Opinião

O setor imobiliário refugia-se no passado

Tiago Dias

O mercado imobiliário tem resistido às profundas transformações tecnológicas que outros setores adotaram rapidamente para assegurar a competitividade no mercado. A tradicionalidade com que se conduz as operações de compra, venda e arrendamento de imóveis fomenta a complexidade e opacidade de todo o processo. Num mundo cada vez mais digital e repleto das mais variadas soluções, não faz sentido perpetuar práticas ultrapassadas neste setor vital para a economia.

Continuamos a assistir a práticas antiquadas e, muitas vezes, inseguras, especialmente quando se trata da proteção de dados das partes envolvidas, por exemplo. É comum que informações sensíveis, como cartões de cidadão, extratos bancários e declarações de IRS, sejam enviadas através de um simples e-mail aos agentes imobiliários. A desconsideração das potenciais implicações graves e perigosas da falta de privacidade e segurança não podem ser tratadas de forma leviana. Estas práticas desrespeitam o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados ao colocar em risco a integridade dos dados pessoais dos clientes. A falta de canais seguros ao trabalhar com informações sensíveis é alarmante e, francamente, inaceitável no século XXI. É importante que o setor imobiliário evolua, adotando soluções tecnológicas modernas e que primem pela cibersegurança de modo a garantir a privacidade dos dados.

Ignorar soluções poderosas como as tecnologias descentralizadas para facilitar este tipo de interações não é prudente. Aliás, há um paralelismo muito interessante que podemos fazer entre as novas tecnologias e, por exemplo, um simples computador. O computador já é parte da nossa vida diária, mas na década de setenta, quando surgiu o primeiro de uso pessoal, também havia receio e, veio-se a ver, não havia motivos para tal.

Infelizmente, há muitos mitos envolvidos à volta da blockchain, frequentemente emparelhada com o mundo da cripto. É imperativo que não se confundam criptomoedas com a tecnologia que as suporta. A blockchain implementa uma estrutura de dados com registos de transações assinados digitalmente para garantir a sua autenticidade e imutabilidade, distribuídos numa plataforma com várias camadas de registos partilhados e autenticados. Cada nova transação validada é adicionada como um novo “bloco” na cadeia de informação. A aplicabilidade da blockchain no mundo real e o valor que pode trazer para a sociedade e para a troca de valor em vários setores parece inquestionável. Está na altura do mercado, reguladores e decisores perceberem que esta tecnologia é um catalisador para tornar o mercado mais transparente, fiável, eficiente. Não deve ser vista como uma ameaça, mas sim como uma inevitabilidade benéfica.

Apesar dos desafios a serem resolvidos, o progresso das startups na área parece promissor, prevendo-se a escalabilidade de soluções baseadas em tecnologias distribuídas nos próximos dois a três anos. Sairá beneficiado quem já tenha automatizado a sua empresa, os inovadores. As tecnologias descentralizadas irão ter uma palavra fundamental na forma como os processos imobiliários serão moldados e abrirá a porta a uma série de formas de gerar valor que nunca antes foram possíveis. Posto isto, é essencial colocar o cidadão no centro do ecossistema de modo a promover um mercado mais confiável. Se o cidadão pede modernização é nesse sentido que devemos rumar, sobretudo se já existem soluções para estes problemas no mercado. Há que aproveitá-las e finalmente dar as boas vindas ao século XXI.

 

Tiago Dias,
CEO e fundador da Unlockit

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