora, olhando para trás, foi o melhor que me podia ter acontecido.
Mas mesmo em Londres, nunca perdeste os teus laços à Vogue cá em Portugal.
CMP: Continuei a colaborar com a revista. Ia propondo temas, ia à London Fashion Week e escrevia os reports para a Vogue online. Também escrevi para a GQ e para a Essential, por exemplo.
E quando é que decidiste voltar, então?
CMP: Eu não estava feliz com o trabalho que fazia. Na verdade adorava escrever e estava a trabalhar como assistente. A Rosário Mello e Castro foi convidada para criar um novo projeto para a Vogue online e pediu-me para trabalhar com ela. Adorei esses anos e aprendi muito. O ritmo de trabalho era alucinante mas tive oportunidade de conhecer artistas e designers que admirava e de os entrevistar. E de trabalhar com pessoas interessantes, que eu adorava. Foi o trabalho que mais gostei até de começar a trabalhar sozinha.
O ritmo de trabalho (na Vogue online) era alucinante, mas tive oportunidades de conhecer artistas e designers que admirava e de os entrevistar.
Mas sempre tiveste, portanto, uma capacidade enorme de te adaptar a cenários diferentes e a papéis diferentes, dentro deste mundo da moda. Viajar e experimentar coisas novas parece ser fácil e gratificante para ti.
CMP: Sim, sou curiosa e gosto de saber o que vai abrir, as coisas novas que estão a acontecer, de que é que se está a falar agora. Um dia, quando estava na redação da Vogue candidatei-me a um projeto de voluntariado numa comunidade islâmica na Tailândia. Juntei as minhas férias todas num mês, comprei um bilhete, e fui um mês para um lugar remoto, no meio da selva, onde nunca tinham visto turistas. Enquanto lá estava a Vogue foi comprada por outro grupo editorial e eu só soube quando aterrei em Lisboa. Depois fui convidada para voltar para a Máxima. Estive só seis meses no site, até aceitar outro projeto numa agência de comunicação que durou menos de um ano – mas que me permitiu compreender que conseguia trabalhar em comunicação com facilidade, recorrendo à minha experiência como jornalista.
Um dia, quando estava na redação da Vogue candidatei-me a um projeto de voluntariado numa comunidade islâmica na Tailândia.
Mas tinhas apenas 28 anos e já andavas nestas andanças todas, de um lado para o outro, com imensa experiência e uma bagagem enorme de cultura e prática. Assustou-te arriscar sair de um trabalho fixo e começar esta vertente mais de empreendedora?
CMP: Saí da Máxima para um trabalho nesta agência, mas era um projeto ainda muito instável. Foi uma decisão péssima que acabou por ser boa – tive muita autonomia e aprendi que conseguia fazer sozinha coisas que nunca tinha feito antes. Decidi despedir-me e ser freelancer, mas já tinha quase dez anos de experiência e conhecia muitos jornalistas. Tive uma ajuda fundamental de várias pessoas, principalmente da Rita Rolex. A Rita organiza eventos e começou a subcontratar-me para fazer a assessoria de imprensa de marcas muito boas, como a Bibi van der Velden ou a Iacobella – foi também através do meu trabalho com ela que conheci os meus clientes da QuartoSala, por exemplo.
E o que é que te diferenciava da tua concorrência?
CMP: Eu sinto que criei a minha própria fórmula, mais próxima do jornalismo do que do trabalho que é feito pelas agências de comunicação. Tenho uma relação muito próxima com os jornalistas. Desenho, diretamente com os meus clientes, a estratégia para marca, que é sempre diferente, e nunca um modelo genérico adaptado a todas as marcas. Primeiro quero perceber quais são os objetivos – não só de comunicação, mas da marca. É crescer digitalmente? Criar brand awareness? Chegar a novos potenciais clientes? Renovar a imagem da marca?
Já ligamos marcas a pontos de venda em Portugal e em Espanha; organizamos eventos; fazemos design gráfico – hoje o nosso trabalho vai muito além da assessoria de imprensa. A presença das marcas nas plataformas digitais é essencial. Sei, também que existem muitas agências de comunicação, e por isso tentei fazer o exercício de colocar-me na posição do cliente, isto é: “se eu fosse uma marca, porque é que me escolheria a mim para a comunicar?”
Eu sinto que criei a minha própria fórmula, mais próxima do jornalismo do que do trabalho que é feito pelas agências de comunicação.
Ou seja, fazes estratégias para os teus clientes, mas também para a tua própria imagem, e estás sempre a pensar em como podes melhorar.
CMP: Sim, acho essencial. Também ganhei muita cultura visual na Vogue, com o Paulo e a Patrícia – e também a trabalhar e a ler, a devorar revistas, a pesquisar, a viajar. O foco do studio é a qualidade do texto e da imagem e por isso também damos apoio a clientes na produção de campanhas e imagens de produto, em copy, produção de catálogos. Temos muito cuidado com os conteúdos que enviamos aos jornalistas e sinto que também é assim que conseguimos a confiança de quem trabalha connosco diariamente do outro lado. Tentamos sempre facilitar o trabalho daqueles com que colaboramos e vamos ao detalhe. Vivo numa reflexão constante sobre como posso melhorar e diferenciar o nosso trabalho.
E trabalhas com muito criadores digitais e influencers?
CMP: Trabalho às vezes com os influencers com quem tenho uma relação mais próxima, mas sempre como um complemento do trabalho – e nunca como o ‘core’ de um plano de comunicação. Sinto que é difícil medir o retorno das parcerias, principalmente quando falamos de marcas com um posicionamento high end. É interessante para gerar brand awareness mas nem sempre reverte em vendas. Pode ser um tiro no escuro, mas há criadores que fazem um trabalho muito interessante e com quem eu gosto muito de colaborar. Ainda assim, prefiro pensar em formas de consolidar a relação das marcas com os seus clientes. É um desafio, mas sinto que estas dificuldades podem ser boas oportunidades para sermos criativos e pensar em novas possibilidades.
O foco do studio é a qualidade do texto e da imagem e por isso também damos apoio a clientes na produção de campanhas e imagens de produto, copy, produção de catálogos.
E, em 2020, em plena pandemia, decides fundar The Communication Studio? Alterou muito a vida o ano de 2020, com marcos tão importantes na tua vida pessoal?
CMP: Foi uma transição natural, a de ser freelancer para abrir a empresa. A partir de uma determinada faturação o meu contabilista aconselhou-me a abrir empresa e comecei a profissionalizar tudo. Também sinto que é mais credível para o cliente trabalhar com uma empresa. E a partir de uma determinada altura é importante tomar uma decisão – quero crescer ou ficar na mesma? O ano de 2020 acabou por ser um ano chave para mim: a minha filha Benedita nasceu nesse ano, fundei o studio e fiz 30 anos. O nascimento da minha filha mudou a minha vida. Os meus objetivos tornaram-se mais sérios e passei a ter novas responsabilidades. Isto tudo reforçou o meu foco no trabalho. Quando deixei de ser freelancer passei a ser muito seletiva e a trabalhar com menos marcas, mas com uma proximidade maior com o cliente, com quem mantenho uma relação diária – quase como se fizéssemos comunicação in-house.
E planos futuros, a nível pessoal e profissional?
CMP: Quero crescer, mas sempre de forma sólida, um passo de cada vez. Não sei se é um sonho utópico, mas para já quero trabalhar com marcas ou projetos de que gosto mesmo. Quando me contactam eu investigo a marca e quero ter a certeza de que a posso recomendar aos jornalistas, às pessoas à minha volta. Também é muito importante dizer ‘não’. Para mim não faz sentido recomendar uma marca que eu não usaria ou um restaurante onde eu não iria. É uma questão de consistência e para mim também é muito importante ter credibilidade, principalmente nesta área, em que vivemos dos nossos contactos. A minha curadoria faz parte da minha estratégia.
Já recusei projetos muito apetecíveis financeiramente e, ainda que pareça uma loucura, sinto que ser seletivo nos distingue a longo prazo. Quero trabalhar com novos projetos em qualquer área, desde que sejam interessantes. Eu adoro trabalhar porque também só trabalho com marcas que gosto e com pessoas que admiro.
A nível pessoal, quero também continuar um Doutoramento em Comunicação que comecei, mas que não terminei por não conseguir conciliar com o trabalho e com a maternidade. É necessário muito tempo, que eu agora não tenho. Dei aulas de Comunicação de Moda na escola Pulp Fashion, da Susana Marques Pinto, mas vou adiar o novo curso, pelo mesmo motivo – falta de tempo.
O nascimento da minha filha mudou a minha vida.
Uma curadoria que se nota no teu trabalho e te destaca. Com quem trabalhas agora?
CMP: Neste momento com a Juliana Bezerra,QuartoSala, Stivali, Mustique, João Magalhães, Just Models. Tenho sempre projetos pontuais todos os meses, principalmente inaugurações ou lançamentos. Gosto de falar com os meus clientes pessoalmente e de forma constante. Visito-os muitas vezes para saber o que estão a fazer e conversarmos. Também aprendo muito com eles. São todos tão apaixonados pelos seus projetos que acabamos por viver o dia-a-dia das marcas de uma forma muito intensa. Se uma marca me diz que tem uma ideia, eu vou querer ajudá-la a concretizar e gosto deste nosso lado quase experimental. Ainda agora acabámos de desafiar a Mustique a apresentar a coleção na ModaLisboa e correu muito bem.
Gosto de falar com os meus clientes pessoalmente e de forma constante. Visito-os muitas vezes para saber o que estão a fazer e conversarmos. Também aprendo muito com eles.
Conselhos para empreendedores?
CMP: Sinto que ainda tenho muito para aprender, mas, neste momento, o meu maior conselho é o de não tentar replicar as fórmulas de sucesso de outros. Ser original é muito importante, principalmente numa era em que somos bombardeados com muita informação online. Depois, é fundamental investir tempo, empenharmo-nos de forma consistente. Eu trabalho muito todos os dias e vejo as pessoas à minha volta fazerem o mesmo.
Se nos esforçarmos e gostarmos muito do que fazemos, acabamos por conseguir o que queremos, talvez mais cedo do que imaginávamos