Opinião

Family Offices: as novas potências do capital privado

Maria Gabriela de Orleans e Bragança

Nos últimos anos, temos assistido ao surgimento dos Family Offices como intervenientes ativos, sofisticados e estrategicamente posicionados: uma mudança estrutural no ecossistema de Private Equity (PE) e Venture Capital (VC). Historicamente, os fundos de VC do primeiro quartil têm gerado retornos superiores aos de PE, mas os resultados medianos são mais baixos e dispersos, refletindo o perfil de maior risco/maior retorno desta classe de ativos. No entanto, os Family Offices, que outrora eram estruturas dedicadas sobretudo à preservação de capital, tornaram-se agora verdadeiros motores de investimento, com processos e equipas a operar ao nível dos maiores fundos mundiais.

Esta transformação não aconteceu por acaso. Três fatores decisivos explicam como os Family Offices estão a expandir as suas operações em Private Equity. O primeiro é a profissionalização interna: a contratação de gestores de topo provenientes de fundos de PE, bancos de investimento e consultoras estratégicas introduziu metodologias avançadas de due diligence, processos de gestão robustos e uma abordagem altamente profissionalizada à gestão de risco. O segundo é a natureza do seu capital, que se distingue por ser paciente e flexível. Sem dependência de ciclos de captação de fundos ou horizontes de liquidez curtos, podem comprometer-se com estratégias de longo prazo, reagindo com agilidade sempre que surgem oportunidades estratégicas. Por fim, os Family Offices demonstraram uma forte capacidade de adaptação às alterações do mercado. Em resposta a disrupções tecnológicas, à crescente exigência em termos ESG e à volatilidade global, expandiram as suas estratégias para setores emergentes, como inteligência artificial e energias limpas — muitas vezes entrando diretamente em negócios e participando ativamente em coinvestimentos.

Esta evolução está a transformar o ecossistema. Primeiramente, porque os Family Offices fornecem um tipo de capital que preenche lacunas onde os fundos tradicionais, limitados por métricas de curto prazo, frequentemente não conseguem operar. Depois, porque a sua capacidade de investir através de vários modelos de envolvimento — incluindo Fund-of-Funds, fundos diretos e coinvestimentos — posiciona-os tanto como concorrentes diretos como parceiros estratégicos dos General Partners. Embora o chamado debate sobre as “duplas comissões” persista, reflete essencialmente as compensações entre acesso, diversificação e controlo que estes diferentes modelos oferecem.

Olhando para o futuro, podemos esperar uma integração ainda maior destes investidores no núcleo do panorama de PE e VC, nomeadamente através do reforço da dimensão europeia. A Europa possui talento e liderança fortes em deep tech e clima, mas continua a enfrentar uma lacuna de financiamento para scaleups. Os Family Offices podem desempenhar um papel catalisador na colmatação dessa lacuna, mantendo simultaneamente uma exposição global, ao conectarem-se cada vez mais a nível internacional, partilharem oportunidades de investimento, liderarem rondas de financiamento e influenciarem setores inteiros. Para gestores de fundos, empreendedores e outros investidores institucionais, ignorar esta mudança não é apenas um erro estratégico, mas também uma oportunidade perdida de colaborar com uma das fontes de capital mais adaptáveis e resilientes atualmente.

A escala que os Family Offices estão a atingir deixou de ser uma tendência emergente: é agora uma realidade que molda ativamente a atualidade do investimento privado. Uma vez que o venture capital implica maior risco e ampla dispersão de resultados, só se torna um componente resiliente e indispensável de um portefólio quando apoiado por estruturas adequadas e diversificadas.

Maria Gabriela de Orleans e Bragança,
Head of Marketing at Ventures.eu

 

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