Vivemos numa época em que o marketing se reinventa a um ritmo quase coreografado, impulsionado por consumidores que mudam de interesses com a mesma leveza com que alternam entre plataformas. Em 2025, o investimento global em marketing ultrapassa os 830 mil milhões de dólares, segundo o Gartner CMO Spend Survey, um número suficientemente expressivo para nos tranquilizar, a todos os marketeers, coletivamente: afinal, se investimos tanto em comunicar é porque continuamos convencidos de que alguém, algures, ainda está a ouvir. Este valor revela não apenas a escala da área, mas também a persistente esperança estratégica de que comunicar melhor continua a ser a forma mais eficaz de crescer num mercado saturado, mesmo este parece estar a definhar lentamente.
Apesar da impressionante evolução dos últimos anos, persiste uma ironia difícil de ignorar. Quanto mais complexas se tornam as estratégias, mais evidente se torna o facto de continuarmos presos a dilemas profundamente humanos. Multiplicam-se canais, ampliam-se mensagens, surgem campanhas meticulosamente concebidas e segmentações quase cirúrgicas, tudo concebido para que a mensagem certa encontre a pessoa certa no momento certo. No entanto, quanto mais refinado é o plano, mais difícil se torna cumprir o essencial: captar atenção, manter relevância e comunicar com autenticidade num ecossistema que recompensa velocidade, novidade e volume, mas olha para a profundidade com a mesma desconfiança com que se olha para algo que dá demasiado trabalho.
À medida que 2025 se aproxima do fim, o paradoxo torna-se impossível de disfarçar. Nunca tivemos tantos dados, tantos insights e tantos canais à disposição, mas nunca foi tão desafiante perceber o que tudo isto significa e, sobretudo, o que merece realmente ser desenvolvido. Entramos, por isso, em 2026 com um imperativo estratégico incontornável: a capacidade de filtrar, priorizar e atribuir sentido a uma sobrecarga informativa que cresce mais depressa do que a nossa paciência. Num ambiente saturado de estímulos e métricas, o foco regressa, quase por exaustão, ao que sempre foi fundamental: compreender não apenas o que as pessoas fazem, mas por que o fazem, mesmo quando isso não cabe facilmente numa premissa ou dashboard.
É neste contexto que algumas tendências deixam de ser passageiras e passam a funcionar como pilares estruturais da prática de marketing. Entre os movimentos que ganham profundidade destacam-se três. O primeiro é o papel da inteligência artificial como co-piloto estratégico. Depois de um período em que a IA foi celebrada sobretudo pela sua capacidade de produzir mais, mais depressa e em maior quantidade, entra agora numa fase em que orienta caminhos, modela cenários, antecipa riscos, identifica padrões invisíveis à intuição humana e sugere direções estratégicas com uma racionalidade que impressiona e, por vezes, inquieta. Curiosamente, quanto mais sofisticada se torna, mais evidente fica a necessidade de alguém com critério para decidir quando a seguir e quando a contrariar.
O segundo movimento prende-se com a expansão do comércio digital para uma nova fase de maturidade emocional e geográfica. O e-commerce deixa de ser apenas um canal conveniente e transforma-se num ecossistema global onde experiências físicas e digitais se cruzam sem grande cerimónia. Comprar online passa a significar entrar em jornadas imersivas em que personalização, ambientes sensoriais, interações em tempo real e sistemas logísticos inteligentes convergem para criar experiências quase imediatas. A geografia deixa de ser fronteira e a proximidade passa a ser definida pela relevância, um conceito que, curiosamente, continua a ser mais fácil de proclamar do que de executar.
O terceiro movimento consolida-se no domínio do branding sensorial digital. A identidade das marcas deixa de depender exclusivamente do visual estático e expande-se para universos imersivos onde som, textura, movimento e interatividade constroem experiências simbólicas mais ricas. A identidade transforma-se num organismo vivo, adaptável e responsivo, convidando os consumidores a sentir a marca, e não apenas a reconhecê-la, um avanço significativo num contexto em que durante anos confundimos reconhecimento com relação.
Este é, por isso, o momento em que estas transformações deixam de ser escolhas estratégicas e passam a funcionar como critérios de sobrevivência. O verdadeiro desafio não reside em adotar tendências, mas em saber integrá-las com visão, coerência e algum bom senso. Num mercado onde tudo é mensurável, replicável e rapidamente ultrapassável, a vantagem competitiva não está em fazer mais, nem sequer em fazer primeiro, mas em fazer melhor, com a certeza de que não se precisa explicar ao consumidor para ele perceber de “caras” qual é a nossa proposta de valor enquanto marca.
André Alves,
Brand & Digital Marketing Diretor da Católica Lisbon Business School & Economics





