É aceite por vários autores que a economia portuguesa era dominada, em 1973, na fase antes da revolução do 25 de Abril, por sete grandes grupos económicos, designados por muitos como os Sete Magníficos. Estes grupos eram sobretudo da área financeira, como o Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa, o grupo Banco Português do Atlântico, o Banco Borges e Irmão, o Banco Nacional e Ultramarino e o Banco Fonsecas e Burnay, mas não só. Do lado da indústria, os dois grandes gigantes à época eram o Grupo CUF, o maior, que controlava cerca de 200 empresas, e o Grupo Champalimaud, que controlava sobretudo setores de base, como o dos aços e dos cimentos.
Destes, centramo-nos em apenas três deles, considerados os dominantes, na mão de três poderosas famílias, e que recuperaram, depois da revolução, algum do seu peso na economia nacional: os Mello, descendentes de Alfredo Silva, fundador da CUF, os Espírito Santo, descendentes de Ricardo Ribeiro Espírito Santo Silva, e os Champalimaud, descendentes de Henrique Sommer e de seu sobrinho materno, António Champalimaud.
O Estado Novo não foi apenas sinónimo de uma política de repressão, mas também de uma política que permitiu o crescimento e a construção destas grandes empresas.
“Alguns destes sete grupos estavam ligados entre si por laços familiares. Grandes famílias que geram algum grau de consanguinidade, pois casavam muito entre si, criando a elite das elites. Isto é também uma maneira de controlar a forma como o capital das empresas circula, e o poder acionista se concentra”, explica Ricardo Noronha, investigador, com doutoramento em História, tirado na Universidade Nova de Lisboa, e cuja dissertação se dedicou à nacionalização do sistema bancário durante o processo revolucionário português. Adianta que estes eram também atravessados por rivalidades e disputas em vários setores e mercados, e marcados por ajudas do Estado, por monopólios e concessões privilegiadas, controlando até a própria fixação dos preços. Tinham quase todos uma base familiar, sendo que alguns eram controlados por mais do que uma família.
Grupos económicos crescem e modernizam-se
Segundo este historiador, o Estado Novo não foi apenas sinónimo de uma política de repressão, mas também de uma política que permitiu o crescimento e a construção destas grandes empresas. “Estes grupos vão modernizar-se aceleradamente à boleia da entrada na EFTA, do efeito do crescimento económico mundial e do crescimento da economia portuguesa, que se industrializa muito rapidamente”, diz Ricardo Noronha. Neste período de crescimento, o peso do produto industrial ultrapassa o do agrícola no PIB, mas também ultrapassa na população ativa. Esta industrialização assentava em salários baixos, muito abaixo do paradigma europeu.
Estes grupos tinham também uma relação privilegiada com o Estado e conseguiam assim manter taxas de lucro muito elevadas, sem correr muitos riscos, sem terem de investir muito em maquinaria, sem terem a pressão de enfrentar a concorrência e sem terem a pressão salarial. Aliás, o paradigma económico europeu a seguir à Segunda Guerra Mundial foi de um forte apoio do Estado a setores empresariais considerados estruturantes da economia, com grande peso na criação de emprego. “Porém estas empresas nacionais eram relativamente pequenas numa escala global – apenas o grupo CUF era uma das maiores 500 empresas europeias”, refere Ricardo Noronha.
Fase de crescimento acaba com o primeiro choque petrolífero
Nuno Valério, licenciado em Economia, e investigador do ISEG, especialista em História económica, recorda que estes grandes grupos foram fruto de um ambiente económico favorável. “Entre o fim da Segunda Guerra Mundial e 1973 houve um grande crescimento da economia mundial e também da economia portuguesa, como nunca tinha havido e nunca mais voltou a haver. Foi um período de crescimento fantástico, e isso obviamente ajudou a criar um bom ambiente para os negócios. Esta fase acabou com a crise de 1973, o primeiro grande choque petrolífero”, refere o economista. Este investigador relata então que a situação de crescimento destes grupos foi perturbada pela crise internacional do outono desse ano. “É frequente associar os problemas destes grupos à revolução do 25 de abril, e às nacionalizações e aos novos poderes, mas na verdade os problemas vinham de trás, de uma crise do sistema monetário internacional, no final dos anos 60 e no princípio dos anos 70, mas que tem o grande choque no outono de 73 com a crise petrolífera”, recorda o autor.
No outono antes da revolução tudo muda: acabaram as reservas e as remessas dos emigrantes, há subidas enormes de preços, particularmente da gasolina.
Foi a partir daqui que se quebra o ciclo de crescimento económico, que cai a balança de pagamentos portuguesa – o principal problema do país nos meses seguintes – e quando se chega ao 25 de Abril, a situação económica é extremamente negativa, com tudo o que se passava na altura, agravada pela guerra colonial, que não deixava ninguém satisfeito. “Do ponto de vista económico, antes do choque petrolífero, Portugal até estava bem, havia alguma prosperidade, não havia desemprego – claro que havia alguma emigração, mas havia prosperidade”, refere o especialista. Adianta que, nesse outono antes da revolução tudo muda: acabaram as reservas e as remessas dos emigrantes, há subidas enormes de preços, particularmente da gasolina. “Isto acontece seis meses antes da revolução do 25 de Abril, quando tudo está a correr mal. Quando se vai ver as contas e os negócios desses grupos, também começaram a correr mal”, explica Nuno Valério.
(Leia o texto integral na edição de abril/maio da Forbes Portugal, já na banca)